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Eu a segui até a praia, onde a mesma se sentou sem se importar de sujar seu vestido, tão perto da água que as pontas dos seus dedos encontravam a areia úmida. Repeti o mesmo processo me sentando ao seu lado tão perto que nossos ombros se encontram.

— Estou ouvindo. — Sua voz era calma exatamente como os sussurros das ondas que se quebravam.

Fechei os olhos, respirei profundamente e me espantei de cada fagulha de medo e covardia.
Por ela, por mim.

— Quando eu tinha três anos eu sofri um trauma que me causou uma doença que se chama afasia, que me fez perder a capacidade de fala corretamente. — Eu não a encarei, não podia. — Os médicos disseram que o meu caso era raro, porque não tinha batido minha cabeça e nem tive um AVC para que a doença crescesse em mim. — Observei o céu me lembrando de cada coisa. — O que aconteceu foi que eu presenciei uma agressão, um abuso. Eu vi meu próprio pai fazer aquilo com a minha mãe e algo em minha mente se rompeu.

Eu ouvi so som surpreso que saiu dela.

— Rafael eu sinto muito.

Balancei a cabeça tentando parecer indiferente.

— Um tempo depois eu descobri que teria um irmão, ou uma irmã nós não sabíamos. Mas minha mãe o perdeu, e com ele a capacidade de ter filhos. — meus olhos marejaram.— Eu era muito novo mas ainda tenho flashes da minha infância, dos dias em que meu pai passou a culpar ela por ser fraca, por não ter suportado. 

— Meu Deus isso é terrível...

Mas eu continuei.

— Eu era o único filho que ele teria, e estava emocionalmente doente. — Murmurei. — Eu não falava, não brincava, não esboçava reação alguma na presença de Ebrom por medo de acontecer algo comigo também. Mas mesmo eu não falando eu tinha ciência de tudo, eu ouvia as empregadas palpitar, as ouvia humilhar a mamãe e também ao meu pai. 

As lembranças eram como água, e ela escorria pelos meus lábios secos e trêmulos.

— Quando eu completei quatro anos, os médicos orientaram aos meus pais um cão de apoio. — sorri tristemente. — Ele foi sim meu apoio por muitos anos, nos escondíamos juntos e eu até brincava com ele por que o mesmo começou a ter uma postura negativa diante do meu pai. Ele não podia chegar perto de mim, ou Luke o atacaria.

— Luke? Por isso sua tatuagem perto ao peito?

Assenti.

— Eu conseguia dizer algo a um cachorro, mas nunca a minha mãe, e nem ao meu pai. E com o passar dos anos ele começou a entrar em desespero, seu único herdeiro era um inútil. E então ele passou a me maltratar assim como fazia com minha mãe, ficamos nessa por muito tempo. — A Olhei. — Rafael Marquenze é um bastardo, Rafael não é o meu filho, ele não merece meu sobrenome, será pra sempre um inútil, ninguém vai amar você nem mesmo sua mãe. O que será da empresa? — Estalei a língua odiando o sabor das palavras. — Eu me mantia em silêncio e me escondia depois todas as vezes. Até que ele tentou fazer aquilo de novo, estava chovendo do lado de fora. Era tarde da noite, mas ouvi seus passos, eu estava com um livro nas mãos e uma caneta entre os dedos.

Ana não desviou os olhos, e agonia transbordava dele. Toquei sua mão na areia porque eu não queria que ela sentisse o mesmo que eu, a mesma sensação de estar afundando.

— Eu entrei no quarto, e o vi, os ouvi.— Mordi meus lábios com força até que a dor do meu coração diminuísse. — Ela implorava para que ele não gritasse, ela dizia para falar baixo porque não queria que eu ouvisse. Naquela noite ela vestia o vestido favorito dela, ele era azul, lindo e a deixava tão linda que todas as vezes que ela vestia eu a desenhava.

Secretária Quinn. (SERÁ RETIRADA EM BREVE)Where stories live. Discover now