Admit that it hurts you

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Fazia menos cinco graus lá fora, estávamos no início do inverno. Ele havia chegado perto da meia-noite, sem avisar, como sempre. As taças de vinho ficavam sempre a postos, eu sabia que ele vinha uma hora ou outra. Seus lábios carnudos e aveludados ficaram vermelhos depois da primeira taça e eu tentei não olhar tanto para eles. 

Ele agia como se fossemos coleguinhas. Apenas conhecidos que bebem vinho no meio da noite. Coisa normal. Talvez eu seja o único lúcido entre nós dois. O único que entende o que fazemos, o porquê fazemos. Ele finge que não sabe, que não entende, e me olha com aqueles olhos redondos de cervo amedrontado. Como se eu fosse uma ameaça. Mas eu é que deveria parar de abrir a porta. 

Não. Eu não poderia. 

Antes de uma da manhã, a garrafa está vazia, e o aquecedor parece nos sufocar. O ar do quarto é pesado, tudo está silencioso em nossa volta, o que me permite ouvi-lo com ainda mais clareza, mesmo que ele se esforce para não deixar rastros do que estamos fazendo. 

O corpo curvilíneo se contorce embaixo do meu, as mãos pequenas agarram meus lençóis e sua boca entreaberta vez ou outra deixa escapar um gemido esganiçado. Tento ser lento o suficiente para que ele peça por mais, mesmo que sem uma palavra sequer. Seu corpo fala muito melhor do que ele poderia. 

Apertar sua pele é a minha parte favorita, deixar que meus dedos se afundem nele, enquanto sinto que cheguei onde precisava, de onde ele não consegue mais escapar. Os gemidos fogem dele cada vez mais longos. Eu poderia ouvi-lo o dia todo, todo dia. 

Quando suas mãos não aguentam mais, trocam os lençóis pelos meus braços e é como se ele pedisse então, finalmente, para que a vagareza acabasse. Ele não aguentava mais. Acato seu pedido, invisto contra seu quadril e o som das peles se chocando é delicioso, eu sei que ele gosta. 

Mais gemidos, meu nome baixinho escapando pelos lábios que amo tanto, mesmo não os tendo de fato. Nossos beijos são escassos, porque fazem parte de um limite que ele colocou. 

Não importa. Continuo, e sinto meu corpo ferver, o ar me sufocar, a onda de prazer subindo. Quero dar tudo a ele, cada parte de mim. Pelo menos todas que ele quiser. Seu corpo arqueia e suas pernas se entrelaçam em minha cintura. Consigo ir um pouco mais fundo, o toque necessário para fazer com que ele desabe sob mim. Entregue ao que ele não consegue admitir. 

Não consigo me afastar, mesmo depois de me desfazer dentro dele. Continuo ali, com as minhas mãos em sua pele, dentro dele, ouvindo sua respiração ofegante, o suspiro de alívio. Eu faria tudo por ele. Faço, na verdade. Isso é tudo que posso fazer. Deixá-lo entrar quando decide vir, beber o vinho que gosta, e fodê-lo até que se esqueça da merda que é sua vida fora das paredes do meu quarto. 

Talvez um dia ele apareça e decida trocar o vinho pelo café. Decida tomar banho comigo e dormir ao invés de foder. Podemos fazer as duas coisas, é claro. Mas é simbólico. É importante ficar. 

Ele não fica. Mesmo que suas pernas estejam bambas e minha porra ainda escorra de dentro dele, ele não fica. Vai ao banheiro e em cinco minutos já está vestido, me vendo ainda nu, sentado na cama, acendendo um novo cigarro. 

Ele me olha de novo com os olhos de cervo amedrontado. Trago o cigarro e sorrio de canto, dizendo silenciosamente a ele que pode ir, se assim quiser. E ele vai. Sai do meu quarto sem dizer nada, e penso mais uma vez no quão patético posso parecer naqueles momentos. 

Quando acho que ele já foi, percebo seus passos voltando para o quarto. Meu coração bate mais forte e minha cabeça recebe mais sangue do que o normal. Aquilo não faz parte do seu script. Não sei o que ele vai fazer. 

Assim que me olha de novo, entra rápido demais para que eu consiga assimilar. Quando percebo, ele está parado bem na minha frente, se inclina um pouco e segura meu rosto com aquela mão pequena e macia. Clamo por tudo que ele me beije. Pelo menos dessa vez. E ele beija. Com mais vontade do que jamais beijou. Seu gosto é tudo que eu quero, e eu nunca me esqueço dele. Balas de morango e cigarro caro. Ele puxa meu lábio inferior ao parar. Não quero que pare, mas me contento com o que tenho. Não consigo tocá-lo depois disso, sei que não o deixaria ir. E ele precisa ir. 

Ao sair de novo, não olha para trás, o que é bom, porque seu patético colega de vinho fuma e chora enquanto o vê partir. Não é algo bonito de se ver. 

Se eu disser que estarei esperando que ele volte, quão idiota vou parecer? 

Não responda.

Por favor...

Ghostin | JIKOOKWhere stories live. Discover now