I hope you're as good in bed as you are in the fields

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O som do trânsito e da correria de São Paulo me invadia os ouvidos, me lembrando o porquê de eu não ter sentido falta de casa. Minha mãe, no telefone esmagado entre meu ombro e minha bochecha direita, tentava soar mais alta do que o barulho da capital, mas não era exatamente eficaz. Em plena Vila Mariana, por mais que ela tentasse, eu só conseguia entender duas de cada dez palavras que ela falava. Algo como "Churrasco. Amiga. Voo. Sobremesa. Vem". O que queria dizer, obviamente, que estava tendo um churrasco na casa de alguma amiga dela, e que eu tinha que ir pra lá antes do nosso voo. E, lógico, sem esquecer a sobremesa.

– Onde, mãe? – perguntei tentando manter meu tom de voz normal. Tudo o que eu não queria no momento eram pessoas me olhando com aquela cara feia de trabalhador paulista que passou o dia ralando e agora vai descontar no primeiro que aparecer.

– Diadema. – ela disse, e com a desculpa de que a ligação estava ruim, desligou.

E foi assim que eu fui parar em um carro alugado no meio do trânsito da Rodovia dos Imigrantes com Molejo na rádio e uma torta britânica de limão no banco do carona com, claro, o cinto de segurança a prendendo. Eu não queria e nem iria levar uma multa, duh. (Mais tarde minha mãe me explicou que tortas não precisavam de cinto de segurança, mas quem sou eu pra arriscar?)

Nem preciso dizer também que, no trânsito de meio-dia (maldita hora pra estar todo mundo saindo do trabalho, da escola, da faculdade), demorei bem mais do que os 28 minutos necessários no percurso, e quando cheguei na casa da tia Regina (eu esperava que fosse lá, porque não conhecia mais nenhuma amiga de Diadema), já se passava de uma da tarde. E eu estava mais ou menos parecida com um daqueles trabalhadores paulistas.

– Ela chegou! David, vai ajudar ela com a torta! – disse tia Regina quando me viu saindo do carro com aquela cara de tacho disfarçada com grandes óculos escuros e contornava o carro para pegar a bandeja redonda com a torta.

– Ninguém toca na minha torta, tia! – eu disse em um tom brincalhão, mas com um fundo enorme de verdade.

– Fiquei sabendo que é sua especialidade. – ela disse sorrindo e empurrando o portão para eu passar.

– Bondade da minha mãe. É literalmente a única coisa que eu sei fazer na cozinha além de lasanha. E isso inclui miojo. – contei, rindo, e me inclinando para dar um beijo no rosto da mulher que havia apresentado minha mãe ao meu padrasto; o que, com a graça de Deus, nos tirou do Brasil.

– Difícil acreditar, olha a cara disso. – tia Regina disse e me guiou para o que parecia ser a cozinha, e onde muitas outras sobremesas brigavam por espaço na grande mesa.

Do lado de fora, a churrasqueira sendo manuseada por pelo menos três homens (entre eles, tio Landislau, marido de tia Regina) exibia peças de picanha dignas de um churrasco gaúcho de tão grandes. O churrasco parecia, de alguma forma, aberto. Reconheci vários rostos entre os adultos na área da churrasqueira, mas eles não podiam ser os pais de todas as 50 crianças que corriam no quintal e formavam fila para o pula-pula. Isso seria demais.

– David! David! – ouvi uma criança gritar mais alto do que as outras.

– Oi? – ouvi uma voz meio cansada meio divertida responder. O dono dela, um cara magro e alto, com seus um e noventa de altura e cabelos cacheados e volumosos, estava rodeado de crianças de todos os lados estendendo blusas, papéis e fotos que ele assinava, pacientimente, um por um.

– Me dá uma bola? – o garotinho perguntou.

– Ih, isso aí eu não sei não, tem que ver com a minha mãe. – respondeu de um modo simples que me fez rir. Eu e todo mundo que assistia, claro.

Good in fields, better in bedWhere stories live. Discover now