PRÓLOGO

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Ataque.

Finta.

Defesa.

Reação.

Tec.

Tec.

Tec. Tec. Tec.

O barulho dos bastões ecoava no imenso espaço de treinos do mosteiro de Navas. suor escorrendo pelo rosto, e conseguia responder a todos os golpes do homem mais velho. Os movimentos fluíam naturalmente, causando um leve sorriso no ancião que assistia a luta.

Ele estava sentado em um tapete, as pernas cruzadas, acompanhando cada defesa e cada ataque, satisfeito com o resultado de todo o seu planejamento. Ao seu lado, um emissário de Alderã, vestido com o azul e o laranja daquela terra, observava a tudo no mesmo silêncio.

Os bastões continuaram se batendo por mais alguns minutos até que a criança deu um pulo e foi para trás do seu oponente, derrubando-o com uma rasteira. O vencido direção do velho que assentiu.

— Jovem aprendiz, novamente me venceu. Parabéns.

A voz do ancião soou suave e sonora.

— Agora, se recolha e medite até a hora do jantar – o rosto da criança sombreou e o professor riu. – Amanhã, você terá a tarde para brincar nos jardins. Vá!

Fez uma cortesia com a mão direita na direção dos homens sentados e saiu correndo, a energia de quem viveu apenas um pequeno pedaço da vida. Quando seus passos já não eram mais ouvidos no salão, os três homens se encararam.

— Mestre Fuentes tinha razão de elogiar a criança, comandante Delamer. Nunca encontrei alguém com tanta habilidade.

— Sim, é a nossa melhor aluna em todas as artes marciais. Domina o bastão e o combate corporal, além do arremesso de lâminas.

Os dois visitantes se espantaram, mas tiverem autocontrole o bastante para não comentar sobre o que Mestre Fuentes tinha dito. O velho também se controlou e não sorriu, porém no seu íntimo sentia uma pontada de triunfo por ter pego os dois de surpresa.

— Fico pensando no que poderia fazer com uma espada... Com um pouco de treinamento. – O capitão da infantaria de Alderã ficou olhando para o pórtico por onde a menina saíra.

Fuentes sacudiu a cabeça.

— Achamos que espadas e lâminas de combate não seriam uma boa ideia para Analuz, por causa da sua cegueira.

— Cega? Isso é impossível.

A afirmação do velho monge fez com que os dois enviados do reino se olhassem surpresos.

— Não, não é, capitão Detreville. Nós a treinamos pensando justamente em esconder isso dos demais para que pudesse usar isso a seu favor em um combate. Agora, acho que o senhor também irá querer se refrescar antes de comermos.

O soldado percebeu que estava sendo dispensado e se retirou com uma reverência cortês aos dois homens mais velhos. Jules Delamer e Augusto Fuentes conheciam-se desde jovens, filhos de homens poderosos, acostumados a tomar decisões e treinados para isso.

— Você tem certeza que é sobre ela

— A  cegueira tirou todas as nossas dúvidas e nos levou a ela. Em dez anos, a mudança irá começar.

Delamer ergueu-se e estendeu a mão para seu amigo, que aceitou a gentileza.

— E será que podemos confiar o destino de todo um mundo nas mãos de uma adolescente cega?

— Ela é muito mais do que isso. E não estará sozinha... As peças estão começando a se juntar e mover, Jules.

— Sentiria mais confiança se estivéssemos falando de um exército, de homens feitos e bem armados.

O velho sorriu, enigmático.

— Existem muitos tipos de armas, Jules. Ela terá tempo para aprender a lidar com muitas delas e outras serão trazidas por seus companheiros. A balança irá pender ao nosso favor, não se preocupe.

Os dois chegaram na varanda do templo, que ficava numa pequena elevação no meio de um imenso vale. Bosques de árvores perenes espalhavam-se em todas as direções e o perfume suave de flores espalhava-se na brisa.

— É triste saber que estamos criando um ser com tanto talento apenas para matá-la antes dos 18 anos.

— A morte é o destino de todos nós. A dela terá um propósito.

Caminho para Mandalay (Andarilhos da Tempestade I)Where stories live. Discover now