Indignado, Thomas balançou a cabeça. Ele nunca havia dito aquilo para ninguém, nem mesmo para Nancy. E aquilo estava dentro do peito dele fazia muito, muito tempo. Um dia, aquela mulher tinha sido alguém de confiança, mas mais do que nunca, Thomas só tinha Nancy.
Um soluço incontrolável escapou da sua garganta, mas nem isso tinha comovido Ava, que continuou a examinar os documentos e papeladas. Ele saiu da sala rapidamente, envergonhado por ser um rapaz de dezesseis anos e estar chorando como um garotinho, realmente se sentindo um menino mimado e ingrato. Thomas tentava parar de soluçar enquanto fazia o caminho de voltar para o seu quarto, pelo menos para chorar tudo o que pretendia com o travesseiro socado no rosto, mas de nenhuma forma ele conseguia.
- Thomas! - Teresa gritou de algum lugar, o que fez Thomas querer fugir ainda mais rápido. - Ai, meu Deus... Thomas!
Teresa conseguiu agarrar o punho dele e ficou espantada ao ver o colega chorar daquele jeito, apesar de saber o motivo. E de ter isso jogado na cara.
- Foi culpa sua! Aquilo foi culpa sua! - ele acusou, mas a voz tão falha que Teresa mal tinha entendido. - Por que você não desligou a esteira? Por que você não desligou a porcaria da esteira, Teresa?
- M-Me desculpa. Eu... Eu não pensei direito.
- Você jura? - Thomas desvencilhou o punho das mãos dela. - E eles concordam com você! Acham que quem armou a confusão fui eu!
- Eu sei! Me desculpa! - ela exclamou, prestes a chorar junto com ele. - E-Eu só queria que a Nancy ficasse segura dessa doença e que ela pudesse ajudar os outros...
- Mas você perguntou se ela queria isso? - ele rebateu. - A Nancy não aguentava mais. Ontem, ela não conseguia dormir e teve que tomar um remédio pra isso. E eu também tenho certeza de que a Nancy se sente sozinha, porque ela me pediu pra ficar até que ela dormisse. E você...
- A Nancy me perdoou. - Teresa interrompeu, a postura ereta mostrando que ela não se intimidaria com a mágoa de Thomas, apesar de deixar algumas lágrimas escaparem.
- Ela o quê? - Thomas parecia não ter ouvido direito, mas na verdade, ele não queria acreditar. - Você conversou com ela?
- Sim. E ela me perdoou. - Teresa repetiu, frustrada. - Eu pensei que vocẽ pudesse fazer o mesmo, mas... Deixa pra lá.
Thomas se sentiu culpado por isso, mas ele não conseguia perdoá-la. E jamais poderia dizer que a perdoava se não fosse verdadeiro, não seria justo com nenhum dos dois.
- Eu sei que ela se sente sozinha, mas eu fiz o que eu pensei ser certo e melhor pra todo mundo. E apesar de ter feito isso cometendo um erro, a Nancy me perdoou. - Teresa confessou, deixando mais algumas lágrimas fugirem dos seus olhos azuis. - Ela tá no subsolo oito.
Teresa se afastou indo na direção oposta a que Thomas pretendia ir, mas ele ficou parado no lugar por alguns segundos, pensando sobre tudo aquilo. Como Nancy conseguia ser uma menina tão boa assim?
Sem hesitar mais um segundo, Thomas saiu correndo, atropelando algumas pessoas sem querer no meio do caminho. Quando chegou no elevador, praticamente socou o botão com o número oito. E apesar de serem apenas três andares, para Thomas, tinha sido uma eternidade.
O sino do elevador soou e a porta se abriu lentamente, mas o garoto estava tão desesperado que quase levou a porta junto ao sair dali. Ele foi andando pelos corredores repletos de portas, todas abertas por todas as cobaias já estarem no seu respectivo experimento, mas havia apenas uma que estava fechada e quem estava ali dentro não pertencia àquele protocolo. Ou não deveria, pelo menos.
- Nancy? - Thomas chamava sem parar enquanto andava pelos corredores, quase tonto de tanto procurar por ela. - Nancy!
- Tom! - ele a ouviu chamar, a voz chorosa e desesperada também. - Tom! Aqui!
- Nancy!
Havia uma porta fechada e pela janelinha que havia nela, Thomas pôde ver uma silhueta ruiva que ele reconheceria até plantando bananeira. Ao se aproximar, viu que Nancy também tinha chorado muito.
- Nancy, você tá bem? - Thomas perguntou, mexendo na maçaneta. - E-Eu não tenho a chave.
- Tudo bem. Eu tô bem. - ela respondeu, apoiando as mãos na porta e fazendo uma cara de choro. - O que eles vão fazer comigo, Tom?
Nancy tinha perguntado aquilo com a voz tão embargada que Thomas soluçou mais uma vez, mas tentou se controlar para não assustá-la ainda mais do que a garota já estava.
- Eu não sei, Nancy. Eu não sei. Eles meio que me afastaram do cargo depois da confusão porque eu... Eu sou um impulsivo descontrolado e mimado.
- Isso não é verdade. - Nancy choramingou. - Você não é assim.
Thomas estava tão triste com aquilo tudo que não conseguiu responder, apenas soltou um suspiro entrecortado pela vontade crescente de chorar. Ele queria abraçá-la. Abraçá-la com força e não soltá-la mais para esquecer daquele dia horrível, mas tinha aquela porta de ferro entre eles e nenhum dos dois tinha a chave - como se não bastasse dias e mais dias se vendo através de uma vitrine durante um experimento exaustivo, com apenas alguns minutos de conversa entre os intervalos do rapaz. E lembrar do final de tarde do dia anterior, quando Nancy tinha "dormido" nos braços de Thomas, não aliviava aquela agonia toda, só aumentava.
- Por que você não tá brava comigo? - ele perguntou, pendendo a cabeça para um lado enquanto fazia uma cara de choro terrível. - Você é tão... Tão boa. Por que você não tá brava? Fui eu que... É culpa minha. Eu não consegui impedi-los e agora... Me desculpa, me desculpa...
- Tom, não! Tá tudo bem, tá tudo bem... - Nancy soluçou, vendo-o chorar e chorando mais ainda. - Não chora, por favor. Tá tudo bem...
Thomas apoiou a cabeça na porta, um pouco abaixo da janelinha que havia nela. Ele deu um soluço alto quando bateu com o punho fechado na porta de ferro, sentindo uma pontada de remorso ao fazer isso por ter pensado que tinha assustado Nancy. Depois, sentiu que ela empurrou a porta bem de leve com as mãos, como um filhotinho tenta usar uma portinha da qual não está acostumado. Ela sabia que era uma tentativa inútil, mas não tinha outra reação.
- Eu não estava dormindo ontem, quando você saiu do quarto. - Nancy confessou em um sussurro, fazendo Thomas levantar a cabeça rapidamente. - Eu ouvi tudo e... Também acho que tava muito bom com você lá e também faria qualquer coisa por você. E eu também... Eu também gosto muito de você. Muito mesmo.
O garoto ficou sem reação, mas com certeza tinha gostado do que tinha ouvido. Ele queria tocá-la, segurar a mão dela ou até mesmo o rosto e fazer algo que nunca tinha tentado, mas que queria muito fazer. Porém, tinha a porcaria da porta entre eles. Thomas bateu nela mais uma vez, só que mais fraco do que a primeira, deixando um soluço baixinho escapar.
- Eu preciso tanto te abraçar... - ele choramingou, fazendo Nancy chorar mais um pouco também.
- Eu também. - ela respondeu, querendo arrebentar a porta, mesmo sabendo que estava fraca demais para fazer alguma coisa assim.
- Parado aí! - alguém gritou na esquina do corredor, que não era muito distante, mas ainda assim era uma distância considerável.
- Quem é? - Nancy perguntou, tentando ver pela janelinha quem estava vindo.
- Droga. - Thomas resmungou quando viu três guardas virem na direção dele.
Ele sabia que estavam ali por causa da visita não permitida, mas ele não compreendia por que não podia ver Nancy. E aquilo o deixava mais irritado.
Thomas tentou dar o soco no primeiro que tentou avançar, mas o guarda era habilidoso e segurou o braço dele, desviando o golpe e aproveitando a situação para lhe dar uma joelhada na barriga.
- NÃO! - Nancy gritou, dando um murro na porta que demandava quase toda a sua energia quando viu os três guardas entrarem no seu campo de visão limitado do corredor. - POR FAVOR, NÃO!
O guarda que havia nocauteado Thomas imobilizou o mesmo no chão com os braços nas costas, juntamente com um que reclamou:
- Por que mandaram nós três? - Nancy reconheceu aquela voz. - Acho que dois já bastavam.
Daniel. O reclamão do Daniel, mas Nancy nem se importou. Ela queria ver Thomas.
- Deixem ele em paz, por favor! - a ruiva choramingou, dando mais um murro na porta, mas todos fingiram não ter ouvido. - Eu só quero vê-lo!
O terceiro guarda - do qual Nancy ainda não tinha visto o rosto por causa da máscara e nem ouvido a voz - puxou uma seringa do bolso e aplicou com uma força um tanto desnecessária na parte de trás da coxa de Thomas, fazendo-o soltar um grito com a pontada de dor repentina.
- NÃO! - Nancy gritou, descontando tudo na porta. - Deixem ele em paz, por favor! Por favor! Deixem ele em paz!
Adormecido, Thomas não se debateu mais e Daniel e - provavelmente - Alan o ergueram, todo molenga por conta do anestésico forte. Enquanto isso, o guarda que havia aplicado o calmante se levantou e virou-se para a janelinha da porta, subindo a máscara que usava.
- Oi, Nancy! - era Harry, sorrindo com escárnio. - Olha só quem eu achei.
Harry agarrou o cabelo de Thomas e ergueu a cabeça do rapaz adormecido como se fosse algum tipo de caça, mostrando o rosto lavado de lágrimas do melhor amigo da ruiva.
- DEIXA ELE EM PAZ! - Nancy berrou, batendo na porta com os dois punhos e fazendo um estrondo ensurdecedor.
- Oh, se comporte! - Harry zombou, apontando para o rosto dela com sarcasmo atrás da janelinha. - Lembre-se de onde esse tipo de atitude te levou.
- SEU DESGRAÇADO! - ela berrou mais uma vez, batendo na porta sem parar enquanto Harry ia embora, seguido por Daniel e Alan, que carregavam Thomas. - Deixem ele em paz! Por favor! POR FAVOR!
Nancy gritava, berrava, espancava, chorava e esperneava sem parar, sentindo-se cada vez mais perto de arrombar aquela maldita porta de ferro, mas o tal momento de vê-la cair nunca chegava, mesmo com toda aquela ira que insistia em extravasar do seu corpo em forma de socos, pontapés e gritos. A ruiva causava um prejuízo enorme para quem quer que fosse pagar por aquela porta, mas não conseguia derrubá-la de jeito nenhum. Em determinado momento, Nancy decidiu que seu golpe final seria se jogar sobre ela.
A menina foi até a outra parede do quarto, pegou impulso ao ir correndo na direção do seu obstáculo e bateu com o ombro direito com toda a força que o seu corpo frágil e magro permitia naquele momento. Nancy deu um grito de dor com o impacto, sentindo que tinha perdido um membro do corpo por causa da força aplicada. Ela tinha ouvido a dobradiça do meio trincar, mas sabia que era necessário muito mais para que aquela porta tombasse.
E foi naquele momento que Nancy tinha cedido ao choro alto, soluçando para quem quisesse ouvir enquanto escorregava pela porta até se sentar no chão gelado de concreto daquela solitária. A quase todo segundo, ela pensava que não conseguia mais respirar de tanto chorar, mas não era por causa da dor no braço, era por causa da dor no peito.
Nancy e Thomas não tinham mais ninguém, apenas um ao outro. E mesmo assim, o CRUEL insistia em separá-los por causa de uma cura que eles nem sabiam se realmente existia. Ela não queria desistir de Thomas e nunca iria, muito menos para alguém como Harry, mas ela estava cansada. Cansada de lutar. Cansada de perder todo mundo. Cansada de chorar.
Nancy encostou a testa e uma das mãos na porta arrebentada, deixando os soluços fazerem o seu peito saltar descontroladamente enquanto se recusava a acreditar que tinha perdido Thomas também. Ele era a única pessoa que podia consolá-la, mas também era a pessoa pela qual ela estava chorando. Completamente desesperada, ainda mais quando relembrou como era estar nos braços de Thomas, Nancy começou a chamá-lo, mesmo sabendo que não receberia uma resposta.
- Tom! - ela ouvia apenas os próprios soluços naquele silêncio doloroso. - Tom!