- Por que você esta deixando os seus sentimentos interferirem no fato de que Perséfone foi sim sequestrada, e que isso era e é errado?- Hwang perguntou.

- Primeiro que eu não estou deixando nenhum sentimento interferir na minha interpretação, mas sim, hoje em dia sequestro é entendido pela sociedade como algo abominável, mas a gente ta falando de um contexto onde sociedade nem existia. Na época desses contos algo assim era tão normal quanto assaltos são hoje, o que claro, não torna correto, mas você não pode ignorar o contexto. Existem discussões entre pessoas que realmente estudaram mitologia grega afundo sobre ter sido realmente um sequestro ou um resgate, inclusive. Hades salvou a Perséfone e ajudou ela a entender quem ela era e o potencial que ela tinha. Em muitos contos é retratado comportamentos tóxicos por parte da Deméter inclusive, se você realmente quiser analisar com os olhos da nossa sociedade de hoje. Nem tudo é sobre você, Hyunjin. - eu disse calmo, como se meu coração não estivesse prestes a sair pela boca.

- Mas se o meu argumento sobre o sequestro foi desconsiderado na sua opinião, o seu não faz o menor sentido também! Ambos levam em conta o olhar da sociedade de hoje. O resto é mera especulação, que não deleta os fatos. Era um sequestro. Eles nem se conheciam, Felix, pelo amor.- ele disse, muito mais calmo e claro do que eu. Acostumado com os olhares recebidos á sua pessoa.

Olhares e atenção não me caiam tão bem quanto nele. Por quê eu sequer pensei em discutir?

Me ajeitei na cadeira, ignorando o novo peso em minhas costas e ombros.

- Exceto que o meu ponto leva em consideração os sentimentos da Perséfone e nos faz entender que ela não estava de contra gosto alí. Se ela quisesse sair, ela sairia. Os seus só levam em conta o olhar da nossa sociedade enquanto menospreza as circunstâncias, contextos e os sentimentos dos personagens! - dessa vez sendo menos bem sucedido em esconder as emoções na minha fala.

- Eu não menosprezei as circunstâncias! Eu só... - certamente ele teria continuado falando com aquele maldito sotaque se não tivesse sido interrompido por Jisung, seu melhor amigo (e melhor pessoa naquela sala), que o havia dado uma cotovelada.

Como se estivesse pedindo para ele desistir.

O professor suspirou em agradecimento, ignorou solenemente nossa discussão e prosseguiu então a aula, fingindo que nunca tivera a estúpida idéia de propor um debate onde eu estava presente no mesmo ambiente que Hyunjin.

Ele não sabia que o único jeito que eu tinha de expressar a confusão de sentimentos que eu tinha pelo garoto era por meio de estúpidas discussões. Que eu sempre fazia questão de querer ganhar. E ele também.

Apesar disso, Hyunjin não parecia nem um pouco disposto a esquecer ou fingir que eu não o havia contrariado na frente de uma sala de trinta pessoas. Muito menos perdoar. Não, seu ego ferido não deixaria.

Depois daquele dia nossas brigas de ego se tornaram cada vez mais frequentes, indo de uma, duas vezes no dia para quatro, cinco, seis até.

As semanas iam se passando e nenhum de nós parecia mais disposto que o outro a largar o osso. A abrir mão do jogo de honra que estava rolando, chegando ao ponto de nossos colegas terem que interferir. Claro que não da mesma forma para ambos, não. Enquanto Hyunjin era avisado com pequenos gestos e brincadeiras, eu era avisado com olhares ríspidos e bufares. Era clara a preferência alheia.

E por causa disso, eu o invejava. O odiava.

Cada vez que a hostilidade era direcionada somente á mim quando era claro que ambos estavamos agindo da mesma forma infantil, feia e orgulhosa, era mais uma ferida no meu ego para somar contra Hyunjin.

Jisung, diferente dos nossos colegas, a
estava começando a amar e instigar cada vez mais as briguinhas bestas, parecendo se divertir cada vez mais com nossas farpas e provocações.

Não demorou muito para sua forma de instigar briga e caos mudasse para algo mais direto.

A sala estava desconfortavelmente silenciosa. Dava para ouvir os pássaros cantando no lado de fora da escola. Dava para ouvir até uma agulha caindo no chão, se tentássemos o suficiente. Nem eu e nem o garoto à minha frente queríamos falar qualquer coisa, um contraste tão diferente das horas que passavamos discutindo em uma situação normal.

Acontece que, de fato, não estávamos em uma situação normal.
Estávamos trancados. Sozinhos. Juntos.

Jisung tinha vindo até mim mais cedo, alegando estar com dificuldade em uma das matérias que tinhamos, me implorando tão piamente que eu concordei em ajuda-lo sem pestanejar, então ele pediu para eu o encontrar na sala a qual eu estava agora.
Demorou um pouco para que ele de fato aparecesse, porém, diferente do que eu esperava, puxando um Hyunjin igualmente confuso pelos braços, ao invés de seus cadernos.

Sua única resposta á minha expressão de "o que caralhos ta acontecendo?" foi jogar o mais alto dentro da sala, rapidamente fechando a porta, soltando uma risada infantil que fez eu e Hyunjin revirar os olhos.

Meu sangue esquentou e, junto á ele, meu rosto. Meus sentimentos misturavam entre confusão, raiva, vergonha, e, ao mesmo tempo, um sentimento de antecipação, me deixando totalmente sem reação.

O que mais me chocou foi ver Hyunjin reagir da mesma forma.
Esperava tudo dele, especialmente deboche e desprezo. Mas não o silêncio. Não o desconforto. Não as várias palavras que queriam - que deveriam, ser ditas, postas para fora, mas não eram.

"Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove...."

Eu contava os segundos para me acalmar e passar o tempo, quando sua voz doce e marcante vibrou no ambiente:

- Desculpa... Por ele...-

- Não é por ele que você tem que se desculpar não, Hyunjin. - respondo com deboche, relembrando propositalmente todas as vezes a qual ele me antangonizou por mesquinhez.

- Não sei do que você está falando.- ele alegou, rápido demais para ser verdade, e revirou o olhar, evitando me encarar.

Hwang Hyunjin nunca desviava o olhar. Por que agora..?

- Então nem se desculpa pelo Jisung, já que isso não é nada em comparação ao que a gente anda fazendo um com o outro. - resmunguei. Ainda que a situação estivesse desconfortável, sua mesquinhez ainda se fazia presente.

Ouvi um bufar antes de sua voz novamente se pronunciar:

- Okay, foi mal. Eu venho fazendo de tudo pra te tirar do sério. - ok, essa eu não esperava.

- Ta tudo bem, de verdade. Ta claro que você não gosta muito de mim, e acredite, o sentimento é mútuo, mas temos que fazer o possível para não parecer que estamos quase nos matando a todo momento. Temos mais de meio ano pela frente nessa escola e.... -

- Não, não! Você entendeu errado. Eu não estou tentando te provocar porquê te odeio! Eu faço isso porquê... é.. legal ver você irritado..- ele admite olhando para baixo, totalmente corado.

Suas palavras me deixam em choque por bem mais de cinco segundos, mas meu cérebro estava tão acelerado que mal processou o tempo perdido.

- ... Que? Como assim? - me fiz de desentendido.

Pânico, pavor, desconfiança e incredulidade brigavam entre si para ver qual sensação ocupava mais lugar na minha mente. Nenhum deles ganhava então todos eles ocupavam da mesma de forma totalmente desorganizada e confusa no meu cérebro.
Os meus pobres neurônios...

- É, ué... Você fica todo corado e desesperado...- ouvi o seu murmuro de resposta, mas mal me dera o trabalho de registrar. - Felix, eu gosto de você.

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