1_Os Comedores De Batata

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- Amy, você ainda me deve muito por me arrastar para festas que eu definitivamente não gosto de ir! - reclamo com a cara amassada enfiada no travesseiro.

Mais uma vez, mesmo depois de um ano, Amy continua tentando me arrastar para salões cheios de pessoas que já devem ser malucas só por serem artistas, quem dirá se recebem uma dose de álcool no sangue! E ela conseguiu dessa vez, algo absurdamente raro, mas acho que o fato de a minha pipoca de micro-ondas  ter queimado e estar sem manteiga no dia me fez achar que seria melhor ir com ela. E como eu fui idiota! Nolan estava lá, como sempre está, e também como em todas as vezes em que eu piso em uma festa ou evento de calouros ele me dá um sorriso convidativo. Eu sempre me pergunto como diabos as bochechas sardentas dele não ficam doloridas, ele sorri demais pra mim.

Eu costumo chamá-lo de Narciso; lindo, porém um belo pedaço de mau caminho.

Agora; deixe-me ter a honra de explicar a minha desgraçada situação atual: eu estou de ressaca; tenho olheiras mais fundas do que a fossa das marianas; minha maquiagem borrada faz a minha cara parecer a de um cadáver em decomposição e eu passei a noite inteira vomitando tudo o que comi no dia na banheira. Sim, na banheira, porque nem mesmo forças para abrir a merda da tampa da privada eu tive! este é o nível da minha humilhação.

Amy está de pé, lançando travesseiros com manchas de baba em mim. Ela já está arrumada; é claro que está, ela não dormiu e bebeu energético, não champagne. O cabelo colorido está desbotado e foi penteado apenas com os dedos, enquanto ela disfarça os lábios inchados pelos beijos - que eu chamaria de fusão pela boca - que ela trocou com Erick durante a noite toda com gloss labial. Os olhos verdes são enérgicos e estão absurdamente abertos, e é bom que estejam assim, se ela piscar irá cair dura e dormir no chão, babando no assoalho sendo pisoteada por Langa, nosso Lulu-Da-Pomerânia, que poucos vão intender o nome, infelizmente.

- Amélia, nós temos aula hoje!

Solto um resmungo, seguido de um gemido de dor. Me enrolo das cobertas, me parecendo com um cadáver enrolado num burrito!

- Você não pode dizer que eu morri? Não seria difícil fingir isso, eu estou basicamente fazendo um cosplay de Emily da Noiva Cadáver.

- Acredite em mim, eu adoraria, a sua cara está até azul! Mas você sabe que não pode deixar a matéria atrasar! se não você vai ficar mais um ano presa no manicômio! - O manicômio é a faculdade, e é muito triste saber que fui eu que quase fundi a minha bunda com a cadeira de tanto ficar sentada estudando para conseguir entrar aqui; sofrer por mais sofrimento; Van Gogh com certeza está se revirando no túmulo por me ver reclamar; ele morreu num hospício, e eu estou reclamando de uma prova. 

Espera... a minha cara está azul?

- Azul?

- É, tudo azul.

A desgraçada está mesmo rindo da minha cara? Ela que me enfurnou em um carro de Uber tarado para ir a uma festa do outro lado da cidade! Me levanto como se tivesse tomado cinquenta latas de energético - na verdade, se eu tomasse cinquenta latas de energético morreria, mas vamos fingir que a ciência não existe -, correndo desesperada para o banheiro. Merda! A sombra azul que usei ontem está borrada pelos cantos dos olhos e bochechas, o rímel escorreu e meu batom petrificou na minha boca! eu pareço duas coisas, uma palhaça e a Pablo Vitar! Para piorar, eu sinto o cheiro repugnante de vômito, e para o meu espanto ele ainda está na banheira, parece que o pé de elefante de Chernobyl se materializou no ralo. Quero vomitar outra vez, mas tudo que eu consigo fazer é encher a banheira de água e shampoo e entrar no banho - no chuveiro, claro, eu ainda não perdi a minha racionalidade para pisar no meu próprio vômito, seria muito, mas muito nojento! -  para manter o mínimo de sanidade.

Pinte Suas LágrimasWhere stories live. Discover now