— Mas eu amo você! Eu sou feliz com o que nós temos! Isso não faz o menor sentido Katharine!

— Não, não faz! E nem pode fazer! Estamos lidando aqui com o que você tem em sua memória afetiva, em seu subconsciente, com os seus antigos desejos. Nada disso pode ser considerado racional. Tudo isso começou a se misturar agora e não vai ser fácil controlar. Por mais raiva que você sinta por tudo o que ele te fez, hoje não é somente esse Dárius que se vai, mas também o Dárius que um dia você amou. É normal que você sofra com a morte dele e tudo o que ela representa, o que não é pouca coisa se tratando de um rei. E eu estou aqui do seu lado, pra te apoiar e te ajudar a lidar com tudo isso.

— Como isso não te incomoda? Como você pode considerar normal que eu esteja chorando a morte dele?

— Porque apesar da vida ter te endurecido, você tem um coração lindo! E eu amo isso em você! Seria uma completa falta de empatia não respeitar esse seu momento e não te ajudar a curar a sua dor. — Ela passa a mão pelo meu cabelo e segura minha mão — Amália, eu te amo e sei que você também me ama. É só o que eu preciso saber. Cuidar das nossas dores e de todos os nossos processos faz parte da vida que eu escolhi ter ao seu lado. Antes de tudo eu escolhi servir e cuidar da minha rainha e não pretendo parar de fazer em nenhum momento da minha vida.

— Eu não sei o que eu faria sem você  ao meu lado! Obrigada por ser tão forte, sábia e tão maravilhosa! Eu te amo!

Ela me dá um beijo na testa e me diz:

— E eu te amo mais!

Ela dá uma pausa e pergunta:

— Vou perguntar novamente: você está pronta, meu amor? Precisamos começar o cortejo.

Respiro fundo, cubro o rosto com o véu novamente e me levanto.

— Sim, agora eu estou pronta.

Dou um beijo em Alina e deixo ela aos cuidados da babá.

    Descemos as escadas principais do castelo e tinham duas fileiras de empregados do castelo à minha espera. Todos fazem uma reverência conforme eu passo e eu retribuo os cumprimentos de forma rápida. Entro na carruagem que me leva até o local do cortejo fúnebre, passando por várias pessoas querendo ver tudo.

    Demoramos um pouco até chegar ao local, o que fez a minha cabeça vagar por inúmeros pensamentos confusos, cutucando feridas que eu achei que já estivessem cicatrizadas e abrindo outras. A carruagem para na frente da cerimônia e assim que eu desço, a única coisa que eu consigo ver é aquele imenso caixão na minha frente. Mesmo que eu já estivesse sido orientada mil vezes sobre todas as etapas do cortejo, eu decido quebrar as regras e andar na direção do caixão antes da hora combinada. Obviamente, ninguém tentou me impedir.

    Diante do caixão ainda aberto, encaro o rosto pálido de Dárius que transmitia uma sensação completamente falsa de paz. Eu mais do que ninguém sabia que ele não tinha partido em paz. A culpa bate forte na minha cara ao encarar a realidade na minha frente e ao mesmo tempo a sensação de que finalmente todo aquele inferno havia acabado me toma sem que eu esperasse. A lágrima desce pelo meu rosto como uma lâmina afiada, me fazendo sentir cada confusão dentro de mim, uma por uma...

    Me passa pela cabeça que seria esperado que eu demonstrasse sinais de tristeza e até mesmo de um certo desespero, por ele ter sido "assassinado covardemente" por alguém. Tirei uma das minhas luvas e toquei seu rosto gélido e rígido. Era difícil reconhecer Dárius naquele homem diante de mim, mas em poucos instantes o fato se consumou na minha mente: Dárius realmente estava morto! Levantei meu véu e me inclinei para lhe dar um beijo na testa, era o mínimo que estavam esperando de mim naquele momento. A terrível sensação do "beijo gelado" me remeteu a mesma coisa que senti no dia em que eu me despedi da minha mãe quando era pequena, o que fez minhas lágrimas rolarem de forma desenfreada. Katharine se aproxima e segura minha mão, me trazendo de volta ao presente. Me recompus e logo em seguida me afastei do caixão.

    Preferi que o sepultamento não demorasse acontecer como o de costume, pois não queria me manter naquela tortura por muito mais tempo. O corpo de Dárius foi enterrado ao lado do de seus pais, fazendo com que eu inevitavelmente me imaginasse ali ao lado dele depois de morta. Que Deus me livre desse destino!

    Depois de todas as exigências cumpridas, eu e Katharine entramos na carruagem e retornamos ao castelo, que dessa vez parecia bem maior do que o de costume. Todo o terror e agonia que eu vivia se foi, dando espaço para um silêncio extremamente desconfortável, carregado de culpa e incerteza. Olho para Katharine ao meu lado e digo:

— Você pode ir ver a Alina pra mim?

De pronto ela diz:

— Claro! Não precisa ter pressa. Fico sozinha com ela, o tempo que precisar.

Ela me dá um beijo na testa e sobe as escadas.

    Caminho devagar pelos corredores do castelo observando cada coisa com uma calma que não me pertencia. Resolvo ir até a sala dos tronos, afinal aquele lugar irá mudar completamente nos próximos dias. Encaro ali aquelas duas malditas cadeiras super acolchoadas e banhadas por uma quantidade de ouro exagerada. Nunca gostei da aparência delas, mas eu entendo o peso do que elas representam. Me sentar ali sozinha nunca foi algo que eu imaginei ter que fazer um dia, mas agora eu não tenho outra opção. Encaro ao lado dos tronos o quadro com a minha imagem ao lado de Dárius, sentindo um aperto e um desconforto terrível. Respiro fundo e subo as escadas que me levam até o meu trono e me sento nele deixando cair nele todo o meu peso de uma vez só. Fecho os olhos, sentindo um medo terrível que até me sufoca! Meu Deus, como eu vou conseguir fazer tudo isso sozinha? Com muito custo eu abro os olhos novamente e me viro para o lado,  na direção do trono que era de Dárius. Ao encarar aquela cadeira vazia, a realidade me toma de uma forma devastadora! Ser a única regente da Romênia é muito mais assustador do que eu podia imaginar…

A amante da rainhaOnde histórias criam vida. Descubra agora