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A noite agradavelmente quente da capital foi o que libertou os paulistas da tristeza, afinal de contas, uma onda de frio por quatro dias não alegra todos os trabalhadores das 6h30 da linha verde. O clima perfeito, o surgimento da lua cheia e o pós de uma carga horária de 8 horas era o combo que resultava em bares e restaurantes lotados, alojando os corações recém-descongelados inquietos por uma cerveja trincando e uma porção de fritas. Nada diferente, mas nunca o mesmo; a característica que faz uma pessoa se apaixonar por outra, de inconstância dentro de uma familiaridade, era a mesma que prendia as pessoas na cidade.

O Colombore estava sendo abrigo de diversos jovens, uma quantidade até mesmo acima do normal. Passeavam por todos os cantinhos do lugar, conversando alto, rindo de piadas e histórias, flertando, subindo discussões fúteis; basicamente, praticavam todas as interações sociais mais humanas, que ignoraram a necessidade no decorrer do dia. Era o momento de paz, até para aquele que desacreditou que poderia voltar à serenidade depois de horas de atendimento ao público.

Bom, está tudo bem. O Microsoft Outlook não pode te machucar daqui.

Sandro estava no centro do palco, com a cabeça pendida levemente para o lado e concentrado em encaixar o microfone de forma firme e correta no pedestal, mas estava sendo mais complexo que o normal. Sua dificuldade no ato simples e recorrente estava começando a estressá-lo, se misturando com a sua falta coragem de encarar o grande público na sua frente. Hoje, vestia uma polo larga branca que chegava até metade de suas coxas, com a LiverPool em laranja estampada no peito direito, e a manga curta passava disfarçadamente de seus cotovelos. A gola preta tinha uma linha branca e uma laranja, fazendo um ótimo contraste com o tom claro de sua pele deixada à vista pelos botões abertos, e a barra da manga possuía a cor preta. Estava com uma calça jeans clara, simples, mas sempre maior que suas medidas. Calçava um Asics GT-2000 T500N vermelho, cinza e com detalhes em preto, porém, o paulista trocou seus cadarços por um mais grosso, cinza. Em seu pescoço, tinha uma corrente prata fina 3x1, que ficava na altura de sua clavícula marcada e tatuada.

O moreno bem vestido parou uma de suas mãos na extensão do pedestal, enquanto a outra deixou de fazer esforço para encaixar o microfone no suporte. Seus olhos não miravam nenhum lugar em particular, tudo estava fora de foco. A consciência de que estava ansioso com a presença do carioca lhe alcançou, depois de tanto fugir. Caio sempre seria sua referência clara para nunca esperar nada de ninguém (sequer afeto), lhe exercitando desde cedo à desistência, aceitação e superficialidade. Porém, dessa vez, estava tudo diferente, pois Rio não era Caio. Inclusive, sempre foi bem diferente do que era com Caio. Nas palavras claras, estava tudo errado. Fora de lugar. Em desordem.

Sandro não tinha dúvidas que tudo em si queria vê-lo, tocá-lo, senti-lo, mesmo que estivesse com uma enorme e falsa raiva devido o homem alto, loiro e de sotaque forte, ter lhe despertado os sentimentos mais confusos que já foi obrigado a sentir. O moreno tinha receio do choque de perceber que tudo estaria diferente, já que agora seus limites estavam perfeitamente estabelecidos, colocando o carioca em equivalência a um contato qualquer em seu telefone. E claro, valia a mesma coisa para Rio. Seria uma nova distância, um novo desinteresse, um novo desconhecimento. 

Por que ele se sentia tão insatisfeito com essa ideia?

Por que ELE se sentia tão INSATISFEITO com essa ideia?

— Sandrinho, quer aju- — O som do encaixe do aparelho no pedestal foi ecoado antes que Pedro pudesse chegar até si, ou mesmo terminasse a frase. O paraense ficou estático. Estava um pouco assustado com a melancolia e mistério que o guitarrista apresentava desde que chegou no bar. Não olhou diretamente nos olhos de ninguém, e as mínimas interações que teve eram puramente obrigatórias, como quando precisou responder a Alice onde estava a fonte de seu teclado, já que apenas ele sabia. O tatuado tirou os olhos do grande vazio que havia caído, checando finalmente a altura do suporte.

" Não existe amor em sp " ;; SPxRJ , pauneiroDonde viven las historias. Descúbrelo ahora