saudade, gratidão, memórias
três dias depois...
Pov Rebeca Andrade
O ginásio estava vazio quando Rebeca chegou, pontualmente às 6h da manhã. O ar frio e o silêncio do ambiente pareciam refletir como ela se sentia por dentro: pesada, sozinha e cansada.
Nos últimos dias, Rebeca havia se isolado cada vez mais. Era como se seu mundo tivesse voltado ao normal depois da ida de Gabi, mas agora, esse "normal" parecia esmagador. Treinos incessantes, cobranças externas e internas — tudo se acumulava. A saudade de Gabi apertava, mas não havia espaço para lidar com isso. Não quando o Campeonato Brasileiro estava tão perto, não quando o país inteiro esperava que ela brilhasse novamente.
Ela respirou fundo, puxando o ar frio do ginásio, deixando-o preencher seus pulmões enquanto erguia o queixo. Rebeca Andrade não era conhecida por desistir. Não foi desistindo que conquistara o ouro em Paris. Não foi desistindo que se tornara um ícone do esporte brasileiro.
Mas, mesmo assim, a pressão nunca a deixava. A voz da mãe ainda ecoava em sua cabeça, lembrando-a de que talento não bastava, que ela precisava vencer, que sempre precisaria vencer. "Se você não ganhar, vão te esquecer."Rebeca apertou os olhos, balançando a cabeça como se pudesse afastar as palavras. Não havia espaço para erros. Não agora. Não nunca.
Enquanto ajustava firmemente as faixas nos punhos, seu olhar fixava-se na barra assimétrica, como se aquele fosse o único lugar onde o mundo fizesse sentido.Ela subiu na barra assimétrica com precisão quase automática. Cada movimento era calculado, cada giro cronometrado. Seu corpo sabia o que fazer, como se estivesse programado para executar. Mas a perfeição, que sempre foi seu objetivo, agora parecia um inimigo invisível que a perseguia, sempre distante, sempre inalcançável.
A barra balançou levemente sob seu peso, mas ela não hesitou. Não podia hesitar. "Você não pode errar." As palavras da mãe invadiram sua mente novamente. "Não pode falhar. Você não é como os outros."O salto final foi impecável, mas quando ela pousou, a adrenalina deu lugar ao vazio. Por fora, Rebeca era um exemplo de força e determinação. Por dentro, sentia-se em pedaços, lutando contra um medo que não podia mostrar a ninguém: o medo de não ser suficiente.
Rebeca olhou para suas mãos, marcadas de calos e leves arranhões. Elas carregavam sua história, cada vitória e cada queda. Mas, naquele momento, não pareciam as mãos de uma vencedora.
"Preciso ser melhor."
Era o único pensamento que ela se permitia ter antes de voltar para a barra, ignorando a exaustão e o cansaço que imploravam por trégua.
Lolo adentrou ao ginásio alguns minutos depois, ainda ajustando o capuz do moletom e segurando sua garrafa d'água. Ela parou ao ver Rebeca na barra assimétrica, já aquecida e completamente concentrada nos movimentos.
— Tá cedo demais pra você já estar aqui, Rebi. — Lolo cruzou os braços, observando a amiga descer da barra com precisão.
Rebeca secou o suor da testa com o braço, evitando o olhar da amiga.
— Não consegui dormir. Achei melhor vir treinar logo.
Lorraine estreitou os olhos, claramente desconfiada.
— Insônia ou excesso de cobrança? — Ela se aproximou, jogando a mochila no chão. — Fala a verdade, Rebi. Tá tudo bem?
Rebeca deu de ombros, tentando disfarçar.
— Tá tudo bem, Lolo. Só tô focada. O Campeonato Brasileiro tá logo aí. Não posso relaxar agora.
— Rebi, isso não é foco, é obsessão. Você tá treinando mais do que o necessário. Não dá pra ser a melhor se você se esgota antes da competição.
— Eu não tô me esgotando — Rebeca respondeu firme, mas a voz carregava uma ponta de exasperação. — Eu só... não posso errar.
Lorraine inclinou a cabeça, o olhar sério.
— Errar? Você é uma das melhores ginastas do mundo. Por que tá agindo como se precisasse provar isso o tempo todo?
Rebeca respirou fundo, os ombros tensos.
— Porque eu preciso, Lolo. Preciso provar que ainda sou a melhor, que Paris não foi sorte. Todo mundo espera isso de mim.

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Cartas para Paris | Rebi
FanficDepois de voltar dos Jogos Olímpicos de Paris, Rebeca Andrade começa a receber cartas misteriosas de alguém, e junto com suas colegas de equipe tenta descobrir quem enviou essas cartas. ou Durante os Jogos Olímpicos de Paris, Gabi, Capitã do time de...