Mas eu não seria capaz de deitar minha cabeça no travesseiro por tirar a vida de alguém.
Eu tinha a minha vida, tinha a porra da minha história, mesmo que não fosse a melhor. Outra pessoa também tinha. Não interessa quem seja. Eu não sou um assassino. Eu queria lutar, merda. Queria ganhar dinheiro com o que gosto de fazer para sustentar meu desejo de ser o único proprietário da minha vida.
Deitei minha cabeça na pedra atrás de mim e fechei os olhos, respirando fundo como se aquele ar pudesse clarear minha cabeça e me dar uma direção. Eu só precisava de uma luz para resolver aquilo.
- Qual a coisa que você mais se arrepende de ter feito? - Victoria perguntou, erguendo seus olhos azuis ou verdes, não era possível distinguir sua cor com certeza, até encontrar os meus e me encarar com curiosidade e determinação o bastante, apesar do seu nítido cansaço pela noite que tivemos. Desviei meu olhar do seu, não querendo deixar que os mesmos me prendesse e suspirei.
- Eu ainda não fiz. - respondi com honestidade, mesmo que ela não fizesse ideia do que eu estava falando. Um bocejo escapou da sua boca e não resisti a abrir um sorriso por presenciar aquele gesto que era tão incomum para a "perfeita Victoria". Encostei-me em um canto da entrada da gruta e dei um tapa em minha perna como um convite para que ela viesse até mim, surpreendendo-me ao vê-la se aproximar sem hesitação. Sua expressão parecia tão tranquila, tão diferente do que ela era todo o resto do dia e me senti mal pra caralho, com a culpa começando a pesar em minha cabeça e meus ombros pelo o que estava prestes a acontecer - Me desculpe. - sussurrei, sentindo meus dedos e minha mão se moverem instintivamente até seu cabelo, começando a acariciá-lo conforme a assistia pegar no sono.
Abri meus olhos e me dei conta de que lá estava eu, sentado no mesmo lugar onde já estive com ela antes. Era interessante a forma como em romances ou histórias cheia de viadagem santificavam os personagens e os faziam parecer perfeitos, sem nenhuma falha ou defeito. Ou então, era muito incrível a forma como uma garota conseguia mudar um cara com seu jeitinho inocente e seu bom coração. Ah, e ainda tem as histórias fantasiosas em que, quando eles se apaixonam, simplesmente transformam seus defeitos em qualidades e se apaixonam por aquilo.
Pedaço de merda.
Eu já tinha assumido para mim mesmo que possuía sentimentos pela Victoria. Eu gostava dela e odiava me sentir assim, o que só servia pra me deixar fraco e fora de mim. Entretanto, eu conhecia a Victoria de verdade. Ela continuou sendo uma vadia sem coração, egocêntrica e arrogante que só pensa em seu próprio umbigo. Exatamente como eu. Isso não muda nunca. Talvez ela nunca vá mudar, já que vem alcançando tudo o que quer com facilidade sem encarar nenhum problema relevante que a faça pensar em seu comportamento, como eu tô fazendo agora. Mas eu não a culpo, na verdade, a invejo. Seria melhor continuar vivendo pisando nos outros, passando por cima de quem quer que seja e conseguindo o que quer do que se encontrar em uma situação como a minha, no momento, e não saber o que acontecerá comigo. Ou com a minha vida.
Eu não faço ideia de quem vou me tornar.
Eu precisava ouvir a voz dela. Precisava ter a certeza de que ela estava lá, botando pra foder na França e derrubando qualquer um com o veneno que destilava ao abrir a boca pra falar alguma merda sarcástica.
Peguei o celular em meu bolso e deslizei meu dedo pela tela até seu nome, torcendo para que a mesma atendesse e eu pudesse finalmente escutá-la depois de tantos dias e depois desse impacto em minha vida. Nunca fui supersticioso, nunca tive fé ou acreditei em Deus, mas, naquele momento, se eu pudesse convocar as entidades santas pra um bate papo, pediria a cada uma delas para que a Victoria atendesse.
Capítulo sem título 21
Começar do início