Era mentira, um mero Gama como ele não tinha ideia do que seria Omega; estava apenas obedecendo ordens, mas não podia permitir que o garoto soubesse disso. Por isso fez o máximo possível para afastar seus pensamentos do assunto.
— Ah, é um local maravilhoso, de fato, vai adorar. Mas, prosseguindo. — Ele voltou a ler da tela holográfica. — A segunda zona na qual foi reconhecido foi na rua D-877, placa de identificação 33, em frente à loja de cosméticos Swing. Temos imagens suas seguindo um jovem, discutindo com ele e então manipulando-o a se matar; apesar de ainda não sabermos exatamente como.
— Em circunstâncias normais, você teria sido imediatamente capturado. Entretanto, devido às suas peculiares habilidades, foram lhe dados cinco meses de liberdade, nos quais fora observado atentamente, na esperança de nos conduzir aos seus fornecedores ou algum criminoso classe C ou maior. Junto a isso, havia o desejo de o conhecer melhor, de descobrir como todos os seus registros foram largamente modificados há 9 meses sem ninguém perceber; que, diga-se de passagem, foi uma façanha e tanto. Mas, como bem deve saber, nada disso se concretizou. Ainda não sabemos nada sobre você, meu querido Amber.
— E por esses e outros motivos, aqui estou agora, para levá-lo. Você partirá para Omega dentro de oito horas. Gostaria de salientar que qualquer resistência é fútil. Meu chip precognitivo me coloca dois minutos à sua frente. Como sou escravo de minha natureza bondosa, pretendo que embarque incólume, ou, pelo menos, vivo. Então não dificulte as coisas para mim, doce criança, e simplesmente me acompanhe. Ah, não, não faça isso. Você acabou de ser morto. Tentou me forçar a entregar a arma e Franco aqui abriu um buraco na sua cabeça. Entende agora? Não há nada que possa fazer. Tudo já aconteceu em minha mente. Nesse espaço de dois minutos, eu sou, sem uma palavra mais adequada, o que se chamaria de Deus. Posso fazer o que quiser, e então mudar tudo de novo. Percebe a inevitabilidade de seu destino agora, criança?
— Obviamente, eu poderia deixá-lo inconsciente e carregar seu corpo. Mas precisamos realmente apelar a tais atos dignos de bárbaros do século XXI? Não somos melhores do que isso? Me diga, Amber Kreyzer.
Quando terminou de falar, ele já sabia que Amber saltaria de pé e investiria na direção da porta. No seu mundo do futuro, no qual tudo era matizado de amarelo e de inconstância, ele observou Amber, deitado numa poça de sangue, dois buracos em suas costas atestando a causa mortis.
Não faça isso, Amber. Não sou mau Nada de muito ruim irá lhe acontecer. Não faça.
Mas ele fez.
Num único e ágil movimento, os dois androides ao lado de Blunt retiraram as pistolas dos coldres e dispararam ao mesmo tempo. Mas um instante antes, na ínfima fração de um impossível segundo, Amber dobrou todo o tronco para a esquerda, caindo sobre uma perna ao mesmo tempo em que o impacto das balas jogava ao ar lascas da porta e ele a abria, fugindo, em seguida, pelo corredor.
Pobre criança. Saiba que agora sua vida acabou.
Blunt e seus androides não perderam tempo. Deram a volta na mesa e investiram atrás do garoto. Sob uma película dourada, Blunt viu Amber dobrando o corredor. Repetiu a cena quatro vezes, até acertar.
Antes que Amber pudesse fazer a curva, uma explosão a centímetros de seus pés o fez estacar e olhar para a Blunt, no meio do caminho.
— Você já está morto, Amber. Eu vi. Só está adiando o inevitável.
É sua última chance. Me acompanhe sem resistência e prometo que irá embarcar sem um arranhão.
Em doze segundos, ele tentaria dobrar o corredor e uma bala atravessaria seu pescoço.
— O tempo está acabando.
Agora.
Amber correu. Não para a curva, mas na direção dele.
Por um segundo, Blunt pestanejou, surpreso. Então, em sua visão, ele mirou e alvejou Amber, um tiro limpo na cabeça. O garoto foi impelido para trás, metade de sua cabeça feita em retalhos.
Ele atirou.
A bala cortou o ar, girando numa velocidade absurda, atravessando o corredor, raspando no couro cabeludo acima da orelha de Amber, que torcera o pescoço, e enterrou-se na parede ao fundo, uma pequena nuvem de poeira levantando-se do local.
O que ele está fazendo?, perguntou-se Blunt, perplexo. Que tipo de reflexos sobre-humanos esse garoto possui? Ou terá ele também um chip precognitivo?
— Atirem! — ordenou aos androides.
No futuro, Amber morto, furado e sangrando no chão.
No presente, Amber desviando, torcendo-se, dobrando-se, as balas rasgando sua pele, mas nenhuma acertando de fato.
Blunt cerrou os dentes. Em sua cabeça, as imagens começaram a se embaralhar, sobrepondo-se a futuros alterados, incompletos, metamorfoseando-se em novos na medida em que eram invalidados.
O que está acontecendo?, pensou, perdido entre futuro e presente. Foi quando o garoto o alcançou e ele sentiu uma mão fria, negra como uma sombra de inverno fechando-se ao redor de sua mente. Ele apagou.
Quando abriu os olhos novamente, os dois androides jaziam deitados, suas cabeças em pedaços; engrenagens, cabos e aço espalhados pelo corredor. A pistola em sua mão estava fervendo.
— O que fez comigo? — Sua voz era um fio trêmulo.
O garoto estava parado à sua frente. Havia cortes espalhados pelos flancos de seu corpo, dos quais o sangue escorria e pingava copiosamente no piso.
— Me dê sua arma — ordenou ele.
Subitamente, Blunt sentiu uma vontade enorme de se livrar daquela arma. Ela era repugnante, suja e não a queria. Ele estendeu-a a Amber.
O garoto pegou-a, sentiu seu peso, mirou em um ponto distante do corredor e disparou. A arma somente emitiu um apito negativo. Jogou-a longe.
Desesperado, Blunt investigou seu mundo dourado do futuro, à procura de uma maneira de escapar daquele monstro. No entanto, pela primeira vez desde que conseguira o chip, não havia um futuro. Somente o presente, somente trevas.
— Como pôde desviar das balas? Como?
— Eu vi o futuro.
— O futuro? Não pode ser... Você também é um precog?
— Não. Eu vi o futuro... na sua mente.
Incapaz de se mover, Blunt pôde apenas contemplar o garoto estender o braço, pousar a mão em sua cabeça e fechar os olhos.
— Eu tentei ser gentil! Te auxiliar! Não, por favor...
O que é isso? O que esse garoto pretende com isso? Não... o que é? Algo está me puxando...
Um a um, seus sentidos foram apagados. A visão obscureceu. Os sons foram abafados pelo vazio. Os odores e sabores desapareceram do mundo. Por fim, nos confins da mente, seu corpo dissolveu-se na espiral de um buraco negro.
Seu desespero tornou-se um eco, um último acorde ressoando pelo fio de sua consciência.
Tenho que levá-lo para Omega. Mas quero ir para casa. Meu trabalho. Aqui é ruim. Quero ver minha mãe. Mamãe. Meu aniversário foi há três dias. Aniversário... o que é isso? Não... Meu nome... Meu nome é Blunt. Blunt. Sim, ainda estou aqui. Meu nome é Bl... Meu nome... Eu... Blunt... Casa... Nome... Mal... Klumt... Lunt... Luny... lun... lun... glo... lu... lu... ba... e... a...
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Min-D
Science FictionMIN-D História por Lucas Ost Kurotsugu Revisão por Tany Isuzu Distribuição: My Light Novel - www.mylightnovel.com.br Sinopse: Num futuro distópico no qual as pessoas são separadas pelo nível cognitivo, Amber Kreyzer é um estudante simplório e de pou...
Capítulo XI
Começar do início