Capitulo único

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Sentada na areia observava o sol se esconder dentro das águas do mar, os últimos raios iluminando sua pele cor de caramelo. Inspirou todo ar que podia e soltou lentamente numa tentativa de acalmar seu coração, porém sabia que nem o passar dos anos poderia curar tamanha dor.

Levantou-se notando a quantidade de areia sobre o tecido branco do seu vestido escolhido cuidadosamente para aquela ocasião. Ela tinha esperado esse momento por anos e bastaram alguns minutos para estar tudo acabado.

A cauda longa marcava os grãos de areia enquanto ela caminhava em direção à água ainda com o buquê de flores rosadas em mãos. Um casamento estava acontecendo naquele momento, ela a noiva trajada de branco se unindo ao seu ponto de paz, o mar.

Eles se completaram no momento em que a espuma branca tocou-lhe os dedos dos pés. Ele com seu mistério, ela com sua tristeza. Ambos transbordando em forma líquida - o mar em sua imensidão de águas, Aurora em suas lágrimas de culpa.

Conforme a água subia os níveis no seu corpo e o vento soprava os cabelos de cachos volumosos, ela se permitia transbordar cada vez mais com suas lembranças, lembranças que deveriam marcar o dia mais feliz de sua vida.

Ela estava pronta. A maquiagem leve combinava perfeitamente com as flores que se enrolavam nos fios negros do cabelo, o vestido de mangas longas tinha a simplicidade que ela tanto gostava em meio aos outros detalhes tão complicados.

Aurora sorriu com os olhos marejados. A felicidade havia chegado muito antes dos votos. Ah sim, os votos, aqueles que ela escolheu as palavras com tanto capricho e amor. Mal podia esperar pra ver a expressão de Louis ao se declarar em frente a todos, a timidez dele após tantos anos ainda causava suspiros no interior da mulher.

As batidas na porta interromperam os pensamentos da mulher, que autorizou a entrada. A menina entrou, timidamente.

— Boa tarde Sra.Miller, sou uma estagiária da equipe de organização, vim a pedido do seu noivo, ele pediu para que lhe entregasse essa caixinha. — A garota entregou a pequena caixa vermelha a Aurora.

—Obrigada. — Ela abriu vendo o pequeno piercing de tragus em formato de rosa e não pode segurar o sorriso.

—Ele pediu para dizer que lembra o dia que vocês se conheceram. — A menina sorriu docemente. — Preciso ir. Em menos de dez minutos um dos membros da equipe virá chamá-la. A senhorita está linda.

Maldito presente, maldita garota e sua forma doce de falar. As ondas movimentavam o tecido sobre a água tornando-o mais pesado. As pernas e o quadril já haviam sido preenchidos quando ela resolveu mergulhar, esperando que a próxima onda a cobrisse assim como a lembrança do momento em que o viu a inundou.

Ela estava parada na porta da igreja. Seu pai se posicionou ao seu lado e beijou-a entre as sobrancelhas. Escutou a marcha nupcial soar alta e as grandes portas de madeira se abriram.

Ela o viu.

Seu coração transbordou de uma felicidade inexplicável ao ver aqueles olhos cor de mel derramarem lágrimas apenas por ela estar ali. Caminhou lentamente vendo os seus companheiros de agencia e seus familiares ocuparem os bancos.

Seu pai e Louis trocaram algumas palavras se abraçando. Seu amado tinha o rosto avermelhado pelas lágrimas e um sorriso tímido. Delicadamente se aproximou, beijando Aurora no mesmo lugar onde seu pai tinha feito.

A lembrança a sufocou mais do que o tempo submersa a obrigando a subir em busca de ar. Os cabelos molhados liberaram as flores totalmente despedaçadas na água, fazendo Aurora se lembrar do momento em que teve que deixar tudo pra trás. Era exatamente dessa forma que ela se sentiu: Destruída.

O padre já falava mais que o normal. Ela só queria dizer sim e se sentir realizada. Observava os detalhes do seu marido com devoção. O amava mais que tudo.

—Ele realmente é lindo, Agente Miller — Uma voz soou no ouvido de Aurora, a fazendo gelar por completo. Ela conhecia aquela voz. Levou a mão ao tragus sentindo o piercing vibrar. — Nem pense em tirar antes que eu fale tudo que tenho pra te dizer.

A mão da agente começou a tremer, a garganta secou e todos os detalhes naquela igreja haviam ficado insignificantes diante do perigo que aquela mulher exalava.

— Me escute, Aurora— Emily soou com escárnio ao pronunciar o nome da Agente da CIA. — Você tem dez minutos para sair desse casamento. Vai abandonar seu noivo como me obrigou a fazer com o meu.

Aurora balançou a cabeça negativamente, mordendo os lábios com força. Louis ainda encarava o padre alheio a toda situação.

—Não é uma opção, Aurora. — No momento em que Louis encarou sua esposa, um laser de pistola piscou rapidamente em sua testa fazendo a agente prender a respiração.

—Aurora Miller, você aceita Louis Harris para amar e respeitar... — Iniciou o padre.

— Não! — Aurora interrompeu, causando murmúrios entre os bancos.

—Diga que não o ama — A voz sombria de Emily soou novamente pelo dispositivo.

—Não posso fazer isso, Louis. Eu não... Te amo mais, nunca tive certeza sobre nós. — As lágrimas invadiram o rosto da mulher, a destruindo.

— Mas Aurora... — Louis tinha a expressão confusa. — Eu te amo.

— Me desculpe, eu preciso ir. — Aurora o encarou, mas preferia não ter feito, pois ele chorava, dessa vez de tristeza. O corredor entre os bancos se tornou extenso enquanto ela corria em direção à saída, se despedindo da própria felicidade. Ele.

Preencheu mais uma vez os pulmões com ar e afundou. O gosto da agua salgada invadiu seus lábios fazendo com que ela fechasse os olhos como um último adeus ao seu ponto de paz. Naquele momento, sabia que paz não existiria em seu vocabulário.

Voltou pra areia jogando o buquê de flores totalmente destruído no chão e desprendeu a longa cauda. Seus olhos brilhavam em raiva enquanto tentava reordenar a respiração descompassada.

Ela acharia Emily.

Nas profundezas do inferno ou em qualquer canto miserável dessa terra.

Aurora a acharia. E a mataria.



-- Nota da Autora safada que sumiu por anos

Oi docinhos, eu sei, eu sei! Sumi por algum tempo, afinal um bloqueio criativo pode acabar com muitas coisa, então peço que me perdoem, por favor!

Esse conto pequeninissimo foi escrito no meio de 2017 por conta de um desafio de escritores em que participei. Fuçando no meu computador achei esse bebezinho lindo e me lembrei que havia ganho o desafio com ele, depois de ler resolvi compartilhar com vocês e espero que gostem.

Não posso prometer que vou voltar a escrever em breve, pois o bloqueio ainda me assombra, mas tentarei escrever alguns contos pequenos pra tentar me livrar dele.


Ps: Perdoem essa capa horrível que fiz correndo e não desistam de mim!

InundadaWhere stories live. Discover now