dar a mim e às meninas um pouco de "privacidade". Era o tipo de
privilégio concedido aos pais dos filhos bem-comportados, que não
tinham a menor preocupação de que faríamos qualquer coisa
remotamente errada. O relato da festa levou cerca de vinte segundos.
Passei o tempo todo distraída com a sensação de que eles tinham algo a
dizer. Quando mencionei a Avery, os dois se entreolharam por uma
fração de segundo.
— Encontramos a mãe dela hoje de manhã — comentou meu pai.
— Na Bagel Factory?
— Não — respondeu minha mãe bem devagar. Olhou outra vez para o
meu pai. Os olhos dele responderam a pergunta silenciosa dela, que se
virou para mim novamente. — Na verdade, nós a vimos na igreja. Seu
pai e eu, bem, nós decidimos nos converter.
Até onde eu sabia, meus pais nunca tinham colocado os pés em uma
igreja até aquela manhã. Não éramos "praticantes", como minha mãe se
referia aos amigos e vizinhos que se arrumavam um pouco mais nas
manhãs de domingo. Eu lembrava que Lara havia feito primeira
comunhão no segundo ano, e eu tinha sido convidada. Fiquei sentada no
banco da igreja, atrás de alguns tios dela, assistindo à minha amiga
caminhar até o altar vestida como uma mininoiva. Ela estava tão etérea,
tão mais bonita do que eu, que voltei para casa chorando, pedindo à
minha mãe para fazer primeira comunhão também. Ela me fez sentar e
explicou, com toda a paciência, que apenas as crianças católicas
recebiam a comunhão, e, como não éramos católicos, como não éramos
nada, essa seria uma celebração que eu não teria.
— Por que não somos nada? — perguntei, na época.
Minha mãe me olhou por um tempo, então, mordiscando o lábio,
respondeu:
— Simplesmente porque não somos esse tipo de gente. Algumas
pessoas são assim, mas nós... não.
Então acho que eu deveria ter encarado com um pouco menos de
naturalidade a notícia de onde eles tinham passado aquela manhã de
domingo. Mas, no dia, fiquei envergonhada. O fato de os dois terem ido à
igreja depois de tanto tempo me pareceu uma coisa estranha e pessoal,
como sexo, que só recentemente eu havia percebido que em algum
momento eles já tinham feito. Então fiquei sentada em silêncio,
consciente dos olhares deles, espalhando cream cheese no bagel, sem
emoção.
— Significaria muito para nós — começou meu pai — se você fosse
conosco na semana que vem. Não precisa ir com tanta frequência quanto
a gente, mas pode ser que aprenda algo com a experiência. De qualquer
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Vivian Contra o Apocalipse
AdventureVivian sempre foi uma daquelas meninas muito certinhas. Obedecia aos pais, tirava notas altas em todas as provas, não se metia em confusão, fofocava com as amiguinhas sobre festas para as quais não tinha sido convidada... pensava como todas as outr...
Capítulo 2
Começar do início