A essa altura, intencionalmente ou não, os eventos culturais e os avanços tecnológicos serviram como cortina de fumaça. As pessoas iam ao vaudeville, assistiam aos filmes, liam livros e revistas, frequentavam cafés, viajavam com mais frequência, copiavam a moda, e usufruíam das inovações científicas... Caças ao tesouro também entretinham os mais aventureiros e seus patrocinadores. E nesse sentido, o Egito era o celeiro dos tesouros.

O momento não estaria propício para que os olhos do mundo acompanhassem com interesse a passagem daqueles "homens maravilhosos e suas máquinas" por terras exóticas e inóspitas? Índia, Peru, Egito, Etiópia, China... E até o Polo Sul.

Haveria alguma fronteira que eles não pudessem desbravar?

Dentre esses homens ousados, o excêntrico industrial alemão Gerhard Von Hausen era um aventureiro apaixonado pela arte antiga. E se não bastasse isso, tinha um fraco por desafios... Patrono das artes de Frankfurt, e figura proeminente junto ao governo alemão, ele estava sempre atualizado sobre o que se passava no meio artístico, especialmente em seus bastidores.

Desde 1813, algumas das maiores potências da Europa disputavam a supremacia em diversas áreas do saber e da cultura; particularmente, em termos de artefatos e estudos arqueológicos egípcios. Como se, de alguma forma, tal supremacia refletisse o poderio de uma nação... Bem, de fato, parecia refletir.

Assim, quando os ingleses tiraram a Pedra da Roseta das mãos dos franceses (a qual, somada aos demais artefatos, haveria de conferir ao Museu Britânico um acervo invejável), estes não hesitaram em continuar suas explorações, mantendo parcelas significativas de descobertas para suas coleções. Desde a expedição napoleônica, os estudiosos franceses conheciam os caminhos, os procedimentos, e as pessoas que lidavam com o mercado de artefatos egípcio. Desta maneira, agregaram novos tesouros, independente de a Inglaterra deter o domínio político e econômico do Egito. Nesse ínterim, a América corria por fora... Claro que o fato de ser a principal ex–colônia inglesa pesava em suas facilidades de acesso.

O fato era que, no final do século dezenove, museus como o Metropolitano de Nova York, e o Louvre de Paris, exibiam coleções espetaculares.

A Alemanha, contudo, também almejava uma fatia. E de preferência, uma fatia bem grande. Saída de um panorama ruralista, graças ao ex–premier Bismarck, a nação germânica investia pesado no domínio tecnológico, científico, artístico e produtivo. Em 1912, já dispunha de um acervo egípcio interessante – resultado dos esforços da Companhia Alemã; e corriam boatos de que Ludwig Borchardt, seu mais proeminente arqueólogo, acabara de encontrar um artefato sensacional.

Quando A Bela Chegou à Alemanha, assombrou os seletos colaboradores de Borchardt com sua beleza perfeita e misteriosa; entre eles, Gerhard von Hausen, um dos maiores acionistas da Companhia.

O entusiasmo se generalizou entre os setores do governo ligados aos negócios estrangeiros; fazendo com que a sua descoberta estimulasse preparativos para novas incursões pela terra dos faraós. Algumas mais favorecidas pelo embasamento de projetos bem delineados e verbas garantidas; outras, impulsionadas por interesses excêntricos, por vezes dispendiosos, que partiam de alguns colecionadores ricos... Para o governo, porém, tanto fazia a procedência da iniciativa. Haviam metas traçadas que deveriam ser cumpridas em todos os segmentos sociais, conforme os objetivos do kaiser. E isso incluía uma necessária evolução cultural e científica. Assim, o Conde Caprivi, o atual premier, tratava de incentivá–las maciçamente.

O espírito competitivo de Hausen ecoava perfeitamente os ideais expansionistas do governo com o qual colaborava. Por essa razão, os planos do industrial para impulsionar a museologia alemã encontraram pleno apoio. Especialmente, quando um conjunto de fragmentos de papiro chegou as suas mãos através do mercado negro.

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