Protetor

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- De pé, tourinho!

Todo dia era dia de treino. O de hoje mal tinha começado e suas costas já rugiam de dor, ansiando para que terminasse logo. Tourinho. Ainda que sua mestre o provocasse de propósito com o apelido que odiava, poder vê-la em ação fazia a experiência valer a pena - isto é, quando ele não estava com a cara enfiada no chão. Não tinha nada mais incrível para o jovem aprendiz do que a oportunidade de decorar todos os movimentos de luta que ela empregava.

O jovem pirnato-touro - um minotauro de pelagem esverdeada, não mais velho que uma criança, mas grande demais pra sua idade - vira sobre o próprio corpo e começa a se levantar, sem olhar para seu agressor. No mesmo instante, sente uma ardência na panturrilha esquerda, que acaba levando-o ao chão, urrando de dor. Agora, há uma nova marca avermelhada em sua perna.

- Sua vontade de morrer me impressiona. - Adverte a mulher com uma expressão severa. - Nunca dê as costas para seu inimigo!

Sua mestre era realmente impiedosa. Afinal, ela era uma bruta seguidora de Mertimul, deus da proteção e senhor da responsabilidade; coisa que seu pai não tinha ao deixá-lo ali com uma mulher tão dura.

Mesmo sendo fruto de uma união improvável entre um pirnato-touro aventureiro, que desbravava as florestas de Kalgar, o continente selvagem; e uma ogra do povo Kame, conhecidos por serem brutais nômades vagando pelas florestas e savanas; os treinos eram puxados.

Pouco depois que nasceu, ainda que contra a vontade de sua mãe, seu pai o levou para longe dos Kames assim que pode. Educou-o as maneiras de seu povo, ensinou-o a andar e a falar o idioma comum. Mal tinha completado quatro anos quando foi deixado com a mulher que, agora, o fitava com seriedade. Isso já fazia dez anos.

Com uma cara emburrada e os olhos semicerrados, o rapaz rola para o lado, pega sua espada de treino do chão e salta sobre seus cascos, avançando contra sua inimiga com um grito. Ela ergue uma sobrancelha, a expressão é certamente muito mais afiada do que qualquer lâmina - o olhar perspicaz e sinuoso de uma mulher treinada e feroz. Aproveitando a distração do rapaz, a mestre desfere outro golpe rápido, que o acerta nas costelas dessa vez. Um impacto tão forte que esvazia seus pulmões e o atira contra o chão, dessa vez com o nariz e os chifres escavando a terra.

- Lembre-se - Diz a mulher enquanto ele sacode a terra da cabeça. - você nunca deve perder o foco em batalha. Hoje lhe custou o ar dos pulmões, amanhã pode lhe custar a vida.

Agora, encarando a mão estendida de sua mestre contra a luz da manhã, pronta para ajudá-lo a levantar, ele percebe que não é só a destreza e a força dela como combatente que faz com que ele a admire. Sua expressão dura é um grande contraste com seu espírito aconchegante e acalentador, combinando com os traços finos de seu rosto. Aspectos que combinam bem com seus cabelos negros como carvão, sempre presos em um coque firme no topo da cabeça. Seus olhos, de um azul límpido, tem o formato de amêndoas e sua pele, muito clara, permanecia suja com terra por causa do treino. Sua armadura de couro endurecido, com as mangas blindadas, era parte de sua O-Yoroi e estava marcada pela experiência em combate, cobrindo seu torço quase completamente - deixando apenas uma abertura nas costas por onde saem um par de grandes asas de plumas negras. No entanto a parte mais notável de sua fisionomia eram seus pés, onde haviam garras semelhantes às de uma águia, e seu rosto, que traz um bico negro - traços comuns a uma Tarukir do povo Avernon.

Muitos descreveriam sua mestre como amedrontadora, mas para ele, era tudo de familiar que tinha.

Após um breve momento admirando essa mistura de seus aspectos selvagens e da delicadeza de seus traços humanos, o pirnato-touro aceita a mão de sua mestre e se põe de pé. Ambos fazem uma leve mesura.

ProtetorWhere stories live. Discover now