Gustavo trancou sua residência e seguiu rumo ao elevador. A mulher, enrolada num lençol, ia ao encalço dele.

– Devolva-me as roupas ao menos! – ela suplicava, tentando ficar coberta ao máximo com aquele tecido fino em seu corpo.

– Tem sorte de ainda ter o lençol. – Ele sorriu, já dentro do elevador, que não demorou em fechar as portas.

Ninguém falaria aquelas palavras. Ninguém!

***

Selena desceu da rota de cabeça baixa e coração apertado. Depois de quatro dias de folga por conta da morte do seu cunhado, enfim, voltara ao trabalho. Os dias passados tinham sido difíceis com o enterro e o estado deprimente da irmã, por isso temia deixá-la sozinha. Mas confiava que Deus auxiliaria sua família na sua ausência. 

Ela entrou na ala da recepção da empresa e, não muito longe avistou Danilo trajando suas roupas sociais e conversando com um senhor de cabelo branco. Ela desejou se aproximar, mas não seria certo interrompê-los, afinal era somente uma mera funcionária. Então, apenas começou a andar junto com os outros funcionários em destino ao refeitório. Mas antes de dobrar o corredor a voz dele a fez parar.

– Você iria passar sem ao menos dedicar-me um bom dia, senhorita Cadori? – Danilo franziu o cenho e cruzou os braços, mostrando falso aborrecimento em sua expressão facial. – Que coisa feia!

– Eu ia falar – ela sorriu e voltou-se em direção a ele –, mas você estava ocupado. – Apontou para o senhor que já se encontrava em outra conversa.

Danilo ficou na frente dela e semicerrou o olhar.

– Perdoo você. – Ele riu, quebrando o gelo. – Descansou bem? – perguntou preocupado, pois sabia de todo o ocorrido com a família de sua amiga. Acompanhou de perto o total desalento da irmã e sobrinhas de Selena tendo sentido a mais pura compaixão por todas.

– Consegui descansar – respondeu com um sorriso comprimido.

– Fico alegre por isso! – Danilo assentiu diante da postura firme da jovem em suportar todos os seus intensos problemas.

– Eu que fico feliz por ter tido você junto comigo nestes dias de dor. – Selena suspirou e massageou a garganta tentando desfazer o nó que se formava em suas pregas vocais. – Nunca terei palavras suficientes para expressar minha profunda e sincera gratidão. – Terminou de expressar seu agradecimento e as gotículas de lágrimas se apoderaram de seus olhos.

– Sua felicidade é o meu pagamento! – ele garantiu, limpando com o polegar as lágrimas que desceu no canto dos olhos dela.

Selena sorriu pelo carinho do amigo.

Danilo a estimava com sinceros afetos. Sofria por não poder tomar os fardos dela para si, mas ele orava. Pedia a Deus todos os dias para que Ele fizesse o que não podia. Rogava ao pai das luzes que iluminasse os caminhos de Selena e não a deixasse desanimar e se afastar do Caminho, mas que em tudo visse a boa mão do Senhor.

– Mas veja só! Quantos sorrisos nesta manhã, não é mesmo? – a voz de Devin atrás de Danilo fez o sorriso de Selena morrer na hora, despertando uma avalanche de sentimentos adormecidos há tantos dias. Aquela era a realidade para qual ela não queria voltar.

Danilo se virou, cruzou os braços sobre o peito e ficou a frente como se fosse um muro entre Gustavo e Selena. Ela não ousou sair de trás do amigo.

– Bom dia pra você também, Gustavo. – Danilo saudou com a voz mais grave.

– Jura, Kanaski? Tem certeza que é um bom dia? – Devin repuxou o lábio para o lado e desviou o olhar para aquela jovem indefesa atrás de seu oponente. – Bom dia, Selena. – Ele não sorriu. Seu cumprimento não era cortês ou gentil. Era frio e seco. Seus olhos verdes faiscavam uma expressão de decepção ou até mesmo uma traição.

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