Sou bombardeado com uma série de perguntas. As vozes da minha mãe, do meu pai, de Gemma e de Liam fazem um coral ensurdecedor em meus ouvidos. Quase não presto atenção no que dizem pois mantenho os olhos fixos na porta, na expectativa que ele volte a entrar nela a qualquer momento. Um fio de esperança invisível me liga à aquele pedaço de madeira. Peço baixinho aos céus para que ele tenha entendido e abra aquela porta. Meu coração se acelera, mas infelizmente, ela não volta a se abrir.
Sorrio tristemente e me recupero.
A falação continua e eu tento organizar meus pensamentos.
ㅡ Calma, gente. Eu vou explicar. ㅡ Digo tentando parecer calmo. Não queria ter que explicar isso agora, queria apenas me recolher em meu casulo para tentar absorver meus próprios sentimentos e angústias. Mas todos me olham em expectativa, então só me resta respirar fundo e continuar. ㅡ Eu estava no supermercado, fui comprar algumas coisas e encontrei Louis. Me senti mal, ele me ajudou, e me trouxe às pressas para o hospital.
ㅡ Louis? ㅡ Gemma me interrompe com as sobrancelhas franzidas, e Liam me olha estreitando os olhos, mas não diz nada. Sei o que ele está pensando e já estou me preparando para quando ficarmos a sós. Engulo em seco.
ㅡ Sim. ㅡ Tento continuar apesar da voz trêmula. ㅡ O rapaz que estava aqui antes de vocês entrarem. Bem, eu posso dizer que, por obra do acaso, ou manobra do destino, ele estava no lugar certo e na hora exata. Ele me trouxe para o hospital e Kalel nasceu.
Minha mãe bate palminhas animada com a menção do nascimento do meu filho. Preciso urgentemente dizer a ela que essa é uma péssima mania, mas me contenho.
ㅡ Meu Deus! ㅡ Liam fica choroso de repente. ㅡ Meu brotinho nasceu de sete meses, Harry. Que perigo! Como ele está?
ㅡ Ele está bem. ㅡ Sorrio ao lembrar do meu filho.
E meu Deus... eu tenho um filho.
É a sensação mais surreal que já senti, e mesmo assim, sinto que ainda não senti tudo. Parece que a ficha vai caindo aos poucos, para você finalmente aceitar que sua vida mudou para sempre.
Nada se compara ao que eu senti quando ouvi o seu pequeno choro e toquei em sua mãozinha minúscula. Meu coração, naquele momento triplicou de tamanho, para que Kalel coubesse inteiro dentro dele.
Dizem que só existe um amor maior que o de um filho por um pai: o de um pai por um filho.
Eu pensava que amava a minha mãe com toda a força existente no mundo, mas isso mudou em instantes, após o nascimento da minha estrelinha. Eu percebi que posso amar muito mais do que achei que fosse capaz.
O amor transcende tanto, que te faz questionar o universo. Como pode caber tanto amor em uma só pessoa? Como isso pode ser instalado em nós de um segundo para o outro, assim... como um estalar de dedos?
Ver Louis o segurando no colo, e o trazendo até mim pareceu um sonho bom. Naquele instante esqueci de tudo que nos aconteceu e foquei em nós três... no nosso mundo particular dentro daquela sala de cirurgia. Naquele momento, tudo era lindo, puro e exato, como deveria ter sido desde o começo. Naquele momento eu não estava nem um pouco azul, eu estava completamente branco.
Como eu posso amar tanto um serzinho daquele tamanhinho?
ㅡ Preciso ver meu sobrinho. ㅡ Gemma praticamente grita, me tirando dos meus pensamentos. ㅡ Ele vai vir ao quarto, não vai?
ㅡ Eles irão trazê-lo mais tarde. ㅡ Digo por fim, depois de uma longa pausa. ㅡ Não sei se me deixarão amamentá-lo, ou pegá-lo no colo, mas vocês poderão vê-lo em breve.
ㅡ E você meu filho? Como você está? Nós ficamos tão assustados quando recebemos o telefonema. ㅡ Minha mãe diz apreensiva.
ㅡ Eu estou bem, mamãe.ㅡ Eu suspiro. ㅡ Agora eu estou bem.
Poucos instantes depois a enfermeira entra no quarto com a incubadora e um serzinho minúsculo dentro dela. Consigo ouvir um coro de choros ressoar pelo quarto de hospital.
Ela não permite que o tirem da incubadora, e explica que ele ainda é muito fraquinho para tanta exposição, e que seu corpinho ainda é frágil demais para que nós o toquemos, então apenas o observamos pelo vidro.
Meu filho está ligado a tubos, mas é tão espertinho. Ele é lindo. Completamente perfeito.
Tão pequeno e tão gigante.
Sinto minhas bochechas molhadas, enquanto admiro a perfeição que é Kalel.
ㅡ Oi brotinho. ㅡ Liam diz em lágrimas. ㅡ Eu sou o dindo Li. ㅡ Liam acena de forma fofa para o vidro.
Eu nunca precisei dizer a Liam que ele seria o padrinho do meu filho, ele sempre soube disso.
ㅡ E eu a titia Gemma. ㅡ Ela diz com voz irritante de bebê, empurrando Liam para o lado.
Solto uma gargalha pois sei que esses dois me darão dor de cabeça com o ciúmes que terão do meu filho. Olho para meu pai e minha mãe e falo:
ㅡ E esses meu filho, são o vovô Des e a vovó Anne.
Minha mãe mal consegue falar de tanto que chora, e meu pai, por mais que esteja disfarçando, está limpando o rosto de dois em dois segundos culpando os óculos por estarem "embaçados".
ㅡ Ele é lindo. ㅡ Diz meu pai quando Kalel abre os olhinhos. ㅡ Mas não se parece nada com você.
Kalel tem olhos azuis, exatamente iguais aos de Louis. O nariz de botão, exatamente igual ao de Louis. As sobrancelhas arqueadas, exatamente iguais as de Louis.
Meu filho seria uma cópia exata de Louis, se não fosse pela boca, que felizmente é minha. Seria um absurdo eu ter gerado ele por sete meses e ele não ter nem um traço meu. Apesar que no fundo, sempre torci secretamente para que ele tivesse os olhos de Louis.
ㅡ Parece sim. ㅡ Digo emburrado.
ㅡ Não tem nada a ver com você, Harry. ㅡ Minha mãe continua ao admirá-lo de perto pelo vidro.
ㅡ Mãe. ㅡ Reclamo contrariado. ㅡ Só porque os olhos dele são azuis? Isso na verdade não quer dizer nada, todo bebê quando nasce tem os olhos meio azulados, eu também tinha.
ㅡ Não tinha não. ㅡ Meu pai protesta. ㅡ Você já nasceu com duas bolas de gudes verdes.
ㅡ Liam, me ajuda. ㅡ Eu praticamente imploro e ele dá de ombros.
ㅡ Verdade Hazz. Ele é muito mais lindo que você... Acho que só a boca lembra, e mesmo assim, isso pode mudar quando ele crescer.
ㅡ Ah! ㅡ Exclamo frustrado, e acaricio o vidro. ㅡ Você é cara do papai, não é estrelinha?
ㅡ De qual dos dois? ㅡ Gemma diz mordendo os lábios para segurar uma risada.
Sinto meu peito estremecer.
Do Louis. Ele é a cara do Louis.
ㅡ Eu, é claro. ㅡ Tento me recuperar e cruzo os braços em frente ao peito.
Minutos depois a enfermeira volta, e há mais um coro de choros quando ela leva Kalel de volta ao berçário de prematuros. Eu me acabo de chorar, mas sei que ele precisa ficar lá até se recuperar completamente. Já estou contando os dias para ele ganhar peso suficiente para irmos para casa. Não vejo a hora de ter o meu filho coladinho a mim.
Quando meus pais e Gemma descem para jantarem, ouço a tão temida voz de Liam,. Tento fingir que estou dormindo, mas ele me cutuca sem a menor intenção de acreditar no meu teatro.
ㅡ Você pode me contar o que aconteceu? ㅡ Ele me pergunta e eu me afundo no travesseiro.
ㅡ Eu já disse. Eu estava no supermercado e esbarrei com ele. Eu nem sabia que ele estava na cidade, pelo que me lembro, Zayn disse que ele ficaria fora por um ano. E bem, minha pressão subiu, eu comecei a passar mal e ele me trouxe. Foi só um acaso.
ㅡ Harry… ㅡ Liam me reprime e eu solto um suspiro.
ㅡ Olha, eu não contei, Li… se é isso que quer saber. Não tive tempo suficiente pra isso. Tudo aconteceu tão rápido. Eu estava praticamente desfalecido. Não era o momento para despejar algo assim. Eu não estava preparado, e ele talvez não estivesse pronto. Mas ele assistiu o parto comigo, e foi a primeira e única pessoa sem ser o médico a pegar Kalel no colo. Ele se emocionou. Chorou comigo quando ele nasceu. ㅡ Sinto as lágrimas me invadirem e solto um suspiro. ㅡ Foi tudo tão lindo, tão puro… foi o nosso momento, mesmo sem ele saber disso. Há tantas pontas soltas nessa história. Tantos desencontros. Você sabia que ele achava que você era meu marido?
ㅡ O quê? ㅡ Liam exclama surpreso.
ㅡ Ele viu a mensagem do bosta do Ethan no meu celular e presumiu que eu fosse casado, e quando viu você entrando no apartamento imaginou que fosse você.
ㅡ Meu Deus! Por isso ele estava branco como papel. Eu nem imaginei que esse fosse o motivo. ㅡ Liam solta uma risada baixa.
ㅡ Pois é. Foi tudo um grande mal entendido, e agora eu pareço preso nessa omissão. Não sei como conta-lo. De verdade, Liam, eu realmente não faço ideia de como irei contar isso. Não sei como ele irá reagir. Ele namora Liam, ele seguiu a vida, e sinceramente tenho medo do que vai acontecer com a gente se eu contar. Para ele, está tudo bem, entende? Para ele, nosso caso não passou de três noites de sexo. Para ele, eu era casado. Pra ele, meu filho tem pai. Você consegue entender isso? Tenho medo dele me odiar, e tenho medo dele querer algo mais. Ou pior, e se ele quiser se vingar? E se ele quiser pegar o Kalel de mim?
ㅡ Não acho que ele faria isso, Harry. ㅡ Liam faz uma pausa longa. ㅡ Mas não o conheço para afirmar nada. É realmente uma situação complicada... Entendo os seus motivos, e não te julgo. Eu não te julgo nem um segundo sequer. Eu também estaria extremamente confuso se fosse comigo, mas ainda sou a favor de você contar. Você só vai saber o que vai acontecer se fizer isso.
ㅡ Eu não sei. Eu preciso de um tempo pra pensar. Tudo aconteceu tão rápido, tão errado, tão inesperado. ㅡ Fecho os olhos e solto um grito abafado.
Tanta coisa aconteceu em um curto período de espaço, que não tive tempo de analisar as questões que me rondavam. Fui bombardeado com as reviravoltas da vida, e toda vez que tentava me reerguer algo me jogava para baixo. Preciso de um tempo. Acho que todo mundo precisa. Eu preciso colocar meus pensamentos no lugar, curtir meu filho, viver minha vida. Eu passei anos sendo privado de tantas coisas. Passei momentos tão infelizes, e quando finalmente tenho algo feliz em minha vida, ainda assim há uma ponta solta. Quero me esquecer dessa ponta, nem que seja só por algum tempo.
Suspiro tenso e Liam, como sempre faz, aperta o meu ombro com carinho.
Uma semana depois, e com a pressão regulada, eu ganho alta. Liam e Gemma se alternavam para dormir comigo no hospital. Kalel ainda não estava pronto para ir pra casa. Precisava ganhar 200 gramas para estar fora de perigo, e eu quase morro de chorar ao ter que deixá-lo no hospital. Mas sei que é necessário.
O visito todos os dias, e finalmente posso amamenta-lo. É o nosso momento. É ali que o azul dos seus olhos se conectam com o verde dos meus... E eu percebo que não há nada mais lindo no mundo do que ele...
Solta uma risada porque ele é a cara de Louis, então reformulo a frase: não há nada mais lindo no mundo do que eles.
Chego em casa e organizo tudo. Limpo mais uma vez o quartinho dele, e separo todas as roupinhas por cor. Preparo nossa casa com carinho assim como preparei meu coração para a sua chegada. Quando finalmente chega o dia de ir buscá-lo, todos vão junto comigo. Liam, Gemma e meus pais.
Vinte dias depois eu finalmente tenho meu filho em meu colo, livre da incubadora e dos tubos. Com lágrimas nos olhos eu finalmente digo:
ㅡ Estamos prontos para nossa vida, estrelinha. Estamos indo para casa.
___
N/A: Olá, estrelinhas 🌟
Passando para informar que haverá um salto temporal no próximo capítulo, perdido que continuem votando e comentando caso estejam gostando, e agradecer por todo carinho. Tenho recebido tantas mensagens por causa dessa fic, que fico até sem jeito. Muito obrigada. E sim, eu sei que vocês estão passando raiva, mas isso logo logo se resolve, prometo. rs
No mais é isso, espero do fundo do meu coração que estejam gostando da estória, assim como eu estou gostando de escreve-la.
Até o próximo capítulo.
Beijinhos pra vocês! ❤️