Setembro de 2017...
O corpo de Gabriela remexeu, ainda lento e preguiçoso pelo despertar, mas as mãos permaneceram vazias ao percorrerem os lençóis pela cama, o que a fez abrir os olhos devagar, estranhando. Camila não estava ao seu lado, e aquilo era incomum. Alcançou o celular e conferiu que eram 6:20h da manhã, era domingo e Camila não costumava acordar tão cedo em um domingo.
— Amor? – Gabriela chamou fraco, olhando ao seu redor, mas não ouviu nenhuma resposta.
Gabriela sentou, esfregando o rosto por alguns segundos antes de levantar e sair à procura de Camila. Alguns passos para fora do quarto foram o suficiente para ver os pés de Camila no chão do banheiro.
— Amor? Ei... Ei, o que aconteceu?
Gabriela apressou-se em alcançar Camila, que estava sentada sobre o chão, de cabeça baixa. Ao seu redor haviam alguns lenços e os testes de gravidez que haviam comprado na semana anterior.
— Não é nada. – Camila disse, nitidamente contendo um choro e ainda de cabeça baixa.
— Como nada? Por que você tá aqui assim? Olha pra mim. – Gabriela tomou seu queixo devagar, guiando para que se encarassem.
— ...Eu menstruei. – Camila mordeu os lábios em um tom de pesar, com os olhos marejados.
Gabriela engoliu a frase em seco, sabendo o que aquilo significava.
— ...Tem certeza?
— Tenho. Eu... Acordei com uma dor estranha, eu... Eu sabia que era uma cólica, mas eu... Sei lá, acho que eu não queria acreditar no que podia ser.
— Fica calma. Eu... Vou até a farmácia e compro outro teste de gravidez.
— Amor, eu fiz três. Três. – Camila tinha o olhar mais triste que Gabriela já havia visto. – Todos negativos... Não deu certo.
— Ainda é muito cedo, meu amor, isso pode ser só um sangramento.
— Vida... – Camila respirou fundo, tocando o rosto de Gabriela com delicadeza. – Eu falhei.
— O quê? Camila, pára com isso. –Gabriela pediu manso. – Vem, levanta desse chão frio. Vamos pra cama.
Gabriela caminhou abraçada com Camila de volta até a cama e a deitou com calma. Camila parecia estar quase em estado de choque, sem reação.
— É minha culpa – Camila murmurou, com os dentes cerrados.
— Não se atreva a dizer isso de novo, Camila. – Gabriela disse, séria.
— E de quem mais seria a culpa, Gabriela? – Camila a encarou, decepcionada.
— De ninguém! Nós fizemos todos os exames, nós duas somos saudáveis e as nossas chances sempre foram as melhores dentro das possibilidades. Nós conversamos sobre isso.
— Eu sei, eu... Droga, eu sei. Mas eu sentia uma coisa diferente, eu tinha certeza de que tinha dado certo.
— Talvez tenha dado. A gente pode fazer outro teste em alguns dias.
— Amor... Cólica e menstruação pra mim é um sinal mais do que claro.
— ...Tudo bem. – Gabriela deitou ao seu lado, deslizando a mão pelo seu corpo e o abraçando gentilmente. – Se for realmente isso, a gente começa do zero de novo.
— Eu sonho com esse bebê há meses, amor. Eu me recuso a desistir, mas... – A frase foi cortada por um longo suspiro. – Eu não achei que doeria tanto.
— Eu sei. – Gabriela sentia o seu coração despedaçar em mil pedaços, mas sabia que deveria ser forte, ao menos ali, para Camila.
O domingo cinza passou devagar, e as duas permaneceram quase todo o dia na cama, fazendo companhia uma à outra, e mostrando que, mesmo ainda sendo duas, aquilo ainda era forte o bastante para continuar.
Camila se sentiu incompleta naqueles últimos dias de setembro. Era como se houvessem lhe roubado um tesouro que ela, na verdade, nunca havia tido. Sentia falta de um ser que, era difícil acreditar, mas jamais havia sequer existido. Volta e meia, se flagrava com a mão sobre o próprio ventre como se, inconscientemente, quisesse sentir que havia algo dentro de si, e aquilo lhe dava nós na garganta torturantes.
Era madrugada de quinta quando a insônia havia a tomado de jeito, e rolava pela cama inquieta. Ouviu quando Gabriela chegou em casa e permaneceu em silêncio deitada, até que a visse entrar no quarto, já de banho tomado.
— Ei! – Gabriela não pôde conter a surpresa ao ver Camila acordada. – Achei que você estivesse dormindo, tá tarde...
— Eu não tava conseguindo dormir... – Camila interrompeu a frase ao perceber os olhos de Gabriela. – Você andou chorando?
— O quê? Não. – Gabriela disfarçou, se afastando.
— Não mente pra mim, Gabriela... Pára de fingir que você tá bem.
— Eu não tô fingindo que tô bem.
— Tá, tá sim, tá fazendo isso pra me proteger, mas eu sei que dói em você da mesma forma que dói em mim.
Gabriela mordiscou o próprio lábio, contendo uma angústia presa.
— ...O que você quer que eu diga?
— Eu quero que diga o que passar na sua cabeça! Eu quero que chore na minha frente, que seja irracional por um minuto, você não precisa ser forte por nós duas. Me diz o que você tá sentindo.
— Você quer saber o que eu sinto? – Gabriela se aproximou e sentou sobre a cama, com os olhos marejados e as palavras trêmulas. – Raiva. Eu sinto raiva. Mas eu não quero sentir isso perto de você, porque você é o oposto de todas as sensações ruins e eu não quero compartilhar sentimentos ruins com você. Eu penso o tempo inteiro na injustiça que é o que tá acontecendo com a gente, porque todos os dias, em milhares de lares sem um pingo de amor, as pessoas engravidam, e trazem crianças indesejadas sem amor nenhum, e aqui, nesse lar, que tem amor de sobra e quer essa criança mais do que tudo, a gente não conseguiu.
Camila ouviu cada palavra com os olhos igualmente marejados, vendo o quanto Gabriela escondia a própria tristeza para cuidar da sua.
— Ficar em silêncio não vai te ajudar, amor, e não vai me ajudar. – Camila falava manso, com a mão sobre o rosto de Gabriela, o afagando levemente. – Eu sei que você vai medir as palavras pra não me fazer sentir que isso é minha culpa, pra dizer que tudo vai ficar bem e nós vamos tentar de novo, mas o seu silêncio não me ajuda, você chorar escondida de mim não me ajuda. Você sempre me convence de que tudo vai dar certo, precisa convencer a si mesma também. E da mesma forma que eu quero chorar no seu colo quando tudo estiver mal, eu quero que você chore no meu.
— Eu não quero a sensação de luto, porque não é isso que tá acontecendo aqui, mas eu... Dói como uma perda de alguém que esteve com a gente... Eu não sei se você entende.
— Eu entendo perfeitamente, eu também não quero clima de luto. Por mais que eu sinta que a gente perdeu o nosso filho, ele nunca esteve aqui, é uma sensação estranha. Nós tentamos, e não deu, e a gente precisa entender que isso acontece.
Gabriela e Camila permaneceram em silêncio por alguns segundos, apenas se olhando nos olhos, tão fundo que pareciam hipnotizadas.
— Eu te amo. – Gabriela quebrou o silêncio, com um tom sincero.
— E eu amo você. – Camila sorriu, alisando o seu rosto com carinho.
— Eu não quero te ver sofrendo.
— Nem eu. O intuito disso tudo é exatamente o contrário, é trazer mais alegria pra gente. A coisa que eu mais quero no mundo é ter o privilégio de trazer o nosso filho pro mundo, e eu sei que isso vai acontecer.
— Vai. – Gabriela sorriu, incentivando. – Você... Não quer fazer o exame de sangue?
— Não. Eu não... – Camila interrompeu a frase com um suspiro, contendo uma agonia. – Talvez daqui alguns dias, ou se eu sentir alguma coisa diferente, eu... Não tô preparada pra mais um "negativo", e ainda mais um tão oficial.
— Tudo bem. – Gabriela comprimiu os lábios em aceitação, e se aproximou de Camila devagar, dando-lhe um beijo na testa. – Agora eu quero que você deite aqui comigo e descanse um pouco. E a gente vai ficar bem. Certo?
— ...Certo. – Camila suspirou, recostando o corpo sobre Gabriela e tentando relaxar o corpo, que já doía pela tensão.
O silêncio veio em poucos minutos, mas ambas custaram a dormir, abraçadas e em silêncio, como se os pensamentos custassem a serem desligados.
Na manhã de quinta-feira, Camila levantou no mesmo horário de todos os dias. Era o dia do exame de sangue que faria para confirmar a gravidez, mas preferiu não pensar naquilo e sabia que estava fugindo da realidade ao não comparecer. Encarou seu reflexo no espelho por alguns segundos, e ainda sentia o corpo diferente, como sentia há alguns dias, mas naquela manhã parecia ainda mais evidente; sentia os seios sensíveis, o que não era algo comum, e a menstruação também havia parado, da mesma forma repentina que havia começado. A breve sensação de esperança a fez engolir em seco. Camila cerrou os punhos, dividida entre a vontade de fazer um novo teste de gravidez, e uma possível nova decepção, que seria ainda maior. Por vários segundos, permaneceu com as mãos apoiadas sobre a pia, cerrando os olhos com força enquanto batalhava internamente, até que um dos lados vencesse.
— Droga, Camila, que droga! – Camila praguejou ao vento, abrindo as gavetas do armário, em busca de um novo teste.
O teste exigia alguns minutos para o resultado, e Camila os aproveitou para tomar um banho, que fez cheio de ansiedade, sabendo que do lado de fora haveria o resultado que tanto esperava e temia.
Quando o banho terminou, Camila fingiu paciência, enrolando uma toalha sobre o corpo e outra sobre os cabelos molhados, e caminhou em passos fingidamente despreocupados até o teste, que estava sobre a pia. Engoliu em seco e respirou fundo enquanto levava o resultado até os olhos, de cenho levemente franzido pelo medo do que veria.
— Não... O quê? – As palavras saíram quase sem som, pelo choque.
No teste, havia um risco nítido, que indicava o negativo, mas ao lado havia um fino risco em tom rosado, quase imperceptível, mas que não passaria despercebido aos olhos atentos de Camila, que observou boquiaberta e com a mão esquerda sobre a boca, quase contendo um grito. Quando tornou a si, Camila voltou à gaveta, buscando por mais um teste que fosse uma contraprova, mas percebeu que não havia mais nenhum.
— Argh, só pode ser brincadeira!
Aquele era o pingo de coragem necessária para que realizasse o exame. Camila se arrumou apressada, tomando cuidado para não acordar Gabriela, e guardou o teste dentro da bolsa, para garantir que ela não o encontraria quando acordasse.
Às 9 da manhã, o exame quantitativo estava feito. Camila deixou a clínica ainda aérea, com a promessa de que o resultado sairia até o final da tarde. Aquela seria uma agonia sem fim. Quando chegou ao carro, houve um silêncio profundo, que fez com que Camila fechasse os olhos. Ouvia apenas a própria respiração, enquanto o ar entrava e saía profundamente. Suas mãos foram, quase inconscientemente, ao seu ventre, em um ato quase desesperado com a pouca esperança que tinha.
— ...Oi. – Camila sussurrou para dentro de si. – Eu... Não tenho certeza se você tá aí dentro, mas... Bom, eu espero que esteja. Eu ainda não consigo sentir o seu corpo dentro de mim, mas eu sinto sua alma tão perto que só pode estar dentro mim, abraçada com a minha... Eu sonho com você há tanto tempo, eu te seguro no meu colo há tanto tempo... – Camila respirou fundo, contendo um choro preso na garganta que fez cada pêlo do seu corpo arrepiar. – A sua outra mãe me tornou uma pessoa com muito mais fé do que eu jamais teria sozinha, então... Se você tá aqui, me desculpa pelos momentos em que eu duvidei que estava. Eu nunca pensei que um dia eu poderia te querer tanto, que esperaria por você, eu nunca imaginei que você faria parte dos planos, mas... Eu quero que você sinta que você é um serzinho muito amado, e se estiver aqui dentro, por favor, fica. Eu quero que você venha, cheio de saúde, pra que eu possa te segurar como eu faço nos meus sonhos... E... Se você se parecer com a sua outra mãe, seria ótimo. – Camila finalizou com um riso frouxo.
Camila viveu o dia mais longo da sua vida. Cada minuto parecia durar uma hora inteira, e olhava o relógio incansavelmente, quase a todo minuto. A posição do Sol parecia nunca mudar, e teve quase certeza de que o relógio havia parado por meia dúzia de vezes. Trocou mensagens com Gabriela, sem fazê-la suspeitar de nada e contendo a ansiedade que tinha dentro de si. Quando a tarde finalmente chegava ao fim, Camila correu ao encontro de Júlia. Às 17h, ziguezagueava ao lado de fora do hospital, esperando pela prima.
— O que é tão importante que vai me fazer perder o meu único intervalo até a meia-noite? – Júlia brincou, de braços cruzados e cenho franzido.
— Eu preciso de um favor.
— Credo, Mila, você tá pálida, o que aconteceu?
— Eu fiz uma coisa... E eu preciso de alguém comigo pra ver o resultado, pra me segurar caso eu desmaie, ou me segurar caso eu caia no choro de decepção.
— Por que eu? O que você aprontou!? – Júlia fechou a cara.
— Você já vai saber.
Camila respirou fundo e, com paciência, desbloqueou a tela do celular e digitou os números do protocolo. O dedo relutou por alguns segundos até clicar no botão que levaria ao resultado.
— O que foi? – Júlia perguntou, sem entender. – Camila, que cara é essa? O que é que tá acontecendo?
Camila permanecia de boca aberta, e os olhos marejaram de forma que as lágrimas escorriam sem qualquer controle. Com um sorriso incrédulo, Camila virou a tela do celular à prima, mostrando o resultado do exame.
— Hcg? Por que você fez um exame de... Ah, meu Deus, positivo? VOCÊ TÁ GRÁVIDA?! – Júlia gritou, também boquiaberta, e Camila assentiu positivamente, com um sorriso em choque que já beirava uma risada. – O quê...? Puta que pariu!
Júlia abraçou a prima com força, pulando como se fossem crianças.
— Me diz que eu não tô errada, Júlia! É isso mesmo?
— Mila, não precisa ser médico pra entender, tá dizendo "positivo" bem grande aqui! Vocês... Planejaram um filho? Sem me contar?
— Ninguém sabe! – Camila gargalhou. – Meu Deus, nem a Gabriela sabe.
— Você engravidou escondida dela??
— Não, ela não sabe que deu certo! Júlia, a gente teve a pior semana da nossa vida. Eu... Nem sei como isso é possível, eu fiz testes em casa e todos deram negativo, eu tive cólicas, eu menstruei...
— Você sabe que isso também são sintomas de gravidez, não sabe? E teste de farmácia dá falso negativo muito fácil... – Júlia segurou o braço de Camila, sem expressão. – Espera... Mila, a minha ficha tá caindo... Isso quer dizer que vocês vão ter um bebê!?
— Vamos ter um bebê! – Camila tinha o sorriso mais largo que já havia dado. – E sabe qual é a melhor parte?
— Qual?
— É o óvulo dela... Tem uma mini-Gabi dentro de mim.
— O quê? Ah, meu Deus. Isso é... Uau. É maravilhoso. Eu vou ser a madrinha, tá entendendo? – Júlia apontou, em tom de ordem.
— É claro que vai... – Camila abraçou a prima com carinho.
— Você tem que ir pra casa contar pra Gabriela!
— Não. – Camila respirou fundo, demonstrando nervosismo. – Eu não posso contar pra ela ainda, e se acontecer alguma coisa?
— Tipo... Você perder?
— É. Quanto tempo você acha que é um risco?
— Mila, não existe uma data limite, a sua gravidez é como qualquer outra, mas você precisa contar pra ela.
— Eu não posso correr o risco de viver essa semana de novo, Júlia, ela não ia aguentar, e eu não ia aguentar.
— Camila, já deu tudo certo, você tá grávida! – Júlia abriu os braços em tom óbvio.
— Eu... Acho melhor esperar, pelo menos um mês.
— Que tal esperar 0 minutos?
— Não, eu vou esperar um mês.
— Uma semana. – Júlia levou as mãos à cintura com uma expressão desafiadora e uma postura de negociação.
— Três semanas.
— Duas.
— Três.
— Confia em mim, eu sou a médica. Duas semanas tá ótimo. E do jeito que você é fofoqueira, talvez nem aguente.
— Ah, acredite, eu vou aguentar.
— Não vai contar nem pro seu pai?
— Ele vai saber logo depois da Gabriela, não se preocupa.
— Olha, o seu silêncio implica no meu silêncio, e eu sou fofoqueira, então trate de espalhar logo que vai ser mãe, pra eu poder espalhar que vou ser madrinha. Entendeu?
— Entendi. – Camila sorriu satisfeita. – Duas semanas. Meu Deus, que vontade de gritar! Parece que eu tirei um caminhão das costas
— Não, você logo vai sentir que tá carregando um caminhão, mas na barriga. – As duas gargalharam. – Droga, eu preciso voltar pro meu turno. Me dá notícias, tá bem? E vê se se cuida, hein? Você é uma gestante. – Júlia franziu o cenho. – É estranho demais dizer isso pra você... Parabéns, Mila.
— Pode deixar, a gente acostuma. – Camila riu, tomando a prima em um abraço. – Obrigada, por tudo.
— Obrigada você, por compartilhar isso comigo. – Júlia afagou os cabelos de Camila. – Te amo.
— Eu sei. Eu também te amo, "tia Júlia".
— Ai, vai com calma, eu ainda tenho uns 2 anos antes desse título começar a ser dito em voz alta, tá legal!?
Camila sentia uma paz que nunca havia sentido antes. Era como se toda a sua visão do mundo houvesse mudado, e os sorrisos não parassem de brotar nos lábios, junto às expressões incrédulas que dava a cada constatação mental que fazia. O caminho de volta foi carregado de uma paz que colocaria fim à uma guerra. Quando deu por si, já estava dentro de casa, mas Gabriela não estava. Sentiu o cheiro do perfume pela casa e constatou que provavelmente havia saído há pouco tempo. Camila caminhou até a sala, onde havia uma foto de Gabriela pequena, e encarou aquela imagem em silêncio, com um sorriso, pela quase certeza de que daria à luz à uma criança idêntica à ela, e nada poderia deixá-la mais feliz.
Naquela noite, Camila fez toda a sua rotina e se deitou cedo, mas dormir estava fora dos seus planos. Talvez fosse pela gestação, pela alteração dos hormônios, ou pela ansiedade e toda a emoção que sentia, mas tudo o que conseguia fazer era observar a própria barriga e alisá-la com carinho, como se afagasse o próprio filho.
Gabriela chegou mais cedo que nas noites anteriores, e ainda sem suspeitar de qualquer coisa, flagrou Camila novamente acordada na cama. Dessa vez, sorriu com um pouco mais de normalidade, e Camila retribuiu, olhando-a com carinho.
— Tudo bem? Como você tá? – Gabriela perguntou, sentando ao lado do seu corpo deitado sobre a cama e dando-lhe um beijo nos lábios.
— Bem, e você? – Camila respondeu, contendo o entusiasmo.
— Bem... Tá melhor?
— Tô sim. Vai ficar tudo bem. – Camila disse, com um sorriso tranquilo.
— Vai, sim. – Gabriela sorriu, acariciando seu braço com a ponta dos dedos. – Eu vou tomar um banho e já venho, tá?
— Uhum. – Camila assentiu, pacientemente.
Duas horas depois, Camila ainda permanecia acordada, e observava Gabriela dormindo tranquilamente. Alisou seus cabelos com cuidado, com um sorriso que somente aqueles momentos lhe faziam dar, e observou cada pequeno detalhe do seu rosto e da forma como dormia, achando graça de como apoiava a mão esquerda sobre o rosto.
— Você vai ser mãe... – Camila sussurrou baixo, sabendo que não a acordaria. – Você não faz ideia de como me faz feliz, e quando eu achei que não podia ser melhor... Você me deu um pedacinho de você. Meu Deus, como eu te amo... – A frase saiu com um suspiro. – Eu sou sua pra sempre, Gabriela. Pra sempre.
Camila afagou o rosto de Gabriela com carinho, e aproximou-se devagar, virando-se de costas e ajeitando os corpos em uma conchinha que encaixava sempre perfeitamente. Tomou discretamente a mão de Gabriela e a repousou sobre sua barriga, como se encaixasse os três seres em um abraço. Gabriela remexeu o corpo devagar, ainda sem acordar, e estreitou o laço, segurando Camila com carinho e mantendo a mão sobre o seu ventre, arrancando dela um suspiro discreto. Ficaram naquela posição, até que o corpo de Camila relaxasse totalmente e os olhos começassem a pesar, pelo conforto da posição em que estava e o sono que chegava e a fez repousar, deixando no quarto apenas o som das respirações baixas e tranquilas.
*** FIM ***