By chance

By RainbowTU

915 134 139

Quem tinha tido a brilhante ideia de definir a hierarquia social a partir da capacidade reprodutiva de cada u... More

AVISOS
A monotonia da inquietação
E então, atração
Sugestões quase explícitas
Entre máscaras, sedução
Enfim, nós

De repente, ele

127 21 27
By RainbowTU

O dia seguinte, no entanto, não me permitiu fazer os questionamentos desejados. Os preparativos para a festa de minha sobrinha estavam intensos, e eu me vi sendo forçado a auxiliar meu irmão na arrumação dos detalhes finais. Ele estava grávido e bastante nervoso, não poderia fazer tudo aquilo sozinho. O Rei, seu esposo, estava ocupado entretendo a Rainha, minha mãe, e as suas próprias mães, e não poderia se ocupar daquilo. Portanto, o Rei Consorte, meu pai e eu, decidimos por sermos as extensões de seus braços para que tudo ocorresse da melhor forma. Tivemos descanso apenas no final do dia, quando fizemos uma breve refeição e fomos cada um aos nossos aposentos a fim de nos arrumarmos para o primeiro grande baile de três, que seriam dados para comemorar um ano de nascimento da possível princesa herdeira gerada por meu irmão.

Arrumei-me com cuidado, me utilizando do auxílio dos serviçais do palácio, que meu irmão colocara à disposição de sua família original. Pouco tempo depois eu já estava em frente ao salão de festas, de onde já era possível escutar algumas poucas vozes. Adentrei no local e me pus a passear pela área, observando a decoração, uma vez que pela noite ali não pude estar.

A primeira visão de qualquer um que chegasse era um imenso quadro onde a atual Família Real de Gwacheon estava retratada. A pintura era bastante bonita, em minha opinião, porém, um tanto quanto mentirosa. Por certo meu irmão e seu esposo eram lindos, e a princesa, a qual mal vira mais cedo, era de beleza encantadora também. O quadro, porém, parecia trazer algo de surreal que não me foi possível especificar, posto que logo em seguida eu fui puxado para o lado de fora pelo Rei Consorte, meu pai.

— Que fazes aqui dentro, Yoongi? — O senhor me disse, me levando para a entrada novamente. — Não sabes que precisas ser anunciado antes de entrar?

— Perdão, Majestade. — Respondi em tom baixo, sendo conduzido para fora. De fato, havia me esquecido desta norma que naquele reinado era bastante importante, mas que para nosso reino não tinha mais tanta relevância já que grandes festas não eram mais ofertadas na Corte. — Eu me esqueci da etiqueta local.

— Tua sorte é que fui eu a ver-te, pequenino, fosse a Rainha e terias uma baita dor de cabeça quanto te visses a sós com ela. Sabes como ela fica zangada com coisas miúdas, pois não? Comporta-te para não lhe promover a ira! Ora que não te custa! Atento!

O Rei Consorte falou ao me soltar do lado de fora e se afastar, e eu não pude evitar de sorrir, no fim. Não pelo sermão, talvez um pouco alto demais, certamente sendo escutado por pessoas mais próximas, e sim pela maneira como ele me chamou. Trouxe-me uma memória gostosa da infância, quando eu era o seu pequenino, e Namjoon, por ser maior que eu, seu pequeno. Já havia muito tempo que não me chamava assim, e escutar a palavra me foi, de certa maneira, confortador.

Enquanto sorria devido ao fato, senti, perto de mim, um perfume um tanto ardido, o qual não sabia ao certo definir. Lembrei-me da noite anterior, e um arrepio acabou por correr minhas costas. Antes que eu pudesse cogitar novamente a possível presença de seres sobrenaturais por ali, uma pessoa parou ao meu lado, intensificando o cheiro.

— É uma chateação que em idades como as nossas ainda tenhamos nossos pais a nos dar ralhos no meio de toda gente, não é mesmo? — A pessoa disse, e pelo tom de voz, julguei ser do gênero masculino. — Acreditas que minha avó até seu último dia de vida se via no direito de me puxar as orelhas? Na frente de quem quer que fosse. Nunca somos adultos o bastante para eles, percebas bem. Somos sempre seus pequeninos.

Virei-me, então, para quem falava comigo. Tratava-se de um alfa menor, como eram conhecidos os não lúpus, e sim, era um homem. Tinha estatura um pouco mais elevada que a minha, usava vestes nobres de cor azul e, o detalhe que mais me chamou a atenção, possuía os cabelos avermelhados. Era uma tonalidade rara de ser encontrada, especialmente em alfas de sua estirpe. A colocação se via com maior ocorrência em alfas do tipo lúpus, e mesmo entre eles não era comum.

Inalei com mais força o seu perfume, sem querer, o que acabou por me fazer tossir de leve. Era realmente ardido, não de uma maneira insuportável, mas que requeria o costume que eu não tinha.

— Oh, é meu cheiro, não? Sinto muito, cheirar a uma especiaria tão característica não é bom, nada bom... — Ele dizia enquanto buscava algo em seu casaco. — Nem mesmo betas o suportam muito bem, suponho que seja o teu caso, certo? — Puxou um lenço de tecido da roupa e o entregou a mim. — Sente este perfume, por favor. É uma composição neutralizadora, há de facilitar tua respiração.

Minha reação natural seria, primeiro, fazer várias indagações, no entanto, a ardência em minhas vias aéreas me incomodava sobremaneira, de forma que apenas obedeci aos ditames do estranho. Em questão de segundos já me sentia melhor, motivo pelo qual lhe devolvi o lenço, que ele tomou de minhas mãos com polidez.

Ia perguntar-lhe algo, mas a voz do anunciante oficial do Reino se fez ouvir, nos pedindo para que déssemos espaço no corredor, e o estranho e eu acabamos por nos distanciar um tanto conforme todos se posicionavam. Em instantes, a Rainha e o Rei Consorte já estavam ao meu lado, me levando para outra extremidade do recinto, onde a família do esposo do Rei deveria estar.

Quando todos estavam prontos, a voz ressoou novamente, anunciando a entrada do governante daquela nação.

— Sua Excelentíssima Majestade Absoluta e Real, o Rei Seokjin de Gwacheon!

Ditas estas palavras, os presentes se viraram para onde seria a entrada do local, e demos as vistas na figura imponente de meu cunhado, com seus cabelos loiros e trajes reais de gala. Conforme ele ia adentrando, os súditos se curvavam, e os nobres e membros das realezas presentes faziam uma singela reverência. A passos lentos, de acordo com os ditames, ele vinha se aproximando do grande salão de festas, e assim que chegou mais próximo de mim, pude relembrar melhor seus traços.

Foi quando ele passou por minha frente, e eu lhe fiz minha reverência real, que uma de suas características me saltou com força à memória: meu cunhado tinha cheiro forte e fresco de limão.

— Sua Majestade Real, o Rei Consorte Namjoon, e a Princesa Infante, Hyerin de Gwacheon!

Escutei meu irmão ser anunciado junto à minha sobrinha, e enquanto o admirava em toda sua beleza com a menina nos braços, ligava o alfa ruivo com cheiro de pimenta e o meu cunhado e seu perfume de limão. Não que cada alfa e cada ômega tivessem cheiros exclusivos, mas as associações se formavam em minha mente sem que eu as controlasse. E assim se seguiram os anúncios e minhas conclusões, até que ouvi meu nome, e me posicionei.

— Sua Majestade, o Príncipe Yoongi de Daegu!

Entrei no salão de acordo com a etiqueta, e em minutos eu já estava de frente para a Família Real de Gwacheon. Fiz minha reverência educadamente, ainda tentando imaginar o que um alfa menor estaria fazendo escondido no palácio com o Rei durante a noite, enquanto todos estavam recolhidos. Fixei-me, especialmente, na questão de que, para meu irmão, seu esposo estava dormindo, e não em supostas reuniões.

Esperei até que todos os convidados fossem anunciados, de acordo com suas importâncias e graus de nobreza, e prestassem suas homenagens à Realeza que os convidara para as festas. Durante a solenidade, eu transitava por entre as pessoas, tentando encontrar algum alfa, do gênero que fosse, que possuísse um perfume mais ardido, ou de notas cítricas, que pudesse afastar de minhas ideias a possibilidade de serem aquele estranho ruivo e meu cunhado os que quase flagrei pela madrugada. Meus intentos, porém, fracassaram, e quando todos já estavam presentes, eu tive certeza de que os dois haviam tido um encontro às escondidas dentro das paredes de pedra do Palácio. E isso não me parecia algo bom ou decente.

— Abram alas para a apresentação de Sua Majestade Absoluta e Real, o Rei Seokjin de Gwacheon, e Sua Majestade, o Rei Consorte Namjoon!

Aos dizeres do anunciante real, os convidados voltaram a se organizar de acordo com suas hierarquias, e eu fiquei posicionado em um local relativamente limpo, para que esperássemos pelo toque da Primeira Valsa, a ser performada pelo Rei e meu irmão. Um costume idêntico ao de Ilsan, e que eu pensava ser um tanto engraçado. A festa era para celebrar o aniversário de um ano da princesa, mas o destaque jamais recairia sobre ela. Os pais, em seu lugar, ganhariam todas as atenções, enquanto ela provavelmente iria dormir a noite inteira no colo de um criado, ao som das músicas e vozes.

Pus-me a apreciar a valsa do casal, e devo dizer, meu irmão era um dançarino impecável. Seus movimentos eram graciosos e ele possuía um charme sem tamanho. O Rei, igualmente, não dava passos ruins, e, quem os visse assim, valsando em harmonia e se olhando intensamente, compraria com facilidade a imagem de esposos felizes e apaixonados. Alguns minutos depois, a Primeira Valsa terminou, e os monarcas foram aplaudidos pelos espectadores, dentre eles, eu.

Aquele era o momento em que a música continuaria, e todos iriam poder formar seus pares e dançar juntamente com os anfitriões. Desde a puberdade não costumava dançar em bailes com frequência, posto que alfas, os que convidavam à dança, tinham preferência por puxar ômegas pelas mãos, e eu geralmente restava esquecido. A bem da verdade, contava com isto para me sentar, apanhar uma bebida e pensar sobre o que fazer acerca da informação que acreditava possuir a respeito de meu cunhado. Cheguei a me virar para me afastar, contudo, uma palma tocou-me na cintura, me levando a retomar o lugar de antes.

A surpresa de ver aquele alfa com os cabelos acobreados só não foi maior que o fato de seu cheiro já não ter me causado nenhum desconforto respiratório.

— Dá-me a honra de valsar comigo, Príncipe de Daegu?

Não era minha intenção, mas um sorriso singelo acabou se formando em meus lábios quando movi a cabeça num tímido consentimento. Gostava muito de dançar, e modéstia à parte o fazia com maestria, porém, tinha poucas oportunidades de mostrar meus talentos. Certamente dançar com aquele sujeito, bem naquele momento, não era minha opção preferida, mas também não via por que recusar. Minhas suspeitas me intrigavam, por certo; entretanto, não passavam disso. Recusá-lo não era uma alternativa necessária.

O ruivo me deu um sorriso farto, e a formação de seus dentes dentro da curva do sorriso de lábios bem delineados tinha uma composição tão bonita quanto a beleza de todo o seu rosto. Ele puxou-me para perto de seu corpo, e pondo a mão direita em minha cintura, esperou que eu fizesse o mesmo consigo. Após, posicionou a mão esquerda às costas, e tão logo eu repeti o gesto, começamos a dançar.

— Perdão por ainda não ter me apresentado, Príncipe Yoongi de Daegu! Sei que a etiqueta me exige comportamento melhor antes de tirá-lo para dançar, mas uma regra ou outra pode ser quebrada, não é mesmo? — O homem disse enquanto rodávamos no salão. – Apresento-me agora. Sou Hoseok, Conde de Gwangju. Ao seu dispor.

O jovem me fez uma breve reverência, tanto quanto lhe foi possível, devido a nossa atividade. Concordei com a cabeça, observando suas feições ornamentadas por seus fios vermelhos em movimento, conforme rodopiávamos. O que o Conde de Gwangju estaria fazendo tarde da noite com o Rei de Gwacheon? Que tipos de relações teriam? Qual nível de intimidade permitiria algo dessa monta?

Naturalmente tinha minhas ideias, não sou burro, e até ser reconhecido como beta, tinha sido criado para um dia governar. Há diferenças entre as legislações, mas algo nunca mudava: poucas coisas justificam encontros escondidos no meio das pedras dos Palácios, e todas são consideradas ilegalidades.

As histórias sobre a rapidez com que meu cunhado havia ascendido ao trono me vieram todas à mente, enquanto devorava e era devorado pelo olhar acastanhado do ruivo que me tomara para dançar. Seria esse o tipo de ligação que eles teriam? Ou seria algo mais simples, como uma relação amorosa imoral entre dois alfas? Estaria eu, neste momento, dançando no salão com um dos amantes do Rei, um dos que meu irmão insistia que ficavam sempre longe?

Minha curiosidade não deixaria de fervilhar enquanto eu não pudesse saber.

— Vi-te ontem com o Rei, quando saías do aposento real furtivamente pela madrugada, Conde de Gwangju. — Acabei por soltar, enfim, com apatia. — Acaso este encontro que tiveste é uma das regras que, de vez em quando, não vês problema em quebrar?

Hoseok deixou de sorrir, e mesmo não me dando resposta imediata, não seria necessário que dissesse algo para confirmar as suspeitas. A palidez de seu rosto me dava a confirmação que eu, honestamente, não mais precisava.

— Acaso disseste algo por aí, Príncipe?

Perguntou com a voz baixa, muito próxima de meu ouvido, logo após me puxar ainda mais para próximo de si. Desta vez, fui eu que não respondi de plano. Esperei que me olhasse outra vez, o que ele fez, mantendo a inexistente distância entre nossos corpos.

— Por aí onde, Conde? — Mantive-me apático ao seu olhar. — Nos ouvidos do Rei Consorte, por exemplo? É o que temes?

Desta vez, ele não perdeu a compostura. À minha insinuação, sorriu, e eu não pude entender muito bem o que ocasionara tal gesto. A possibilidade de eu deixar no ar que ele poderia estar se deitando com outro alfa era engraçada? Ou ele considerava ômegas tão pouca coisa que não se importava que meu irmão soubesse? Ou, quem sabe, Namjoon já estivesse ciente disso?

— Não tens ideia de coisa alguma, Príncipe. Isto prova alguns pontos. É algo bom.

Seguimos dançando, ele sorrindo e eu o encarando, intrigado. De fato, não sabia de coisa alguma, e tentar descobrir só me deixou ainda mais enevoado pela escuridão. Assim que a valsa acabou ele me soltou, me fez uma reverência e partiu, distanciando-se com rapidez. Tudo o que pude ver foi o conde, com cautela, se aproximar do Rei, e ao julgar que poucos estariam os observando, cochichar-lhe algo no ouvido.

Seokjin sorria, e assim permaneceu durante tudo o que o nobre tinha para lhe dizer. Eu fiquei em meu canto, os olhando, e vi quando, minutos depois após ser abandonado pelo conde, o Rei se aproximou de Namjoon e lhe participou algo nos ouvidos. Meu irmão, que também sorria, falhou um pouco nisso por um segundo, mas somente eu, que o fitava num ritmo incansável, devo ter percebido.

Antes que pudesse imaginar isto acontecendo, em questão de minutos Namjoon já estava ao meu lado.

— Venha, Yoongi! — Falou me segurando pela mão. — Já destes uma boa olhada em tua sobrinha? Por certo que não, mal tivemos temos para nos falarmos hoje! Deixe-me te mostrar como ela dorme feito anjo!

Assim, acabei sendo arrastado pelo salão, até que atingíssemos uma porta lateral, para a qual ele me concedeu acesso, entrando logo depois. Pude ver que se tratava de uma espécie de antessala, previamente arrumada para servir de quartinho para que uma criança pequena pudesse repousar. Tinha um bercinho de ferro no centro, um mosquiteiro no teto, e algumas poltronas ao redor, bem como uma mesa com utensílios para cuidados de bebês.

— Retira-te, Jungkook, por obséquio. — Namjoon disse ao jovem que embalava o bercinho no centro do local. — Quero um momento a sós com a Princesa de Gwacheon e o Príncipe de Daegu.

O rapaz anuiu, fazendo uma reverência a nós dois, e saiu, deixando uma suave fragrância de morango silvestre para trás. Um ômega, a julgar pelo tipo de cheiro e pela pouca intensidade com que o senti. Nenhuma surpresa. Era a preferência dos monarcas pegar os criados ômegas para cuidar dos príncipes e princesas durante a infância. Eu próprio e meu irmão fomos cuidados, na maior parte do tempo, por um ômega chamado Shinwoo. Excelente pessoa, mas muito sério. Os sorrisos lhe eram raros.

— Veja como minha menina é linda, Yoongi. — Aproximou-se do berço, embalando-o de leve ao encarar a pequena adormecida ali dentro. — Loira como o Rei, formosa como ele. Há grandes esperanças de que venha a ser uma alfa lúpus também. — Fez a última afirmação colocando a mão livre sobre o ventre. — Se ela for uma, torcerei para que este próximo venha um ômega, assim poderemos expandir o reino com bons acertos matrimoniais, de diferentes formas. Seria uma bela sorte, não acha? Ter um herdeiro de cada espécie.

— E se um dos dois for beta, Namjoon? — Questionei sem nenhuma pretensão, somente para lhe trazer à mente que nós existimos. — Teriam teu esposo e tu planos neste caso?

Ele me olhou por um tempo, e eu retribui. Embalava o berço e acariciava a barriga enquanto me olhava, e isto começou a ficar embaraçoso depois de um tempo — que me pareceu bastante longo. Já começava a me arrepender do que dissera, quando ele interrompeu o silêncio.

— Contaste a nossos pais ou a alguma outra gente o que viste pela noite, Yoongi?

— Falas do encontro entre teu marido e o conde?

Respondi com seriedade, ao que Namjoon arqueou uma das sobrancelhas, concordando em seguida.

— Contei coisa alguma a ninguém, irmão. Não tive tempo para isto, e ainda que o tivesse tido, sequer sabia que eram eles até agora, não havia razão para comentar algo. Reconheci-os na Festa Inaugural, pelos cheiros.

— Entendo. — Ele voltou a olhar para a menina, sorrindo ternamente. — Seria te pedir muito que não abrisses mais a boca para tocar neste assunto?

— Estás sendo direto como nunca antes, irmão. — Arguí, esperando uma reação qualquer, que não recebi. — Poderias me dar a graça de saber o motivo pelo qual isto é um grande segredo, ao menos?

Desta vez ele reagiu e eu fui intensamente encarado, até o ponto de ficar incomodado.

— Não posso prometer-te tal coisa, mas te garanto que não trarás nada de bom ao ficar mencionando tua descoberta por todos os cantos.

Meu irmão soou áspero, como se estivesse me repreendendo. Era uma postura incomum para ele.

— Eu não saí largando pelo vento o que descobri. — Retruquei, no mesmo tom. — Perguntei diretamente a um dos envolvidos, porque me pareceu curioso o fato de o conde e o Rei estarem de cochichos quando tu mesmo me disseste que teu marido dormia.

— Pois calado tu estarias bem, no entanto, resolveste falar. — Lançou um beijo para a filha, e eu me admirei com a tranquilidade em que ele mimava a garota e falava de assuntos sérios ao mesmo tempo. — Por isto te peço, irmão, que por favor, te cales e não questiones mais ninguém, sim?

Namjoon voltou a me olhar, e a expectativa da resposta positiva fazia suas írises brilharem. Assenti, e quase pude escutar o ar sair de seus pulmões quando arfou em alívio.

— Atenderei ao teu pedido, mas não gosto da forma com que ages para manter isto em sigilo. É medo de que teu marido seja decapitado ou receio de que ele se zangue contigo e te mande decapitar?

— Não digas sandices, irmão. Agora volta para o baile — Falou com suavidade, porém de maneira firme, redirecionando a atenção para Hyerin e para a própria barriga. — O Conde te espera lá fora. Sê gentil com ele, dança, te diverte. Trata Hoseok bem. Podes me atender em mais este pedido?

— Arrumaste babá para garantir minha boca fechada?

— Não se trata disto, não sejas tão desagradável. — Balançou a cabeça em negativa. — Ele te espera porque tem interesse em passar a noite em tua companhia, e se ainda és o mesmo de quando morávamos juntos, haverás de apreciar muito estar com ele.

— Eu? Apreciar a companhia de um alfa? Esqueceste de quem sou, por certo.

— Não esqueci nenhum detalhe de tua personalidade astuta e irrequieta, irmão, e é por isto que te faço tal afirmação. Dá-me um voto de confiança e sê obediente aos meus conselhos, fazendo-me favor. Verás do que falo, e quiçá me serás grato também.

Balancei minha cabeça em discordância, soltando um suspiro ruidoso. Namjoon parecia lúcido, mas a forma com que falava não trazia muita clareza, em nenhum aspecto.

— Vais ficar aqui? — Questionei, por fim.

— Sim. Vou me dar uns minutos na companhia da princesa, antes de acordá-la para se despedir de seus convidados. É a celebração de seu nascimento, afinal, e deve dar o ar de sua graça antes de sumir definitivamente para seus aposentos. — Sorriu, tocando o rosto da menina. — Desde que desmamou já cresceu tanto, Yoongi... Em breve já não poderei mais chama-la de minha pequenina, pois deverá atingir meu tamanho com rapidez, neste ritmo. Jamais supus que fosse capaz de amar tanto alguém quanto amo esta pequenina...

Namjoon perdeu-se em admiração por sua cria, e eu fiquei o observando por uns segundos antes de me mover. Era terno e, num certo nível, desolador ver Namjoon com sua filha nascida, e com o ventre crescido, à espera do próximo. Era como se fosse tudo o que ele tinha. Como se vivesse por aquilo.

Eu talvez nunca viesse a saber as razões pelas quais estaria me pedindo para me calar, mas se o fazia, deveria ser importante para si, direta ou indiretamente. Aproximei-me dele, e lhe dei um beijo no rosto antes de me despedir.

— Não te preocupes, irmão. Agirei como se nada tivesse visto.

Não esperei que ele me respondesse, e saí do pequeno quarto improvisado. Bem perto da porta estava Jungkook, que fez uma reverência ao me avistar. Retribuí, e assim que me virei, dei de cara com o homem de cabelos vermelhos e perfume de notas inquietantes.

— Espero que aceites minha companhia, Príncipe de Daegu. – Estendeu-me o braço. — É com gosto que a ti a ofereço.

— Estou disposto a aceita-la, muito embora não acredite ser a mais acertada das decisões. — Caminhei para alinhar-me a ele, um passo apenas mais à frente. — E recolhe este braço, Conde. Não sou um ômega para que andemos desta maneira.

— Oh, sim. — Ele fez como pedi, rapidamente. — Força do hábito. Não te ofendas por ter agido como se fosses um ômega.

— Não me ofendi. Teria sido verdadeiramente ofensivo ser tomado por um alfa, daí não teria pedido de desculpas bom o bastante para me fazer sentir melhor.

Disse quase sem pensar, e ele riu. Não uma risada baixa, abafada, mas escandalosa. Olhei-o com as sobrancelhas erguidas, sem entender por que minha ofensa gratuita tinha sido tão engraçada para ele.

— Ora, não te rias de algo que não foi dito com tal intenção! — Passei a caminhar, e ele se pôs a me seguir.

— Perdão novamente, Príncipe, mas a ousadia de menosprezar um alfa em sua face é algo arriscado. — Dizia atrás de mim, sem alterações na voz. — Já lidei com ômegas inconsequentes, mas um beta de língua afiada é a primeira vez. Ser pego de surpresa às vezes me causa risos, uma reação tão ridícula quanto inevitável.

— Entendo.

Disparei, e ele então se calou. Segui andando pelo salão, cumprimentando algumas pessoas e sendo cumprimentado, com o Conde sempre em meu encalço. Rodeei toda a área, até que me senti cansado e me ajeitei numa das poltronas, após pegar um copo de espumante da bandeja de um dos serviçais. Observei o Conde fazer o mesmo, sentando-se na poltrona em meu lado.

Beberiquei do copo, e com o canto dos olhos o observei, esperando que fizesse alguma aproximação, algum movimento. Minha espera, contudo, estava dando em nada. Ele estava apenas ali, cuidando para que eu não ficasse sozinho, e tão somente isso.

Incomodado, tomei todo o espumante em uma única virada, me erguendo com rapidez.

— Ao que consta tua companhia é uma perda de tempo, e meu irmão estava muito errado em achar que eu o agradeceria por ter arranjado isto para mim.

Ia me afastar, mas tive o braço puxado, e acabei por me prostrar diante do outro.

— Aguardava que me dissesses algo, que me falasses o que pretendias fazer. Como te calaste, me limitei a te seguir. Queres que a iniciativa parta de mim, Príncipe?

Olhei para seus dedos ao redor de meu pulso, apertando-o, e talvez ele tenha captado o sinal, porque me soltou de imediato. Foquei a visão em seus olhos, então, e o tom de castanho, de fato, era belo demais quando colocado em composição com os cílios compridos e o cobre de sua cabeleira bem penteada.

— Um alfa esperando sinal para agir? — Soltei sarcasticamente.

— Não convivo muito com betas, mas vós também tendes vossas vontades, pois não? Eu já tive meu momento contigo, te puxando para dançar mais cedo. Espero agora por aquilo que desejas fazer comigo.

Ia retruca-lo, mas vi as pessoas se aproximando umas das outras, e me direcionei para o local em que elas repousavam os olhares. A Princesa de Gwacheon estava nos braços do Rei, pronta para passar pelo salão com ele, com Namjoon um passo atrás. Seria aquele o momento da despedida da aniversariante, de forma que os convidados poderiam, de vez, esquecer a razão que os unia ali e seguir suas vidas em festejo de adultos. Posicionei-me, tendo o Conde logo atrás de mim.

— A Princesa é a criança mais bonita que já vi. — Ele disse quando a Família Real passou por nós. — Se o ventre de teu irmão seguir assim abençoado, teremos a linhagem mais bela de Gwacheon. Há de ser a linhagem mais significativa também.

Anui por educação, sem imaginar que tipo de serventia tinha um comentário daquele. Meu cunhado e meu irmão fizeram todo o trajeto com Hyerin, e, no fim, a entregaram a Jungkook e mais um corpo de serviçais. Regressaram pelo mesmo caminho, e a um pedido escandaloso do Rei, a orquestra voltou a tocar, desta vez, músicas mais animadas que as anteriores. Meu cunhado então puxou meu irmão pela cintura, e os dois começaram a dançar, dando aos demais a deixa para que fizessem o mesmo.

— Se aguardas para fazer minhas vontades, Conde, eis tua chance. — Tomei-lhe a cintura, esperando que fizesse o mesmo comigo. — Dancemos.

O Conde me olhou de baixo para cima, ofertando a mim um sorriso largo, que acabou por ser definido por mim como uma espécie de marca registrada. Diferentemente do que eu esperava, não se ligou a mim pela cintura, e sim pelo ombro, como um ômega faria em relação a um alfa. Não me apeguei, contudo, a tal detalhe de seu comportamento, e me pus apenas a dançar com ele.

Não poderia precisar se meu irmão se referia a isto quando disse que eu lhe agradeceria por ter me posto em companhia do Conde, porém, eu estava valsando com um exímio bailarino, esta era a verdade. Conduzia e se deixava conduzir sem equívocos, e seus pés nunca se embaralhavam nos meus. Movia-se corretamente, conforme o ritmo da música, e nos momentos em que participávamos das quadrilhas, passava por baixo dos braços sem esbarrar em ninguém.

Permaneceu bailando comigo sem reclamar, dando a mim o momento agradável de pôr minhas habilidades em prática, até que eu me sentisse exaurido. Pedi-lhe para que parássemos, no que fui atendido sem maiores complicações. Segundos depois, estávamos sentados sobre um divã bastante bonito, um ao lado do outro, numa área menos iluminada do salão.

— Agora estamos quites, Príncipe. – Disse assim que ajeitou as roupas, cruzando as pernas. – Já tomei a iniciativa, já o fizeste igualmente. Qualquer um dos dois pode, neste momento, se manifestar, portanto, vou me pôr a te provar que minha companhia é a melhor que poderias ter em Gwacheon.

Um riso soprado me escapou dos lábios, e eu me voltei a ele, abandonando a postura real para que pudesse o encarar.

— Pois mostra-me, então, porque sinto curiosidade em saber quais as qualidades que te dão acesso direto ao Rei a qualquer tempo, e garantem a proteção do Consorte quanto a isso.

Observei seu sorriso diminuir um tanto, ao mesmo tempo em que seus olhos perscrutavam os arredores, num movimento discreto. Tinha prometido ao meu irmão não mais tocar no assunto, e eu de fato pretendia me calar, porém, para pessoas ácidas, tal qual meu caso, perder a chance de provocar era como deixar de respirar, e quando dei por mim, a frase já tinha escapulido.

— Não vais deixar tal assunto morrer, suponho.

— Em algum momento deixarei. Até lá, terás que aturar vez em quando algum sarcasmo banhado no tema, porque é de minha natureza agir assim.

— Por certo... – Suspirou, me fitando. – Que achas de um passeio pelos arredores do palácio, Príncipe?

— Onde ninguém poderá escutar minhas intempéries?

— Gosto de tua perspicácia.

— Gosto que o confesses. – Ergui-me, tomando posição à sua frente. – Estive a explorar a flora do Palácio ontem a noite, mas vi muito pouco, posto estar escuro e não ser daqui. Como nobre de Gwacheon com vasto conhecimento da residência real, creio que saberás me dar melhor proveito do tempo noturno neste sentido. Estou correto?

— Corretíssimo, Príncipe. – Direcionou a mão para mim. – Aceitas o apoio de meu braço, mesmo tu não sendo ômega?

— Não te basta andar lado a lado?

— Deverá bastar, claro que sim. – Sorriu, pondo a mão para trás. – Tens interesse em botânica, por algum acaso?

O Conde perguntou tomando seus passos, e eu me pus ao seu lado, concordando.

— Pois teremos um agradável fim de baile juntos, Príncipe. A mim também interessam as formas e os perfumes das plantas. Fui estudante de botânica, a propósito. Não concluí os estudos porque outros interesses se sobrepuseram às minhas vontades, mas ainda haverei de retomá-los um dia. A ti já agradou algum estudo mais aprofundado?

Saímos do palácio, momento em que o homem recebeu reverências dos guardas e pegou uma das lamparinas.

— Com exceção dos estudos dados aos possíveis herdeiros de um trono, nada me chamou tanta atenção ao ponto de me levar ao aprofundamento, exceto pela filosofia e um pouco de História. Contudo, tenho admiração por botânica, muito mais pela estética que pelos conceitos.

— Ora, a filosofia! – Ele exclamou entusiasmado. — Tenho cá meus mestres preferidos, não muito populares em nossas paragens, infelizmente. Trariam frescor às crenças arcaicas de nosso povo... Conheces a eles, ou te limitas aos filósofos de nossa linhagem?

— Conheço a todos, e a poucos admiro, para ser honesto. Na maior parte não parecem pensar em conformes lógicos, e por isto não me prendem. Porém, os de minha grande admiração me tem quase como devoto de seus princípios.

— Desde que seja quase devoção, não há problema algum, meu caro. O perigo está em encarar com religiosidade inquestionável aquilo em que se acredita. O absolutismo cega. A superioridade deve ser vista como método de organização, e não de opressão. Reis, rainhas, vassalos, alfas, ômegas, betas... Tantas regras e tanta mesquinhez em suas composições! Os fins acabam esquecidos e passa-se a viver pelos meios, não poucas vezes tortuosos.

Encarei-o, não muito certo se tinha captado o que quisera dizer. Esperava que me olhasse de volta, explicasse mais sobre seu ponto, mas ele seguiu andando, com a lamparina à frente de nós. Emendou nesta colocação um assunto aleatório e depois outro, e então mais outro, enquanto me mostrava flores e arbustos que a luminosidade da lamparina nem sempre conseguia expor por completo.

Quando o primeiro dia de festa acabou e nos despedimos, a curiosidade sobre o que o Conde fazia com o Rei na madrugada tinha sido substituída pelo desejo de poder voltar a conversar com ele, e confesso que isto me deixou surpreso e até mesmo aborrecido. Em que momento da noite a possibilidade de ele ferir a honra de meu irmão tinha se tornado irrisória ao ponto de eu demonstrar interesse em outros aspectos do Conde?

Foi a dúvida que eu levei para o sono.

**********

E foi isso! A quem chegou aqui, muito obrigada e até o próximo! ;**

Continue Reading

You'll Also Like

628K 52K 68
Lilly Miller é uma jovem bailarina que é dada em troca de uma dívida de seu pai aos irmãos Fox, que controlam e manipulam todos os seus passos e açõe...
3.4K 354 10
Aos trinta e dois anos, Namjoon conquistou exatamente o que queria desde criança, mas algo o impede de se sentir feliz. Seokjin, aos trinta e cinco a...
956K 41.2K 114
Olivia Maybank é uma adolescente de 17 anos, tudo que ela tem é o irmão gêmeo e os amigos. Seu maior desejo é se tornar independente, conseguir fugir...
Obsession By viih

Fanfiction

4.1M 215K 86
"Você é minha querendo ou não, Alles!!" ⚠️VAI CONTER NESSA HISTÓRIA ⚠️ •Drogas ilícitas; •Abuso sexual; •Agressões físicas e verbais; •Palavras de ba...