Iara
A fila já estava grande, e só era 4 da manhã.
Tinha umas 15 pessoas na nossa frente pra entrar pra aquele presídio, todas mulheres, impressionante...
Enfim, o sol estava começando a nascer quando a fila já estava quase dobrando o quarteirão.
Já vi algumas coisas na minha vida mas numa fila de presídio nunca havia visto uma visitante organizar a fila.
— É mulher de um cara da facção do Felipe — Alexandra susurrou pra mim enquanto eu olhava pra a mulher, ela era negra e com um corpo lindo, as tranças vermelhas chegavam na bunda cheias de ligas — ela sempre faz isso, desde que o Felipe foi preso da última vez ela fazia isso.
— Porque? — tinha que ter um motivo, ela não iria fazer isso atoa.
— É líder de alguma coisa da facção, pelo o que soube na época ela ajudava muitas mulheres com filhos quando ficavam sozinhas sem os maridos. Tem umas ONGs aí, instituições de caridade e tudo — faço uma cara de impressionada.
Ela se aproxima de mim e da Alexandra e a reconhece porque na cara fechada que ela carregava se abre um sorriso.
— Dona Alexandra? Quanto tempo não vejo a senhora, soube do Cobra — ela diz cumprimentando com dois beijos no rosto.
— Pois é minha filha, só hoje consegui vir ver ele — ela balança a cabeça e me olha — essa é minha nora — olho sem graça pra dona Alexandra e depois pra a mulher que me encarou com as sobrancelhas levantadas.
— Nora? Fiel do Cobra?
— Sim — Alexandra comenta e eu molho os lábios sem saber como explicar pra ela.
— Sou a Iara — estendo a mão e ela aperta a minha.
— Eai Iara, sou a Cristina — balnco a cabeça — não sabia que tinha gente nova na área do Cobra, bom saber, sou mulher do Kleber — balanço a cabeça — não conhece né? — ela ri.
— Na verdade a Iara é nova com tudo isso Cristina — Alexandra diz.
— Ela tem que se adequar — ela me olha de novo — não é só vir aqui dizer visitinha, tem que passar a imagem do porque um cara como o Cobra te escolheu — franzo o cenho — se alguém não te conhecer tu pode se meter em enrascada.
— Como assim? — pergunto sem entender e ela olha pro lados.
— Você sabe que estando com esse título nas tuas costas tu fica visada né? — ela balança a cabeça confirmando — polícia, rivais... todos fica de olho — engulo em seco.
— É... Cristina, não assusta minha menina — Alexandra diz e ela ri — ainda é cedo, com um tempo as coisas vão se encaixando.
— Só to avisando pra deixar ela ligada — ela me olha — Espero que o chefe já saiba da tua existência, e se tiver disposta a entrar nisso tudo tem que saber que se desistir no meio do caminho não pode vacilar e virar x9.
— Ela não vai — Alexandra diz entrando no meio de nós duas, eu ainda olhava pros olhos ameaçadores da Cristina — Iara não é qualquer uma Cristina, ela tem coisa serio com meu filho.
— Seu filho pode arranjar quem quiser dona Alexandra, jamais julgaria isso, tô falando que se quer entrar, mesmo não sendo envolvida ela vai ter que seguir as regras.
— Fica tranquila — digo e ela me olha — não dou pra trás quando resolvo algo — digo firme e a verdade. Isso foi pensado por muito tempo, ainda estou com medo sim do que vou enfrentar antes de entrar lá dentro mas eu não sou arregar de nada que eu decidi.
Ela me encara e depois balança a cabeça.
— Beleza, senti verdade em tu Iara, fé pra vocês — ela se afasta e comprimenta a pessoa atrás da gente.
— O que foi isso? — perguntei pra Alexandra baixo e ela suspirou.
— Ô Iara, existem obrigações que as pessoas exigem que façam. Não sei muito bem te dizer sobre isso.
Fico calada, estava cheias de dúvidas mas sei quem tiraria, Felipe.
Quando finalmente entramos dentro daquele presídio pediram todos os meus documentos, a mulher me olhava e depois pra minha identidade querendo saber cada detalhe do meu rosto pra ver se a identidade era verdade.
Após isso verificaram a comida dentro da caixa que eu e Alexandra carregava. Foi horrível eles abrem todos os sacos, furam as coisas com as facas, mexem os sacos e apertam isso tudo pra sentir algo. Cheiram e olham tudo, mas isso tudo é fichinha pra o que acontece agora.
Revista íntima.
— Tira a roupa — a mulher logo disse quando entrei na sala fechada, ela estava sentada numa cadeira e só tinha eu e ela.
Fiz onque ela me mandou e fiquei completamente nua me tampando com as mãos o máximo que eu conseguia.
— Fica em cima do espelho — ela manda outra vez.
No chão tinha um espelho e eu abri as pernas.
— Agaicha — ela diz se levantando da cadeira e vindo até eu, quando eu fiz ela olhou pro espelho — agora tosse — eu fiz com ela olhando tudo o que acontecia com a minha intimidade totalmente aberta dando a visão refletida pra ela no espelho — levanta.
Fico de pé novamente e ela me encara. Analisa meu corpo inteiro, desde os meus seios, meu rosto e até entre os meus dedos do pé.
Ela ainda pediu pra que eu sacudisse o cabelo de cabeça pra baixo tudo pra ver se eu escondia algo.
— Pode se vestir — ela mandou grossa e eu me vesti novamente, estava com uma legguin preta e uma blusa rosa maior, de chinelo já que aquitinha um padrão de como entrar.
Quando ela me liberou eu passei por outra pessoa conferindo meus documentos e encontrei Alexandra com a caixa de papelão parada do lado dela. Havia 5 pessoas na minha frente pra passar pro lado de lá. Minha revista íntima deve ter demorado.
Ela saiu pela grade verde que era o pátio e logo andou até um ligar que que não conseguia mais ver. Fico aguardando a minha vez, ansiosa por ver o Felipe a poucos minutos, me sentindo mal por ter sido revistada até o ânus.
— Próxima — o cara gritou e eu andei até ele — documento — entreguei minha identidade e minha carteirinha de visitante, ele olhou a documentação e me olhou e depois me entregou — passa — ele abriur a grade e eu passei olhando um pátio cheio de gente.
Muitos homens de beje, andando por ali. Olhei pra todos os lados procurando quem me interessava, nem a dona Alexandra eu estava achando, estavam todos iguais.
Andei até o sol bater mais na minha pele e chegar mais próxima do pátio, olhando em volta e foi aí que vi. Alexandra estava de costas sentada na mesa e o Felipe na frente dela.
Foi tudo rápido, ele me olhou quando o achei e se levantou do banco. Corri até ele querendo abraçá-lo mas fui parada por um carcereiro.
— SEM CORRER! — ele gritou entrando na minha frente que me assustou.
— Desculpe — falei com o homem me olhando mal encarado.
— Iara — Felipe me chamou se aproximando e eu o olhei.
Fui até ele dessa vez sem correr mais ainda andando rápido e pulei em cima dele passando as pernas na cintura dele, ele passou os braços na minha cintura encostando o queixo no meu ombro e eu o apertei.
— Meu amor — segurei no rosto dele e o beijei.
— Que saudade de você, puta que pariu — ele disse sussurrando nos meus lábios.
— Sem contato físico — outro carcereiro fala parando do nosso lado e eu o olho soltando minhas pernas do Felipe.
— Tá caralho — Felipe murmura me puxando pra longe — Mandei não vir — ele fala segurando minha cintura andando na frente dele e eu sorri pequeno.
— Você não manda em mim — ele morde o lábio inferior sorrindo e me beija.
Senti a língua dele quente entrando na minha boca, a que eu senti falta demais nesses três meses, do toque, do cheiro dele.
Meu Deus, eu tava morrendo de saudade dele.
— Sem contato, já falei — o cara fala de novo e eu separo o beijo nos deixando ofegantes.
— Bando de urubus chatos — sorri pequeno quando ele murmura novamente e me afasto pra evitar outra reclamação.
Olho pro lado com a Alexandra sorrindo grande olhando pra gente. Me aproximo da mesa de concreto me sentando em um banquinho e o Felipe sentando do meu lado.
— Tô atrapalhando? — Alexandra diz e eu balanço a cabeça.
— Claro que não — digo e ela rir.
— Vocês duas são teimosas demais, mandei ficarem quieta em Vidigal.
— Chega desse papo — Alexandra diz e empurrando a caixa — trouxe seus mimos aí.
— Tem até chocolate — Falei fazendo carinho na nuca dele e ele sorriu.
— Vocês duas em — Ele abre a caixa lacrada e começa a mexer no que tem dentro — ainda bem, tava sem tudo isso.
— Imaginei, da última vez você me disse que tava difícil até sua higiene — Alexandra falou e ele balançou a cabeça.
— Mó saudade de você duas — ele passou o braço pelo meu pescoço e olhou pra a mãe dele.
— O meu filho, todo dia é uma preocupação diferente com você aqui dentro — a Alexandra fica com os olhos marejados e o Felipe se levanta e vai se sentir do lado dela.
— Mãe, já disse que tô de boa, sei me cuidar, não corro risco aqui dentro, tô protegido — apoio o queixo na minha mão e o observo abraçar a mãe e beijar o topo da cabeça dela e ela deitar a cabeça no peito dele — também fico procurando, com vocês lá fora, com aquelas pau no cu rondando vidigal, como tá por lá?
— Na mesma, uma droga — Alexandra diz levantando a cabeça.
— Prometo que vai tudo voltar como era antes — ele diz e me olha — vão tudo pagar esses bando de otarios por te divulgado vídeo do teu corpo — ele olha pra mãe dele — e por ter feito a senhora ser esculachada. Filhos da puta.
Além deu ser humilhadas por eles e assediada a Alexandra era chamada de várias coisas também, não sei como mas descobriram que ela foi prostituta, isso virou piada entre eles e motivo pra fazerem comentários totalmente agressivos.
Felipe tem olhos em todo lugar, nada disso eu disse pra ele e nem Alexandra, ele só me perguntou se eu estava bem depois disso e quando perguntei como ele soube disso ele falou que tinha gente dele em todo lugar.
— Isso é o de menos, o que me dói é ver aquelas crianças sendo ameaçadas e impedidas de ao menos brincar na rua, com as mãe morrendo de medo de serem mortos por que os policiais acham que são bandidos — Alexandra diz e eu vejo Felipe precisonar o maxilar.
Sua barba estava grande, ele também parecia bem mais magro.
— Desgraçados, pega o morro pra deixar virar um buraco — ele diz com ódio.
É nítido o carinho que ele tem por aquele lugar. Alexandra me disse que ele nasceu lá, o irmão infelizmente foi morto lá.
E ele também já me disse que é quase como uma promessa fazer daquele morro enquanto ele viver um lugar melhor pra se viver.
— Que foi que tu ficou quieta? — Felipe me perguntou me olhando e a Alexandra me olhou também.
— Nada — na verdade eu estava pensativa, sobre ele, sobre nós dois.
— Ela ficou assim depois que a Cristina parou a gente — Ele levanta uma sobrancelha e me olha.
— Te botou medo? Porque ela coloca até em mim — sorriu olhando pra ele quando sorriu também.
— Bobo, não fiquei com medo, achei foi estranho.
— Ela foi bem estranha mesmo — Alexandra diz — disse que a Iara tinha que seguir umas regras.
— Ah... — Felipe me olhou e deu de ombros — Não é nada demais, depois eu mando ela baixar a bola, só deve estar desconfiada, nunca vieram me visitar a não ser a Hellen.
— Desconfiada do que? — perguntei.
— Sei lá minha linda, não importa ela só quis te dar uma amedrontada mas relaxa que ninguém mexe com tu não.
— Isso não me desceu, você vai ter que me explicar essa história direitinho — disse encarando ele — e ela tava bem desconfiada viu, porque até foi meio rude.
— É o jeito dela.
— Vocês dois estão se vendo hoje, depois de 3 meses e tão discutindo? — Alexandra rir negando com a cabeça e se levantando.
— Vai aonde? — Felipe perguntou e ela o olhou.
— Eu vou deixar vocês conversarem, sei que tem muito pra falar.
— Não Alexandra, que isso você não vai fazer isso não — eu disse.
— Eu só queria abraçar ele e ver se tava tudo bem Iara — ela abraçou o Felipe de novo — mas eu sei que vocês tem que ter um papo, eu estou lá fora te esperando, quando for sair relaxa nas revistas, vou estar no carro — balanço a cabeça e ela olha pro filho — eu te amo, vê se se cuida pelo amor de Deus, não entra em briga, e nem provoca esses caras pra não ir pra solitária Felipe — ele sorri pequeno a encarando.
— Sim senhora — eles dois se abraçam de novo — também te amo demais, obrigado pela caixa.
— Sinto sua falta meu filho — Alexandra pega no rosto dele — quero tanto que você seja feliz meu bem.
— Ô mãe, se preocupa comigo não, tá tudo sobre controle — ela balança a cabeça e ele limpa as lágrimas que tinham caído — Vai com Deus.
— Fiquei com ele meu bem — eles dois se separam e ela olha pra mim e pisca — te espero lá fora — confirmo com a cabeça e ela se vira depois de olhar mais alguns segundos o Felipe.
— Fico com tanta dor no peito ver ela assim — falei o vendo se sentar do meu lado — não queria que ela fosse embora, ela sentiu muito a sua falta.
— Ela nunca foi de ficar muito tempo, sempre deixou claro que me odeia ver assim — olho pra ele — esse uniforme ela disse que dá pesadelos nela, não é a primeira vez que ela foge com uma desculpa esfarrapada — olho pra ele com pesar — também me dói ver ela assim, por isso muitas vezes prefiro que não venha, evitar isso porque não compensa.
— Tudo compensa quando se ama alguém Felipe — ele me encara e se aproxima de mim passando o braço nos meus ombros.
— Tudo é muita coisa, o que é tudo pra você?
— Eu ainda estou entendendo meus limites — encosto minha cabeça no ombro dele e seguro a mãos dele em seu colo cruzando nossos dedos — disse que nunca viria a um lugar assim e por você eu vim e viria mais vezes.
— Eu não mereço você — ele diz e eu o olho — isso aqui não é qualquer uma que faz não Iara, não ia te julgar se tu caísse fora, mas admiro tu por ter feito isso.
— Você não me merece mesmo, sou muito areia pro teu caminhãozinho — ele gargalha.
— Senti saudade dessa tua personalidade, desse teu jeito espontâneo e incrível de ser que me fez se apaixonar por você desde o primeiro dia — ele acariciou meu rosto com a mão que estava apoiada no meu ombro — Eu te amo.
ELE FALOU, ELE FALOU.
Eu ia dizer, só estava esperando um momento certo em que eu pudesse colocar as três palavrinhas, mas ele falou primeiro.
Sorri o olhando sorrir também.
— Não é o melhor lugar pra isso, mas prometo te dar muito mais que um eu te amo dentro desse lugar.
— Isso não importa Felipe, nós não somos perfeitos, tivemos muitos erros, mas chegamos até aqui e se agora estamos conseguindo dizer o que sentimos foi com nossa coragem de enfrentar uma relação de novo — ele me encara atentamente — achei que conhecia esse sentimento mas você me mostrou que eu estava errada e me mostrou o que é o amor — me aproximei da sua boca — amo você.
Eu sempre quis um amor de princesa da Disney, aquela que a gente se apaixona junto. Mas a verdade é que aquilo é idealizado de uma forma cruel.
Não existe homem perfeito, nem mulher perfeita, existem pessoas com defeitos e qualidades.
Amor é construção, tem respeito, admiração e carinho por aquela pessoa.
Eu não admiro o Felipe por ele ser bandido, admiro ele por lutar pelas suas causas por mais erradas que sejam sua justiça, admiro o respeito pela sua mãe, admiro até a forma como ele sempre respeitou o sentimento que ele tinha pela Allana.
Seus defeitos eu sei lidar, não vão me afetar, por mais que sejamos um mais cabeça dura que o outro de alguma forma isso deu certo.