The feelings got lost in my lungs
They're burning, I'd rather be numb
And there's no one else to blame
Demi Lovato - Heart Attack
Katherine
Bahrein
Eu desejei que tudo que eu vivi no início da manhã de ontem tivesse sido um pesadelo...mas não foi. Não consegui tirar da cabeça o momento que nossos olhares se cruzaram. Foi como se todas as memórias de 2012 tivessem sido resetadas na minha mente. Mas não, não foram somente as boas memórias.
Quando sai do elevador, me senti completamente sem rumo. Ao invés de ir tomar café, preferi sair para fora do hotel para respirar o ar puro de um dia de forte sol que já estava brilhando no céu.
Eu não podia ir até o hotel de Louise, que ficava próximo ao meu e aparecer lá pedindo um abraço reconfortante pois ela não sabia da minha história com Charles, então decidi correr em um parque que ficava a menos de 200m do hotel que eu estava hospedada.
Quando me dei conta, tinha corrido quase 10km e na volta, parei em um supermercado para comprar algo para comer de café da manhã pelos próximos dias, pois apesar da minha vontade ser de ir embora, eu não podia fazer isso e deixar a minha melhor amiga sem um motivo plausível, então foi mais fácil optar por fazer a refeição mais importante do dia no quarto.
Aproveitei o resto do dia para estudar e confesso que foi em vão. Li e reli os mesmos artigos por várias vezes, mas era como se a todo o momento minha memória se recordasse da cena do elevador.
🏎️
- Eu ainda não entendi por que você não quis sair para jantar ontem - Disse Louise enquanto caminhávamos rumo a entrada do paddock - Eu tive o trabalho de ir até o seu hotel e você preferiu ficar lendo artigo?
- Eu disse que iria aproveitar a quinta-feira para estudar - Respondi - E eu pedi algo do restaurante do hotel depois que você foi embora.
- Você sabe que a maioria dos pilotos estão hospedados no mesmo hotel que você, não sabe?- Disse rindo - Cuidado pra não trombar com nenhum, especificamente um conterrâneo.
- Não entendi - Me fiz de desentendida, pois é claro que sei de quem ela está falando e mal ela sabe que já nos encontramos no elevador.
- Charles Leclerc! Encontrei ele ontem no elevador e falei que estava indo visitar uma amiga e até o seu nome ele quis saber - Ela deu de ombros - Mas eu disse que você não se apaixona por caras babacas igual a ele.
- Não sabia que vocês eram amigos - Respondi na intenção de mudar o rumo da conversa.
- Ele acha que é meu amigo só por que...- Ela me olhou com um sorriso sem graça. Aparentemente ela falou mais do que deveria e do que eu sabia.
- Nos encontramos para almoçar que horas? - Decidi não questiona-la, pois se ela não me contou, é porque provavelmente foi algo irrelevante...ou não.
- Eu te mando mensagem avisado - Disse enquanto entrávamos no paddock - Bem vinda ao meu trabalho.
- Amiga, eu me sinto em casa - Dei risada - Nas corridas de Mônaco o meu pai sempre ganhava paddock pass dos ricos da marina que ele trabalhava.
- Então você já sabe como é - Ela disse apontando para frente - Ali fica os hospitality das equipes. Geralmente os que tem mais gente na frente são os da ferrari/mercedes/rbr.
- Ok - Respondi.
- O ruim das corridas aqui no Bahrein é que não tem muita gente famosa transitando - Disse revirando os olhos - Mas de vez em quando os pilotos passam por aqui.
- Gosto muito do Lewis - Respondi - Talvez seja o único que eu ouse pedir uma foto.
- Ele não nega uma foto nem para um cachorro - Disse Louise se despedindo - Alguém tem que trabalhar né...nos vemos depois.
- Que pena que hoje a escolhida para trabalhar foi você e não eu - Falei em tom de deboche enquanto Louise se afastava indo em direção a área que os jornalistas ficavam.
Eu amo assistir corridas em casa, mas estar aqui dentro do paddock é completamente diferente. Me lembro de uma corrida lá em Mônaco, na qual meu pai comprou uma câmera digital para levar ao paddock para tirar foto com os pilotos favoritos dele naquela época. Ele tirou uma foto minha com o Lewis Hamilton, que tinha ganhado o seu primeiro título mundial no ano anterior. Tenho essa foto até hoje, pois ele fez questão revela-la no dia seguinte e colocar em uma porta retrato da sala de casa.
Após a morte da minha mãe, meu pai, a princípio, parou completamente de acompanhar fórmula 1, pois na cabeça dele, isso automaticamente o lembraria de como era incrível morar em Monte Carlo. Ele nasceu lá e herdou o trabalho do meu avô, que também trabalhava na principal marina do principado. Isso tudo tornou a nossa mudança para Paris para a casa da minha tia mais dolorosa ainda, pois na capital francesa não tem praia e meu pai teve que começar uma nova profissão aos 45 anos.
Já passava das 12:00 quando Louise me enviou uma mensagem pedindo milhares de desculpas dizendo não conseguiria almoçar comigo, pois a sua amável chefe quis realizar uma reunião justamente no horário de almoço. Respondi dizendo que entendia o motivo e que nos encontraríamos após o fim do tl2.
Decidi comer um lanche qualquer na lanchonete do próprio paddock e aproveitei que tinha levado meu ipad mini para tentar terminar de ler o tal artigo importante que eu tinha começado ontem. De repente, bem próximo a mesa que eu esteva, uma moça que aparentava ter a minha idade e estava grávida caiu. Ela tentou se apoiar em algo mas foi em vão, fazendo que com que ela caísse com o corpo para frente e consecutivamente com a barriga batendo com força no chão. Não pensei duas vezes antes de largar as coisas que estavam sobre a mesa e ir em direção a ela, que continuava com a barriga para baixo.
- Me diz que você é médica e que meu bebe vai ficar bem - Ela disse enquanto eu a ajudava a apoiar as costas no chão - Eu não posso perder meu filho.
- Sou médica e preciso que você fique calma - Falei olhando para as pessoas que já estavam ao nosso redor e só conseguia perceber que elas estavam com celulares ao invés de ao menos tentar ajudar - Você está de quantos meses? Parece que já está prestes a ganhar.
- 8 - Ela respondeu - A minha barriga está doendo muito - Disse em meio a suspiros - Ele estava programado para o mês que vem.
- Confia em mim, você não vai perde-lo - Tentei acalma-la enquanto colocava a minha mão na sua barriga. Ela estava de vestido e reparei o que eu rezei para que não acontecesse. Ela estava tendo sangramento. Ela não conseguia ver pois estava deitada, mas uma criança que estava próximo falou "olha, esta saindo sangue dela".
- O que? Eu estou tendo um sangramento? - Ela tentou se levantar mas eu neguei com a cabeça a ajudando a deitar novamente - Eu vou perder meu filho, você está mentindo para mim.
- Não estou! - Respondi - A sua queda foi feia mas senti ele se mexer quando estava com a mão na sua barriga e isso é um bom sinal - Tentei acalma-la mais uma vez - Eu só quero saber aonde está essa ambulância que não chega - Aumentei o tom de voz e alguém gritou que a mesma já havia sido chamada - Como é o seu nome?
- Mariah - Ela respondeu - Eu sabia que não era uma boa ideia ter vindo - As lágrimas já escorriam pelo rosto dela.
- Mariah, eu me chamo Katherine! Sou médica e quase obstetra - Dei um sorriso amarelo e quando ia falar outra coisa na intenção de tentar distrai-la, ela gritou de dor. Com o tempo de gravidez que ela está e depois da queda que levou, não são mais contrações de treinamento e sim contrações reais.
- Eu não estou aguentando de dor - Ela apertou a minha mão - Me leva para o hospital, por favor.
Apesar de estar grávida, é notório que a barriga dela é somente por causa do bebe. A ambulância não chegava até nós e apesar de ter sentido o bebe mexer, sei que o estado dela pode estar se tornando grave devido ao sangramento e as contrações. Uma vez um professor da faculdade me falou que um médico não pode fazer tudo sozinho, mas que se ele começar fazendo a parte dele sem se acomodar e esperar pelo outro, já está de bom tamanho.
- Vamos - Falei enquanto a pegava no colo e sim, constatei que o peso dela era somente devido a barriga. Ela deve ter 1,60m de altura então não tive muita dificuldade ao tira-la do chão. O que me chocou foi que ninguém que estava próximo sequer perguntou se eu queria ajuda ou algo do tipo. Quando estava quase saindo da multidão os socorristas se aproximaram e com a ajuda deles, a coloquei na maca.
Expliquei rapidamente o que havia acontecido e antes que eles fossem, falei rapidamente com ela.
- Vai ficar tudo bem.
- Eu devo isso a você - Disse Mariah antes de entrar na ambulância.
A blusa branca que eu estava vestida ficou suja de sangue e no momento a única coisa que eu queria é voltar para o hotel e tentar de alguma forma ter notícias do bebê. Mas como eu teria notícias se a única coisa que eu sei é que ela se chama Mariah e provavelmente está grávida de um menino? Aliás, me impressionou uma moça com 8 meses de gravidez estar em um lugar como esse e sozinha.
🏎️
- Todo mundo esta falando de você - Disse Louise se aproximando de mim. Eu permaneci na lanchonete depois de todo o acontecido. Com a diferença de que todo mundo que entrava no local olhava para o celular e para a minha cara - Você tem noção que você ajudou Mariah Rossi, esposa de um dos chefões da FIA?
- Não? - Respondi.
- Pois bem, ela é esposa dele e está esperando o primeiro filho dos dois, ele tem 60 anos e ela 24 - Louise falou enquanto observava a minha blusa suja de sangue - E pelo jeito a queda foi feia hein.
- Foi bem feia - Falei enquanto me levantava - Só quero ir embora.
- Não duvido nada ele te oferecer uma recompensa por ter ajudado o troféu dele a não perder o filho .
- Troféu? - Questionei - Não entendi.
- Ela era repórter de uma tv italiana e sempre foi oferecida - Disse Louise revirando os olhos - Nenhum repórter aqui do paddock gostava dela e então o besta caiu do papo dela...se casaram com menos de 5 meses de namoro...e agora ela está prestes a ter um filho dele.
- Eu a ajudaria de qualquer forma, Louise - Respondi - E nem se ele me oferecesse dinheiro eu aceitaria. Ser médica é o meu trabalho, foi essa profissão que escolhi para a minha vida. Agora será que podemos ir? - Falei enquanto recolhia minhas coisas da mesa.
- Prometo não encher a sua paciência até voltarmos para Paris - Disse Louise enquanto caminhávamos rumo ao estacionamento - Você passou o dia todo sozinha e até salvou duas vidas.
- Besta - Respondi - Mas espero que amanhã possamos ficar mais tempo juntas.
- Com certeza - Ela riu - Puts, esqueci meu crachá.
- Diz que é mentira, por favor - Falei revirando os olhos.
- Deixei na área dos jornalistas, tenho certeza - Ela disse se afastando antes que eu pudesse falar algo - Em 4 minutos eu volto.
É provável que ela só não esqueça o microfone porque sabe que sem ele seria impossível alguém ouvir o que ela fala.
Segui a minha caminhada rumo a saída do paddock e aproveitei para olhar meu celular. Meu pai havia me ligado 10x, fora ligações dos meus amigos e as mensagens no wpp. Todos com as mesmas perguntas: " é você nessa foto? "você sabe que o mundo inteiro sabe quem é Katherine Fontainneles?" Balancei a cabeça negativamente e não percebi quando esbarrei em alguém e isso fez com que meu celular caísse no chão. Se a pessoa não tivesse segurado na minha cintura, seria a minha vez de cair com tudo.
- Desculpa, eu não te...- Não era possível. Aqueles olhos verdes de novo. Mas dessa vez, com um olhar preocupado.
- Kathê - Disse Charles olhando nos meus olhos - Eu não te vi, desculpa - Ele permaneceu imóvel e apenas me observando.
Só ele me chamava dessa forma. Eu nunca fui muito fã de apelidos, mas todos em Monte Carlo me conheciam como Kathy, e então um dia ele me disse que me chamaria de uma forma diferente e passou a me chamar de "Kathê"..
- Eu rezei tanto para ter a chance de cruzar com você - Disse ele enquanto se abaixava para pegar meu celular, que por um milagre, estava intacto - Se tiver quebrado eu compro outro.
- Mesmo se tivesse quebrado não precisaria se preocupar - Respondi séria mas pensando no que ele acabara de dizer - Tenho que ir - Falei tentando me desvencilhar dele, mas senti seu braço tocar no meu - Charles, não!
- Vamos conversar - Ele disse soltando meu braço - Por favor! Você tem o direito de achar o que quiser de mim e eu te dou total razão, mas por favor, deixa eu reconhecer que fui um babaca com você.
- Já reconheceu - Respondi e dei um sorriso debochado.
- Muita coisa mudou nesses 10 anos, mas eu quero te mostrar que algumas coisas continuam iguais - Ele insistiu - Eu prometo que não te procuro nunca mais! Só uma conversa, por favor.
Minha terapeuta sempre disse que eu sou uma pessoa completamente racional em relação as minhas emoções. Eu nunca comentei com ela a respeito de Charles, mas em uma consulta em específico, me recordo de falar que tinha um sentimento por uma pessoa, mas que não sabia explicar como esse sentimento estava desenvolvido dentro do meu coração. Ela falou que eu deveria tentar entender esse sentimento. Talvez tenha chegado a hora.
- Você continua o mesmo insistente - Respondi - Meu quarto é o 1516 e o andar acho que você já sabe.
- Vou passar lá assim que sair daqui - Ele deu um sorriso tímido mas eu permaneci séria - Obrigada por aceitar me ouvir.
- Sei que se eu continuar dizendo não, você vai continuar dizendo sim e uma hora eu vou ceder - Respondi.
- Algumas coisas nunca mudam - Disse Charles.
- Eu espero que tudo tenha mudado - Respondi me afastando...
🏁
Adiantei o capítulo domingo hehe!
Se tudo der certo, posto outro no máximo na quarta-feira. Voltei a programação normal da minha vida e agora vai sobrar tempo para escrever mais 🤏🏽
Só quero saber até quando essa pose de durona da Kathê vai durar haha porque o Charles já deu pistas de que ainda tem sentimentos por ela 🤧
beijos&beijos
take care ✨❤️