Tudo estava destruído, o fogo tomava conta de todas as plantações. As grandes casas desmoronavam nas fazendas. O campo onde havia o túmulo de uma pequena garotinha, estava completamente queimado. As flores que cresceram ali, já eram apenas memórias, nas mentes de quem estava refugiado muito longe dali, a fumaça e as cinzas estavam por todos os lugares.
Os animais da floresta e dos campos corriam desesperados do fogo, muitos morriam no processo. O caos se alastrava como uma terrível doença. Tudo estava abandonado, muitos cadáveres estavam pelo chão da rua principal. Alguns queimados, outros foram assassinados.
O pequeno garoto estava desmaiado no meio do bosque, tudo pegava fogo e estava cada vez mais perto de acabar com a sua vida. Poucos plebeus se arrastavam nas ruas, mal conseguiam andar por causa intoxicação pela fumaça, que fritava seus pulmões por dentro. Uma morte lenta e dolorosa para todos que estavam nas ruas.
A tenebrosa morte estava ali por todo aquele reino. Muitos haviam morrido, aqueles que decidiram ficar estavam desprotegidos, reféns daqueles que invadiram suas terras.
A carruagem de Oukari e Homaru andava pelo centro da capital de Lantreneje. Os cavalos tinham dificuldades para caminhar no solo quente, quase não havia caminho para passar, tinham que passar pelos corpos do chão.
A pobre rainha estava paralisada vendo toda a cena lamentável da capital. Não saia nenhuma palavra da sua boca, além de gemidos de dor e choro. A cena era terrível, Lantreneje já era. Nada restou além de fogo, cinzas e sangue.
Homaru ficou em silêncio, vendo todos os corpos, algumas pessoas foram enforcadas e penduradas nas janelas, para quem quer que fosse, que passasse por ali, visse. Entre essas pessoas havia todo tipo de gente, não importava nem mesmo a idade, ou meses de vida.
O cocheiro evitava olhar ao redor, apenas olhava para frente, atormentado. A cena era lamentável não importava para onde você olhasse. Os animais que viviam nos bosques, comiam a carne daqueles que ainda estavam vivos no chão. Os gemidos de dor e agonia ecoavam por todos os lugares, sussurros de pessoas pedindo ajuda, e qualquer tipo de lamentação estava presente ali.
Oukari mal suportava olhar para fora, o cheiro de morte era terrível, impregnava facilmente nas roupas das pessoas. Ficar na carruagem quente e abafada era terrifico, mas ela ainda estava aguentando tudo isso. Porque ainda estava dopada do remédio, o que ainda mantinha Oukari firme, era o apoio de Homaru e o desejo incontrolável de ver o seu filho adotivo.
O guarda que andava atrás da carruagem segurava a vontade de vomitar, o estômago embrulhava só de olhar o sangue na parede e nas casas. Um idoso no chão, agarrou a pena dele, implorando por ajuda.
Plebeu_Vo-você... Por favor... Ajuda... Ajuda... - Lamentou.
O guarda olhou para seu colega, que retirava a espada da bainha. Eles não sabiam quem era aquela pessoa, mas aquele idoso... Oukari conhecia.
Guarda_O que vai fazer?
Guarda_Ele está sofrendo, não podemos fazer nada... - Cravou no pescoço do senhorzinho.
Homaru_Desgraçados... Acabaram com tudo... Com tudo... - Lamentou e virou o rosto após ver um grupo de guardas amarrados e pendurados nos galhos das árvores.
Eles finalmente estavam saindo da capital e se aproximando das muralhas.
Oukari_.... - Oukari fungou e estremeceu.
Homaru percebeu seu sofrimento silencioso, e a puxou para perto.
Homaru_Você não deveria ver essa cena...
Oukari_O remédio está passando... Meu peito doí de ver essa cena. Não importa o quão dopada eu esteja...
Homaru_Acho que você deveria tomar a última pílula, não quero que você se lembre de mais detalhes terríveis, desse dia.
Oukari pegou o frasco do bolso de Homaru e tomou a última pílula.
Oukari_Espero que isso alivie até as dores do coração... - Murmurou.
Homaru colocou a cabeça para fora da carruagem e olhou os dois guardas.
Homaru_Está tudo até bem quieto, alguma movimentação estranha?
Guarda_Vimos alguns cachorros passando pelo mato, mas nada, além disso.
Homaru_Então eles ainda devem estar dentro dos muros do palácio...
Guarda_De alguma forma, seus guardas resistiram bem, vimos bastante guardas mortos. Mas a grande parte eram dos nossos de Konomori...
Homaru_O erro de Majesthe foi subestimar Lantreneje, nosso reino pode não ser muito grande, mas isso não importa, tamanho não é documento...
Guarda_É aquele ditado, mais vale dez soldados habilidosos, do que cem homens. - O guarda disse para o outro.
Homaru_Me pergunto como deve estar Martin e Oumaru... - Homaru comentou com Oukari.
Oukari_Espero que meu irmão esteja bem... E que Arthur esteja em segurança em Lasnarosse...
Homaru_Ele há de estar... Não se preocupe.
Oukari olhou para fora da carruagem novamente, e viu Rose mais uma vez, usando seu vestido favorito.
Oukari_Eu a vejo novamente...
Homaru_Oukari por favor... - Implorou para ela para de falar da menina morta.
Oukari_Está tudo bem... Sei que ela... Não é real... assim como todos os outros que vejo...
Homaru_Quem você vê?...
Oukari_Todos que perdi, e que vi morrer... Rose, Hotoi, Harshel, Haru, Majesthe, Vejo até a mãe de Arthur de vez em quando... Pessoas que marcaram a minha vida e me tornaram quem sou hoje...
Homaru_Embora seja doloroso, eu gostaria de ver as pessoas que perdi mais uma vez, sinto que estou esquecendo do rosto delas... - Comentou, tristemente.
Oukari_Não é tão bom quanto parece... Às vezes ouço elas dizerem coisas horríveis...
Homaru_Que coisas horríveis?
Oukari_... Rose diz que foi minha culpa... Harshel diz que nunca deveria ter sido meu amigo... Haru diz que eu o enganei, Majesthe diz que tudo isso é minha culpa e a mãe de Arthur... Diz que roubei o filho dela, que não sou uma boa mãe, que nunca serei o suficiente...
Homaru_Isso é realmente terrível... Mas não acho que essas pessoas, exceto Majesthe diria uma coisa dessas a você...
Oukari_Eu não tenho tanta certeza disso...
Homaru_E quanto ao meu irmão? O que ele diz?...
Oukari_Hotoi é especial, ele nada me diz além de me olhar. Penso que ele apenas concorda com tudo o que disseram para mim até o momento... Ou talvez eu apenas tenha me esquecido da voz dele...
Homaru_Não era do feitio do meu irmão pensar essas coisas, principalmente de você que ele amava tanto.
Ouvi atentamente essas palavras de Homaru.
(...)
Não demorou muito para chegarmos ao palácio, os portões das muralhas estavam no chão. A carruagem não conseguia passar por cima, então tivemos que descer.
Desci da carruagem depois de Homaru, e vi ele paralisado olhando a cena de dentro das muralhas, inclinei minha cabeça para ver a cena que estava diante dele. E vi que muitos soldados estavam mortos, grande parte eram os de Konomori. Mas ainda restavam alguns pouquíssimos guardas lutando contra eles.
Assim que os nossos guardas nos viram, seus rostos cansados se iluminaram. Os guardas de Konomori estavam transtornados por estarmos de volta, vivos.
Guarda_Majestade! O imperador está de volta! - Um guarda gritou alegremente enquanto se defendia dos ataques de dois soldados de Konomori.
Olhei ao redor procurando pelo meu irmão, mas não o enxerguei. Homaru deu alguns passos enquanto tirava sua espada da bainha.
Homaru_Não acredito no que estou vendo... - Ele olhou para o corpo de Martin no chão.
Oukari_Não pode ser... - Me aproximei e vi o corpo dele.
Homaru_Desgraçados... - Ele apertou o cabo da espada e olhou um grupo de soldados de Konomori que se aproximavam, se preparando para nos atacar.
Soldado_Não posso acreditar que estão vivos... - Um soldado de Konomori estava disposto a enfrentar Homaru com seus quatro colegas.
Homaru_Oukari fique perto de mim. - Ele me puxou para trás de si.
Os guardas de Konomori, mandados por Dhoragon para nos proteger, se aproximaram.
Guardas_Parem já de atacar! Dhoragon ordenou! A Rainha Majesthe está morta! - Sacou a espada e ficou atrás de mim para me proteger.
Soldado_Majesthe nos disse para não hesitar, não importa o que digam! E assim eu e meus colegas faremos, em nome da nossa amada e eterna rainha!
Oukari_Isso é um absurdo! Não faz sentido acabarem com suas vidas pelas ordens de uma pessoa que nada sentia por vocês! Ela sequer se importava com suas vidas, mandaram vocês para a morte! - Falei o que tive vontade, antes que o remédio começasse a fazer efeito e eu perdesse a minha lucidez.
Soldado_Essa é a nossa doutrina! Seguir uma ordem até o fim! Mesmo que quem ordenou, esteja morto!
O outro guarda aliado estalou a língua, zangado pela atitude de seu ex-colega.
Guarda_Maldita doutrina! - Ele atacou um dos soldados.
Oukari_Não pode ser... Por que fariam isso? - Minha voz embargou, estremeci dos pés a cabeça. Eles eram loucos, loucos!
Homaru se defendeu de um dos ataques.
Homaru_Argh, eu disse a você que não adiantava conversar com eles! - Chutou o soldado para longe e rebateu a espada de um outro soldado.
Vi todos ao meu redor lutando para me proteger e me senti patética, eles estavam arriscando suas vidas por mim, suas vidas! Eu não consigo entender essa loucura dos soldados de Majesthe! Onde estão suas humanidades!? Vão destruir tudo e acabar com suas vidas por outra pessoa que sequer devia saber seus nomes?!
Me abaixei e comecei a estremecer.
Oukari_Parem! Parem já com essa loucura... - Coloquei as mãos sobre a cabeça e chorei.
Homaru_Oukari! Não fique assim, você será um alvo fácil! - Ele alertou enquanto empurrava a espada de um soldado.
Oukari_Vão se matar a troco de nada! Qual é o propósito? - Apertei minha cabeça chorando ainda mais.
Homaru_Oukari!
Eles morrerão por uma doutrina que não se importa com eles?! Em nome de uma pessoa que era completamente egoísta! Alguém que causou tudo isso, e que teria feito muito mais! Eu não entendo, não entendo!
Minha cabeça estava a mil por hora. Senti como se fosse perder a minha sanidade a qualquer momento, beirando a loucura no meio de uma guerra sem proposito além de matar e destruir tudo! Tudo que lutei com muito esforço para conquistar! Tudo o que eu fiz até aqui, havia sido destruído em poucos dias. Por quê?! Por quê!?
Meus olhos estremeceram e eu gritei como uma louca! Minha visão ficou turva e senti que não estaria mais sã em poucos segundos, e ficar sem consciência no meio daquela batalha, acabaria comigo! Eu morreria!
Juntei toda a minha coragem e meu desespero, e corri do círculo.
Homaru_OUKARI! NÃO FAÇA ISSO, VEM AQUI! - Ele tentou me seguir, mas seu caminho foi bloqueado por mais alguns soldados que apareceram em sua frente.
Corri sem rumo pelo pátio cheio de inimigos, tentaram me golpear várias vezes, mas tive muita sorte, a adrenalina no meu corpo me fez correr tão rápido para longe, que quando me dei conta, estava subindo uma colina. Olhei para trás enquanto as cinzas se amontoavam no meu corpo, vi o palácio já distante e cai de joelhos na grama queimada. Chorei e berrei como uma criança mimada que não consegue o que quer.
Eita que deu a louca na Oukari!😳😰