Love&Thorns PJM+JJK

By gabyoffc

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#CONCLUÍDA - Jungkook é um menino solitário, antissocial e triste. Sua vida começa a mudar quando encontra um... More

⚠️AVISOS ⚠️
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By gabyoffc

"A raiva não te dá o controle da situação,

Ela tira a situação do seu controle.

E te faz tomar atitudes sem pensar."

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Algumas atitudes precisam ser tomadas

para que você entenda seus sentimentos.


Não imaginava que o encontraria, não imaginava que estaria com tanta raiva. Não havia planejado. Na verdade, não tinha sequer pensado. Às vezes, você faz coisas não porque pensou naquilo, mas porque sentiu. Sentiu demais. E nem sempre você pode se controlar quando sente demais. Talvez a diferença entre ser menino e ser adulto fosse que meninos não são capazes de controlar as coisas horríveis que sentem. E os homens são. Nessa tarde, fui menino. Nada adulto.

Um menino. Um menino enlouquecido. Louco, louco.

Peguei o carro e fui direto até a drogaria onde Jimin trabalhava. Repassei na cabeça nossa conversa no deserto. Lembrei o nome do cara. Woojin. Entrei na drogaria e lá estava ele. O cara que Jimin comentou que queria beijar. Ele estava no balcão.

— Sou Jungkook — disse.

Ele olhou para mim cheio de pânico.

— Sou amigo de Jimin — continuei.

— Eu sei — ele disse.

— Acho melhor você fazer uma pausa.

— Não posso...

Não quis ouvir desculpas esfarrapadas.

— Vou lá fora esperar você. Vou esperar exatamente cinco minutos. Se você não aparecer, volto aqui e quebro a porra da sua cara na frente de todo mundo. E se você acha que eu não faria isso, olhe bem nos meus olhos.

Ele podia ver minha raiva, minha fúria.

Saí e esperei. Antes dos cinco minutos ele apareceu.

— Vamos andar um pouco — falei.

— Não posso ficar muito tempo fora — ele disse.

Woojin me seguiu. Caminhamos.

— Jimin está no hospital.

— Ah.

— Ah? Você não foi visitar.

Ele permaneceu calado. Senti vontade de lhe dar uma surra bem ali, naquele momento.

— Não vai dizer nada, babaca?

— O que você quer que eu diga?

— Seu desgraçado. Você não sente nada?

Reparei que ele estava tremendo. Não que eu ligasse.

— Quem foi?

— Do que você está falando?

— Não brinca comigo, seu merda.

— Você não vai contar pra ninguém?

Agarrei-o pelo colarinho.

— Jimin está numa cama de hospital e a única coisa com que você se preocupa é para quem vou contar. Para quem eu contaria, seu merda? Só diga quem foi.

— Não sei.

— Besteira. Conte agora ou vou chutar você até Seoul.

— Não conheço todos.

— Quantos?

— Quatro caras.

— Só preciso de um nome. Só um.

— Julian. Era um deles.

— Julian Enriquez?

— Isso.

— Quem mais?

— Jaehyung.

— Quem mais?

— Não conheço os outros dois.

— E você simplesmente deixou Jimin lá?

— Ele não quis correr.

Bufei mais irritado ainda.

— E você não ficou com ele?

— Não. De que ia adiantar?

— Então você nem ligou?

— Eu ligo.

— Mas não voltou lá, voltou? Não voltou para ver se estava tudo bem, né?

— Não.

Ele parecia assustado.

Empurrei-o com força contra a parede de um prédio, ele caiu no chão. E fui embora.

[...]

Eu sei onde Julian mora. Tinha jogado beisebol com ele e os irmãos no primário. Nunca fomos amigos. Não que fôssemos inimigos ou coisa assim. Dei umas voltas no quarteirão com a picape e, quando percebi, já estava estacionado em frente à casa dele. Caminhei até a porta da frente e bati. A irmã mais nova abriu.

— Oi, Kookie — ela disse.

Abri um sorriso. Ela era bonita.

— Oi, Lulu — minha voz saiu calma, quase amigável. — O Julian tá aí?

— Tá no trabalho.

— Onde ele trabalha?

— No Benny's.

— A que horas ele sai? — perguntei.

— Geralmente ele chega em casa um pouco depois das cinco.

— Obrigado.

— Aviso que você passou aqui? — ela perguntou, sorrindo.

— Por favor.

Benny's. O sr. Rodriguez, amigo do meu pai, era o dono dessa oficina de carro. Eles tinham estudado juntos. Sabia exatamente onde era. Fiquei rodando a tarde inteira à espera das cinco horas para aparecer lá. Quando faltavam alguns minutos, estacionei do outro lado da esquina da oficina. Não queria que o sr. Rodriguez me visse. Ele faria perguntas. Contaria ao meu pai. Não queria perguntas.

Desci da picape. Queria ver Julian sair da garagem. Quando ele surgiu, chamei com um gesto.

Ele atravessou a rua.

— E aí, Kook?

— Sem novidades — eu disse, para depois apontar para o carro. — Só dirigindo por aí.

— Essa picape é sua?

— É.

— Belas rodas, vato.

Julian também vinha de família mexicana, a diferencia era que ele sabia mais o espanhol do que eu.

— Quer dar uma olhada?

— Eu tenho umas coisas pra fazer. Se der, aparece mais tarde e a gente dá uma voltinha.

Agarrei-o pelo pescoço e o botei de pé.

— Entra — ordenei.

— Mas que porra é essa, Kook?

— Entra — repeti. E o joguei contra a picape.

Chingao, ese. Qual é o seu problema?

Ele tentou me dar um soco. Foi o suficiente. Simplesmente parti para cima. O nariz dele começou a sangrar. Isso não me deteve. Logo ele estava no chão. Eu dizia palavrões, xingava. Minha vista estava embaçada e continuei a bater.

Então ouvi uma voz e um par de braços me puxou para trás. A voz gritava comigo, os braços eram fortes, e eu não conseguia mais bater.

Parei de tentar.

E tudo parou. Tudo se aquietou.

O sr. Rodriguez estava diante de mim, me encarando.

— Qual é o problema, Kook? Que te pasa?

Não tinha nada a dizer. Olhei para o chão.

— O que está acontecendo, Kook? A ver. Di me.

Não consegui falar.

Apenas olhei o sr. Rodriguez se ajoelhar e ajudar Julian a levantar. O nariz dele ainda sangrava.

— Vou matar você, Jungkook — ele murmurou.

— Você e que exército?

O sr. Rodriguez me olhou feio. Em seguida, olhou para Julian.

— Você está bem?

Julian fez que sim com a cabeça.

— Vamos arrumar umas roupas limpas pra você.

O sr. Rodriguez me encarou de novo e ameaçou:

— Você tem sorte por eu não chamar a polícia.

— Pode chamar. Não dou a mínima, não será somente eu na prisão. Mas, antes de chamar, pergunte para Julian o que ele anda fazendo.

Entrei no carro e fui embora.

Só notei o sangue nas minhas mãos e na minha camiseta quando cheguei em casa.

Cheguei e sentei na varanda.

Eu não sabia o que fazer. Então só fiquei lá, sentado. Podia ficar ali para sempre — esse era o meu plano.

Não sei quanto tempo fiquei lá. Comecei a tremer. Sabia que tinha enlouquecido, mas era incapaz de explicar até para mim mesmo. Talvez seja isso o que acontece quando você enlouquece. Não dá para explicar. Nem para si mesmo. Nem para ninguém. E a pior parte de enlouquecer é que, depois que a loucura passa, você não sabe o que pensar de si mesmo.

Meu pai apareceu e ficou de pé, na varanda, me observando. Não gostei da expressão dele.

— Preciso falar com você — ele disse.

Meu pai jamais dissera isso. Jamais. Não assim. Sua voz me assustava.

Fiquei nervoso.

— Aconteceu algo com Jimin?

— Não. É sobre outra coisa.

Então eu já soube que ele sabia sobre Julian.

Ele sentou ao meu lado.

— Acabei de falar com Rodriguez ao telefone.

Permaneci calado.

— O que aconteceu, Filho?

— Não sei — respondi. — Nada.

— Nada?

Pude sentir a raiva na voz de meu pai.

Olhei minha camiseta ensanguentada.

— Vou tomar banho — falei.

Meu pai me seguiu para dentro de casa.

— Jungkook!

Minha mãe estava no corredor. Não suportei o modo como me olhava. Parei e baixei os olhos. Não conseguia parar de tremer. Meu corpo inteiro tremia.

Vi minhas mãos. Os tremores não paravam de jeito nenhum.

Meu pai me pegou pelo braço. Sem força nem maldade, mas também sem suavidade. Meu pai era forte. Ele me levou até a sala de estar e me fez sentar no sofá. Minha mãe sentou ao meu lado.

Ele, na poltrona. Eu estava anestesiado e sem palavras.

— Fale — meu pai disse.

— Precisava machucá-lo.

— Kook? — minha mãe apenas me olhou. Odiei seu olhar de descrença. Por que ela não conseguia crer que eu precisava machucar alguém?

Devolvi o olhar e disse a ela:— Precisava machucá-lo.

— Seu irmão machucou alguém uma vez — ela balbuciou. E então começou a soluçar.

Não aguentei. Odiei a mim mesmo mais do que nunca. Apenas a via chorar e, por fim, pedi:

— Não chore, mãe. Por favor, não chore.

— Por que, Kook? Por quê? Você quebrou o nariz do rapaz, Kook. E o único motivo para não estar delegacia é que Michael Rodriguez é amigo de infância do seu pai. Vamos ter que pagar a conta do hospital, filho. Você vai ter que pagar.

Fiquei calado. Sabia o que estavam pensando. Primeiro seu irmão, agora você.

— Sinto muito — minha voz soou vacilante, mesmo para mim. Só que parte de mim não sentia muito. Parte de mim estava contente por ter quebrado o nariz de Julian. Só fiquei mal por ter magoado minha mãe.

— "Sinto muito", Jungkook? — perguntou meu pai; seu rosto parecia de aço.

Eu também podia ser de aço.

— Não sou meu irmão — falei. — Odeio quando vocês pensam isso. Odeio viver na p... — me segurei para não usar a palavra na frente de minha mãe. — Odeio viver à sombra dele. Odeio. Odeio ter que ser o bom menino só para agradar vocês.

Nenhum dos dois disse qualquer palavra.

— Não sei se sinto muito — finalizei.

— Vou vender sua caminhonete — meu pai ameaçou, me encarando.

— Ótimo. Pode vender.

Minha mãe tinha parado de chorar. Seu rosto carregava uma expressão estranha. Não era suave nem tensa. Apenas estranha.

— Você precisa me dizer por quê, Filho— suplicou.

Respirei fundo e concordei.

— Tudo bem, mas vocês vão escutar?

— Por que não escutaríamos? — meu pai disse, com a voz firme.

Olhei para ele.

Depois, para minha mãe.

Depois, para o chão.

— Eles machucaram Jimin — falei, baixinho. — Vocês não imaginam como ele está. Deviam ver a cara dele. Quebraram as costelas. Deixaram Jimin caído em um beco. Como se não fosse nada. Como se fosse um saco de lixo. Como se fosse merda. Como se não fosse nada. Se ele tivesse morrido, não dariam a mínima.

Comecei a chorar, forte. Minha voz ficou grossa e meu rosto ficou todo molhado.

— Vocês querem que eu fale? Vou falar. Vocês querem que eu conte? Vou contar. Jimin estava beijando um garoto.

Não sei por quê, mas não conseguia parar de chorar. E quando parei, senti muita raiva. Mais raiva que nunca.

— Eram quatro. O outro garoto fugiu. Mas Jimin não. Porque Jimin é assim, não foge. Ele fica, ele é gentil, um garoto dócil, corajoso e bondoso demais para meter um soco na cara de pelo menos um dos idiotas.

Olhei para o meu pai.

Ele não falou nada.

Minha mãe chegou mais perto de mim. Ela não parava de passar a mão na minha cabeça.

— Estou com tanta vergonha — balbuciei. — Queria machucá-los também.

— Kook? — a voz de meu pai saiu mansa. — Kook, Kook. Você está lutando essa guerra da pior maneira possível.

— Não sei lutar essa guerra, pai.

— Você devia ter pedido ajuda — ele disse.

— Também não sei fazer isso. Eu... — solucei. — eu só queria proteger ele de tudo isso.

Então chorei ainda mais, me joguei nos braços do meu pai enquanto pude sentir minha mãe alisar meu cabelo. Ouvi o choro da minha mãe junto aos meus próprios soluços.

Eu me segurei o quanto pude, tentei de várias formas manter o choro preso dentro de mim. Porque seria bobeira chorar por algo que não era meu, mas eu estava enganado. Enganava a todos, inclusive a mim mesmo. Contando mentiras, pregando peças em minha cabeça.

Eu sempre quis, desde o início, proteger Jimin com toda minha força e todo meu ser. Eu sempre o quis por perto, até mesmo nos meus piores momentos.

Eu estava lutando uma guerra com meus pensamentos, com meu ego, com minhas verdadeiras vontades, com as pessoas ao meu erro. Estava enfrentando essa batalha de forma errônea.

Agora eu consigo entender, eu gosto tanto da amizade de Jimin que é difícil me controlar quando outro tenta o fazer mau.

É como um colapso, onde eu tenho que agir imediatamente, para acabar com tudo e todos ao meu redor. Até que eu veja que ele está completamente seguro.

[...]

Visitei Jimin todos os dias. Ele passou uns quatro dias no hospital. Os médicos precisaram se certificar de que tudo estava bem, pois Jimin sofrera uma concussão.

Suas costelas doíam.

O médico disse que as costelas trincadas demorariam para sarar. Mas não estavam quebradas, oque teria sido pior. Os hematomas melhorariam sozinhos. Os externos, ao menos.

Ele estava diferente, parecia mais triste. Eu sabia que parte dele não conseguiria melhorar, sabia que algo dentro de si havia se repartido em pedaços e não foi somente suas costelas que fraturou.  

No dia em que voltou para casa, Jimin chorou. Eu o abracei. Pensei que ele nunca mais fosse parar de chorar.

Ele sentiu muitas dores e tomou alguns remédios que o deixou sonolento, então esperei ele dormir para sair de seu quarto.

— Tudo bem com você, Kook?     — sra. Park perguntou gesticulando para que me sentasse à mesa. 

— Sim, tudo bem. 

— Tem certeza?

— A senhora acha que preciso de terapia? 

— Não tem nada de errado em fazer terapia, Kook.

— Falou a psicóloga.

Ele riu e balançou a cabeça. O Sam apenas olhava para mim, sem se meter no assunto, mas parecia atento a tudo que falamos. 

— Você só começou a bancar o sabichão depois de conhecer meu filho. 

— Eu estou bem — disse, rindo. — Por que não estaria?

Os Park se entreolharam. 

— É coisa de pais? 

— O quê? 

— Esses olhares que os pais trocam.

— É, acho que sim — Sam disse, rindo.

Eu sabia que meu pai e ele tinham conversado. Sabia que ele sabia o que eu tinha feito. Sabia que ambos sabiam.

— Você sabe quem são os garotos, não sabe, Kook?   — perguntou a sra. Park.

— Conheço dois. 

— E os outros dois? 

Pensei em responder com uma brincadeira. 

— Aposto que consigo descobrir.

A sra. Park riu. Isso me surpreendeu. 

— Kook — ela disse —, você é louco. 

— É, acho que sou. 

— Mas, você podia ter se dado mal. 

— Foi errado. Sei que foi errado. Mas fiz. Não consigo explicar. A polícia não vai fazer nada contra aqueles caras, vai? 

— Com certeza não. 

— Não é com os outro caras que me preocupo.   — disse Sam.    — É com você e o Jimin. 

— Eu estou bem — repeti. 

— Certeza? 

— Certeza. 

— E não vai atrás dos outros caras? 

— A ideia me passou pela cabeça. 

Dessa vez, a mãe de Jimin não riu. 

— Prometo que não vou — corrigi.

— Você é melhor que isso — ela disse.

— Não vou pagar pelo nariz do Julian. 

— Seu pai já sabe disso?   — perguntou Sam. 

— Vou contar a ele quando chegar. Se eles não pagaram pela internação do Jimin, também não merecem que eu gaste meu dinheiro com eles. Eles não vão chamar a polícia, não é? Não é como se pudessem depois do que fizeram. 

— Você é bem ligeiro com essas coisas, hein, Kook?

Sam a abriu um sorrisinho malicioso.

—Sei me virar.

[...]

Meu pai não discutiu quando disse que não pagaria pelas despesas médicas de Julian. Também não achou ruim quando disse que poderiam tomar minha caminhonete e chamar a polícia. Sam e ele conversaram com a velinha que viu a cena e nem se ela quisesse conseguiria identificar os caras. Então meu pai conversou com o sr. Rodriguez e ele não saiu muito contente daqui de casa. 

Não houve discussão, eles apenas conversaram e tudo ficou em sigilo. 

Meu pai não tomou minha caminhonete e minha mãe fez minha comida favorita. 

Conforme os dias foram passando percebi que Jimin e eu não tínhamos mais tantas coisas para conversar. Eu ia até sua casa, entrava em seu quarto e lia um poema para ele, depois ele pedia para ler novamente e assim eu fazia. Ele raramente sorria com minhas piadas e estava sempre com os pensamentos distantes. 

Era quase final de verão e nós estávamos distantes. 

Eu me sentia mais próximo dele depois de tudo o que aconteceu neste verão, mas também me sinto distante depois do que ele sofreu. Pensar que não estive aqui para o proteger me deixa furioso.

Nenhum de nós voltou ao trabalho. Não sei. Acho que, depois do que aconteceu, parecia sem sentido.

Um dia, fiz uma piada de mau gosto: 

— Por que o verão sempre acaba com um de nós todo quebrado? 

Não rimos.

Não levei Bam para ver Jimin, ele gostava de pular e brincar e sempre lambia Jimin por inteiro. 

Depois de muito tempo em silêncio decidi falar para ele sobre meu irmão, como meus pais me contaram o que aconteceu. 

— E então? Quer ouvir a história inteira? 

— Conta — ele respondeu.

— Pois bem. Meu irmão tinha quinze anos. E raiva. Pelo que entendi, ele sempre tinha raiva. Fiquei sabendo disso mais pelas minhas tias. Acho que ele era cruel ou talvez, sei lá, apenas tinha nascido com raiva. Aí, certa noite, ele caminhava pelas ruas do centro, caçando confusão. Foi isso que meu pai disse: "Jeon Hoseok sempre procurava confusão". Meu irmão pegou uma prostituta. 

— Onde ele arrumou dinheiro? 

— Não sei. Que tipo de pergunta é essa?

— Aos quinze anos, você tinha dinheiro para uma prostituta?

— Aos quinze anos? Do jeito que você fala, até parece que faz muito tempo. Mas, caramba, não tinha dinheiro nem pra comprar uma bala.

— Viu só? 

Encarei Jimin. Seus olhos brilhando para saber mais. 

— Posso continuar? 

— Desculpa. 

— A prostituta na verdade era homem.

— Quê? 

— Era um travesti.

— Nossa. 

— Pois é. Meu irmão explodiu. 

— Explodiu como? 

— Socou o cara até a morte.

— Meu Deus — falou, afinal. 

— Sim. Meu Deus. 

Demorou bastante tempo para que um de nós dissesse outra coisa.

Por fim, olhei para Jimin e contemplei seu semblante sério. Suas sardas rosadas e sua boca ainda um pouco machucada, seus olhos meio inchados.

— Você sabia o que é um travesti? 

— Claro.   — respondi. 

— Você não sabia o que é um travesti?

— Como saberia?

— Você é tão inocente, Kook.

— Não tão inocente — eu disse.    — Nós já... quer dizer, você já. 

Tossi. Engasguei com minhas palavras e não consegui parar de tossir. 

Jimin permaneceu calado, me deixou terminar.

— Não sou inocente.    — finalizei, com a voz cortada pelas tossidas fanhas. 

— Sinto muito, Kookie. 

Ele sempre me chamava assim quando achava que eu ia chorar. 

— Tudo bem. Isso foi bom. Quer dizer, não bom para meu irmão, mas bom para minha perspectiva que o enxergar. Você sabe que eu sempre quis ser igual ou melhor que ele. 

Abaixei a cabeça.  

— Você com certeza é melhor do que ele, Kook. 

Sorri. 

— Sou como ele, eu acho.

— Por quê? Porque quebrou o nariz de Julian Enriquez? 

— Você ficou sabendo? 

— Sim. 

— Por que não me contou que sabia?

— Por que você não me contou, Kook?

— Não sinto orgulho disso, Jimin. 

— Por que fez, então? 

— Não sei. Ele machucou você. Quis machucá-lo. Foi uma conta besta que fiz na cabeça — falei, levantando o olhar para ele. — O roxo dos olhos já está quase bom.

— É, quase.

Ficamos em silencio, Jimin passou a segurar minha mão enquanto conversávamos, acho que isso o fazia se sentir melhor. 

— E as costelas? 

— Melhoraram. De vez em quando é difícil dormir à noite. Então tomo analgésico. Odeio. 

— Você seria um péssimo drogado. 

— Talvez não. Gostei muito daquela maconha. Muito mesmo. 

— Talvez sua mãe devesse entrevistar você para o livro dela. 

— Ah, ela já me infernizou demais. 

— Como ela descobriu? 

— Eu falei. Ela é como Deus. Sabe de tudo.

Tentei não rir, mas não consegui evitar. Jimin também riu. Só que para ele rir doía. Por causadas costelas. 

— Não, Kookie. Você não é como o seu irmão. 

— Não sei, às vezes eu sinto que sou até pior. Não consigo me compreender, não sei quem sou. Não entendo meus sentimentos. 

Sua mão acariciou a minha palma com o polegar. 

— Nem sempre, talvez você já se entenda. Só não admite.     — pigarreou.    — Posso perguntar uma coisa?

— Claro.

— Você se incomoda de eu ter beijado Woojin?

— Acho Woojin um merda. 

— Ele não é. É legal. Bonito.

— Bonito? Quanta superficialidade. Ele é um merda, Jimin. Abandonou você lá.

— Você parece mais preocupado com isso do que eu.

— Mas você devia ficar preocupado.

— Você não teria feito o mesmo, teria? 

— Não. 

Peguei sua mão por cima da minha e a acariciei também. 

— Gostei de você ter quebrado o nariz dele.

Ambos rimos. 

— Woojin não liga para você. 

— Estava com medo. 

— E daí? Todo mundo tem medo.

— Você não, Kook. Você não tem medo de nada.

— Isso não é verdade. Mas não deixaria aqueles caras fazerem o que fizeram com você. 

— Talvez você só goste de brigar. 

— Talvez. 

É isso que me faz parecer tanto com meu irmão. A sua raiva, sua fúria, sua vida, seu eu. Me tornando sangue e carne dele. 

Jimin olhou para mim. Não parava de olhar para mim. 

— Por que você está me encarando? — perguntei. 

— Posso contar um segredo, Kook? 

— Adianta eu dizer que não? 

— Você não gosta de conhecer meus segredos.

— De vez em quando seus segredos me assustam.

Ele riu. 

— Eu não estava beijando Woojin de verdade. Na minha cabeça, estava beijando você.

Eu apertei a sua mão e por um breve segundo quis sorrir, mas não consegui. Estava fardado a pensar que Jimin merecia e merece alguém melhor. 

— Melhor você arrumar uma cabeça nova.

Ele ficou triste. 

— É. Acho que sim.

E mais uma vez eu me senti uma péssima pessoa.

[...]

Fui nadar na piscina onde Jimin sempre vai e lá encontrei Lisa. 

— Fiquei sabendo do seu amigo. 

— É. 

— Também que arrebentou o Julian. 

— Ele mereceu. 

Ela riu. 

— Sabe, biscoito, você é um bom garoto no final das contas. 

— Eu não acho isso. 

— Eu acho, e tenho certeza que Jimin também. Você o salvou e agora o protegeu. Você é um ótimo amigo para ele. 

Fiquei em silêncio, refletindo suas palavras. 

— Engraçado, nunca nos tratou assim.    — ela continuou. 

Pigarreei. 

— Chega. Vou embora. 

Peguei minhas coisas e caminhei até a casa de Jimin  e bati na porta. Sam atendeu.

Ele me olhou de cima a baixo. 

— Fui nadar. 

— Jimin vai ficar com inveja.

— Como ele está?

— Bem. Melhorando. Faz tempo que você não aparece. Sentimos saudade. Ele está lá no quarto. — ele avisou, me acompanhando para dentro da casa. Depois, hesitou um instante e acrescentou: — Ele tem companhia.

— Ah. Posso voltar depois.

— Não se preocupe. Pode subir.

— Não quero atrapalhar. 

— Não diga besteira. 

— Volto depois. Sem problema. Eu estava voltando da piscina... 

— É só o Woojin — ele disse. 

— O que?

Acho que ele notou a cara que fiz.

— Ele meio que deixou Jimin na mão. 

— Não seja tão duro com os outros, Kook. 

Aquilo me irritou demais. 

— Avise Jimin que eu passei aqui.

Voltei caminhando para casa, irritado. Não acredito que depois daquele cara ter deixado Jimin daquele jeito sozinho, ainda teve a cara de pau de voltar a falar com Jimin. 


[...]


Horas mais tarde Jimin me ligou. 

— Meu pai me disse que você ficou irritado. 

— Não fiquei irritado.

A porta da frente estava aberta e Bam começou a latir para um cachorro que passava na rua.

— Um minuto — pedi. — Bam! Quieto!

Levei o telefone para a cozinha e sentei à mesa.

— Pronto — retomei. — Então, não fiquei irritado.

— Acho que meu pai perceberia se fosse outra coisa.

— Tudo bem. E que merda de diferença isso faz?

— Viu? Você está irritado. 

— Só não estava a fim de ver seu amigo Woojin. 

Senti a bile na minha garganta, louco para explodir. 

— E o que ele fez pra você?

— Nada. Só não vou com a cara dele.

— Por que não podemos ser todos amigos?

— Aquele desgraçado deixou você lá para morrer, Jimin.

Porra. 

— A gente conversou sobre isso. Está tudo bem.

— Legal, ótimo. 

Suspirei. 

— Você está agindo feito um louco.

Porque eu estou louco, estou enlouquecendo. Você me enlouquece. 

— Jimin, às vezes você vem com umas merdas, sabia? 

— Escuta. Hoje vamos a uma festa. Queria que você fosse. 

— Eu aviso — falei e desliguei o telefone.

Desci até o porão e levantei peso por umas horas. Levantei e levantei, até sentir dor pelo corpo inteiro. 

A dor não era tão ruim. 

Tomei banho. Deitei na cama e fiquei. Devo ter pegado no sono. Quando acordei, a cabeça de Bam estava apoiada na minha barriga. Fiz carinho nele. A voz de minha mãe soou no quarto:

— Está com fome? 

— Não... Nem um pouco.

 — Certeza?

— Sim. Que horas são? 

— Seis e meia.

— Puxa, acho que estava cansado. 

Minha mãe sorriu.

— Talvez por causa de todo aquele exercício. Algum problema?

— Não. Só cansaço.

— Quando você está irritado, levanta peso.

— Outra de suas teorias, mãe? 

— É mais que teoria, Kook.

Fiquei em silêncio. 

— Jimin ligou. 

Não respondi. 

— Acho que ele falou algo sobre vocês irem a uma festa. 

— Não irei. 

— Tá bom. Reunião de família, agora. 

Ela saiu do quarto sem dar tempo de questionamentos. Quando voltou, meu pai estava com ela. 

— Para que isso? Nunca tivemos isso. 

— Agora teremos, nova tradição.     — disse ela. 

— Kook, sua mãe quer ajudar.

Suspirei audível, exausto. 

Meu pai sorriu para mim. 

— Uns minutos atrás, sua mãe entrou na sala e tirou o livro das minhas mãos. E disse: "Fale com ele. Fale com ele, Jeon". Ela usou aquela voz de fascista dela. 

Minha mãe riu graciosamente. 

— Filho, é hora de você parar de fugir. 

Olhei para meu pai. 

— Do quê? 

— Você não sabe? 

— O quê?

— Se continuar a fugir, isso vai acabar com você. 

— O quê, pai? 

— Você e Jimin.

— Eu e Jimin? 

Olhei para minha mãe. Depois para meu pai.

— Jimin é apaixonado por você — ele disse. — Isso é bem óbvio. Ele não esconde isso de si próprio. 

— Não posso controlar o que ele sente, pai. 

— Não. Não pode.

— E além disso, pai, acho que ele já superou. Ele gosta daquele Woojin. 

Meu pai concordou com a cabeça.

— Kook, o problema não é só Jimin estar apaixonado por você. O problema real, para você, pelo menos, é que você está apaixonado por ele.

Fiquei calado. Apenas olhei o rosto de minha mãe. E, depois, o de meu pai. 

Eu não sabia o que dizer.

Meu coração pareceu que ia sair pela minha boca a qualquer momento, consegui sentir pulsar em minha garganta. 

— Não sei. Quer dizer, isso não é verdade. Sei lá, acho que não. Quer dizer... 

Gaguejei. 

— Jungkook, eu sei o que vejo. Você salvou a vida dele. Por que acha que fez isso? Por que imagina que, do nada, sem pensar, você se joga para tirar Jimin da frente de um carro em movimento? Você acha que isso simplesmente aconteceu? Pois eu acho que você não suportava a ideia de perdê-lo. Simplesmente não podia. Por que você arriscaria a própria vida para salvar a de Jimin, se não o amasse? 

— Por que ele é meu amigo.

— E por que você arrebenta a cara de um sujeito que bateu nele? Por que faria isso? Tudo isso, Filho, tudo quer dizer algo. Você ama esse rapaz. 

Continuei com os olhos no chão. 

— Acho que você o ama mais do que pode suportar.

— Pai? Pai, não. Não. Eu não posso. Não posso. Por que você diz essas coisas?

— Por que eu não aguento mais ver a solidão que mora dentro de você. Por que eu amo você, filho.

Minha mãe e meu pai ficaram me assistindo chorar. Pensei que fosse chorar para sempre. Mas não. Quando parei, tomei um gole generoso de cerveja da mão do meu pai.

Parecia que finalmente eu estava entendendo tudo o que senti e sinto por Jimin. Como se agora tudo fizesse sentido em minha cabeça. 

— Pai, acho que gostava mais quando você não falava.

Minha mãe riu. Eu adorava seu riso. E então meu pai riu. E, por fim, eu ri.

— O que vou fazer? Estou muito envergonhado. 

— Vergonha de quê? — minha mãe falou. — De amar Jimin? 

— Eu sou um cara. Ele é um cara. Não é para as coisas serem assim. Mãe...

— Eu sei — ela disse. — Ophelia me ensinou algumas coisas, sabe? Todas aquelas cartas. Aprendi um pouco. E seu pai tem razão. Você não pode fugir. Não de Jimin. 

Tia Ophelia vivia com uma mulher, eu sabia disso. 

— Eu me odeio.

— Não se odeie, amor. Te adoro. Já perdi um filho. Não vou perder outro. Você não está só, Kook. Sei que você pode ter essa sensação. Mas não é verdade.

— Como você pode me amar tanto? 

— Como poderia não amar? Você é o rapaz mais bonito do mundo. 

— Não sou. 

— Você é. Você é. 

— O que eu faço agora?

— Jimin não fugiu — meu pai disse com a voz suave. — Sempre o imagino apanhando daquele jeito. Mas ele não fugiu. 

— Certo — eu disse. 

Pela primeira vez na vida, entendi meu pai perfeitamente. 

E ele me entendeu.

Jimin é corajoso, bondoso e de coração puro. Eu sou corajoso para outras coisas, mas medroso ao extremo quando se trata de sentimentos. E agora, sabendo o que sei sobre o que sinto por ele, e sentir ainda mais intenso depois de finalmente entender que o amo me faz questionar, onde eu estava com a cabeça?

Por que não enxerguei isso antes?

Por que precisei ouvir de meus pais o quanto eu sinto pelo Jimin?

Eu precisava falar com Jimin, precisava contar que sinto algo por ele. Mas estou o ignorando já tem dias e ele deve estar com Woojin neste momento. 

Isso me doeu mais do que quando imaginei beijando uma garota pela primeira vez.

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