| YUU, Point of view |
A claridade de mais um dia nebuloso gradualmente me arranca do sono. Deito-me com o braço sobre os olhos, ainda meio tonto e ofuscado. Um sonho, lutando para ser lembrado, esforça-se para alcançar minha consciência. Solto um bocejo e viro para o lado, ansiando que o sono retorne. E então, os eventos do dia anterior retornam à minha mente.
Levanto-me tão rapidamente que minha cabeça começa a girar.
— Seu cabelo parece um monte de palha... mas eu gosto — a voz calma emerge da cadeira de balanço no canto do quarto.
— Mika! Você está aqui — vibro e, sem pensar, atravesso o quarto para abraçá-lo. No instante em que minha mente processa minhas ações, congelo.
Ele ri. — Claro — responde, satisfeito com minha reação. Suas mãos deslizam pelas minhas costas. Coloco minha cabeça em seu ombro, absorvendo o aroma de sua pele.
— Eu achei que era um sonho.
— Sua imaginação não é das mais criativas — ele zomba.
— Pai! — corro em direção à porta.
— Ele partiu uma hora atrás, depois de ajustar a bateria do carro. Normalmente você não fica tão sonolento de manhã — observa, estendendo os braços para me receber novamente, um convite quase irresistível.
— Eu só preciso de um minuto — admito.
— Eu vou esperar.
Caminho até o banheiro, minhas emoções descontroladas. Sinto-me como um desconhecido, tanto por dentro quanto por fora. A imagem no espelho mal se assemelha a mim - olhos excessivamente brilhantes, pequenas manchas vermelhas nas maçãs do meu rosto. Após escovar os dentes, tento domar o caos emaranhado do meu cabelo. Jogo água fria no rosto e busco retomar uma respiração tranquila, mas sem muito sucesso. Volto depressa ao meu quarto.
É quase um milagre que ele ainda esteja aqui, com os braços estendidos, à minha espera. Ele me envolve, e meu coração bate de forma irregular.
— Bem-vindo de volta — cochichou, abraçando-me.
Ele me segura por um tempo até que eu percebo que suas roupas estão diferentes, o cabelo mais arrumado.
— Você saiu? — pergunto, tocando o colarinho de sua camisa nova.
— Não poderia simplesmente sair daqui com as mesmas roupas com as quais cheguei. O que os vizinhos iam pensar? Você estava profundamente adormecido; não perdi um detalhe — seus olhos me estudam. — Você só começou a falar hoje cedo.
— O que ouviu?
Seus olhos, agora vermelhos, suavizam. — Você disse que me amava.
— Você já sabia disso.
— Foi bom ouvir de novo, de qualquer maneira.
Escondo o rosto em seu ombro.
— Eu te amo — sussurro.
— Eu também te amo, Yuu-chan — responde com simplicidade.
Não há mais nada a ser dito. Ele nos balança para frente e para trás enquanto o quarto gradualmente se ilumina.
— Hora do café da manhã — comentou casualmente.
Nesse momento, cubro meu pescoço com as duas mãos e olho para ele com os olhos arregalados. Seu rosto expressa choque.
— Brincadeirinha — rio silenciosamente. — E você disse que eu não sei atuar.
Ele faz uma careta descontente. — Isso não é engraçado.
— Foi muito engraçado, e você sabe disso. — observo atentamente seus olhos para garantir que estou perdoado, e ao que parece, estou.
— Talvez eu deva reformular — ele sugere. — Está na hora do café da manhã para os humanos.
— Está bem.
Ele me levanta gentilmente, mas com rapidez suficiente para me deixar sem fôlego, e me carrega facilmente pelas escadas. Protesto, mas ele me ignora.
A cozinha está radiante e acolhedora, parecendo refletir meu humor.
— O que tem para o café da manhã? — pergunto alegremente.
— Bem, eu não tenho certeza. O que você quer? — Sua sobrancelha ergue ligeiramente.
— Não se preocupe, sei me cuidar sozinho. Assista enquanto como. — digo, sorrindo.
Encontro uma tigela e uma caixa de cereais. Sinto seus olhos sobre mim enquanto pego o leite e uma colher. Coloco a comida na mesa e paro.
— Quer alguma coisa?
— Apenas coma, Yuu-chan.
Sento-me à mesa, observando enquanto ele come um pouco, seus olhos estudando todos os meus movimentos. Sinto-me envergonhado e limpo a garganta para quebrar o silêncio.
— O que está na agenda para hoje? — pergunto.
Ele pondera por um momento. — Hmm, o que você acha de conhecer minha família?
Engulo em seco. — Você está com medo disso?
— Sim — ele admite, incapaz de esconder isso, pois posso ver nos seus olhos. — Mas não se preocupe — ele sorri. — Eu vou te proteger.
— Não estou com medo deles — explico. — Estou com medo de que eles... não gostem de mim. Eles não vão ficar, bem, surpresos quando você me levar para conhecê-los? Eles sabem que sei sobre vocês?
— Ah, eles já sabem de tudo. Fizeram apostas ontem, sabia? Apostaram se eu ia te trazer de volta ou não. Sob qualquer perspectiva, não temos segredos. Não é nem possível, já que eu e Krul lemos mentes.
Sinto um arrepio percorrer minha espinha ao pensar na família dele fazendo apostas sobre nosso relacionamento. Ao mesmo tempo, fico aliviado por saber que eles já estão cientes da minha existência.
— Apostas? — pergunto, confuso.
Ele assente com um sorriso enigmático. — Sim, apostas. Mas não se preocupe, eles são uma família muito acolhedora. Vai se dar bem com todos, tenho certeza.
Há algo que ele não está me dizendo, e isso me deixa inquieto.
— Isso é bom? — perguntou, virando-se abruptamente para olhar para o meu café da manhã com uma expressão brincalhona. — Honestamente, não parece muito apetitoso.
— Bem, não é um urso pardo irritado... — ignoro-o quando ele faz uma careta.
Ele permanece no centro da cozinha observando o exterior pelas janelas de trás. Então, seus olhos voltam para mim e ele sorri, um sorriso de tirar o fôlego.
— Acho que você deveria me apresentar ao seu pai também.
— Mas ele já te conhece?
— Quero dizer, como seu namorado.
Eu o encaro, surpreso. — Namorado? Você não me pediu em namoro.
— Talvez porque você tenha dito para irmos devagar.
— Touché — brinco. — Isso não é necessário, sabe. Mas se você quiser...
Seu sorriso é paciente. — Você sabe que eu quero, Yuu-chan.
Empurro os restos de meu cereal para as bordas da tigela, pensativo.
— Vai dizer que sou seu namorado ou não?
— Nem um pedido de namoro antes? Ou isso é muito ultrapassado para nós? — pergunto ironicamente.
Ele ri suavemente e se aproxima, ficando mais perto de mim. Seu olhar é intenso e cheio de promessas.
— Bem, Yuu-chan, se eu soubesse que você queria um pedido formal... — ele faz uma pausa, como se pensasse. — Então, formalmente, Yuuichirou, você aceita ser meu namorado?
Sorrio, sentindo uma onda de calor me envolver. Tudo isso parece tão surreal, mas ao mesmo tempo, é a coisa mais certa que já aconteceu.
— Sim, eu aceito, Mika. Serei seu namorado.
Ele me puxa para um abraço apertado, beijando minha testa carinhosamente.
— Agora que isso está resolvido, acho que podemos lidar com a apresentação ao seu pai, não acha?
Assinto, ainda sorrindo.
— Bem, não precisamos sobrecarregá-lo com todos os detalhes agora. Mas ele precisa de alguma explicação para o motivo de eu ficar aqui tanto tempo. Não quero que o Chefe Hyakuya emita um mandado de prisão.
— Você vai ficar? — pergunto. — Vai ficar aqui mesmo?
— Até quando você me quiser — ele assegura.
— Eu sempre vou querer você — aviso. — Para sempre. Isso te preocupa?
Ele não responde, apenas olha nos meus olhos por um período insondável.
— Você já terminou? — pergunta, por fim.
Levanto-me de um salto. — Sim.
— Vá se vestir, eu espero aqui.
Foi difícil decidir o que vestir. O que usar quando seu novo namorado vampiro vai te apresentar à sua família de vampiros? Acabo optando por uma calça moletom preta, casual, e uma camisa de manga vermelha.
— Muito bem — desço as escadas. — Estou pronto.
Ele está esperando por mim no pé da escada, mais perto do que imagino, e acabo colidindo com ele.
— Você está muito indecente, ninguém deveria ser tentador assim, não é justo.
— Tentador como? — pergunto, enquanto tento manter uma expressão séria.
Ele suspira, balançando a cabeça. — Você é realmente incrível. — Pressiona os lábios suavemente na minha testa. — Será que devo explicar como você é tentador para mim? — pergunta retoricamente. Ele passa os dedos lentamente pela minha coluna, e sua respiração acelera na minha pele. Minhas mãos estão em volta de seu pescoço, e minha cabeça fica leve novamente. Ele abaixa a cabeça lentamente e toca seus lábios nos meus por um segundo, muito cuidadosamente, fazendo-os se entreabrir.
— Por favor, continue...
Ele sorri de maneira maliciosa, com um brilho travesso nos olhos. — Bem, veja, Yuu-chan, é como se o universo inteiro conspirasse para me enlouquecer com o desejo. Cada olhar, cada sorriso, cada toque seu parece um convite irresistível para me perder em você. E quando nossos lábios se tocam, é como se uma faísca elétrica percorresse meu corpo inteiro, como se o tempo se dilatasse, e o mundo desaparecesse, restando apenas nós dois. Você é a minha maior tentação, e eu não posso resistir a você.
Ele inclina-se novamente, seus lábios encontrando os meus em um beijo ardente, e todas as palavras se perdem na explosão de paixão. O mundo ao nosso redor desaparece, e tudo o que importa é o calor dos nossos corpos se entrelaçando, e o amor que queima entre nós como uma chama eterna.
— Acho que deveríamos ir... — digo, com a voz entrecortada, separando nossos lábios.
— Você estragou o clima — ele suspira.
— Você está muito assanhado, Mika! — brinco, batendo em seu ombro. — Olha, estou me esforçando muito para não pensar no que estou fazendo, então podemos ir?
Ele sorri — Vamos.
Percebo, enquanto ele conduz minha caminhonete em direção ao centro da cidade, que não faço ideia de onde ele mora. Passamos pela ponte do rio e seguimos pela estrada que leva ao norte, as casas crescendo em tamanho à medida que avançamos. Outras residências passam lado a lado, todas rumando em direção à vastidão da floresta. Enquanto me pergunto se devo perguntar ou aguardar pacientemente, ele vira em uma estrada de terra. Não há sinalização; a estrada é quase invisível entre as árvores imponentes. A floresta se estende dos dois lados, obscurecendo a visibilidade da estrada, que só é perceptível devido às sinuosas curvas que contornam as árvores antigas.
Após alguns quilômetros, algo começa a brilhar entre as árvores, e subitamente, uma pequena clareira se revela, ou seria mais adequado chamar de um quintal? No entanto, o resplendor da floresta não desaparece, pois seis árvores majestosas cercam o local em todas as direções. As sombras projetadas mantêm a casa mergulhada na penumbra, desafiando minhas primeiras suposições.
A casa, com seu estilo antigo e gracioso, parece ter aproximadamente um século de existência. Sua cor branca desgastada emana uma sensação de história. Com três andares, a estrutura tem um formato retangular bem proporcionado. As janelas e portas, aparentemente originais ou restauradas com esmero, fazem parte da estética da casa. Minha caminhonete é o único veículo à vista, e o som de um rio próximo ecoa, mas ele permanece escondido na escuridão da floresta.
— Uau.
— Gostou? — ele sorri.
— Tem um certo charme.
— Pronto? — pergunta.
— Nem um pouco, mas vamos lá. — Tento sorrir, mas minha garganta parece apertada.
— Você está tenso. — diz, enquanto pega em minha mão..
Caminhamos pelo longo corredor de entrada, e ele gentilmente abre a porta.
O interior da casa revela-se ainda mais surpreendente e imprevisível do que o exterior. O ambiente é espaçoso, aberto e luminoso, uma modificação aparente de diversos quartos que foram combinados ao longo do tempo para criar um espaço amplo e contínuo. O lado sul é dominado por uma extensa parede envidraçada, que, além de filtrar a luz natural e projetar sombras das árvores, oferece uma vista deslumbrante do quintal que se estende até as margens de um majestoso rio. Uma escadaria imponente enfeita o lado oeste da sala. As paredes, o teto baixo, o assoalho de madeira polida e os delicados tapetes são todos mantidos em tons de branco, criando uma sensação de serenidade e luminosidade.
À esquerda da porta de entrada, encontro as mães de Mika, próximas a um impressionante piano. A Dra. Tepes, é a primeira a chamar minha atenção, e não posso deixar de ficar sempre surpreso com sua aparência jovem e deslumbrante. Ao seu lado, presumivelmente, está Mahiru, a única membro da família que ainda não tive o prazer de conhecer. Ela tem uma tez semelhante aos outros, porém não tão pálida. Seu rosto é esguio, com cabelos em um tom lilás que me fazem lembrar personagens de quadrinhos. Mahiru tem uma estatura média, é esbelta, e seus traços são mais angulares com curvas mais acentuadas em comparação com outros membros da família. Ambas estão vestidas casualmente, suas roupas claras harmonizando com a estética da casa. Embora nos cumprimentem com sorrisos acolhedores, mantêm uma distância respeitosa, como se tentassem não me intimidar.
— Krul, Mahiru — a voz de Mika quebra o breve silêncio. — Conheçam Yuu.
— Seja bem-vindo, Yuu — diz Krul enquanto se aproxima. Ela estende os braços em minha direção, e dou um passo à frente para abraçá-la.
— É bom vê-la novamente, Dra. Tepes.
— Por favor, me chame de Krul.
— Krul — sorrio para ela, surpreso com minha súbita confiança. Posso sentir o alívio de Mika ao meu lado.
Mahiru também sorri e dá um passo à frente, estendendo a mão na minha direção. Seu aperto frio e firme, exatamente como eu esperava.
— É um prazer conhecê-lo — diz sinceramente.
— Obrigado. É um prazer conhecê-la também. — E é mesmo. É como conhecer um personagem de quadrinhos ou contos de fadas, pela sua aparência.
— Onde estão Chess e Horn? — Mika pergunta, mas ninguém responde, pois elas aparecem no topo da escada.
— Ei, Mika — Chess chama, animada. Ela desce correndo a escada, uma mistura de cabelos lilases e pele pálida, e para graciosamente na minha frente. Krul e Mahiru lançam olhares de advertência, mas eu a recebo de bom grado. Parece ser algo natural para ela, pelo menos. — Olá, Yuu — diz, inclinando-se para me dar um beijo na bochecha. Os rostos de Krul e Mahiru exibem surpresa no começo, mas agora estão nitidamente alarmados. Sinto Mika tenso ao meu lado, e observo seu rosto, mas sua expressão permanece impenetrável. — Você realmente tem um cheiro ótimo, não tinha notado antes. — comenta.
Ninguém parece ter exatamente as palavras certas, mas então Horn está lá, alta e graciosa. Uma onda de tranquilidade percorre meu corpo, e de repente me sinto completamente à vontade, onde quer que eu esteja.
— Olá, Yuu — Horn cumprimenta, mantendo uma distância que é ao mesmo tempo respeitosa e calorosa, seu sorriso doce sendo contagiante.
— Olá, Horn — respondo, um pouco envergonhado, e depois, aos outros. — Vocês têm uma casa linda aqui — faço um comentário casual.
— Obrigada — Mahiru responde com sinceridade. — Estamos muito felizes por você ter vindo. — Seu olhar revela admiração, e percebo que ela me considera corajoso.
Lembro que Lacus e René não estão à vista. O olhar de Krul me chama a atenção; ela está observando Mika atentamente. Perifericamente, vejo Mika acenar levemente com a cabeça.
Meus olhos vagueiam e pousam no magnífico piano na sala. Mahiru percebe minha expressão pensativa.
— Você toca? — ela pergunta, inclinando a cabeça na direção do piano.
Balanço a cabeça. — Não, de jeito nenhum. Mas é um instrumento lindo. É seu?
— Na verdade, não — ela ri. — O Mikaela sabe tocar, ele não te contou?
— Não, na verdade não mencionou isso — olho para Mika, surpreso. — Nem um pio.
Mahiru levanta as sobrancelhas, confusa.
— Mika é bom em muitas coisas, não é? — explico.
Horn ri suavemente, e Mahiru dá a Mika um olhar repreensivo.
— Espero que não tenha ficado se gabando — ela brinca.
— Jamais — ele sorri. A expressão dela se suaviza com o som e eles trocam um olhar que não consigo decifrar, embora Mahiru pareça quase ter antecipado isso.
— Na verdade, ele foi até muito modesto — retifico.
— Bem, toque para ele — Krul incentiva.
— Você acabou de dizer que eu não deveria me gabar — ele responde.
— Toda regra tem exceções — Mahiru replica.
— Eu adoraria ouvi-lo tocar — ofereço.
— Está decidido, então — Mahiru o empurra na direção do piano. Ele me leva com ele, fazendo-me sentar ao seu lado no banco.
Ele me lança um olhar longo, quase exasperado, antes de girar as chaves do piano. Em seguida, seus dedos flutuam rapidamente sobre as teclas, preenchendo a sala com uma composição complexa e requintada, algo que parece quase impossível para apenas duas mãos. Meu queixo cai, minha boca fica entreaberta de espanto, e ouço risadas por trás de mim devido à minha reação.
Mika me observa casualmente enquanto a melodia continua a soar ao nosso redor, sem pausa.
— Você gosta? — ele pergunta.
— Você compôs isso? — gaguejo, finalmente compreendendo.
Ele acena com a cabeça. — É a música favorita de Krul.
Fecho os olhos, balançando a cabeça.
— Qual é o problema? — ele pergunta.
— Eu também toco, sabia? Não é piano, e com certeza não sou tão bom quanto você, mas... é divertido — respondo.
— Isso é incrível! — ele parece genuinamente entusiasmado. — O que você toca?
— Bateria. É apenas um hobby, na verdade. Gosto de tocar algumas músicas e criar minhas próprias batidas.
Ele me olha com curiosidade, e eu me pergunto se está tentando ler meus pensamentos. Mas logo ele sorri.
— Um baterista, hein? Isso é interessante. Você já tocou para alguém antes?
— Não muitas vezes, apenas para amigos e familiares. Infelizmente, não consegui trazer minha bateria para cá. Mas eu realmente gosto disso.
Mika parece pensar por um momento. — Eu adoraria ouvir você tocar algum dia, Yuu-chan.
— Adoraria te mostrar. — Sorrio para ele.
— Tocar bateria deve ser um talento incrível, Yuu. Estou ansioso para te ouvir também — diz Mahiru, se juntando à conversa.
Chess sorri enquanto se aproxima. — Isso parece emocionante. Adoraríamos ouvir também.
Horn apenas assente com um sorriso gentil.
— Elas gostam de você, sabia? — ele diz casualmente. — Especialmente a Krul.
Olho para trás, e a sala enorme está vazia agora.
— Onde elas foram?
— Estão tentando nos dar privacidade, suponho.
Suspiro. — Elas gostam de mim. Mas Lacus e René... — paro, não tendo certeza de como expressar minhas dúvidas.
Ele faz uma careta. — Não se preocupe com Lacus — diz, com seus olhos grandes e persuasivos. — Ele vai aparecer.
— E o René?
— Bem, ele acha que sou um lunático, o que é verdade, mas ele não tem problema com você. Ele só é reservado demais.
— Por que isso o incomoda tanto? — não tenho certeza se quero saber a resposta.
Ele solta um suspiro profundo. — René tem mais problemas com... com você ser humano. Para ele, é difícil ter alguém de fora sabendo a verdade.
— E a Horn...
— Na verdade, isso é por precaução — ele explica. — Ela achou melhor manter uma certa distância já que foi a última de nós a tentar se adaptar ao nosso estilo de vida.
— E a Krul e a Mahiru? — pergunto rapidamente.
— Estão felizes por me ver feliz. Na verdade, a Mahiru não se importaria se você tivesse três olhos e pés gigantes. Por muito tempo, ela temia por mim, achando que perdi algo essencial com a transformação, que era jovem demais quando a Krul me transformou... elas estão radiantes. Toda vez que eu te toco, elas quase explodem de alegria.
— A Chess parece bem... empolgada.
— A Chess pode ser meio temperamental às vezes, mas ela tem sua própria forma de ver as coisas — ele diz com os lábios apertados.
— Você não vai me explicar, vai?
Há um momento de comunicação silenciosa entre nós. Ele percebe que eu sei que ele está escondendo alguma coisa. Eu percebo que ele não me contará nada. Pelo menos, não por enquanto.
— O que Krul estava tentando dizer antes?
Ele franze a testa. — Você percebeu, não é?
Dou de ombros. — Claro.
Ele me olha pensativo por alguns segundos antes de responder. — Ela queria me contar uma novidade, mas não sabia se devia compartilhá-la com você.
— E você vai me contar?
— Tenho que fazer isso, porque ficarei um pouco... insuportavelmente protetor nos próximos dias ou semanas.
— Mais do que você já é? — brinco. — O que está errado?
— Nada há algo errado, necessariamente. Chess viu alguns visitantes se aproximando. Eles não são como nós, pelo menos em relação aos hábitos alimentares. Provavelmente nem aparecerão na cidade, mas certamente não tirarei os olhos de você até que eles tenham ido embora.
— Ah, tudo bem. — digo, desviando o olhar e observando a sala novamente.
Ele segue meu olhar. — Não é o que você esperava, não é? — pergunta com uma voz presumida.
— Não — admito.
— Sem caixões, sem caveiras empilhadas nos cantos; não acho que tenhamos teias de aranha... Que decepção isso deve ser para você, Yuu-chan. — Ele continua brincando.
— Cala a boca.
A música que ele ainda está tocando, chega ao fim, as notas finais se transformam em um tom mais melódico. A última nota ecoa no silêncio.
— Quer ver o resto da casa?
— Não tem caixões? — pergunto, minha voz carregada de sarcasmo.
Ele sorri, pega minha mão e me conduz longe do piano.
— Sem caixões — promete.
Subimos a grande escadaria, minha mão deslizando pela superfície do corrimão delicado. O corredor que segue as escadas é revestido com uma madeira de cor suave, semelhante à do chão.
— O quarto de René e Lacus... o escritório de Krul... o quarto de Chess — ele faz gestos enquanto passamos pelas portas. — Você está bem?
— Quantos anos todos têm aqui? — pergunto em voz baixa, ignorando sua pergunta.
— Krul tem um pouco mais de 2000 — responde.
Olho para ele, com inúmeras perguntas nos olhos.
— Krul nasceu no Japão, acredita ela. Foi em um século muito antigo, muito antes dos tempos modernos, por isso é impossível determinar uma data exata.
Mantenho minha expressão impassível, consciente de que ele me observa enquanto eu ouço. É mais fácil se eu tentar não acreditar no que estou ouvindo.
— Os outros têm menos do que isso, é claro, não passam de mil anos.
Ele para. Percebo que está omitindo algo.
— Como está se sentindo? — ele pergunta.
— Estou bem — asseguro. Depois de morder o lábio com hesitação, ele deve perceber a curiosidade que queima nos meus olhos.
Ele sorri. — Espero que tenha mais perguntas para mim.
— Algumas.
Seu sorriso aumenta, revelando seus dentes brilhantes. Continuamos andando pelo corredor, ele puxando minha mão.
— Venha, então — ele incentiva. — Vou lhe mostrar.