Os demônios que habitam em mim

Cap IX

O treinamento deu resultados inesperados, incluindo uma mudança de cor nos meus olhos, os deixando verdes. Segundo Remiel, essa é a cor natural dos meus olhos quando meu poder aflorar e o que é preciso é controlar na presença de humanos. Principalmente os que sabem que meus olhos são escuros.
Nessa manhã fui parado por minha vizinha de janela, uma senhora de setenta e dois anos que mora sozinha com dois gatos e um cachorrinho pequeno.
_Bom dia Dona Florência! Respondi encontrando com a mesma que colocava seu lixo na rua por ser dia de coleta
_Bom dia Liam, me olhou um pouco estranho
_Algum problema? Perguntei analisando seu rosto e percebi que estava diferente, porém inventou uma desculpa qualquer e entrou
Mais tarde naquele mesmo dia o senhor Fox disse que ouviu boatos sobre mim, mas não levou em consideração.
_Que tipo de boatos? Perguntei confuso
_Alguém próximo, falou olhando constantemente para a casa de minha vizinha como se dissesse sem falar que era ela _Disse que você é um vampiro ou algum tipo de ET
_Oi? Perguntei pasmo direcionando meu olhar para a casa da senhora que estava nos espionando na janela
_Ela disse que seus olhos mudaram de cor, igual nos filmes, mas não dê bola, afinal o que esperar de uma senhora que fala com suas flores?
_Tem razão, falei dando uma risadinha um pouco preocupada
Fui para a aula e tentei controlar qualquer coisa que estivesse influenciando meus poderes a se manifestar, talvez fosse alguma preocupação que o fizesse. Tomei cuidado e até usei óculos de sol para garantir que não houvesse nenhum problema de mal entendido por aí. Uma senhora ver e contar é algo para se duvidar, uma criança tem tão pouco prestígio quanto o idoso, isso também vale para um adolescente rebelde.
Mas um adulto sensato? Não posso arriscar!
Cheguei na escola e avistei Sofia próxima aos armários, que por coincidência também era próximo do meu. O que dava uma bela oportunidade para conversarmos.
_Oi Sofia, como foi sua noite? Perguntei puxando assunto
_Liam? Bem, obrigada pela carona e ajuda..
_Sem problema, falei interrompendo a mesma que deu um sorriso sem graça
_Sabe, desculpa também! Fui fria com você por um mal entendido... Falou revelando o motivo de estar tão na defensiva
_Tudo bem, você estava assustada. Respondi amigavelmente
_E aí gente, falou Josh se aproximando _Liam! Exclamou pulando no meu pescoço _Controla seus olhos! Cochichou _Ta me evitando? Brincou como se nada tivesse mudado
_Capaz, falei vendo meu reflexo na tela do celular _Tava esperando para irmos para aula, respondi sem graça
_Fizeram as pazes? Perguntou me deixando sem graça, afinal não tinha falado com Josh sobre como me senti com tudo aquilo dele ser um nefilim
_Quando um cara fica brigado com outro por um dia inteiro? Jamais! Brincou dando um sorriso largo
Me fez pensar se em algum momento ele já fez isso sem realmente se sentir, tipo só um fingimento bobo. Não que eu me importe, mas contei coisas das quais ele já sabia e fiz isso com muita dificuldade por levar tanta coisa em consideração. Porém ele talvez nunca realmente se importou, talvez nunca nem ligou para meus pensamentos e só me tratou como uma babá trata a criança que cuida. Com superioridade!
_Bom, a gente se vê por aí meninos, tchau! Falou indo para sua sala
_Tchau, respondeu logo me soltando _Ta ficando frequente, precisa se controlar!
_Não diga o óbvio, respondi na defensiva
_Ainda de mal? Perguntou arrogantemente
_Não, só não faça isso como se fossemos amiguinhos que fazem trancinhas no cabelo do outro
_Que seja, quantas vezes hoje? Perguntou referente ao problema atual
_Umas cinco, eu acho, mas só uma pessoa viu e ninguém vai levar ela a sério
_Saquei, mais cuidado!
_Eu sei! Respondi evitando conversar
_Falar que é impressão é uma alternativa, falou
_Eu sei, ou que eu sou algum tipo de vampiro segundo minha vizinha
_Vampiro? De dia? Só se for um Edward Cullen!
_Ah não! Muita purpurina, deixei uma risada escapar e Josh fez o mesmo
_Sabe eu sei que tá chateado porque parece que eu menti e fingi com você como se fosse um humano burro, mas não foi assim.
_Humano burro? Prefiro mundano!
_Para mim a gente se dar bem não foi fingimento, nem o resto, só não contei sobre minha origem, mas se for pensar você fez o mesmo cara!
_Tuche! Resmunguei
Não abraçamos, nem fizemos perguntas óbvias se tínhamos voltado a ser amigos, isso não condizia com nossa personalidade. Só sorrimos um para o outro que sabíamos que estávamos de boa, que as mortes previstas eram só de demônios e não entre nós.
_Sofia me viu assim ontem, falei de uma vez só baixo para que ninguém mais ouvisse além de nós
_Como é que é? Perguntou incrédulo
_Inventei que era impressão dela, acho que deu certo!
_Certeza? Levantou a sobrancelha ainda com dúvida
_Sim, mas se fosse eu acreditaria mais que meus olhos são resultados de atitudes vampirescas! Falei fazendo gesto com meus dedos como se espalhasse purpurina com eles, purpurina essa que Edward Cullen usou para dizer que sua pele brilhante era de um assassino e não de um cara que esbarrou na parada gay.
_Ela agiu normal com você, acho que ela acreditou na sua teoria seja ela qual for
Estava a caminho da minha sala de aula quando vejo uma porta entreaberta e uma sombra lá dentro, uma ponta de curiosidade bateu o suficiente para espiar o que estava acontecendo ali dentro.
Era Sofia.
Ela estava de cabelos presos em um coque alto e bagunçado, sua franja curta não ficava presa ficando em seu rosto. Sua concentração era impressionante, era como se nada existisse, a luz do sol que batia naquele horário me fazia duvidar se não havia mais anjos na Terra.
Estava linda. Leonardo Da Vinci e Vicent Van Gogh, ou qualquer outro, teriam inveja da vista privilegiada que eu possuía. Estava tão iluminada, tão pura, que parecia a própria lua na luz do dia.
Senti um calorzinho percorrer meu corpo pelas minhas veias, indo até meu coração e me fazendo suspirar, invés de respirar. Era aconchegante a sensação, tão aconchegante que me fazia sorrir involuntariamente para o nada sem nem perceber.