━━━━━ ◇ 𝐋𝐞𝐨𝐧𝐢𝐬 ◇ ━━━━━
Depois de toda aquela confusão, no dia seguinte, ainda tive que aturar o teatro que Draco fazia. Ele agia como se tivesse acabado de voltar de uma guerra, se sentindo um herói, ou um guerreiro corajoso. Mas ele não passava de um idiota que arrumou problemas para cima de Hagrid.
— Está doendo muito, Draco?
— A dor vai e vem... - ele se exibia para Pansy Parkinson. - Mas, eu acho que tive sorte. Segundo a Madame Pomfrey, mais um minuto e eu podia... Huh... Ter perdido o braço...
Revirei os olhos diante daquele papo furado.
— Coitadinho... - Pansy falou, com dó.
Já estava sem paciência. Minha vontade era de jogar com força meus livros em cima da mesa na frente para eles, para os assustar. Mas como sempre, me mantive sob controle. Ao menos enquanto podia.
Sentei-me ao lado de Harry, estando uma pilha de nervos.
— Estou preocupado com o Hagrid! - eu falei, antes de dar um gole no suco. - Vi Lucius hoje no corredor. Tenho certeza de que esse maldito falou para o pai o que houve.
— Droga... Hagrid pode se encrencar.
— É... E se isso acontecer, é bom que Draco Malfoy esteja bem longe. Ou Madame Pomfrey vai ter um belo de um trabalho para recolher os pedaços do corpo dele que sobrarem.
Harry achou tão engraçado o que eu disse que saiu suco de abóbora pelo seu nariz. Logo, foi a minha vez de rir da situação.
Ele tinha mesmo a habilidade de me deixar mais calma...
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Draco não reapareceu nas aulas até o fim da manhã de quinta-feira, quando nós da Sonserina e os alunos da Grifinória já estávamos na metade da aula dupla de Poções. Ele entrou cheio de arrogância na masmorra, o braço direito enfaixado e pendurado em uma tipoia.
— Como vai o braço, Draco? — perguntou Pansy Parkinson. — Ainda está doendo muito?
— Está... — respondeu o garoto, dengoso.
Mas o vi piscar para Crabbe e Goyle, quando Pansy desviou o olhar.
— Vá com calma, vá com calma... - disse Snape gratuitamente.
Harry, que estava sentado com Rony, olhou para mim entediado com a situação. Snape não teria dito "vá com calma" se nós tivéssemos entrado atrasados, e sim teria nos dado uma detenção. Mas Draco, que era seu queridinho, sempre conseguia escapar com qualquer coisa nas aulas de Poções.
Estávamos preparando uma poção nova naquele dia, uma Solução Redutora. Draco olhou alguns segundos para mim, mas armou seu caldeirão bem ao lado do de Harry e Rony, de modo que os três ficaram preparando os ingredientes na mesma mesa.
— Professor... — chamou Draco. — Vou precisar de ajuda para cortar as raízes de margarida, porque o meu braço...
— Weasley, corte as raízes para Malfoy... - disse Snape sem erguer a cabeça.
Rony ficou vermelho como um tomate.
— O seu braço não tem nenhum problema! — sibilou o garoto para Draco.
Draco deu um sorriso satisfeito.
— Weasley, você ouviu o que o professor disse! Corte as raízes.
Rony apanhou a faca, puxou as raízes de Draco para perto e começou a cortá-las de qualquer jeito, e os pedaços ficaram de tamanhos diferentes.
— Professor! — falou Draco com a voz arrastada — Weasley está mutilando as minhas raízes.
Snape aproximou-se da mesa, olhou para as raízes por cima do nariz curvo e em seguida deu a Rony um sorriso desagradável, por baixo da cabeleira longa e oleosa.
— Troque de raízes com Malfoy, Weasley.
— Mas, professor...!
Rony passara os últimos quinze minutos picando cuidadosamente suas raízes em pedacinhos exatamente iguais.
— Agora! — mandou Snape com o seu tom de voz mais perigoso.
Rony empurrou as raízes caprichosamente cortadas para o lado de Draco na mesa, e, em seguida, apanhou novamente a faca.
— E, professor, vou precisar descascar este pinhão... — disse Draco, a voz expressando riso e malícia.
— Potter, pode descascar o pinhão de Malfoy... — disse Snape, lançando a Harry o olhar de desprezo que sempre reservava só para o garoto.
Harry bufou e apanhou o pinhão enquanto Rony começava a tentar consertar o estrago que fizera às raízes que ia ter que usar. Harry descascou o pinhão o mais depressa que pôde e atirou-o para o lado de Draco, sem falar. O outro riu com mais satisfação que nunca.
— Tem visto o seu amigo Hagrid, ultimamente? — perguntou Draco aos dois.
— Não é da sua conta! — retrucou Rony aos arrancos, sem erguer a cabeça.
— Acho que ele não vai continuar professor por muito tempo... — disse Draco num tom de fingida tristeza — Meu pai não ficou nada satisfeito com o meu ferimento...
— Continue falando, Draco, e vou lhe fazer um ferimento de verdade... — rosnou Rony.
— ... Ele apresentou queixa aos conselheiros da escola. E ao Ministério da Magia. Meu pai tem muita influência, sabe. E um ferimento permanente como este... - ele fingiu um longo suspiro — Quem sabe se o meu braço vai voltar um dia a ser o mesmo?
— Então é por isso que você está fazendo toda essa encenação... — comentou Harry, decapitando sem querer uma lagarta morta, porque sua mão tremia de raiva — Para tentar fazer Hagrid ser despedido.
— Bom... — respondeu Draco, baixando a voz para um sussurro — Em parte, Potter. Mas tem outros benefícios, também...
Eu tinha aguentado a raiva que nutria por Draco até aquele momento, mas depois de ouvir que ele estava fazendo aquilo para prejudicar meu amigo, eu não iria mais permitir que ele fizesse o que bem quisesse. Levantei-me em fúria da cadeira, lhe dando um tapa forte da bochecha. Ele se assustou, e não foi o único, pois até mesmo Rony e Harry olharam estupefatos para mim.
— SEU... SEU...
Senti que minha cara estava em chamas, e meu corpo todo tremia e queimava.
— EXPELLIARMUS!
Da ponta da varinha do professor, saiu um jorro de luz, que veio na minha direção. O jorro foi tão forte que me fez bater na parede de pedras, e escorregar até cair no chão.
— LEO!! - Harry correu até mim, me ajudando a levantar. - PROFESSOR! VOCÊ O MACHUCOU!
— Saia daí, Potter...
O professor me encarava furioso. Andou até mim em passos lentos, ainda apontando a varinha para mim. Encostou a ponta dela na minha bochecha, me deixando assustado.
— Professor... Eu... Eu não quis...
— SILÊNCIO! - ele gritou, ecoando pela sala. - Saia da minha sala agora!
━━━━━ ◇ 𝐇𝐚𝐫𝐫𝐲 ◇ ━━━━━
Eu cerrei os pulsos, tentando me segurar para não matar Malfoy ali, na frente de todo mundo.
— VIU O QUE VOCÊ FEZ? - fui até ele. - A CULPA É TODA SUA!
Ele não reagia. Estava em choque, com a boca aberta e os olhos arregalados, assim como metade daquela sala - incluindo Rony e Mione. Snape não gostou nada de eu ter gritado no meio da sua aula.
— Senhor Potter, sente-se imediatamente.
— E o senhor? - eu me virei para encará-lo. - Como pode o atacar daquele jeito?
— Ora, seu moleque arrogante! - disse Snape, caminhando na minha direção. - Está questionando a minha autoridade, Senhor Potter?
— Que autoridade?! - disse, já sem estribeiras.
— Muito bem, então... - ele me deu as costas. - Cinquenta pontos a menos para Grifinória. E pode sair desta sala também! Detenção para o senhor e para a senhor Leonis.
Ele soltou uma risadinha desdenhosa e parou na frente do quadro negro, esperando que eu me retirasse da sala. Peguei o meu material em cima da mesa e, em uma última encarada, empurrei os tubos de ensaio de Draco no chão, que caíram virando um milhão de pedaços, além de derramar o seu caldeirão com a poção.
— Nos vemos depois, Rony... - falei.
— B-Boa sorte... - ele falou.
Passei pela porta, quase a quebrando com a força que a bati. Estava tão possesso. Sempre odiei Snape e Malfoy, mas aquela tinha sido a gota d'água.
A primeira pessoa que vi quando saí foi Leonis
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Com as lágrimas escorrendo pelo meu rosto, eu permaneci próximo da porta da sala de Snape. Pude ouvir toda a discussão dele com Harry, e a forma como ele me defendeu aqueceu o meu coração.
Me senti tão feliz de saber que eu tinha mesmo encontrado um amigo verdadeiro, que estava lá por mim, que mal conseguia conter o choro. Entretanto, engoli tudo aquilo porque Harry havia saído de sala.
— Snape me expulsou... - ele disse como se não fosse nada demais.
— É, eu estou vendo...
— Eu meio que falei que ele estava errado em te atacar daquele jeito. - Harry aproximou-se de mim. - E que Malfoy deveria ser punido pelo que fez e...
— Sim, eu escutei tudo atrás da porta. - eu sorri, sem graça. - Por que fez isso? Você é doido, ou o quê?
— Eu não podia ver ele te tratar daquela forma! - ele cerrou os dentes. - Ele é um idiota!
— Ele sempre implica comigo. Já me acostumei com isso.
— Não é justo que ele te trate daquela maneira. Eu não ia ficar calado vendo aquele absurdo!
Eu sorri de novo. Desta vez de alegria.
— Puxa... Valeu, Harry.
— Pelo que?
— Por isso... Você sabe. Por me defender desse jeito. - eu expliquei. - Eu fico feliz de saber que escolhi o cara certo.
— Como assim o cara certo?
— Que-quero dizer o amigo certo! Eu acabei me confundindo, só isso... Hehe...
— Bom... Se é assim, eu também fico feliz por ter te escolhido como melhor amigo. Você é dez, Leo!
— Sério?
— Sério. Não deixa o Malfoy, o Snape, ou qualquer outro idiota te dizer o contrário, entendeu? Eu vou estar aqui para te lembrar disso.
— Eu... Vou tentar me lembrar disso...
Sentia minhas bochechas ardendo como se estivessem tocando brasas. Meus olhos simplesmente se recusavam a encarar Harry, por alguma razão. Minhas mãos suavam como se eu as tivesse colocado debaixo d'água e tremiam muito. E eu não conseguia entender o motivo daqueles sintomas.
— Bom... Acho que o melhor a fazer agora é esperar a próxima aula. - disse ele, me tirando de meus pensamentos. - Podemos sentar debaixo daquela árvore ali. A gente fica matando tempo.
— É... Acho que pode ser...
Eu me sentei na grama e encostei na árvore atrás de mim, deitando a cabeça para trás. Em seguida, Harry se sentou de frente para mim na grama, um pouco mais afastado, e deixou-se deitar por completo. Ficou alguns minutos encarando o céu perfeitamente azul que fazia naquele dia, mas por algum motivo, virou-se para me encarar de repente, com a cabeça apoiada na mão direita.
— Quer jogar snap explosivo? - ele sugeriu de forma calma. - Só pra gente não ficar parado.
— Hm... OK. Pode ser. - eu assenti. - Você trouxe o seu?
Snap Explosivo é um jogo de cartas mágicas em que os cartões explodem espontaneamente durante os jogos. O jogo é bem popular entre os alunos de Hogwarts. É um jogo de baralho onde usa-se as cartas para construir um castelo que pode explodir a qualquer instante. Quando você vê duas fotos idênticas, acerte o cartão com o topo da sua varinha - um ponto é seu. O jogador com mais pontos vence o jogo.
— Não. - respondi. - Você trouxe o seu?
— Trouxe... - disse ele, enfiando a mão na mochila até o fundo. - Eu amarrei as cartas com um elástico que encontrei na comunal anteontem.
Harry distribuiu as cartas na nossa frente e nós dois começamos o jogo. Até que estava bem divertido, afinal eu estava vencendo o Harry de lavada com dez pontos de diferença.
Foi quando ele resolveu conversar enquanto jogávamos.
— Leo... Como é sua relação com seus tios? Você já conhece o meu caso.
— Puxa, assim do nada?
— Fiquei interessado de repente... Se você não quiser falar sobre, tá tudo bem.
— Não, não... Eu não me importo de dizer. Ao menos, não para você, que eu conheço bem.
— Legal! - Harry comemorou.
— Enfim... É bem ruim se quer saber. Acho que não tanto quanto a sua, que você até já apanhou, mas continua sendo ruim. - eu falei, dando de ombros. - A única pessoa que me trata bem lá é minha tia Narcissa, mãe de Draco.
— Sério? Logo a mãe dele?
— É... Ela me trata como se eu fosse filho dela também. Isso nem sempre é positivo, porque tudo o que ela impõe para o Draco ela também impõe para mim.
— Não consigo nem imaginar como é a mãe dele. Tipo, como uma mulher pode ter dado a luz a uma pessoa tão... Tão... Desprezível?!
— Não se engane, Harry. Por mais que eu goste da minha tia, ela continua sendo grande apoiadora do meu tio Lucius. Tudo que ele faz, ela aprova. Ou seja, ela tem uma ética e moral diferente da gente... Muito diferente.
— Entendo...
— Eu acho que ela só me trata como seu filho por conta da irmã dela, minha mãe, que está PRESA!
— É, faz sentido.
— GANHEI! - gritei depois de ver o resultado do jogo.
— Droga! - Harry lamentou. - Você foi muito bom, Leo... Me venceu por sete pontos!
— Quer jogar de novo?
— Estou mais interessado na história da sua família. Vai, continua contando!
— Enfim, com o meu tio... Bem, ele não gosta de mim. Ele é fissurado em Draco e só pensa na educação dele. Ou seja, eu, que não concordo com a maioria das coisas que eles fazem, sou considerado uma má companhia para o filhinho dele.
— Que pesadelo... Deve ser horrível passar as férias com eles.
— Muito ruim mesmo. Quase não saio do quarto... É por isso que gosto tanto de Hogwarts! Porque eu me sinto em casa aqui.
— Eu também, Leo... Eu também. - disse Harry, se erguendo. - Eu fico muito impressionado com o quanto eu e você somos parecidos. Temos problemas parecidos.
— Além do assunto de família, temos reputações. Eu por ser filho de Bellatrix Lestrange e você por ser Harry Fucking Potter!
— Eu estou começando a achar que você está me copiando. - disse Harry, brincando comigo. - Vou cobrar direitos autorais!
— Até parece! Eu nasci primeiro, esqueceu?
— Só cinco meses de diferença!
— E também sou mais alto que você! - eu me aproximei dele para encará-lo de cima.
— Eu sou mais forte! - ele disse, erguendo os punhos. - Posso te derrubar onde e quando quiser!
— Ah, claro, claro! - eu ri, debochando dele. - DUVIDO!
— MEU PAU NO TEU OUVIDO! - Harry gritou muito alto. - HA HA HA HA HA!
— Shiiiiu! Fala mais baixo! Snape pode te ouvir da sala se gritar assim.
— Ainda acha que não sou capaz de te derrubar?
— Continuo duvidando!
— Então vamos ver! - disse ele, se endireitando. - BANZAI!
Harry de repente correu na minha direção, e com bastante força, agarrou a minha cintura. Graças aquela atitude, meu pé escorregou e meu corpo pendeu para trás. Dessa forma, eu caí sobre os livros de Harry no chão de grama. A ponta do livro de adivinhação espetou com força a pele das minhas costas, me fazendo ganir como um cãozinho machucado.
Harry caiu sobre mim, erguendo a cabeça com um sorriso de orelha a orelha no rosto. Ele conseguiu - tinha me derrubado mesmo.
— HÁ! - ele riu. - Eu disse que te derrubava!
— Pois é... Ai.
Mas muito mais do que isso, Harry produziu sentimentos ardentes dentro de mim, repentinamente. Olhando no fundo daqueles olhos de esmeralda, senti calafrios por todo o corpo. Minhas mãos e pés de repente ficaram frios, como se estivesse usando meias e luvas de gelo. Senti um pequeno choque na parte de trás da nuca, além das minhas bochechas estarem quentes.
E ele continuou onde estava, paralisado e ainda rindo, me torturando com aquele olhar terrivelmente atraente e aqueles lábios monstruosamente delicados e finos. As bochechas pigmentadas de cor de rosa, aquele sorriso de menino maroto estampado na cara e aquele caindo sobre o rosto dele me fizeram me sentir muito inseguro.
— HARRY...! LEONIS...!
A voz de Hermione soou próxima da sala de Snape, me salvando, afinal ainda estava com as costas sendo espetadas pela ponta do livro de Harry. Harry se ergueu do chão, com uma cara completamente diferente da anterior, enquanto encarava a direção onde Hermione estava.
E quando eu fiz o mesmo, senti que ia desmaiar.
Todos os alunos que haviam acabado de sair da aula de Poções estavam nos encarando. Alguns riam, outros faziam não com a cabeça, e ainda outros cochichavam e murmuravam coisas inaudíveis. Mas todos - sim, TODOS - eles definitivamente tinham visto a mesma cena: Harry em cima de mim no meio do gramado castelo.
— Acho que... - disse Harry, com a voz fraca. - Podem ter interpretado aquilo errado...
— AH, JURA?! - eu falei, me virando para encará-lo.
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