Zuriel

By St_N13

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O que você define como realidade? Para Luke, a realidade nunca fez muito sentido. Sua vida se resumia entre... More

Pétala 01 - O dia que eu não vivi...
Pétala 02 - O dia em que a conheci...
Pétala 03 - O dia em que minha mãe sorriu...
Pétala 04 - O dia em que recebi uma visita...
Pétala 05 - O dia em que me exercitei...
Pétala 06 - O dia em que morri.
Intermissão - Reclusão.
Pétala 07 - Mentiras.
Pétala 08 - Meu anjo da guarda falho.
Pétala 09 - Minha primeira luta.
Pétala 10 - Minha sorte ainda vai me matar.
Pétala 11 - Meu Tormento me persegue.
Pétala 12 - Dia das Bruxas com azar.
Epílogo - O começo do fim.
Intermissão - Meu menininho cresceu.
Pétala 14 - Uma deusa grega no Oregon.
Pétala 15 - Pequenas Estrelas.
Pétala 16 - União e Sincronia.
Pétala 17 - Com grandes poderes, vem uma pilha enorme de problemas.
Interlúdio - As consequências do que ele fez.
Pétala 18 - Bata primeiro, corra depois.
Pétala 19 - O Guardião dos Segredos.
Pétala 20 - A energia da vida.
Pétala 21 - Dias de treinamento.

Pétala 13 - Mudanças.

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By St_N13

Ciaossu!

Demorou, mas 'tamo de volta!

Deu um trabalho revisar todos os capítulos desse arco, sério. Ficou bem maior do que eu pensei que ficaria na versão final, mas espero que tenha continuado com o mesmo ritmo de antes.

Não tenho muito o que falar, além de que espero que vocês se divirtam. Eu sei que eu me diverti escrevendo.

Bom, de volta à rotina. Boa leitura a todos.

Ciao ciao...


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Mudanças.

Certa vez, eu ouvi dizer que essa é a única constância da vida em um universo tão vasto.

Nada permanece como está para sempre. Tudo sempre está mudando, se reconstruindo, devorando a si mesmo, destruindo tudo aquilo que se foi para renascer como algo novo em seguida..

O mesmo vale para as pessoas.


Até pouco tempo atrás, Luke Jonathan O'Brien era apenas mais um garoto de quinze anos com problemas — muitos deles, mentais.

Parecia não haver esperança para ele, que há tanto tempo não enxergava sentido ou motivos para continuar vivendo, mas isso foi até o mesmo descobrir sobre um mundo inteiramente novo e ainda mais perigoso que aquele ao qual estava acostumado.


Magia.


Ela é real, e flui por todo o mundo. Em mim, e em você. Em tudo que existe.

Cabe a você acreditar no que é ou não real. Para Luke, ela é muitíssimo real agora.


[ ... ]


— Prontos? — disse Moon, olhando com apreensão para os dois combatentes à sua frente. — Lembrem-se de que isso é apenas um treino, ok?

Luke sorriu enquanto assumia sua postura de luta.

— Relaxe. Até parece que você não confia em mim.

— Isso não é verdade, Babo. Eu acredito em você tanto quanto acredito na capacidade da Ária de levar o treino um pouco a sério demais.

— Oh, desculpe. Eu prometo que vou me segurar — Ária disse com um sorriso inocente.

Moon respirou fundo. Ao longo daquelas semanas, ela tinha visto Luke se machucar demais enquanto treinava e caçava aqueles monstros bizarros que surgiam na cidade.

Ele definitivamente não precisava de outra ida ao hospital!

— Foi um deslize, está bem? — Luke se manifestou, saindo da postura por cansaço e coçando a nuca. — Eu me distraí, e... enfim! Isso não vem ao caso. Podemos começar o treino agora? Eu tenho planos para essa noite.

— Oh, sério? — Moon mostrou-se estranhamente interessada. — Envolveria alguém em particular?

— Claro que sim. Eu, dois hambúrgueres e uma bacia de pipocas — ele respondeu com ar sonhador. — Hoje é a estreia de um anime novo que eu queria muito ver, então-

Moon revirou os olhos, mas não pôde deixar de sorrir – mesmo frustrada.

— Ah, claro. Você e seus desenhos...

Animes — Luke corrigiu. — Vem cá, por que você cisma tanto com eles? Você é asiática! Faz parte da sua cultura também!

— E você é americano. Faz parte da sua cultura fazer filmes adolescentes com enredos duvidosos e questionáveis, mas não vejo você gostando deles.

O grisalho até ia rebater, mas desistiu. Moon tinha um bom ponto.

— Pessoal — Ária chamou, erguendo um pouquinho sua mão. — O treino...

— Ária tem razão, é inútil discutir — a coreana respirou muito fundo, ignorando os pensamentos sobre a lerdeza do amigo. — Só tomem cuidado, está bem? E isso vale principalmente para você, Babo. Eu não quero ter que cuidar dos seus ferimentos de novo.

— Eu pensei que você gostasse de medicina.

Moon freou-se antes de responder.

Por um momento, a visão de seu suéter encharcando-se com o ferror rubro do sangue de seu melhor amigo tomou seus olhos, a fazendo reviver os detalhes daquela cena com muitos detalhes. Detalhes reais.

O cheiro, a textura. O medo, a dor, o desespero...

O sentimento de ter suas mãos tomadas pelo vermelho ainda a fazia ter pesadelos, mesmo depois de tanto tempo.

Porém, tudo sempre se esvai com um piscar de olhos.

— Hum. Talvez... eu não goste mais, não tanto quanto antes — disse, um tanto cabisbaixa — Ou então, talvez eu só esteja um pouquinho sobrecarregada, sabe?

Luke saíra de onde estava apenas para tocar gentilmente em seu rosto.

— Desculpe — sorriu, melancólico. — Meio que isso é minha culpa...

Moon já sabia que ele sentia suas preocupações e medos mais do que qualquer outra pessoa, por isso tinha que se manter forte para não distraí-lo, para que ambos tivessem um futuro juntos, depois da primavera.

Por ele.

— Está tudo bem — sorriu em resposta. — Eu só preciso conciliar melhor tudo que está acontecendo. Se está mesmo se sentindo culpado, trate de tomar mais cuidado quando você for bancar o caçador de monstros justiceiro, por favor.

Moon sentiu que seus cabelos não eram a única coisa que poderia estar derretendo ao vê-lo sorrir e afagar seu couro cabeludo antes de se afastar.

— Estamos prontos. Certo, Ária? — foi o que Luke disse antes de reposicionar-se, alguns metros à frente de Ária naquela clareira. — Quando quiser, senhora juíza...

— C-Certo — ela levou um apito aos lábios com cautela, olhando de um para o outro. — Preparar... Apontar...


PRIIII!


O soprar do apito foi o gongo que ambos precisavam.

Luke impeliu-se sem hesitação na direção de Ária, que segurava uma espada invisível. O garoto já sabia o que viria, tantas foram as vezes que aquele arco dourado o pegou de surpresa nos treinamentos anteriores...

Só que não hoje!

Quando seu corpo sentiu, instintivamente, que estava no alcance da claymore de sua Protetora, o grisalho freou bruscamente e ergueu um pouco de poeira enquanto agarrava o ar e o dobrava.

Ária já tinha iniciado o movimento enquanto empunhava a mais pura luz quando notou a breve deformação no tecido do espaço que o mesmo havia segurado.

Tal deformação antecedeu o erguer de uma onda de Trevas.

A Etérea não apresentou o mínimo de hesitação ao brandir novamente sua espada, e somente depois de partir a onda em duas que ela lembrou que seu Protegido estava do outro lado – mas, de alguma forma, ele havia sumido.

— Procurando alguém?

Luke havia apenas se abaixado.

Por crer fielmente que Ária teria um pequeno atraso para recuperar sua postura, graças ao tamanho e peso de sua arma, o O'Brien voltou a avançar ao ficar de pé e se surpreendeu quando a viu assumir uma postura defensiva, usando a lâmina como um escudo para se proteger.

Bem, isso obviamente não importaria.

Tente relaxar um pouco, garota — Moon ouviu a voz de Draco, o pequeno lobo que dizia ser o Guardião de Luke. Seu focinho saía de dentro de sua bolsa. — Aquele moleque pode ter inúmeros defeitos, mas ser incompetente em combate não é um deles.


TUM!


Diante de seus olhos, Luke repeliu a espada com o punho, que transbordava o elemento que emanava de sua alma.

Desarmada, Ária foi obrigada a recuar. O grisalho, por outro lado, foi motivado a continuar avançando enquanto replicava alguns dos movimentos que aprendera com Moon nos últimos dias.

Foi com um chute alto e giratório, porém, que o garoto sentenciou a si mesmo.

A Protetora não somente se protegeu de todos os golpes, como ainda agarrou seu pé no meio do movimento e o girou, arremessando-o contra uma das árvores do bosque.

Luke conseguiu desacelerar ao se concentrar, e sentiu os olhos arderem com um fulgor que irrompeu à sua frente.

Ária havia recuperado sua espada.

O grisalho apressou-se em mergulhar para o lado para evitar as costas da lâmina da claymore, que rachou o chão com o impacto de seu movimento. Com um ou dos movimentos de mão, Luke moldou dardos de trevas enquanto corria e os lançava, forçando sua Protetora e amiga a cortá-los rapidamente.

Ela nem viu quando Luke subiu numa árvore e saltou em sua direção, muito menos quando ele pegara um galho e o revestia com seu elemento.


TIM!


O choque das duas lâminas dispersou partículas translúcidas e negras no ar.

Luke foi repelido por uma rápida expansão de energia e girou no ar para cair de pé, assim conseguindo impulsionar-se outra vez contra sua oponente.

Entretanto, não foi o que ele fez.

— Mas o que...?! — Ária ofegou. Seu corpo estava pesado, impossibilitando-a de se mover.

— O que aconteceu? — Moon murmurou, confusa.

Draco sorriu de canto. Ele havia entendido, claro.

Moleque esperto...

— Você nem notou, não foi? — a cicatriz nos lábios de Luke sorriu enquanto o mesmo se colocava de pé. — Gravidade, minha cara. Todos os meus ataques que você cortou espalharam trevas no ar. Ao invés de deixar que se dissipasse, eu tentei manter tudo disperso no ar até que eu conseguisse o suficiente para te imobilizar.

Olhando com atenção, era possível ver uma espécie de névoa negra ao redor dos dois.

Luke suspirou. Estava exausto. Preparar aquela armadilha exigiu muito mais esforço do que ele estava acostumado.

— Vamos acabar logo com isso — ele desfez sua espada e jogou o galho fora. — Não era assim que eu imaginava minha primeira vitória, mas acho que serve.

Para sua surpresa, Ária sorriu com confiança por algum motivo.

— Você não deveria ter me deixado recuperar a Lone.

Para invocar sua armadura, a garota não precisava se mover, e essa ação produzia tanta luz como uma pequena estrela na Terra.

Em outras palavras, as trevas de Luke oscilaram e enfraqueceram, possibilitando que Ária empunhasse sua espada com as duas mãos e a cravasse no chão, dissipando toda a névoa paralisante que o garoto havia preparado em um instante.

O brilho o desorientou por tempo o suficiente. Quando sua retina havia parado de sambar com pontinhos de luz, suas costas doíam e Ária já estava ajoelhada sobre seu peito, segurando a mão que portava o anel com uma mão enquanto a outra enfiava a lâmina da espada ao lado de seu rosto.

— A luta só acaba — ofegou. — quando o oponente não puder mais lutar, seja imobilizado ou morto...

— Eu gostaria de evitar o "morto" — Luke atreveu-se a sorrir. — Eu me rendo.

Moon respirou com alívio ao soar o apito de novo. O treino acabou. Luke perdeu, mais uma vez. Ninguém havia se machucado, pelo menos não mais do que o normal.

— Eu cheguei tão perto... — o garoto resmungou ao se sentar.

Sua têmpora direita doía tanto quanto suas costas. O amargor de mais uma derrota já lhe era familiar, mas continuava sendo simplesmente intragável.

Ária, por outro lado, apenas sorriu e lhe estendeu a mão.

— É verdade — disse. — Você está indo muito bem para quem teve seu primeiro contato com a magia há pouco tempo.

Luke bufou ao ficar de pé. Sua linguagem corporal indicava sua impaciência.

— Ir bem não é o suficiente.

— Por que você está se cobrando tanto? — Moon questionou ao se aproximar. — Só o fato de você ter aprendido a usar seus poderes tão bem em uma batalha já deveria ser o bastante, não?

— Talvez, mas não quando você tem um alvo mágico nas costas que atrai uma psicótica sanguinária com foice e todos os seus outros amiguinhos góticos — só de lembrar de Lira, a cicatriz no peito de Luke ardia. — Se eu não consigo derrotar a Ária, não vou ter a menor chance se ela voltar.

A coreana revirou os olhos e tirou uma grama do ombro dele.

— ... O erro é você achar que vai lidar com tudo sozinho — sorriu. — Você não precisa se cobrar tanto. Eu... hum... nós duas vamos estar aqui caso algo de ruim aconteça, e... bom, você já sabe o que planejamos para que a Ária consiga atuar mais facilmente como sua Protetora.

— Não vejo como isso vá impedir os Ceifadores de vir atrás de mim...

— E não vai. Essa nunca foi a intenção. Mas pelo menos você vai ficar mais seguro.

Luke suspirou e encarou o anel em seu dedo. Se houvesse pelo menos uma forma de ficar mais forte em menos tempo...

Não seja apressado, garoto — Draco saiu da bolsa tiracolo de Moon enquanto coçava os olhos com as costas de sua patinha. — Seu treinamento... Uaaaah!... Seu treinamento mal começou. Ainda há muito que você não sabe sobre os poderes que residem nesse Artefato.

Antes que o garoto pudesse expressar seu ânimo em saber que teria mais aulas longas e demoradas – ou seja, chatas – com seu Guardião, um arrepio na espinha o fez se voltar ao horizonte e encará-lo.

Tormento — disse, junto de Ária, antes que Moon perguntasse. — Ele ainda tá se formando. Deve ter algo acontecendo na cidade!

A coreana não precisou de mais nada. Rapidamente, ela buscou um pequeno dispositivo em sua bolsa, que parecia muito um daqueles tocadores de MP3 antigos, e começou a mexer nos botões.

— O que você tá fazendo? — Luke quis saber.

— Sintonizando na rádio da polícia — ela falou, como quem dizia que o céu era azul ou que a água era molhada. — Eu estava sem nada para fazer, aí pensei em como poderia ajudar vocês a combaterem esses monstros. Eu considerei que eles tinham mais chance de aparecer quando algo de ruim acontecia, e a polícia sempre está por dentro do que acontece de ruim, então uma coisa levou a outra.

— ... Tá me dizendo que você casualmente modificou esse Foxypod pra sintonizar na rádio da polícia?

— Ah, ele também capta os sinais de tevê e rádio — ela deu de ombros. — Também funciona como um MP3 normal.

— Brilhante! — Ária aplaudiu, enquanto Luke, boquiaberto, voltava a se comparar com um desenho inacabado do Paint.

Será que não havia algo em que Moon não era perfeita?

Eventualmente, Moon captou a frequência que queria. Estava acontecendo uma perseguição a um veículo com indivíduos armados e mascarados que tinham acabado de assaltar uma joalheria no Distrito Norte.

— Isso explica porque a "fonte" parece estar se movendo — Luke ponderou, ouvindo Draco concordar com um bocejo. — Certo. Eu tô indo pra lá!

— A-Ah. Eu vou com você!

— Na-na-ni-na-não, mocinha. Você vai ficar! — ele segurou Ária pelos ombros. — E nem adianta protestar. Você pode ter aprendido a controlar melhor, mas aquele show de luzes te cansa e muito.

Mesmo que ela tentasse disfarçar, os sinais de cansaço ainda eram um pouco evidentes demais se você prestasse atenção nos mínimos detalhes.

Ainda assim, Ária era teimosa. Tão teimosa quanto ele.

— M-Mas...!

— Ele está certo, garota — Draco disse. — Sua liberação de energia em sua expansão de agora a pouco te desgasta demais. Você não está em condições favoráveis de lutar, além de que, por se tratar de uma perseguição, seria bom ter uma mobilidade decente. Você teria que estar com seu cem por cento de vigor para correr atrás de nós.

Moon repreendeu o lobo com o olhar ao ver Ária murchar.

— Não dê ouvidos a ele, meu bem.

— É, esse lobo idiota gosta de falar demais — Luke fez o mesmo, mas sorriu ao afagar os cabelos da amiga. — Não se preocupe, eu prometo que volto logo. Não é como se fosse algo que eu não fosse capaz de resolver sozinho.

O Artefato em seu dedo bruxuleou junto da chama escarlate em seu olhar. Isso fez Ária se sentir melhor, ao mesmo tempo que fez Moon se engasgar com o cuidado que queria demonstrar e desejar a ele.

Luke sabia o que ela queria falar, por isso lançou-lhe uma piscadela e se virou.

Draco — e uma luz negra o engoliu, assim que as trevas tomaram conta de seu corpo.


[ ... ]


Joalherias não eram tão difíceis assim de serem roubadas.

Quanto mais renomada for, maior será o lucro. Entretanto, isso também dificultava a entrada. Mas, se conseguisse passar pela segurança, uma vez dentro do local era só fazer a festa e arrecadar seus lucros.

Foi basicamente isso que eu aprendi com Payday.


— Não acredito no quanto isso foi fácil! — disse um dos mascarados enquanto recarregava sua pistola.

Outro mascarado riu, enquanto sua arma vomitava balas para distrair a polícia e assustar os civis.

— Claro que foi moleza, imbecil — disse o que estava no banco da frente, ao lado do motorista. — Por acaso você já viu algum plano meu falhar?

O líder deles tirou a máscara para respirar e riu ao olhar pelo retrovisor. Os tiros de aviso haviam funcionado, a polícia evitava se aproximar muito para não pôr os civis em risco. Agora eles só tinham que despistar as viaturas ziguezagueando pelo Distrito Norte e ir ao Distrito Sul.

No pior dos casos, seria na ponte Lakecross que eles iriam sumir completamente, e tudo graças àquele presentinho que haviam conseguido com o chefe.

Era o plano perfeito!

— Continuem assim — disse o líder. — Em breve, estaremos nadando em dinheiro!

Entretanto, o motorista não estava tão confiante.

— E se aquele cara dos boatos aparecer? — disse. Ele era um pouco mais jovem do que os demais e não possuía uma máscara. Seu disfarce era unicamente um óculos escuro. — Q-Quero dizer... o Fantasma.

Os demais riram com desdém e escárnio, talvez um pouco de histeria.

O Etolor disperso na atmosfera, gerado principalmente pela oposição que os sentimentos negativos causam em relação aos positivos, é como uma névoa que inebria e confunde os sentidos em casos onde a concentração é forte o suficiente para gerar uma manifestação física do que se sente.

Em outras palavras, claro que ninguém o levaria a sério.

— Só continue dirigindo! — o líder o acertou com um tapa na nuca. — Vai ser preciso mais do que uma lenda urbana para nos parar agora, moleque.

— Poxa, assim você me ofende... — disse uma nova voz, logo após uma curva fechada. — Alguém pode abrir a janela? Tá difícil de respirar aqui dentro com tanta soberba.

A névoa foi aspirada.

No banco de trás, um garoto usando um elmo havia aparecido e mantinha uma das bolsas com as joias no colo.

— Uh... Isso aqui tá pesado — Luke abriu a bolsa. — Oh, isso aqui é um diamante? Legal. É a primeira vez que eu vejo um. Vocês realmente se divertiram, hein.

— Que porra é essa?! Algum tipo de piada? — o líder sacou sua pistola, olhando pro motorista. — Explique–se, agora!

— E-Eu não sei como ele entrou, eu juro!

— Rapazes, calma. Eu sei que esqueci o convite pro baile de máscaras, e da máscara, mas não precisam se exaltar tanto...

As armas foram rapidamente apontadas para sua cabeça. Luke ergueu os braços lentamente, tremendo.

— C-Calma, não precisam atirar! Por favor, eu sou só um garotinho assustado...

— Feche a bolsa, seu maldito! — latiu o líder, que riu ao ser obedecido. — Agora, largue-a!

— Oh, com muito prazer...

Foi a vez de Luke rir. Ele agarrou as bolsas que estavam no colo dos outros mascarados e atravessou o banco, levando-as consigo.

Os mascarados ficaram com cara de paisagem depois do que viram.

— Mas que porra foi essa?! — o líder rosnou. — O que diabos...?! Cadê ele?!

— É ele! — o motorista ofegou. — Eu sabia que ele era real!

— "Ele"? Ele quem?

— Seja lá quem for, ele está voltando! — disse um dos mascarados. — Vai se dar mal, fedelho!

Luke usava sua hovershadow para perseguir o carro e se surpreendeu quando um dos criminosos saiu pela janela para começar a atirar? Sério que iriam tentar balear alguém que, literalmente, atravessou o carro bem na frente deles?!

Pelo visto, inteligência não eram os seus melhores atributos.

Evitar os primeiros disparos foi fácil.

O Abençoado ziguezagueou entre os carros que os criminosos desviavam. Isso quase o fez ser atropelado algumas vezes, mas nada que um pouco de improviso – como saltar por cima dos tetos ou deslizar por baixo da lataria – não resolvesse.

— Desgraçado! — o líder praguejou. — Acerta logo ele!

— Eu tô tentando, porra! Me passa outra munição de-

Um impacto no teto do carro pronunciou o que iria acontecer. O mascarado que atirava foi puxado para fora e arremessado para a calçada sem mais nem menos, só que, por algum motivo, seu corpo parecia cair bem mais devagar do que deveria.

O garoto de elmo se espremeu para entrar pela janela logo depois, os surpreendendo.

— Hum, vocês não acham que estão indo um pouco rápido demais? — Luke fechou o vidro da janela. — É que tá ventando bastante, e o limite de velocidade nessa rua é de-

— Vai pro inferno!

O mascarado sentado ao seu lado disparou, mas atingiu o vidro. Luke reagira bem a tempo de se recostar no banco e agarrou-o pelo pulso, desarmando-o.

Um único chute no peito foi o suficiente para fazê-lo voar contra a porta, que se desprendeu do carro e arrastou-se pela avenida no meio dos carros.

Por acaso, algo parecia prendê-lo à porta. Um tipo de fumaça negra.

— Sabe, eu realmente espero que vocês tenham licença para ter essas coisas — Luke disse, analisando a pistola em suas mãos. — Vai dar um problemão se não for, sabe?

O líder dos mascarados apontou sua pistola para o rosto do garoto, mirando exatamente no meio de sua testa, com olhar letal e ameaçador.

Para sua surpresa, o garoto apenas sorriu.

— Isso aí não é brinquedo, sabia? — disse, seu olhar sendo tomado por um escarlate vibrante incompreensível, assim como o temor que instaurou-se no peito do homem. — É melhor que abaixe a arma antes que alguém se machuque.

O líder obedeceu prontamente, o que resultou em seu nocaute.

Luke puxou-o para o banco de trás e rapidamente assumiu seu lugar. O motorista recepcionou-o calorosamente com uma arma, assim como todos os outros – a diferença estava, porém, na forma como ele se dispunha a empunhá-la.

Ele não estava disposto a aguentar o impacto do tiro.

— ... Acho que a melhor maneira de dirigir seria mantendo as duas mãos no volante — o de elmo disse, despreocupado. — Ah, também é bom que você pare o carro antes que seja tarde demais.

— V-Você não entende — o motorista balbuciou. — Eu preciso fazer isso! Senão...


Eu preciso conseguir o dinheiro para pagar a cirurgia da minha mãe!


Luke suspirou. Sempre motivações nobres, mas escolhas idiotas...

Isso quase o fez sentir vontade de deixá-lo ir embora. Quase.

— O que você tá esperando?! — o líder acordou, ainda zonzo pelo nocaute. — Atire! Estoure os miolos desse moleque!

— ... Sua mãe não gostaria disso — Luke disse, olhando-o no fundo dos olhos. — Faça a coisa certa. Por ela.

Não havia intimidação em sua voz...

Os olhos são a janela da alma. O de elmo conseguia ver a sua, sem julgá-lo. Isso fez com que seu pedido alcançasse-o e soprasse para longe a influência perversa do mascarado que o mandava puxar o gatilho.

O motorista deixou a arma cair por conta de seu aperto frouxo.

Luke empurrou o líder de volta ao banco, ao vê-lo tentar recuperar a arma, sem nem tocá-lo – e ainda fez questão de passar o cinto nele.

— Fique quietinho aí, ok? — disse, o indicador nos lábios. — Deixe o rapaz ter seu desenvolvimento de personagem em paz, pode ser?

— A polícia! — o motorista exclamou ao se lembrar. — Droga... O que eu deveria fazer?!

— Diga a verdade — o de elmo disse. — Se você não tinha um real envolvimento com isso tudo e tá arrependido, então se entregue e assuma a responsabilidade.

— M-Mas, eu não posso... Sem mim, a minha mãe vai-

— Aposto que nem você gostaria que sua mãe vivesse o resto da vida sabendo e tendo desgosto pelo que você fez hoje. Acredite, falar a verdade vai ser a melhor coisa que você poderia fazer.

— ... Você acha que eles vão acreditar em mim e reduzir minha pena?

— Sei lá. Eu tenho quinze anos, não sei como a lei funciona. Além do mais-

— Maldição...! Moleque... maldito... covarde! Eu vou... Eu vou...!!

Uma oscilação brusca de energia negativa ocorreu no banco de trás, tão repentina que fez o espaço brilhar. A mesma que trouxe Luke até ali, e que ele pensou ter aspirado completamente ao chegar.

Ao olhar, viu algo surgindo no pescoço do líder, que tentava alcançar algo em sua perna, sem que o mesmo sequer notasse. O sentimento de impotência ao ver seus planos serem arruinados assim, tão facilmente, estavam criando um Tormento novo.

— Que coisa é essa?! — o motorista sibilou ao notar seu ex-líder sendo enforcado por algo que surgia do nada.

— Não é nada! — Luke disse, indicando a rua. — Continue dirigindo!

O tempo está se esgotando, garoto, Draco sussurrou eu sua mente.

— Senhor Fantasma! — o rapaz gritou.

Ao olhar para a frente, Luke pôde ver que a rua tinha sido fechada, com pregos para estourar os pneus do carro dos criminosos e assim poder prendê-los.

Uma operação simples, mas bastante eficaz.

Tudo estava indo tão bem... Por que sempre tinha que ter uma reviravolta?!

— O que eu faço?! — o jovem choramingou.

Foi nesse momento que uma ideia arriscada, perigosa e muito, muito estúpida iluminou a mente de Luke.

— Coloque os cintos e confie em mim, Nick — sorriu. — Nós vamos voar!

— O-Ok! Espera, o quê?

O de elmo já apontava para a rua a esse ponto. Uma rampa escura se ergueu ao mesmo tempo que o cinto de Nick, o motorista, emperrou.

Ele tinha pisado no freio por instinto, mas carros não foram feitos para voar.

Luke teve que fazer muitas coisas enquanto sobrevoavam o bloqueio da polícia.

A primeira delas foi ajudar Nick com seu cinto, depois salvou o pescoço do líder ao atirar um espinho de trevas no Núcleo do Tormento, que ficava perto das pinças daquela centopeia grotesca.

Por último, ele envolveu o carro com trevas para que ele não caísse de qualquer jeito – só que isso devia ter sido feito primeiro, pois agora-


TUM!


A lataria rangeu com o impacto.

— Estamos sem freio! — Nick exclamou, ainda tonto. — Não dá pra parar!

— Continue dirigindo! — Luke ordenou ao estalar a língua. — Eu vou tentar-

A centopeia voltou, e dessa vez agarrou o pescoço do de elmo. Seu aperto foi tão forte que o garoto ficou desnorteado e sentiu o cérebro começar a carecer de oxigênio.

— Sua... coisinha... irritante...!!

— Senhor Fantasma! A rua!

Mais à frente, havia um semáforo que pouco importava se estava aberto ou não. Como a rua estava fechada, não havia muitos carros passando por ali – ou seja, haviam muitos civis passando a rua naquele momento.

Porque a rota de fuga desses caras tinha que ser, justamente, pelo Centro Comercial?!

Dirija! — Luke ofegou, já ficando azul.

Nick entendeu o recado. Se mais alguma coisa ruim acontecesse, ele não teria como continuar cuidando de sua mãe.

Ao respirar fundo, o rapaz desistiu de tentar frear. Havia uma curva e eles iriam aproveitá-la, tudo que precisavam era de um pouco a mais de velocidade.

— Se segurem!

Ele jogou o carro um pouco para o lado e puxou o freio de mão. O som dos pneus cantando sobre o asfalto assustou os pedestres, mais do que o som das sirenes que vinham de longe, que saíram da rua bem a tempo de ver o carro realizando um drift perfeito.

Nick era um bom motorista de fugas.

— Essa rua vai dar direto na avenida principal! — Nick disse, ainda suando frio. Algo em seu retrovisor o fez gritar. — Essa não!

— Você tá morto, moleque!

O líder dos mascarados havia alcançado sua faca.

Nick jogou o carro com tudo para o lado e conseguiu evitar que Luke fosse esfaqueado no peito. O grisalho, porém, ainda estava se asfixiando com o Tormento centopeia, cada vez mais rígido no banco.

— Traidor maldito! — o homem latiu com voz embargada. Sua têmpora tinha batido com tudo na porta, e ele quase caíra pela outra porta, que não existia mais. — Você vai se arrepender por ter feito isso!

Se proteger de uma facada enquanto está dirigindo é mais difícil do que parece.

Nick não teve chance de se proteger antes que a faca perfurasse seu ombro, o que dificultou drasticamente a sua condução.

O aperto do líder, porém, afrouxou quando Luke o socou no rosto. O garoto tinha, de alguma forma, libertado um dos braços. Assim, ele puxou com toda a força que tinha o corpo da centopeia que ainda apertava seu pescoço.

— Centopeia... idiota...!!

— S-Senhor Fantasma!

O homem pegou a pistola que havia caído e a apontou para o rosto do grisalho.


POW!


O disparo foi seguido por um gemido abafado de dor.

Não querendo descobrir se seu elmo era a prova de balas, Luke rapidamente colocou o corpo da centopeia na frente do rosto e, assim, viu a bala ricochetear do Tormento para o corpo de seu Atormentado.

O líder dos mascarados tombou no banco, enquanto seu encosto se desfazia.

— Eu definitivamente odeio centopeias agora — Luke ofegou, terminando de exterminar o monstro. Ao olhar para Nick, viu que ele estava sangrando, a faca ainda cravada em seu ombro. — Puta que... Você tá legal?

— Estou melhor que ele... — Nick respondeu, amargamente. — Ele morreu?

O líder jorrava sangue de seu ferimento. Ele não se mexia mais.

De alguma forma, Luke sabia que o coração do homem ainda batia, mesmo que pudesse parar a qualquer momento.

— ... Quem sabe? — e fez questão de parar a hemorragia com suas trevas. Deveria ser o suficiente para mantê-lo vivo até que a ajuda chegasse. — Você consegue continuar?

— Sinceramente? Eu me arrependo de não ter distribuído currículos antes...

Luke não conteve o riso. O humor deles era meio... similar demais.

Parar um carro sem freios era fácil, desde que você conseguisse replicar o efeito que os freios hidráulicos fazem em tempo real enquanto você tenta não provocar um acidente. Então, bom, se você não tiver superpoderes, é bom levar o carro no mecânico.

Ninguém merece correr risco de vida por sua causa, nem você mesmo.

A história de Nick infelizmente não acabou da melhor forma, mas teve seus pontos positivos. Ele se entregou sem resistência quando a polícia chegou e foi enviado ao hospital junto de seu ex-líder baleado.

Nick se recuperou bem, já o outro cara...

Digamos que ele vai ficar sem aprontar por um loooongo tempo, pelo menos até seu estômago se recuperar da lesão.

A pena de Nick foi bem mais leve do que o mesmo esperava.

Aparentemente, os outros criminosos – após os efeitos da supressão de memórias – disseram que um "moleque" havia ferrado totalmente o plano de fuga, então as autoridades devem ter considerado que Nick havia se arrependido do que fez e tentou pará-los sozinho, resultando em tudo que acontecera depois.

Como conseguiram explicar o salto pelo bloqueio foi um completo mistério.

Agora, sobre a mãe de Nick-

Bom, o tempo dirá. Agora, voltemos à narrativa atual...

Luke afastou-se da ponte, local onde o carro havia parado, e deixou a polícia fazer seu trabalho. Do alto de um prédio, o garoto sentia-se um tanto orgulhoso pelo que havia feito, apesar de seu pescoço ainda doer.

Um Tormento exterminado, criminosos presos – com direito à redenção de um deles – e joias recuperadas. Isso sim era um serviço de heroísmo completo!

— Tudo acaba bem, quando termina bem — murmurou.

Se você ignorar o começo e o meio, sim, tudo ocorreu bem, Draco resmungou.

— Você tá é incomodado pelo que eu consigo fazer sem implorar por sua ajuda, lobo.

E por que eu ficaria? Quanto menos trabalho para mim, melhor.

— Percebe-se isso na sua metodologia de ensino...

Se reclamar mais, vou parar de te ensinar sobre os poderes do anel, moleque.

— Ui, que sensível... Sabe, você deveria ser menos-

De repente, um pressentimento fez com que as palavras morressem em seus lábios. Era familiar... As mesmas sensações que vem sentindo a dias, desde que encontraram com aquele anjo no Dia das Bruxas.

Passos. Passos fortes, pesados. Muitos.

Antes que Luke sequer se desse conta, ele estava cercado por vários homens fortemente armados, trajando roupas pretas discretas e cheias de bolsos.

— Parado aí, aberração!

Por algum motivo, o grisalho já sabia que eles não estavam lá para parabenizá-lo por mais um ato de heroísmo.


[ ... ]


Moon esteve em seu quarto o tempo todo enquanto o noticiário passava.

Foi um fim de tarde agitado, pelo visto. Luke não só tinha dado um jeito no Tormento que se formara como também havia "brincado" de herói ao parar o assalto à joalheria, ajudando a polícia a prender os culpados.

Não que houvesse algum problema nele ter feito isso. Certamente os criminosos haviam se esquecido dele graças à supressão de memórias.

Não, não haviam problemas, mesmo...

Isso, é claro, se você ignorar o fato de que ele não tinha dado sinais de vida depois do ocorrido.

— Sim, Sarah — Moon dizia, tão apreensiva quanto a O'Brien mais velha. — Ele está aqui comigo, sim. Meus pais estão ocupados, então... Ah, isso é... O celular dele descarregou, daí eu emprestei meu carregador e... Ok, eu digo para ele ir pra casa antes do jantar. A Ária está bem, não se preocupe. Certo, tchau.

Fim da ligação.

Moon respirou bem fundo antes de pousar o celular sobre sua escrivaninha, em meio às suas anotações inacabadas sobre o conteúdo da aula do dia seguinte.

Céus... Que bom que a Sra. O'Brien confiava nela, porque, do contrário, Luke estaria encrencado.

Ah, mas não mais que ele já estava. Moon iria se certificar pessoalmente de que ele se arrependesse desse sumiço de quase duas horas!


TEC!


Foi quando mais uma folha de seu caderno fora arrancada e amassada que um bater em sua janela a fez virar.

De relance, um farfalhar de cabelos cinzentos atravessando o vidro a fez sorrir.

— Boa noite, Cinderela. Como foi o baile? — Moon o ouviu ofegar em um riso. — Sua mãe me ligou, sabia? Mais de uma vez. Ela está preocupada. A Ária saiu procurando você e até agora não voltou, também. Tem ideia do quanto você...?!

Sua voz sumiu ao acender a luz do quarto. Luke estava suado, pálido e fraco. Estava pressionando a lateral do abdômen e mal se aguentava em pé, quem dirá o peso que seu sumiço havia causado.

— Ai meu Deus, Luke! — ela sibilou, o aparando antes que o mesmo desse de cara com o assoalho. — O que aconteceu?

— Armas... — gemeu, apoiando todo o seu peso nela. — Muitas delas... Uns soldados malucos me... Argh!

Um espasmo de dor atravessou seu corpo, o fazendo perder ainda mais a cor.

O elmo em sua cabeça se desfez quando Moon o jogou sobre sua poltrona. Ela encontrou o ferimento sem dificuldades, afinal estava muito bem visível debaixo de sua camisa empapada de suor e sangue. A pele estava queimada ao redor do buraco da bala, mas uma luz estranha era emitida debaixo das trevas que estampavam o sangramento.

A garota sentiu o estômago revirar. Se não fosse por esse tal elemento mágico que ele controlava, Moon conseguiria ver por dentro do corpo de Luke, o que era simplesmente aterrorizador demais para se pensar.

Ele foi baleado — Draco surgiu para falar o óbvio. — É uma longa história. Essa bala precisa sair do corpo dele o quanto antes, garota. Ela está retardando a recuperação natural do corpo dele.

— E por que você já não a tirou, se é tão poderoso? — Moon tinha temor na voz.

— Eu não consigo retirá-la. Não tenho as patas adequadas para isso.

— ... Certo — ela revirou os olhos e respirou fundo. — Fiquem aqui. Eu já volto.

Luke riu com dificuldade, mas Moon já havia saído.

— Eu não iria a lugar nenhum... Ai! — outro espasmo, que fez o ferimento brilhar por dentro. — Que merda...?

— Boa pergunta, garoto — Draco estava sério. — Eu não sabia que a tecnologia da Terra já era capaz de assimilar magia.


[ ... ]


Algumas horas antes, perto da ponte Lakecross...

— Parado aí, aberração!

Mesmo de costas, Luke conseguia dizer que estava cercado. Olhando de relance, ele podia ver muitos homens armados usando roupas esquisitas que cobriam todo o seu corpo, com calças e cintos cheios de bolsos.

Eles seriam militares, com certeza, se os mesmos fossem góticos.

— Ok, pessoal, erro comum — Luke não se virou. — Os criminosos estão lá embaixo. Eu peguei eles. Eu sou um dos-

— Poupe-me de sua ladainha! — TZZIM! — Fale mais alguma coisa e não irá sobrar nada de você para ser catalogado!

Algo me diz que eles não vieram te dar medalhas, garoto, Draco comentou.

— Fale alguma novidade — Luke resmungou baixinho. — Tem alguma forma de sairmos daqui?

Além de se entregar? Bom, talvez tenha um jeito. Você só vai precisar de um empurrãozinho.

— ... E de uma distração também — sorriu. — Já sabe o que fazer, não sabe?

Com quem você pensa que está falando?

— Se vire, monstro, e nem tente resistir! — ordenou o homem. — Faça qualquer gracinha e eu estouro seus miolos!

TZZZIM! – mais estática. As armas deles disparavam raios, por acaso?

— Ok, ok! Eu me rendo! — Luke ergueu as mãos. — Eu vou com vocês, só não atirem, beleza? Eu gosto de estar vivo.

Alguns deles riram.

— Você não faz ideia do que te espera quando chegarmos ao laboratório. Ei, você, algeme ele!

Luke se virou, mas não ergueu o rosto. Um dos homens de preto se aproximou com um par de algemas estranhas – que também emitiam o mesmo som de estática –, e o mesmo iria continuar se aproximando se não tivessem notado algo... importante.

— Pare! — disse o líder. — O que você tá escondendo nas mãos? Vamos, abra-as!

Luke mostrou a eles seu olhar escarlate e obedeceu, deixando cair pequenas bolinhas de escuridão aos seus pés.

— Nada demais — disse, sorrindo. — Apenas um pouco de distração.

— Filho da...!! PRO CHÃO!


BUM!


A explosão foi bem mais abafada e contida do que esperavam. Um breu absoluto se instaurou no telhado, seguido por um silêncio que foi cortado por vários TZIM! seguidos, que resultaram em feixes luminosos e breves.

A brisa varreu a cortina de escuridão. O Fantasma havia sumido.

— Senhor — um dos agentes se aproximou. — O que devemos fazer?

O capitão tirou o capacete e abaixou sua arma, encarando o horizonte da cidadezinha de merda que tinha a presa que ele tanto precisava caçar.

— ... Vamos retornar à base.


[ ... ]


— Então... Homens armados vieram até você tentando te prender?

— Acho que "prender" seria um eufemismo grave levando em conta o que eles estavam dispostos a fazer, sabidinha.

Moon havia voltado com alguns álcoois, algodões e panos limpos. Mesmo tremendo e enojada, ela se concentrou ao máximo para cuidar do ferimento de Luke, que apenas gemia e se contorcia com a dor.

Achar o projétil foi incrivelmente fácil. Bastou seguir os brilhos que acompanhavam os espasmos e, voilá, uma bala totalmente ensanguentada havia sido retirada!

— Ugh — a garota gemeu, choramingando ao ver o sangue pingar. — Eu acho que não sirvo para ser médica.

— D-Desculpe...

Antes que pudesse tranquilizá-lo, a bala brilhou na ponta de sua pinça. Não apenas isso, mas uma pequena descarga elétrica havia ocorrido bem diante de seus olhos, a fazendo largar a pinça sobre a tampa do algodão.

— O que...? Que tipo de reação é essa?

— Não busque sentido nisso — Draco advertiu, encarando a bala com um misto de espanto e seriedade. — Isso não é uma bala qualquer. Está impregnada com magia.

Talvez, não medicina. Mas aquilo... aquilo sim lhe despertava muitíssimo interesse!

— Magia? — perguntou, pegando a tampa com interesse. — Achei que magia e tecnologia não se misturassem.

— Bom, não a sua tecnologia. A Terra não é exatamente o berço da tecnologia, não tanto quanto vocês, humanos, tentam fingir que é.

— Aonde você quer chegar, lobo? — Luke havia se recuperado, mas ainda ofegava.

Draco respirou fundo e sacudiu a pata. Isso era um assunto para outro momento.

— O universo deve ser muito mais vasto do que pensamos, já que magia é uma fonte de energia totalmente nova e inexplorada — Moon balbuciou, ainda encarando a bala. — Imagine só quantos avanços teríamos se fôssemos capazes de converter a energia liberada pelo seu artefato. Seria o fim para os problemas ambientais a respeito das fontes de energias não renováveis! Além de que-

Vá com calma, garota! — Draco latiu antes de bufar. — É por esse motivo que humanos são tão mal-vistos. Prepotentes e orgulhosos como são... Já parou pra pensar o que aconteceria se todos soubessem que a magia existe? Que monstros estão aí fora, se alimentando de seus sentimentos? Que superpoderes podem ser reais? Imagine o que aconteceria se usassem a magia para resolver os conflitos fúteis que seus governos criam, garota. Caos. É isso que aconteceria. Não, não. Ainda vão ser necessários muitos séculos para que os humanos estejam prontos para lidar com essa descoberta. Ou milênios! Talvez, seja melhor que vocês nunca saibam. Que o Todo-Poderoso Prisma permita que isso seja possível, pois aposto que nem mesmo ele sabe o que aconteceria se isso fizesse parte de seu senso comum outra vez.

Moon quis contra-argumentar, mas algo a parou. Mais do que odiar ser contrariada ou julgada, ela sabia que Draco deveria ter seus motivos para ser tão descrente e cético na humanidade, ou nos mortais como um todo. O olhar de Luke lhe dizia isso.

Sendo assim, ela apenas deixou a bala estática de lado e começou a limpar o ferimento no abdômen de seu... amigo.

— A bala não perfurou tanto — disse, um tanto distante. — Não atingiu nenhum órgão importante, então não deve demorar muito para sarar. Ainda mais com a sua... "regeneração acelerada".

— Que sorte... — e se contorceu com o toque frio do algodão, agora úmido com álcool.

Moon continuou o trabalho em silêncio até enxugar completamente o ferimento. Draco fez questão de cobri-lo com trevas e disse que iria se certificar que o ferimento sarasse mais rápido durante a noite, enquanto Luke dormia.

Nenhum dos dois fez muita questão.

A garota estava exausta, mas, agora que estava mais aliviada e tranquila, pôde ponderar e juntar alguns fatos. A bala brilhou uma última vez, o que a fez se levantar e ir até sua escrivaninha e ligar seu Foxybook.

— O que você tá fazendo? — Luke disse, lutando contra a vontade de cutucar suas bandagens negras.

— Só quero ter certeza de algo — Moon respondeu. — Espero que eu esteja errada...

— No dia que você estiver errada, estaremos perdidos — e se aproximou.

Ele não entendeu o porquê Moon engasgou e desviou o olhar, tão rápido que seus cabelos poderiam ter rompido a barreira do som, como um chicote.

— ... Você ainda está sem camisa — ela disse.

Luke correu para a poltrona, onde sua camisa suja e rasgada se encontrava. Quando voltou, Moon já havia iniciado sua pesquisa, mas suas orelhas continuavam tão vermelhas quanto suas bochechas.

Ele não podia ver muito bem de onde estava, mas eram páginas de fóruns que falavam sobre um misterioso "justiceiro" que, de alguma forma, estava envolvido com os incidentes estranhos que vieram acontecendo em Donnatown nos últimos meses.

Moon suspirou, frustrada. Estar sempre certa era sua maldição.

— Não que eu duvide, mas certa sobre o quê, exatamente? — Luke quis saber.

— Sobre os efeitos da supressão de memória — Moon passou as mãos nos cabelos e se virou. O garoto a encarou quase sem piscar. — Nós não lembramos da Ária, e nem daquela outra garota, antes, certo?

— Hum, na verdade...

— Ok, você lembrava, mas não sabia quem elas eram. Isso pois elas são Etéreas, seres mágicos que fogem da nossa realidade "padrão". Não tinha nenhuma garantia de que não iriam lembrar de você, um humano que por acaso possui poderes mágicos.

Draco sentou-se sobre a escrivaninha e suspirou.

— A sabidinha está certa — disse, lendo os relatos. — Era inevitável. O feitiço, por padrão, afeta somente as coisas que são incompreensíveis ao cérebro, quer ele saiba ou não. A presença dos Tormentos e dos Etéreos, por exemplo, é algo que vocês, humanos, reconhecem instintivamente como algo que foge completamente de sua realidade mundana. Mas, no seu caso, garoto — olhou para Luke. —, você é um humano com poderes. A forma como você faz as coisas podem ser esquecidas, mas não o que você fez. As pessoas vão se lembrar de você, mas não de quem é você.

— E você não viu motivos para me contar isso antes? — Luke resmungou.

— Eu não achei que seria um problema. Como falei, tanto sua tecnologia quanto vocês, seres humanos, não estão preparados para descobrirem sobre a magia. Levaria anos para vocês estarem prontos, isso se vocês estiverem destinados a isso.

Moon olhou para a bala, que apenas bruxuleava com suas descargas, inofensiva.

— Você tem certeza de que isso é magia, Draco?

— Confie em mim, garota. Há magia fluindo através dessa bala. Um fluxo fraco, inconstante, mas concentrado. É a única forma de ele ser prejudicado por algo tão bobo e simples, ao ponto de desestabilizar as oscilações de sua alma. Apenas magia combate magia.

— Então, teoricamente... — Luke divagou em voz alta. — Eu posso ficar invulnerável me revestindo com trevas?

— Você teria que dar um jeito de alterar sua composição muscular para isso, mas, sim, pelo menos na teoria — Draco deu de ombros antes de encarar novamente a tela do notebook. — A pergunta certa a se fazer, moleque, seria-

— Como essa tecnologia é capaz de existir, se não estamos prontos para ela? — Moon concluiu, coçando o queixo.

Luke a olhou bem antes de olhar para o projétil que o atingira pela primeira vez. Ali, com o último oscilar de energia da bala, ele concluiu:

Se for para conhecer pessoas novas, então ele se vestiria melhor da próxima vez.


[ ... ]


Ao mesmo tempo, em outro lugar...

Um carro percorre as ruas tão turbulentas de Donnatown. A cidade esteve uma bagunça completa nos últimos dias, nem parecia com aquela cidadezinha pacata que um dia fora.

O noticiário local ainda insistia em contar histórias mirabolantes sobre o assalto à joalheria que fora frustrado graças à competência dos bravos policiais que deram seu melhor para prendê-los em uma perseguição de tirar o fôlego pela cidade.

— ... Que monte de bobagem! Troque de canal, agora — bufou. — Sinto que posso criar rugas se continuar ouvindo tanta estupidez...

Ela foi obedecida prontamente.

Argh! Que idiotas... Sinceramente, como não podiam apenas admitir que não sabiam o que havia acontecido?

Ou seria melhor falar que não lembravam?

— Conhecimento é poder, não é, papai? — murmurou, brincando com um pingente em sua correntinha de cobre. — Vamos ver o que mais você quer conseguir de mim.

Seus olhos verdes vibrantes cintilaram intensamente quando seu motorista parou o carro na fachada da maior construção de Donnatown.

Com um sorriso travesso, a Princesa Raposa adentrou na Torre Fox.

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