Brian não precisava olhar seu reflexo para saber que estava vermelho feito um pimentão. Helena permaneceu parada à porta segurando sacolas do mercado, carregando uma expressão indecifrável. Ela havia encontrado Brian e Tobias dançando pela cozinha. Pôde ouvir a risada de ambos assim que colocou os pés dentro de casa, mas imaginou que fosse William.
— Oi, mãe — Tobias se pronunciou quando percebeu que nenhum dos dois iria ceder e cumprimentar o outro. — Acho que você já conhece o Brian.
Helena passou a língua nos dentes achando muito infeliz o comentário de Tobias. Não havia motivo algum para brincadeiras diante daquela situação, ela pensou.
— E o que ele está fazendo aqui esta hora?
Brian abriu a boca para responder mas Tobias tomou a frente.
— Ele acordou e desceu para tomar o café da manhã.
Helena franziu o cenho sentindo as mãos queimarem por conta do peso das sacolas. Deu alguns passos até a bancada e as largou, estralando os dedos em seguida. Sua cabeça latejou quando ela tentou assimilar o que estava acontecendo e o que aquilo significava.
— Você pode parar com as brincadeiras e começar a falar sério? — Helena perguntou sem olhá-lo nos olhos. — Onde está o William?
Neste momento o bom humor de Tobias pareceu evaporar de seus poros e ele e Brian trocaram um olhar. Descobrir daquele modo que Helena ainda não tinha conhecimento do que houvera entre Tobias e William fez com que Brian se sentisse constrangido.
— Sente-se — Tobias puxou uma cadeira. — Nós precisamos conversar.
Helena concordou pois se tinha uma coisa que ela queria naquele momento era falar sobre o que se passava em sua cozinha.
— Acho melhor eu ir embora - disse Brian já saindo da cozinha. Estava subindo as escadas para buscar seus tênis no quarto de Tobias quando o mesmo lhe chamou.
— Nos vemos mais tarde? — ele perguntou assim que Brian parou e virou-se para trás.
— Claro.
Tobias sorriu e surpreendeu Brian indo até sua direção e lhe dando um beijo rápido antes de retornar à cozinha onde Helena o aguardava, já impaciente.
— Você precisava mesmo trazer aquele garoto para cá justo quando eu vou visitar sua tia que está doente? — disse Helena assim que Tobias voltou, sentada à mesa. Tobias suspirou, puxando uma cadeira para sentar ao lado dela.
— Se você pensa que eu não vou contar ao William o que acabei de ver aqui, está muito enganado... — Helena disse com voz de reprovação. Tobias puxou uma cadeira e sentou-se ao lado dela.
— Não será necessário — disse Tobias respirando fundo antes de prosseguir. — Eu e o William terminamos.
As palavras de Tobias fizeram com que Helena direcionasse toda a sua atenção a ele. Tobias lhe deu tempo para processar o que acabara de dizer e Helena desviou o olhar. Ela pareceu surpresa em um momento, decepcionada em outro.
— Eu não acredito que você vai cometer o mesmo erro de novo.
A voz de Helena soou calma e complacente mesmo suas palavras sendo frias como gelo. Tobias fechou os olhos prevendo onde aquilo iria chegar e quando abriu Helena olhava para ele.
— Eu deveria saber que isto iria acontecer.
Brian estava descendo as escadas lentamente, tentando não chamar atenção quando ouviu Tobias dizendo:
— Eu amo o Brian, mãe. Sempre amei.
Ele sentiu a mesma sensação que sentira quando Tobias lhe disse que o que sentia por ele nunca diminuiu, na noite passada. Brian abriu a porta com cuidado e saiu sentindo o calor da manhã o abraçar enquanto ele sorria voltando para casa.
Helena levantou-se e parecia que deixaria a cozinha sem dizer mais nada quando parou e virou-se para olhar para Tobias.
— Você pode até ter conseguido esquecer, mas não espere que eu faça o mesmo.
E dito isso, Helena se retirou com suas palavras deixadas pendentes no ar como uma espécie de gás tóxico.
Com a mão livre — pois a outra estava segurando o celular —, Brian abriu a porta de sua casa. O ar do lado de dentro estava gelado o que presumia que o ar condicionado estivera ligado. A porta se fechou enquanto Brian digitava em seu celular uma mensagem para Eric. "Você não sabe o que me fez fazer. Me ligue assim que ler isso", dizia a mensagem.
Brian seguiu até seu quarto com movimentos silenciosos, como se estivesse chegando em casa após ter passado a noite fora em um festa — embora algo similar tenha acontecido.
Estava com a mão na maçaneta quando a porta do quarto de Marise se abriu e ela saiu de dentro dele com seu típico robe azul marinho. Sua expressão era de sono embora ela parecesse estar acordado há algum tempo.
— Bom dia — disse Marise, sorridente. — Está com fome?
— Bom dia — Brian soltou a maçaneta da porta concordando com a cabeça. Não tivera tempo de provar as panquecas que Tobias havia preparado para o café da manhã.
No caminho para a cozinha, Marise colocou o braço ao redor dos ombros de Brian que sorriu com o gesto. Ele sentia como se estivesse dentro de um sonho e tudo aquilo que estava vivendo era uma mera fantasia criada para obliterar os acontecimentos dos últimos dias.
— Então, por onde andava? — Marise perguntou fazendo com que Brian emergisse dos seus pensamentos. Tudo parecia caótico dentro de sua cabeça. — Por favor, não me diga que passou a noite por aí.
— Eldorado anda mais perigosa do que antigamente — Marise prosseguiu indo em direção à cafeteira. Os olhos de Brian brilharam ao lembrar da noite passada; de como ele e Tobias passaram a noite juntos, deitados lado a lado, e de como o seu corpo encaixava tão bem com o de Tobias — como peças de um quebra-cabeça.
— Eu estava bem mais perto do que você imagina — disparou Brian ainda divagando em suas memórias.
Marise olhou para ele por cima do ombro. Brian pegou as xícaras dentro do armário e se aproximou de Marise que colocava o pó do café.
— Brian, é cedo demais para suas charadas. Fale logo!
— Eu estava com o Tobias — ele completou sem conseguir controlar o sorriso que se abriu em seu rosto. Marise franziu o cenho ao ver a expressão do filho.
— Com o Tobias? Isso quer dizer que você dormiu na casa dele? — Marise olhou para Brian que estava colocando as xícaras à mesa, um pouco confusa. — Não passou pela minha cabeça que você e ele estivessem juntos e... Minha nossa! Vocês não...?
Brian riu ao ver sua mãe fazendo sinais com a cabeça, entendendo ao que ela se referia. Era adorável a forma como Marise, mesmo sendo jovem e livre de qualquer tabu ficar sem jeito ao falar de sexo com seu filho mais velho.
— Não, mãe — respondeu Brian após a crise de riso cessar. — Nós dormimos juntos mas apenas dormimos.
— Quero dizer, não haveria nada de errado, só fiquei curiosa.
Marise parecia bem mais aliviada e Brian estava achando graça na situação.
— Contanto que seja seguro, não tem problema algum.
— Podemos voltar a falar sobre o que realmente interessa?
— Isso — Marise levou o jarro de café para a mesa e sentou-se na frente de Brian que encheu sua xícara. — É bem mais adequado. Me conte. O que aconteceu?
— Eu fui atrás dele e segui o seu conselho — Brian levou a xícara aos lábios. — Deixei meu coração tomar as rédeas — disse em tom sarcástico.
Marise assentiu, bebendo um gole do seu café que estava quente e forte — do jeito que ela gostava.
— Isso quer dizer que vocês resolveram o que tinham para resolver?
— Mais do que isso — Brian olhou para Marise. — Acho que nós, meio que voltamos.
Marise arqueou as sobrancelhas enquanto o vapor da xícara subia até suas narinas.
— Uau — disse Marise, desacreditando. — Não esperava por isso.
Brian a encarou se perguntando se aquilo havia sido uma ironia ou ela estava falando sério.
— Digo, eu sabia o que sentiam um pelo o outro mas acho que eu havia perdido as esperanças.
Marise baixou os olhos e Brian respirou fundo, sentindo como era doloroso para ela ter de admitir aquilo.
— Eu sempre quis que você recuperasse o que seu pai tirou de você — Marise continuou com os olhos marejados. — Nunca achei justo você ter que pagar pelos pecados dele.
Brian sentiu as lágrimas e levou a mão até os olhos, as impedindo.
— Acho que quando é destinado, não importa o que aconteça.
Marise segurou a mão de Brian por cima da mesa e um sorriu para o outro. A aura daquela manhã era de pura confraternização e contentamento. Brian se sentia feliz como há muito tempo não sentia. Uma felicidade que radiava de seu corpo e fazia com que o ambiente se tornasse mais acolhedor e o mundo lá fora lhe trouxesse novas oportunidades.
Enquanto observava sua mãe, Brian pensou no fato de Marise parecer tão jovem e ao mesmo tempo ter tanta experiência. Tantos anos ao lado de Vincent fez com que ela aprendesse a ser mais afetuosa e empática — diferente de Vincent. Sua atenção estava voltada para aquele momento mãe e filho que ele nem ouviu quando a campainha tocou.
— Você atende? — Marise perguntou e Brian ouviu logo em seguida, levantando-se e indo em direção à porta.
Ao abri-la, Brian foi surpreendido por Tobias.
— Oi de novo — ele disse para Brian.
— Oi.
— Você está ocupado?
— Não exatamente — Brian olhou por cima de seu ombro. — Por quê?
— Quero que venha comigo.
— Venha para onde?
— Acho que você vai reconhecer quando chegarmos.
Brian estava prestes a dizer alguma coisa mas foi cortado por Tobias.
— Eu só quero sair daqui. Preciso de um momento longe de toda essa bagunça, mas quero estar com você — Tobias disse esperando que Brian se compadecesse.
— Então — ele esticou o braço para Brian com a palma da mão virada para cima. — O que me diz?
Brian não respondeu, apenas segurou a mão de Tobias que o puxou para perto dele e o beijou.
— Quanto tempo eu dormi?
A voz de Melissa fez com que os dois se afastassem e olhassem para dentro. Tobias soltou uma gargalhada ao avistá-la parada no corredor com seu pijama rosa e cabelo desgrenhado e a aparência de recém acordada. Ela continuou os olhando sem entender muito bem até que Brian também começou a rir e Melissa deu de ombros, virando-se para trás e saindo do campo de visão deles.