— Eu não tenho medo.
Foi o que ele disse por fim.
— Está esperando o quê então?
Ele continuou a me encarar pensativo. Era tão difícil assim vir até mim?
— Por que não fazemos o seguinte então... Você me conta os seus medos e então eu me aproximo aos poucos.
Parei para pensar, e eu só sairia contando mais coisas sem receber nada em volta.
— Vai me contar seus medos também? — Arqueei minha sobrancelha — Pretende se abrir comigo?
Ele negou, fechando seus olhos.
— Uma coisa de cada vez, hoje, o momento é seu — Explicou — Quando tivermos outras oportunidade, tenho certeza que poderemos avançar mais na conversa.
Assenti um pouco desconfortável.
— Por que quer saber meus medos? — Comecei a brincar com meus dedos, tentando, de alguma forma, enrolar um pouco.
— Não está com medo agora?
— Estou.
— Então me conte sobre eles.
Suspirei profundamente. Não havia escapatória, não é mesmo?
Eu não sabia por onde começar, sequer havia pensado em uma resposta para ele. Eu só conseguia olhar seus olhos negros me encarando cada vez mais densamente, querendo respostas ansiosamente, na medida do possível.
— Não sei como contá-los a você — Abaixei meu olhar, e passei a não encará-lo mais.
— O que sentiu quando encontrou Taemin novamente?
Talvez, no fundo dos meus pensamentos, eu estivesse considerando não dizer nada. Mas eu queria que Jungkook se aproximasse, por algum motivo desconhecido.
— Nostalgia.
Ele me encarou um pouco mais leve, deixando que o ar saísse com calma. Como se o prendesse por um bom tempo.
— Saudade também?
Eu não sabia se assentia ou não.
— A mágoa é maior.
— E qual o seu medo em relação a isso?
— Eu senti que, talvez, eu só não fosse... Bom o suficiente para ele — Sussurrei a primeira parte — Já faz um tempo que eu não me sentia assim.
— Mas estava com raiva dele, não é?
— Eu estava com raiva porque eu passei tempo demais ao lado dele, mas nunca fui retribuído. E quando quis me certificar que ele também me amava, ele juntou suas coisas e veio embora com a família. Eu merecia uma explicação melhor, pelo menos uma verdade na cara. Ele podia ter me poupado tanto tempo, mas preferiu me iludir.
Jungkook se aproximou um pouco, ainda mantendo uma distância entre nós. Mas pelo menos havia se movido, cumprido o que havia proposto.
— E por que não se aproximou de mim quando pedi?
— Eu não sei... Apenas não quis. Eu acho.
— Estava com medo — Afirmou — Só precisa me dizer do quê.
— Por que está se importando tanto?— Bati minha palma na almofada — Você não faz o tipo de que se importa o suficiente para insistir tanto.
Jungkook cerrou o maxilar, fechou seus punhos com força e respirou fundo. Uma irritação desnecessária do meu ponto de vista. Era só se virar e ir embora.
— Você tem razão, mas ainda erra em muitas coisas, Jimin.
— Não entendo.
— Qual o seu medo, hein?
— Dói me responder? — Encarei-o novamente — Dói falar que se importa sim?
Merda, por que ele não podia apenas admitir?
— Eu me importo, Jimin. É isso que quer ouvir? — Sua voz soou um pouco rígida — Porra, acha que já não está claro o bastante que, sim, eu me importo pra caralho?
— Seu jeito de se importar é difícil de interpretar, Jungkook. Você age como se nada te afetasse, é rude na maior parte do tempo e as vezes não me diz o óbvio em palavras. Eu gosto de ter certeza, seu idiota.
— Tem medo de estar errado? — Me perguntou, já não tão irritado quanto antes.
Um progresso.
— Eu sempre estou errado, em todos os momentos. Eu errei quando achei que Taemin me amava; errei quando achei gostar de Hoseok; errei quando me vinguei de você e te mandei para o pronto-socorro; errei quando achei ter esquecido completamente do meu ex. Eu erro em tudo o que eu acho que estou com certeza.
Jungkook se aproximou de novo, e agora só tínhamos três palmos de distância. Seu rosto estava próximo do meu, mas ao mesmo tempo com uma distância ridícula entre nós. E eu só queria findá-la.
— É por isso que eu odeio o óbvio. Porque não é óbvio o suficiente para mim.
Jungkook segurou minhas mãos, desentrelaçando-as de cima da almofada e então esticou meu braço em sua direção. Eu não entendi o que ele queria.
— Você precisa dar esse último passo agora.
— Por quê? — Tentei puxar de volta, mas no fundo, eu não queria mesmo.
— Porque você precisa ver que esse óbvio, você está certo.
Eu realmente não entendia ele de qualquer forma. Sempre tão imprevisível, tão... Tão ele mesmo, mas ainda assim confuso. Eu não consigo entrar nessa sua cabeça bagunçada tanto quanto a minha.
Por fim, eu dei esse último passo que Jungkook não quis dar. Sentei-me em seu colo, perto o suficiente para ele poder ouvir as marteladas que meu coração dava em meu peito. Seus braços passaram em volta de minha cintura e me envolveram em um aperto gostoso.
— O que está óbvio para você agora? — Ele sussurrou em meu ouvido — Me diga.
Eu encostei minha testa na curva de seu pescoço sem medo.
— Está óbvio que você se importa comigo está disposto a me consolar.
Ele sorriu e então esfregou suas palmas em minhas costas.
— Que bom que isso está óbvio então.
— Mas tem uma coisa que não está óbvia para mim — Resolvi arriscar, e ouvi um "siga em frente e pergunte então" que fez com que minhas mãos suassem um pouco — Por que se importa?
Seu peito subiu com força para então soltar o ar com lentidão. Se ele se importa, então quer dizer que eu sou importante para ele, certo?
— Por que você é o anjinho da minha vida.
— Estou falando sério.
— Jimin, você é do tipo de pessoa que conquista o seu lugar na vida das pessoas — Me apertou mais em seus braços — Não percebe isso? O tanto de pessoas que se afeiçoam à você?
— Você está estranho, Jungkook. Você não costumava ser tão coração mole — Me permiti rir do meu próprio comentário — É estranho te ver assim, todo... Meloso.
— Não estou sendo meloso, anjo. Estou sendo um amigo.
— Está bem. Amigo.
Eu sorri bastante nessa hora. Ele se importava de um modo bem mais forte do que imaginei.
[...]
— Jimin, está em qual mundo? — Taehyung estalou seus dedos em minha cara — Jimin!
— Estou no planeta Terra, Tae. Você por acaso mora em Marte?
Ele me deu um tapa na nuca. Oshe, ele que faz essas perguntas aleatórias e minha resposta óbvia irrita ele?
— Eu te perguntei dez coisas e você sequer olhou para mim apenas para encenar uma falsa conversa — Taehyung se sentou em seu sofá limpinho desde a manhã que havia tirado o dia para limpar a casa — Podia pelo menos fingir que eu não estava falando com as paredes.
— Repete então.
— Nossa, nem um pedido de desculpas?
Revirei meus olhos e pulei em seu colo.
— Oh, ilustríssimo amigo, eu sinto muito mesmo por não te ouvir — Fiz uma bela atuação — Será que a divindade pode me perdoar agora?
— Falando assim até te beijar eu beijo.
Me afastei dele no mesmo instante.
— Eca, Tae — Botei minha língua para fora — Tudo bem que você é gostoso e tudo mais, mas seria como beijar um irmão. Não, não, não, tira essa cena da minha cabeça.
— Vem me dar umas bitoquinhas aqui, vem.
Empurrei ele para fora do sofá quando ele agarrou meus braços, e só para enfurecê-lo, coloquei meus pés no sofá de tênis e tudo.
— Seu VIADO — Ele gritou, exasperado— VIADO DESGRAÇADO.
— Sou mesmo, e eu não vou tirar meu pé daqui — Empinei o meu nariz.
— Eu limpei ele todinho hoje — Choramingou — E você acabou de destruí-lo.
— Destruí nada, eu só sujei ele de novo — Ri — E agora você deveria limpar ele de novo ao invés de tentar me beijar.
— Eu não, se vai dormir aqui hoje, que durma no sofá sujo então.
Puta que pariu, é mesmo.
— Mas... Você não vai me deixar dormir no seu quarto no colchão?
— Não, você não quis me beijar então vai querer dormir lá também.
Bicho filho da mãe.
— Tae, mas como que eu iria beijar você se Hoseok é o dono do seu coração?
— Você me magoou, Jimin. Vai dormir no sofá.
Suspirei, vendo a porcaria de vida que eu tenho. Nem para isso ela contribuí comigo.
— Me dá logo esses produtos de limpeza — Resmunguei me levantando do sofá.
E o que realmente aconteceu foi que eu limpei, sim, o sofá, mas recebi a notícia que eu dormiria no quarto de Taehyung mesmo assim. Eu só quis sujar de novo, mas como fui eu que limpei, achei melhor não. Foi um esforço grande demais para que eu sujasse tudo de novo.
Agora eu entendo o sofrimento de Taehyung ao me ver sujá-lo com meus tênis.
— Como estão as coisas entre você e Jungkook? — Taehyung dera uma espiadinha de lado rapidamente antes de se sentar no outro sofá menor que ele tinha, de frente para mim.
— Estão bem confusas, na realidade.
— Você... Já chegou em alguma conclusão?
Balancei a cabeça em negativa.
— Jungkook me disse que se importava bastante comigo, mas eu não sei realmente o que isso quer dizer.
— Que talvez ele goste de você, Jimin. Já parou para pensar nisso?
Eu nem havia chegado perto dessa conclusão. Nunca parei para pensar nesse tipo de coisa porque seria um equívoco meu. Seria estranho se, no fim de tudo. minhas especulação estivessem erradas como estive com Taemin.
Seria um baque e tanto, pelo menos para mim.
— Não, eu não quero pensar desse jeito — Suspirei — Se for para errar, que eu não pense nisso então.
— Vai fugir para sempre? — Taehyung estava com um ponto — Sabe, se continuar assim, outra pessoa vai conquistar Jungkook.
— Acha mesmo? Ele não gosta de ninguém novo, Taehyung — Ergui a sobrancelha, não vendo fundamentos em sua afirmação.
Mas realmente, era muito difícil disso acontecer mesmo. Ele quase não conhecia novas pessoas e muito menos interagia com estranhos que se aproximavam dele.
— Mas você conseguiu, e alguém mais pode fazer isso também.
— Isso tem uma possibilidade de apenas 1%, Tae.
— O que você faria se ele começasse um relacionamento, hein? — Okay, talvez eu não queria imaginar isso — Você não vai poder espantar a pessoa, seria egoísmo.
— Eu não espantaria a pessoa — Revirei meus olhos — Eu aceitaria de boa.
— Tem certeza?
Não.
— Isso não vai acontecer, está bem? E mesmo se fosse verdade... Eu...
— Você...?
— Eu... Não sei — Estranhamente eu não consegui imaginar essa possibilidade também, de aceitar ele com outra pessoa — Seria estranho vê-lo nos braços de outra pessoa.
— Você se sentiria magoado, Jimin — Seu olhar estava convicto demais — Você iria se sentir de lado, iria querer conversar com ele sobre essa pessoa. E então iria ver que gostaria de voltar no tempo e se declarar muito antes dessa pessoa aparecer.
— Jungkook não é meu para eu ter direito de reclamar sobre ele e sua vida.
Ele não possuía dever nenhum de se privar de ficar com as pessoas só porque o que tínhamos eram algumas provocações e sexo.
— O quê Jungkook faria se você entrasse em um relacionamento agora?
— Ficaria com ciúmes, como sempre faz quando Yoongi está por perto — Constatei.
— Mas você acha que ele aceitaria bem?
— Não.
— Então por que você deveria aceitar também?
Hoseok devia fazer uma mudança e tanto na vida de Taehyung, nunca eu em minha vida me imaginei estar recebendo conselhos vindos dele.
— Por que é o certo a se fazer.
Taehyung suspirou profundamente.
— O certo seria você correr até ele, dizer como se sente e tentar fortalecer o laço de vocês.
— Que laço o que, Tae, está louco?
— Para de contestar tudo, caramba — Ele massageou suas têmporas por um momento — Eu só quero dizer que vocês podem... Sei lá, tentar algo diferente.
— Tipo um namoro?
— Exatamente, tipo um namoro. Sabe, onde pessoas que se gostam tentam algo mais respeitoso entre elas... Privacidade também.
— Eu não quero um namoro, Tae — Neguei veemente — Não quero, namoros são... tão complicados.
— Vocês dois já são tão complicados, qual o problema? — Perguntou, sem saber mais como me convencer — Isso tudo por causa daquele rapaz?
Com "aquele rapaz" Taehyung queria se referir a Taemin. E talvez ele estivesse com razão.
— Eu não vou forçar algo que pode... Não dar certo.
— Mas você gosta dos momentos em que está com Jungkook?
Jungkook era... Como eu posso dizer? Uma pessoa que certamente havia tomado um espaço na minha vida rapidamente. Era como um novo amigo que eu diria ser o mais confiável, porque a personalidade dele me passava segurança em todos os momentos. Mesmo que eu quisesse matá-lo em alguns momentos, era sempre tudo da boca para fora.
Jungkook era totalmente confiável.
— Eu amo esses momentos, Tae.
Meu melhor amigo sorriu antes de me mandar um olhar satisfeito.
— Eu acho que você já tem suas respostas, mas ainda tem medo.
Eu sempre teria medo quando o assunto fosse esse.
— Taehyung...
— É sério, Jiminnie — Ele soou um pouco manhoso, como se me convencesse a fazer algo e sabia que estava no caminho certo — Uma hora você vai perceber tudo com clareza.
— Tudo o quê?
— Você vai saber quando as coisas começarem a se encaixar.
Depois disso, meio que acabamos passando a tarde quietos no sofá vendo algum filme enquanto tudo o que eu fazia era pensar. Pensar em simplesmente tudo e todas as coisas possíveis. Eu só queria entender essas coisas que Taehyung queria me dizer.
No fim as contas eu queria mesmo aliviar essa tensão que eu mesmo havia criado em volta de mim. E só uma coisa vinha em minha mente.
— Tae, me diz uma coisa...
— O quê?
— Nós estamos na faculdade, certo?
— Certo.
— Então por que nunca fomos em nenhuma festa do campus?
Taehyung parou o que fazia, largando tudo o que tinha em mãos na mesinha de centro para me encarar "passado".
— Eu tinha me esquecido desse detalhe — Falou, descrenço — Jimin, eu totalmente esqueci que as festas acontecem praticamente toda semana.
— Dizem que as melhores são as dos estudantes de medicina — Eu não sabia de onde tinha tirado essa informação, mas estava na minha mente — Eu fiquei com vontade de ir em uma. Faz um bom tempo que eu não vou à uma festa.
— Você quer ir hoje?
— Não sei, você está a fim de ir? — Perguntei.
— Eu quero muito ir em uma festa, mas quero que Hoseok vá junto.
Ah, esses dois parecem que nasceram juntos. Credo.
— Hoseok já deu uma festa, não é? — Lembrei — Depois daquilo nunca mais fomos em uma.
Taehyung estava no celular, esperando uma resposta do quase namorado. Aliás, eles já estavam namorando ou não?
— O que ele disse?
— Hoseok vai levar Jungkook se formos ainda hoje.
Uh, quer dizer que eu iria ficar bêbado hoje? Acho que estou estrapolando os meus limites, mas foda-se, não é mesmo? E ainda teria Jungkook lá? Certamente esse seria o melhor dia para esquecer tudo por enquanto e aproveitar uma noite maravilhosa para desestressar.
Eu só faço tudo ao contrario mesmo, ao invés de pensar, irei esquecer por um momento.
Algo me diz que eu teria uma noite louca.
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