Skull
O som do osso se quebrando em baixo de mim é confortante, assim como o sentimento de minha mão batendo em carne humana. Sim, eu sei o quanto isso é doente... E não, eu não me importo.
Sinto o sangue espirrar em meu rosto e meu peito, mas não ligo nem um pouco. Minhas mãos já estavam vermelhas, e eu tenho certeza que escuto uma voz gritando comigo, mas eu não conseguia parar.
Porque tudo que eu via em baixo de mim não era o rosto do lutador... Era o rosto deles. Dos dois filhos da puta. E, por mais que eu saiba que estão mortos, seus rostos não saem da minha cabeça.
Sinto uma mão puxar meu ombro nu, e imediatamente me viro, meus punhos levantados para cima, pronto para meter porrada em quem quer que esteja me parando agora. Mas minha mão para no ar quando vejo o rosto do meu melhor amigo.
"É o suficiente, Skull... Mais um pouco e você teria matado o cara." Easton Wells murmura para mim, e, pouco a pouco, meus sentidos voltam.
Minha respiração era pesada, e eu ouvia a multidão gritando em volta do ringue. Forço a minha mão a relaxar, se abrindo do rígido punho que eu tinha e abaixando, tirando do rosto de East.
Olho para o cara que eu tinha acabado de brigar, e vejo que meu amigo estava certo. Mais um pouco, e ele estava morto. Seu rosto estava machucado para caralho, sangue o tornando irreconhecível. Não me sinto mal, por mais que saiba que provavelmente deveria. O cara está aqui, então sabe os riscos que vêm quando você sobe nesse ringue.
Principalmente quando você luta comigo.
Easton me entrega uma camisa, e eu boto, sem me importar em limpar o sangue que sujava meu peito e abdômen. A regata branca com o capuz solto nas minhas costas fica manchada de vermelho, mostrando o sangue aparente.
Eu aceno para meu amigo com a cabeça, e, sem falar nada, nós dois andamos para fora do ringue. Essa era a minha última luta da noite, apesar de todos aqui saberem que eu vou voltar semana que vem. E em todas as semanas depois disso.
East era o único que sabia onde eu estava. Ele não sabia o porque eu vinha para cá, assim como eu não sabia o porque ele vinha comigo. Nós dois apenas sabíamos que estávamos fodidos, em jeitos diferentes, mas na mesma intensidade.
Eu sabia tanto da vida dele antes da gangue quanto ele sabia da minha. Apenas que East é italiano, e, por algum motivo, está aqui a muito tempo. Viu sua mãe morrer, e é só isso que eu sei. Não pergunto, também. Eu tenho os meus demônios e ele tem os seus... O cara é como um irmão para mim, mas não compartilho isso com ninguém. E ele entende isso, porque também faz o mesmo.
Wells normalmente apenas vinha comigo nas lutas, e não entrava no ringue. Ele só estaria satisfeito se seu oponente estivesse morto. Assim como eu gostava de sentir o controle que uma luta me dá, ele gosta de sentir o poder que uma matança lhe dá. Eu não julgo nem um pouco.
Andamos juntos pelo corredor, as vozes e pessoas gritando ficam para trás. Não paro para cumprimentar Rob, o dono do lugar, e ele também nem tenta. Todos aqui já estão acostumados comigo depois do ringue.
Nós dois caminhamos para fora do lugar, até onde as duas motos estavam paradas. Levanto o capuz da regata, cobrindo meu rosto, e subo na minha Harley, ao mesmo tempo que East faz o mesmo.
Eu venho para esse lugar a sete anos, mais ou menos. Foi em uma luta que conheci East, enquanto ele desfigurou a cara de seu oponente. Depois que o vi lutar, levei o menino para o bar e o fiz fazer o teste para a gangue. Nós vamos juntos para as lutas desde então.
Não precisamos nem mesmo falar para onde estávamos indo. Eu ia voltar para o trailer, considerando que eram três horas da manhã, e East ia encontrar algum ladrão, cafetão, traficante... Alguém para matar. Era nossa rotina a um bom tempo agora.
Dou partida com a Harley em direção ao trailer, e ouço o barulho da moto de East se distanciando, indo para a direção oposta a minha. O que quer que assombrava o passado do moleque era, provavelmente, tão ruim quanto o meu. Eu não sabia, e eu não perguntava.
Não paro no caminho de volta para o trailer, sem pensar em muita coisa. Eu nunca ia para o bar depois de uma luta, porque por mais que eu ame a minha gangue, eles não teriam o mesmo entendimento que eu tenho com East. As perguntas viriam. Skull, porque você está lutando? Porque tem sangue na sua camisa? O que diabos aconteceu com você para torná-lo assim?
E nenhuma dessas perguntas eu sou capaz de responder.
Paro a Harley na frente do trailer e desço, buscando as minhas chaves no bolso. Eu sabia que o lugar estaria vazio, considerando que meu irmão não dá sinal de vida a uma semana, com exceção daquele bilhete dizendo que estava bem.
Eu não gostava de brigar com Wade... Porra, tudo que eu fiz na minha vida foi com o propósito de deixá-lo a salvo, mesmo que fossem coisas fodidas. Mas eu sabia que ele já estava irritado com o fato de eu estar me fechando.
A nossa briga, mais de um mês atrás, apenas confirmou isso. Eu realmente não queria que meu irmãozinho tivesse raiva de mim, mas contar a ele o que aconteceu estava fora de questão. Não quero estragar a ingenuidade que ele ainda tem sobrando, mesmo que não saiba que existe... Porque isso é algo que não tem como recuperar.
Conhecimento pode ser uma cadela às vezes.
Então, quando ele fugiu a uma semana, depois que Clarke Jones, uma menina da gangue, foi morta, eu nem tentei procurá-lo. Sabia que estava bem, e isso é tudo que eu tenho que saber.
Entro no trailer e jogo a chave no balcão perto da porta, imediatamente tirando a regata suja de sangue. Vou direto para o banheiro, precisando de um banho.
Ninguém sabe o quão fodido eu estou... Eles não podem nem chegar perto de adivinhar. Porque, por mais que tentem, nunca vou dizer a verdade.
O que aconteceu comigo quando eu tinha apenas sete anos é meu fardo para carregar.