Era pra ser só um beijo de contenção. Como um daqueles tapas que você dá na cara de uma pessoa histérica pra fazê-la enxergar a realidade e se acalmar. Só isso. Mas ela reagiu totalmente fora do que ele esperava; ela era uma criança, mas reagiu como uma mulher devia reagir. Tirou a ação dele por um momento. Estava um pouco fria, provavelmente pelo estresse e pelo susto, e se retesou no primeiro momento, mas então ele sentiu as mãos dela agarrando a camisa dele e retribuindo... Retribuindo como um beijo devia ser retribuído, com vigor, com gana, com vontade. Sem pensar, pelo puro instinto, ele passou um braço pela cintura dela, ajeitando-a em seu peito, fazendo-a oscilar na direção dele, pequenina que era, e ela arfou, sentindo os lábios dele se tornando mais exigentes, como que mais gananciosos, mais agressivos.
Você é especial, uma original
Porque não parece assim tão simples...
Tudo ali era novo. Não havia inexperiência ou nada disso. Ele sabia exatamente o que estava fazendo e como fazer. O toque era firme, ele cheirava a loção pós-barba e algo leve de colônia masculina. O cérebro dela não estava funcionando; entrara em curto. Estava agarrada a camisa dele, tecido caro, macio ao toque, e sentiu o braço dele envolver a cintura dela, esmagando-a contra o peito dele. Ela era pequena o suficiente pra caber perfeitamente ali e a sensação foi... Curiosa. Num sentido bom. Soltou uma das mãos, subindo pelo rosto dele, sentindo a barba por fazer e entrando pelos cabelos dele. Estranho, em todos esses dias nunca pensara em tocar os cabelos dele, mas agora era importante. A boca dele tinha gosto de algo amargo e ao mesmo tempo lembrava uvas. Inebriava ela. A língua dele buscava a dela e, apesar do fato de a respiração estar cada vez mais precária, ela sentia que era de extrema importância que aquele contato não se perdesse.
E eu não posso evitar olhar
Porque eu vejo verdade em algum lugar dos seus olhos.
Então os dois cambalearam, ele erguendo as mãos e levando aos cabelos dela, os dedos cheios dos cachos dela, freando o beijo tão bom. Os dois levaram um instante recuperando a respiração, as testas coladas, ela de olhos fechados e ele com os olhos abertos, observando-a, até que ela o olhou.
Anahí: Por que você fez isso? – Perguntou, rouca, parecendo ainda menor.
Alfonso: Pra você ver que você é perfeitamente capaz de atrair qualquer homem a sua volta, e isso não seria favor nenhum. – Respondeu, gentil, soltando os cabelos dela com cuidado – E você ainda está amadurecendo. Vai se tornar uma mulher linda, eventualmente.
Anahí: Eu... – Tentou, organizando a mente enquanto ele se afastava.
Alfonso: O que há em você que um homem possa não querer? – Devolveu, piscando em retorno. Ela sorriu, abaixando o rosto.
Eu nunca poderia mudar sem você.
Você me reflete, eu amo isso em você
E, se eu pudesse, olharia pra nós o tempo inteiro.
Anahí: Obrigada. – Agradeceu, finalmente tendo se acalmado.
Alfonso: Por nada. Vamos, já devem ter servido meu almoço. Você precisa comer, terminar de se recompor, depois decidimos o que fazemos. – Ela piscou por um momento – E lá vai você... – Lamentou, vendo o sorriso nascendo no rosto dela.
Anahí: Você vai me deixar subir?! – Perguntou, se aproximando dois passos.
Alfonso: Direto pela boate. – Ralhou e ela riu de leve – Sem parar nem se o elevador quebrar. É térreo – meu apartamento – meu apartamento – térreo. Tire esse sorriso da cara antes que eu me arrependa. – Avisou, revirando os olhos e dando as costas.
A viagem de elevador foi longa; cinquenta andares. Ele tinha a sobrancelha erguida pro sorriso convencido dela. Piorou quando os dois passaram 49º andar, e ele precisou deitar a cabeça no ombro, refreando a animação dela. O painel mostrou o 51º - a boate – e ele cruzou os braços, observando-a. Era meio cômico, ela com as bochechas vermelhas de curiosidade pelo que estava por trás da porta e repreendendo-a de sacanagem. Por fim as portas se abriram no 52º: O apartamento dele.
Uma sala bem mobiliada com uma varanda que dava pra cidade, quatro sofás formando um quadrado amplo no centro da sala e uma mesa de centro. O chão era em mármore escuro. Tudo muito amplo, muito espaçoso, extremamente masculino. Ela entrou olhando em volta, mais uma vez absorvendo tudo. Ele se sentiu um tanto quanto exposto perante a curiosidade dos olhos azuis, mas não disse nada. A esquerda da saída do elevador havia um bar; não um barzinho, um bar enorme, uma parede coberta por garrafas das mais diversas bebidas, a maioria de cor âmbar, com uma luminosidade incandescente atrás. Havia um balcão a frente, também em mármore, e bancos. Nas outras paredes haviam estantes com livros. Na extremidade contraria direita a varanda havia um arco largo feito de algo que lembrou pedra clara a ela, numa arquitetura que lembrava slides sobre a Grécia que ela vira, e no cômodo que dava acesso ela podia ver uma cama enorme bem ao fundo. O quarto dele. Estava escuro, todavia. Tudo muito casual, com uma displicência que exalava sofisticação.
Anahí: Sua boca estava amarga. – Observou, distante, olhando a disposição das garrafas.
Alfonso: Eu estava bebendo antes de você chegar. – Respondeu, divertido com o comentário, esperando-a terminar o inventario.
Anahí: Uvas. – Comentou, vendo uma taça quase vazia largada no balcão com uma uva solitária no fundo – Você fica sozinho aqui?
Alfonso: Na maior parte do tempo. – Admitiu. Ela fez a volta pelo balcão.
Anahí: É muita bebida. – Comentou, olhando no geral.
Alfonso: E você é menor de idade. Cai fora. – Dispensou, e ela rolou os olhos. Ele se aproximou, se debruçando no balcão e apanhando um telefone atrás – Herrera. Pode mandar subir meu almoço. Refeição para dois. Obrigado. – E desligou.
Anahí: É um lugar legal. Vista legal. – Admitiu, olhando a varanda fechada.
Alfonso: Ora, obrigado. – Disse, encostado na bancada. Olhou a taça quase vazia, esvaziando-a com um gole.
Anahí: Como você começou isso tudo? – Perguntou, se virando para olhá-lo.
Alfonso: Me formei. Encontrei um emprego. Sabia que era pouco. Comecei a trabalhar e nunca comprar nada pra mim mesmo. Juntar dinheiro. Levou alguns anos pra juntar algum capital. – Lembrou – Conheci Madison. Somamos capital, tínhamos um início. Começamos do zero. Trabalhamos duro. Conhecemos pessoas. Ampliamos horizontes. Adquirimos informação.
Anahí: "Informação é poder". – Citou, os olhos azuis sondando-o.
Alfonso: Crescemos. – Assentiu, apontando em volta.
Anahí: Vago... – Dispensou – Você sempre foi solteiro? – Perguntou, dando pela ausência de porta retratos.
Alfonso: Quem disse que eu sou solteiro? – Perguntou, franzindo o cenho.
Anahí: Você acabou de me beijar. – Apontou, obvia.
Alfonso: Eu precisava que você se acalmasse. Não significa um termo de compromisso. – Ela assentiu.
Anahí: Onde estão as coisas da sua mulher, então? Sua família? – Ela apontou em volta. Era absolutamente pessoal. Ele sorriu de canto.
Alfonso: Estamos observadores hoje. Vou dever essa resposta. Não quero estragar o bom clima. – Ela assentiu, então virou as costas, sumindo na direção do quarto. Havia um degrau ao passar pelo portal de pedra. Os sensores iluminaram o cômodo quando ela entrou. Ele riu de leve – Ok.
O quarto era grande como os do hotel, mas de alguma forma era ainda mais sofisticado. Os jogos de cama eram grafite e branco, os moveis eram escuros, havia um painel com um espelho aos pés da cama. Ela parou, observando. Sem porta-retratos. Poltronas, cômodas, tudo em harmonia deixando a cama enorme como destaque do cômodo. Ela caminhou, olhando em volta. A iluminação fluorescente dava um toque quase que moderno ao lugar, resultado do modo como as luzes eram direcionadas. Ela deu alguns passos, passando os dedos pelo edredom, e era macio como era de se esperar.
Alfonso: Pode pular, se quiser. – Autorizou e ela mostrou a língua, fazendo-o sorrir.
Anahí: Onde você prefere ficar, aqui ou em Venice? – Perguntou, olhando em volta.
Alfonso: Hum... Bom, aqui além da praticidade do trabalho eu tenho mais privacidade, por motivos que você não tem como entender agora. A casa... Complexo... Imóvel em Venice está sempre cheio demais pro meu gosto. – Admitiu – Eu fico só aqui. Lá sempre há pelo menos mais um. Em compensação, lá é na beira da praia. O perfume e o som do oceano não podem ser comparados. É difícil escolher. Depende do momento.
Anahí: Você gosta de ficar só? – Perguntou, olhando-o.
Alfonso: 80% do tempo. – Confirmou.
Anahí: Ok. - Ela tocou uma porta e revelou um banheiro. Não entrou. Ele colocou as mãos nos bolsos, deixando-a vasculhar sua privacidade. Continuou caminhando até achar outra, que deslizou mostrando um closet farto. As luzes se acenderam, mostrando uma coleção extensa de ternos escuros enfileirados, camisas penduradas, entre outras coisas que ela não observou porque virou para olhá-lo – Ternos?
Alfonso: Eu sou um homem de negócios. – Se defendeu, se fazendo de ofendido.
Anahí: Nunca vi você em um terno. – Observou.
Alfonso: Me viu de terno no seu colégio. – Corrigiu e ela ergueu as sobrancelhas. Houve o barulho de um sino vindo da sala – Certo, você pode terminar de desbravar o apartamento e invadir minha privacidade depois. Nosso almoço chegou. – Apontou, indicando a sala com a cabeça, e os dois saíram.
O almoço foi delicioso, mas ela meio que se acostumara a comida sofisticada do hotel. Comeram no balcão do barzinho. Falaram pouco... Até terminar. A chuva prometida até então caiu lá fora, mas era o tempo de Los Angeles: Uma hora incendiando de calor, na outra se derramando em chuva.
Anahí: Certo...
Alfonso: Lá vamos... – Murmurou, pondo o guardanapo dobrado do lado do prato.
Anahí: O que pode haver de tanto trabalho pra você fazer aqui, afinal de contas? – Perguntou, e ele ergueu as sobrancelhas – Não me olhe assim, eu percebo que é algo enorme, mas meio que se controla sozinho a certa altura. E fora essa Madison você citou o nome de mais pessoas que trabalham pra você. Trabalham na administração.
Alfonso: Ok, madame, devagar agora. Você não lembra os nomes porque estava dormindo, o que é displicência sua. "Essa Madison" adora tirar férias fora de hora, caso não tenha percebido ela não esteve aqui desde que você apareceu. – Alfinetou – Por último, existe uma diferença entre trabalhar "pra mim" e trabalhar "comigo". Minha equipe trabalha comigo, isso é importante.
Anahí: Oh, ok, não precisa se inflamar. – Ele revirou os olhos.
Alfonso: Certo, última parada da tour e eu preciso levar você pra casa. – Apontou, se levantando.
Ela foi sem questionar por mera curiosidade. Ele os guiou para uma porta na lateral da sala, porta simples que deu para um escritório simples. Havia um monitor grande preso na parede, uma mesa com um computador, estantes com arquivos nas paredes. Ela olhou em volta, dando um passo pra dentro, e ele literalmente colocou uma mão na cintura.
Alfonso: Isso é, literalmente, o que transborda da Skyfall pra dentro da minha casa. – Apontou, erguendo a sobrancelha – Assuntos do hotel e da boate que não conseguem ser resolvidos a tempo e eu preciso literalmente trazer pra cá.
Anahí: Ok, eu não quis irritar você. – Ele riu de leve.
Alfonso: Dificilmente. Eu só estou mostrando como o mundo adulto realmente funciona. Odiaria pensar que perdi as últimas semanas falando pro vento. – Assentiu – Vamos.
O caminho pra casa teve temas mais leves: Ele fazia perguntas simples e ela se irritava com os temas, o que o fazia rir. Ele morava no centro, o que rendeu um caminho longo, mas era domingo, então não demorou muito. Ele encostou e ela soltou o cinto, pronta pra descer.
Alfonso: Espere. Eu preciso falar uma coisa com você antes de você ir. – Começou, mas foi interrompido.
Anahí: Agora? – Perguntou, exasperada, olhando por cima do ombro.
Alfonso: Estamos em cima da hora pra alguma coisa? – Perguntou, ultrajado.
Anahí: Seu carro é ofensivamente caro pro ego dos meus vizinhos. – Ele ergueu as sobrancelhas – É capaz de encontrarem meu pai se virem. Espera. – Ele franziu o cenho, olhando ela mexer na mochila, quase com o braço todo afundado. – Aqui. – E surgiu com um chaveiro escandaloso, procurando alguma coisa. Apertou o botão da janela, abrindo-a e bipou a porta da garagem, que começou a abrir.
Alfonso: Certo, não é pra tanto. Eu só preciso dar um alerta. Já teria dado se você tivesse parado quieta. – Ela revirou os olhos.
Anahí: Você quer sumir com esse carro logo? – Perguntou, olhando pelo retrovisor.
Alfonso: Criança, você está ouvindo o que eu estou dizendo? – Perguntou, exasperado.
Anahí: Alfonso, se está com medo da baliza meu pai já me ensinou o suficiente, é só trocar o banco. – Sugeriu, virando o rosto pra encarar ele, que fechou a cara.
O carro deu um solavanco quando ele girou o volante, trocando a marcha, e o motor macio o fez deslizar e encaixar dentro da garagem de uma vaga só. Questão de segundos. Nem deu tempo de ele retrucar uma resposta pra ela: Quando virou pra olhá-la ela já havia pulado pra fora e espiava a rua, encostada na porta da garagem.
Alfonso: Está chovendo. Você é neurótica. – Dispensou, descendo do carro. Ela mostrou o dedo pra ele. – Quando pensamos ter avançado no linguajar, retrocedemos nos modos. – Tomou nota.
Anahí: Ok. – Murmurou após alguns instantes e apertou o controle de novo, fechando a porta – Nunca mais me pegue desprevenida assim outra vez. Sorte sua meu pai deixar o carro dele na garagem da rua quando viaja. – Ralhou, passando por ele como se ele tivesse feito algo inacreditável. Alfonso levou alguns instantes pra processar que havia sido chamado atenção por ter dado carona a ela, mas então ela já havia entrado em casa.
O corredor principal passava por uma cozinha simples, pequena, que deu em uma sala. Ela estava lá, ligando as luzes. Parecia ainda mais senhora de si agora que estava em seu próprio território. Era uma pena saber que ele ia fazer o humor dela murchar, pensou, quieto.
Anahí: Bienvenido a mi casa. – Disse, se fazendo de simpática.
Alfonso: Você é maluca, neurótica, grosseira, mal-agradecida e seu espanhol é péssimo. – Enumerou, fluidamente – Obrigado, de qualquer forma.
Anahí: Você fala espanhol? – Perguntou, passando por ele.
Alfonso: Entre outras línguas. Nasci na Espanha. – Ela não respondeu. Ele a seguiu no corredor, começando a ficar impaciente – Você pode parar um instante? Eu realmente preciso falar com você.
Anahí: Depois que eu tomar um banho. Sério, eu estou um nojo. – Dispensou, ligando a luz do quarto e pendurando a bolsa em um cabideiro. – Espaço pessoal. Fique à vontade. – E saiu antes que ele pudesse protestar.
Bem, era a vez dele de invadir a privacidade dela, supôs... E o quarto dela era surreal. Surreal no nível infantil. Lembrava um quarto de criança em alguns pontos. Ele parou, olhando em volta. Paredes beges. Moveis claros. A roupa de cama tinha listras roxas e lilases. E um urso de pelúcia entre os travesseiros. No canto do quarto uma escrivaninha com um notebook, alguns porta-retratos com fotos dela com amigos e com o pai e um carregador de celular. Vários post-its. Havia um guarda-roupas e uma penteadeira.
E uma cadeira com uma quantidade fora do normal de roupa acumulada em cima.
Ele se aproximou da escrivaninha, e os post-its eram prazos de trabalhos que ela não fizera. Todos pra vencer. Ele revirou os olhos, olhando os porta-retratos. Não reconhecida ninguém, só uma versão ainda mais nova dela. Se aproximou da cama, havia um criado mudo com mais um porta-retratos (ela em uma praia com um chapéu enorme fazendo bico) e um abajur. Apanhou o urso na mão, distante em seus pensamentos. Tivera um deslumbre diferente hoje, mas em boa parte ainda ela era uma criança.
Anahí: Você conheceu o Léo. – Disse, sorrindo de canto. Ele a olhou, saindo de seus pensamentos.
Alfonso: Você ainda tem ursinhos de pelúcia. – Debochou, virando o urso pra ela.
Anahí: Urso. No singular. Meu pai ganhou esse urso pra mim no meu aniversário de 14 anos em um tiro ao alvo num parque de diversões. Ele tentou 23 vezes pra conseguir ganhar o urso pra mim. – Ele ergueu as sobrancelhas.
Alfonso: Ok. Léo, então. – Aceitou, pondo o urso de volta no lugar. Aceitável. – Você precisa zerar aqueles post-its e você sabe disso. – Ralhou e ela suspirou.
Anahí: Jesus... – Suspirou, se jogando na cama.
Alfonso: Vai precisar te ajudar. – Confirmou.
Anahí: É isso que você quer falar comigo? – Perguntou, destapando o rosto e ele piscou, se lembrando.
Alfonso: Ah, sim. Veja. – Ele se sentou, dobrando a perna. Ela se amparou no braço. Usava um moletom azul que deixava os olhos dela ainda mais ressaídos – Não me faça perguntas e foque no que interessa do que eu vou dizer.
Anahí: Lá vem bomba. – Ele a repreendeu com o olhar. – Estou ouvindo.
Alfonso: Acontece que eu conheço muito as pessoas. Eu sei muito sobre pessoas e sobre como elas agem. Sem perguntas, Anahí. – Cortou – E, pelo que você me explicou desse garoto, Benjamin, ele foi um cretino com você, um babaca, você foi maravilhosa se defendendo dele, e mais uma vez estou orgulhoso...
Anahí: E... – Perguntou, se ajeitando, incomoda dele ter voltado no assunto.
Alfonso: E você machucou o ego dele. – Concluiu.
Anahí: Eu só me defendi! – Exclamou, pulando sentada.
Alfonso: Ei, anjo, eu sei! – Acalmou, e ela se apaziguou por um momento. Era a primeira vez que ele usava um apelido carinhoso com ela. Nenhum dos dois notou. Uma pena – Eu sei disso. Mas ele investiu em você, você o rejeitou. Se eu sei algo sobre pessoas, e acredite, eu sei, isso feriu o ego dele.
Anahí: E daí? – Perguntou, ainda na defensiva.
Alfonso: E daí que ele pode tentar revidar. Pessoas tendem a fazer isso, e você não pode ser pega de surpresa. – Disse, tocando o queixo dela com o polegar.
Anahí: Você acha que ele vai tentar me agarrar de novo?! – Grasnou, pegando impulso pra se levantar. Ele a manteve pelos braços.
Alfonso: Não. O tempo pra isso passou. Nem tampouco eu permitiria. Você está segura, acredite. Acontece que amanhã você tem aula outra vez. – Ela hesitou – Ele pode tentar atingir você, tentar envergonhar você de alguma forma, o que na cabeça louca dele "equilibraria" as coisas. Algum tipo de comentário besta, de brincadeira idiota, qualquer coisa que acaricie o ego rejeitado dele. E você não vai ser pega de surpresa, certo? – Perguntou, paciente.
Anahí: Porque ele faria isso? Não havia ninguém lá pra saber o que houve. – Murmurou, com o cenho franzido.
Alfonso: Não, mas ele pode achar que você é idiota como ele é. Que você contaria a sua amiga, Kristen, ou a vai saber quem mais, que ele investiu e você rejeitou ele. – Ela tombou na cama, levando as mãos ao rosto – Então você vai manter esse seu queixo erguido, vai usar o mesmo tipo de teimosia que você pratica tão bem comigo, e você vai se sair bem. É só não dar corda. Ele não tem nada contra você.
Anahí: Todo mundo vai ficar sabendo. – Murmurou, mortificada.
Alfonso: Bem, isso não está nas suas mãos. Mas cabe a você sair da situação por cima. – Ela continuou com o rosto debaixo do braço. – Ok?
Anahí: Se você diz. – Pelo tom de voz ela obviamente discordava.
Alfonso: Você vai ficar bem. Eu preciso ir agora. – Ela sentiu a cama sacudir quando ele se levantou – Onde você colocou as chaves da garagem?
Anahí: Na mesinha da sala. – Ele assentiu e ela o viu se levantar. Se viu também acompanhando-o, cautelosa. De repente se sentiu solitária demais – Escuta... – Ele a olhou – Eu não sei se você já tem planos ou qualquer outra coisa, mas...
Alfonso: Está hesitando. Nunca hesite; é seu direito dizer as pessoas o que você pensa, e não nunca deve temer por isso. Vai aprender com o tempo. – Ela assentiu – Ande, o que quer me perguntar?
Anahí: Eu... Eu não quero ficar sozinha hoje a noite. – Ele assentiu – Meu pai está fora, Kristen deve estar com Robert...
Alfonso: Você quer que eu fique? – Cortou, os olhos sondando-a.
Anahí: Eu realmente não gostaria de ficar sozinha agora. – Admitiu. Alfonso a observou por um instante, suspirando em seguida e assentiu.
Alfonso: Compreensível. – Aceitou – Eu fico. – Aceitou, razoável, e ela sorriu.
Anahí: Obrigada. – Ele assentiu, apanhando o celular no bolso – Minha cama não é grande como as do hotel, mas cabe nós dois.
Alfonso: Não duvido, mas vou me dar o benefício da dúvida. Eu me acomodo bem no sofá. – Ela franziu o cenho e viu o tom de deboche tingir o olhar dele – Seria descortês de minha parte invadir a privacidade de uma dama. – Justificou, solene.
Anahí: Você é arcaico. – Murmurou, de maus modos, revirando os olhos e esbarrando por ele ao passar no corredor. Ele só riu de leve, digitando uma SMS, vendo-a abrir o quarto do pai e sumir lá dentro.
Anahí apanhou uma muda de roupas de cama e travesseiros, de modo que um dos sofás virou uma cama. Ele não quis nada, apenas ordenando veementemente que ela fosse dormir. Ela foi, mas ele continuou acordado, apenas com o abajur ligado, respondendo alguns e-mails. Durante a madrugada se levantou por água, e terminou resolvendo checa-la. Ainda chovia. Madison soltara dez cachorros nele por e-mail ao saber onde ele estava; Nathaniel soltara cinquenta.
Ele abriu a porta devagar, espiando. Anahí dormia encolhida na cama, com o celular na mão e o abajur ligado. Ele entrou, tirando o celular dela e apagando a luz. Apanhou o edredom e a cobriu. Ela se esticou feito um gato, suspirando no sono. Ele sorriu de canto, olhando-a, e em seguida, só por impulso, ergueu a mão, tocando a maxilar dela. Teimosa, insuportável, invasiva, desrespeitosa, desleixada... Linda, se defendendo quando preciso. Jovem demais pra precisar se defender. Ele fez um breve carinho no cabelo dela e saiu, um pensamento brincando na cabeça enquanto fechava a porta.
Era estranha e disfuncional, mas realmente desenvolvera afeição pela garota. Talvez ela estivesse certa ao intitula-los "amigos", afinal.
- Acorde.
- Hum...
- Seu celular é programado pra desistir de te chamar sem você precisar acionar a função soneca. Você já determinou que vai se atrasar. É um péssimo habito. – Repreendeu, parecendo meio indignado.
Anahí: Oh, meu Deus, você ainda está aqui. – Gemeu, erguendo o edredom até a cabeça e sumindo lá embaixo.
Alfonso: Que tipo de amigo eu seria se fugisse durante a noite? – Perguntou, ainda se divertindo com a ideia de ser amigo de uma adolescente – Parou de chover. Você vai se atrasar para escola. – Ela descobriu o rosto. Tinha o rosto inchado pelo sono, os cabelos alvoroçados em um lindo tom de chocolate ao redor do rosto.
Anahí: Eu... Eu acho que não vou ao colégio hoje. – Disse, hesitante.
Alfonso: E isso por que...? – Incitou.
Anahí: Não estou me sentindo bem. Deve ser uma virose, pela virada de tempo e tudo. – Justificou. Ele hesitou por um momento, os olhos de águia passeando pela expressão dela, então sorriu. Estava sentado ao lado dela, na cama.
Alfonso: Você está mentindo. – Acusou, divertido, se levantando.
Anahí: Não estou! – Ele cruzou os braços – Como pode saber?
Alfonso: Simples. Por que eu nunca menti na minha vida. – Disse, tranquilo – Logo eu sei reconhecer quando vejo alguém mentir. Ande, levante.
Anahí: O que é isso agora? "Nunca menti na minha vida"? – Perguntou, se sentando e vendo ele abrir seu closet. Alfonso franziu o cenho brevemente, olhando pros lados. Estava todo amassado por ter dormido do sofá, mas sua roupa ainda era melhor que tudo ali.
Alfonso: Certo. – Ele se encostou no portal do closet – Meus pais eram religiosos. Muito. Eu fui educado em um internato católico. Minha formação inteira foi tendo a ideia de que se eu contasse uma mentira, por menor que fosse, Deus saberia e eu iria pro inferno. – Ela tinha um sorriso enorme na cara.
Anahí: Você está de sacanagem. – Ele riu de leve.
Alfonso: Pode rir, mas eu tinha pavor de ir pro inferno. Optava por dizer a verdade e arcar com o que eu tivesse feito do que arriscar a ira de Deus. Vai saber. – Insinuou, piscando pra ela. – Depois, quando alcancei idade o suficiente pra perder o medo do inferno, eu percebi que era um feito muito grande ter vencido a infância sem ter contado nem uma mentirinha branca. Não quis manchar meu histórico. – Resumiu.
Anahí: E então...? – Perguntou, cruzando os braços.
Alfonso: Pouco tempo depois, eu tinha poder aquisitivo pra não precisar mentir. Eu digo a verdade e as pessoas vão precisar viver com isso. Eu nunca contei uma mentira na minha vida. – Repetiu.
Anahí: Onde estão seus pais? – Perguntou, entretida. Ele ergueu a sobrancelha.
Alfonso: Morreram em um acidente na fase da minha vida em que eu ainda tinha medo do inferno. Nunca rezei tanto na vida como pra que Deus os colocasse em um lugar de primeira no céu. – Contou, pondo as mãos nos bolsos – Agora, você vai levantar e me dizer como isso aqui é organizado ou eu vou precisar descobrir sozinho? – Ela piscou, como se tivesse esquecido do assunto.
Anahí: Alfonso, eu realmente não quero ir. Sério, só hoje. – Pediu, se ajeitando.
Alfonso: Por causa daquele otário? – Dispensou, erguendo a sobrancelha – Anahí, se você não vai, ele vence. – Mostrou, claro.
Anahí: Ele já venceu. Vai estragar meu dia. – Disse, quieta.
Alfonso: Não. Eis o que você vai fazer: Vai levantar dai, se aprontar e vai caprichar mais que nunca. Nada de maquiagem pesada, você não precisa disso, mas hoje você vai caprichar. – Disse, com o olhar pensativo – E você vai naquele colégio e vai ter um dia normal. Sabe por que você vence? Porque você é linda, e você vai esfregar na cara dele algo que ele quer e não tem. – Ela hesitou, então se levantou.
Anahí: E que seria...? – Alfonso sorriu de canto, tocando o queixo dela.
Alfonso: Você, querida. – Concluiu, suave. Ela sorriu de canto.
Anahí: Na esquerda ficam minhas roupas de sair. As melhores. Na direita minhas roupas mais tranquilas. – Apontou, e ele olhou. – Nós não podemos usar roupas no colégio, só farda. – Lembrou.
Alfonso: Qual o seu melhor jeans e tênis? – Ela vasculhou um instante, apontando – Falando sério? – Ela assentiu, franzindo o cenho – Certo, vá pro banho. Eu vou preparar seu café. – Ela ia reclamar – Pro banho, Anahí. – Ela foi e ele apanhou o celular no bolso, discando alguns números – Bom dia, passarinho.
- Bom dia, querido. O que houve?
Alfonso: Estou com uma demanda em cima da hora que só você pode me ajudar. – A pessoa esperou – Preciso de um ótimo par de tênis 36, um jeans daqueles que só você sabe encontrar, e uma... – Ele hesitou consigo mesmo – Uma camisa nova de um colégio. Pra meia hora.
- Uma... Farda de colégio?
Alfonso: Não me faça perguntas, o tempo está correndo. – Lembrou, saindo do quarto com a camisa de Anahí na mão.
- Quais os números?
Alfonso: Tênis 36, calça também 36. Ela tem uns 1,60cm. A pessoa que vai vestir ainda é nova, mas já tem um traseiro que você pode valorizar com a calça. Anota o nome do colégio pra comprar a camisa. – Avisou, dizendo o nome do colégio em seguida.
- Me dê 15 minutos. – E encerrou a ligação.
Anahí levou vinte debaixo do chuveiro. Quando saiu, havia um perfume de ovos e bacon pairando pela casa, vindo da cozinha. Ao entrar no seu quarto, de toalha, Alfonso estava sentado na beira da cama, de forma até engraçada do lado do urso dela, concentrado com seu celular. Havia um pacote ao seu lado na cama.
Anahí: E isso agora? – Perguntou, apontando as sacolas brancas ao lado dele.
Alfonso: Agora entendemos por que você sempre se atrasa. – Disse, com um olhar reprovador, olhando o cabelo dela, que pingava água – Isso é seu. Experimente, se não servir estamos estupidamente em cima da hora pra substituir. – Suspirou, voltando a olhar o celular. Nenhum dos dois pareceu minimamente desconfortável com o fato dela estar molhada e de toalha na frente dele.
Anahí se aproximou, desconfiada. Em uma sacola havia uma caixa com um par de tênis e meias. Ela franziu o cenho. Na outra sacola, uma camisa do colégio. Não era dela, pela embalagem estava nova, e um conjunto de lingerie. Ela ergueu a sobrancelha, indo pra terceira sacola.
Anahí: Puta que pariu! – Exclamou, fazendo-o se sobressaltar, e apanhou o jeans na sacola. Ele franziu o cenho, vendo-a se afastar com a calça na mão.
Alfonso: Você tem esses rompantes com frequência? – Perguntou, com a sobrancelha erguida.
Anahí: Cale a boca. – Alfonso cruzou os braços – Olhe isso! – Ela virou o jeans. Uma calça daquelas custaria um ano da sua mesada, se ela ganhasse o dobro do que ganhava. Cobiçara um daqueles há algum tempo, mas tirou da cabeça. Não é que fossem pobres, só não esbanjavam dinheiro, e ela não tinha nada de marca. Até agora.
Alfonso: Estou olhando e tentando entender. Não serve? – Ela negou com o rosto, olhando a sacola.
Anahí: Você comprou roupa pra mim? – Perguntou, rindo, e enfiou a mão na sacola – Ok, você comprou lingerie pra mim? Pra onde acha que eu estou indo, pro desfile da Victoria Secrets? – Perguntou, erguendo a embalagem de um conjunto caro de calcinha e sutiã de renda branca, que combinavam com a camisa da farda.
Alfonso: Acho que você está indo pro colégio atrasada outra vez. – Ralhou, se levantando – Vá se trocar. Seque esse cabelo. Capriche. – Ele apontou pra as roupas na cama – O café está esfriando. – Avisou, saindo – Ah, e, Anahí...
Anahí: Sim? – Perguntou, olhando as tramas da renda do sutiã que ganhara.
Alfonso: Estou encorajando você a ir pro colégio, porque é o certo a fazer. Estou estimulando você a erguer esse lindo queixo pra qualquer babaca que cruzar seu caminho, porque é o certo. – Apontou, sério – Mas durante o processo, você precisa estar bem. Nervosismo pode ser normal, mas passa. Se não passar, se você realmente não puder lidar com isso, você tem meu número. Você me liga e eu tiro você de lá, independendo da hora, certo? – Ela sorriu de novo.
Anahí: É a terceira vez que você diz que eu sou linda hoje, querido. – Brincou e ele revirou os olhos.
Alfonso: Eu sou um homem gentil, querida. – Rebateu, fazendo-a rir – Garota impossível. – Murmurou – Vá se aprontar!
Ela fez seu melhor naquele dia. Caprichou no secador, então seus cachos estavam macios, sedosos. Nada de maquiagem forte, o básico, e reforçou um tantinho mais no rímel. Usou seu batom favorito, deixava os lábios com a aparência de que ela tinha acabado de morder um morango, mas muito sutil. Os tênis eram macios e a calça era maravilhosa; o jeans se ajustou a ela, fazendo sua bunda empinar, parecia até maior! Não precisava usar aquela lingerie cara, poderia guarda-la para outro dia, mas acabou por descobrir algo que toda mulher sabe: Mesmo que ninguém vá ver, saber que você está com uma lingerie bonita faz sua auto estima ir as alturas.
Alfonso: É a quarta vez e eu estou me tornando redundante, mas você está linda. – Ela se sobressaltou, olhando-o pelo espelho. Ele piscou pra ela, sorria de canto – Precisamos ir, estamos em cima da hora.
O caminho de carro foi curto. Anahí novamente ficou psicótica com a ideia de alguém ver o carro dele saindo da garagem, novamente ele debochou da ideia. Conversaram sobre assuntos leves no carro, como cinema e musica, e Alfonso percebeu que gostava dela, quando não estava sendo irritante: Ela não trazia o peso da responsabilidade que conversas com adultos traziam.
Anahí: Ok, obrigada pela carona. – Ela se esticou, dando um beijinho na bochecha dele. Aparentemente esse agora era um habito normal – Até de tarde. – Era o primeiro dia da ultima semana do intensivo.
Alfonso: Ei. – Ela olhou pela janela, fechando a porta – Se algo sair do controle, você me liga. – Reforçou.
Porque com sua mão na minha mão
E um bolso cheio de alma...
Anahí: Certo. – Agradeceu, dando as costas.
Alfonso: Ei! – Dessa vez ele estava de sacanagem. Ela se virou, exasperada. – Se comporte.
Anahí: Cara, vai se foder. – Disse, incrédula, e ele riu gostosamente vendo-a subir os degraus. A calça realmente trabalhara a bunda dela.
Alfonso: Ei! – Ela ignorou, ajeitando a mochila preta nas costas – Anahí! – Nada. Ele buzinou e ela virou, parecendo estar respirando fundo. Ele riu de novo. – Sério. – Ela desceu os degraus, o vento da manhã jogando os cachos hoje mais brilhantes que o normal pelos ombros.
Anahí: Você sabia que se eu te der um murro, eu nem vou presa por isso? Vantagens de ser menor de idade. – Ameaçou, se inclinando no carro.
Alfonso: Estou ciente. Escute, é sério. – Ela fez uma cara de falsa compreensão – Mantenha esse lindo queixo erguido. Seja forte. Arrase com ele. – Ela sorriu canto – Faça isso, vença o dia... E eu deixo você entrar na boate. – Concluiu. Ela piscou uma vez, absorvendo a mensagem.
Eu posso te dizer:
Não há lugar onde eu não poderíamos ir.
Anahí: Você está blefando. – Ele riu de leve, negando.
Alfonso: Blefe é um tipo de mentira. – Apontou.
Anahí: E você é o homem que nunca mentiu. – Ele assentiu – Quando você diz "entrar na boate" não vai me deixar entrar e ficar barrada atrás de um balcão, né? – Ele riu mais gostosamente ainda.
Alfonso: Não. Acesso livre. Use isso como incentivo e como algo pra pensar durante o dia. – Ela sorriu, e ele viu ela corar com a expectativa.
Anahí: Você tem um acordo, Herrera. – Ele riu de novo com o tom profissional e comprometido dela.
Alfonso: Tenha um bom dia, linda. – Ela assentiu, sorrindo de canto e saiu de perto.
Apenas coloque sua mão no vidro,
Eu vou estar tentando te puxar.
Você só precisa ser forte.
Dessa vez ele não a chamou de volta: Estava atolado em trabalho. Anahí passou pelos portões com a cabeça longe; nem lembrava de Benjamin ou qualquer outra merda, mas ele a deixaria entrar na boate! A cabeça dela procurava imagens de como poderia ser lá dentro. Procurara na internet imagens do interior da boate, para descobrir que era norma do estabelecimento a proibição de fotos lá dentro. Inclusive, os clientes precisavam deixar seus celulares na recepção, antes de entrarem. Ela não fazia ideia do que esperar.
Kristen: Anahí! – Ela se sobressaltou, tendo andado até o refeitório sem perceber. Kristen vinha até ela afobada – Eu te liguei mil vezes!
Anahí: Eu... Eu juro que não mexi no meu celular ontem. – Era verdade – Eu estou okay, Kris. Oi, bom dia. O de sempre, por favor. – A moça do refeitório foi buscar o café.
Kristen: Eu ia até sua casa, mas desabou aquele diluvio! Nós voltamos e Ben disse que você tinha ido embora "de xilique". Eu não acreditei, Robert deu uma prensa nele e ele contou, mais ou menos. Estava confuso e em seguida eu meti a mão nele. Ele machucou você? – Perguntou, nervosa.
Anahí: Ele... Nós estávamos ficando e ele forçou uma barra. – Kristen assentiu, esperando – Eu disse não e ele continuou insistindo e forçando e ai eu meio que... Bati nele? – Kristen ergueu as sobrancelhas e ela riu de leve – Eu não sei, eu empurrei ele pra longe, ele caiu. Nós discutimos e eu fui embora. Ei. – Disse, pegando os lados da cabeça da outra – Eu estou bem. – Kristen suspirou, assentindo.
Kristen: Graças a Deus, eu estava morta de preocup... – Ela parou, olhando Anahí de cima abaixo, enquanto a outra provava o café – Uau. Olhe só pra você! – Disse, sorrindo.
Anahí: Não, olhe só pra minha bunda! – Exclamou, virando o quadril e apontando pra a amiga olhar – A calça faz milagre! – Kristen riu.
Kristen: Onde você conseguiu isso? – Perguntou, vendo a marca da calça presa na costura.
Anahí: Alfonso me deu. – Kristen ergueu as sobrancelhas – Eu fiquei muito nervosa ontem, depois de... Você sabe. – Kristen assentiu – Terminei indo pro hotel. Ele me acalmou. Eu não queria vir hoje, ele me deu roupas novas. – Disse, dando de ombros.
Kristen: E isso é ok? – Perguntou, parecendo em duvida. O primeiro sinal tocou acima delas.
Anahí: É. Eu acho. – Kristen ofereceu o braço – Você precisa ver o sutiã que eu estou usando! – Disse, em tom confidente e Kristen riu.
Anahí percebeu que nem lembrava mais como era estar no colégio no horário certo. Ao entrarem na sala havia já algumas pessoas, elas se sentaram e outros colegas foram chegando. Bateram papo durante esse tempo.
Kristen: Ele comprou uma calcinha pra você? – Perguntou, as duas sussurrando, inclinadas uma pra outra. – Que doideira é essa?
Anahí: Não foi ele. Não daria tempo. Acho que mandou alguém comprar. Meia, tênis, esse neném, - Apontou, fazendo carinho na calça – Lingerie e até essa camisa nova. Ele disse que era importante eu me sentir bonita hoje, depois de tudo.
Kristen: Faz sentido. – Admitiu, dando de ombros. Anahí olhou em volta, mas ninguém prestava atenção nela, a sala ainda na metade do que devia estar.
Anahí: Olhe só isso. – Murmurou, pondo a mão dentro da blusa após jogar os cabelos por cima do ombro e puxando um pedacinho da alça do sutiã.
Kristen: Wow. – Se admirou, tocando a renda alva – É tão delicado!
Anahí: É lindo! Faz conjunto com a calcinha e tudo! – Disse, sorrindo – No intervalo te mostro no banheiro. – Kristen assentiu, pondo a alça do sutiã de volta no lugar.
Kristen: Aw, agora estou com inveja. Devia ter me inscrito pra hotelaria também. – Anahí riu gostosamente.
Profº Thomas: Bom dia, todos. – As pessoas se aprumaram em seus lugares – Vamos começar hoje com a equação que eu passei pro final de semana, apanhem suas atividades. Ora, Anahí. – Se admirou, vendo-a ali – Que surpresa agradável vê-la aqui no horário.
Anahí: Quase não pude dormir de ansiedade com essa equação, terminei chegando antes da hora. – Debochou, apanhando o caderno na mochila. Alguns riram. O professor negou com o rosto, mas não deu corda.
Entretanto, dito e feito. Benjamin estava no lugar de sempre, no fundo da sala. Houveram murmúrios, cochichos e risos durante a manhã toda. A parte divertida foi ir ao banheiro e mostrar a lingerie legal a Kristen. Só isso a demoveu de descer a mão no garoto de novo, mas Anahí permanecia de queixo erguido, como se aquilo não fosse sobre ela. Até o intervalo.
Em período de intensivo, como os estudantes faziam visitas pelas tardes, as aulas eram apenas pela manhã ao invés de tempo integral, e o horário do almoço virava um horário pra lanche, no meio da manhã. Ela chegou com Kristen primeiro, as duas pediram o lanche, Robert veio depois. O idiota do garoto fez questão de sentar perto dela, ele e o grupo dele. Ela o ignorou, apesar das piadinhas. Então ela foi buscar sua bandeja, e ao voltar o grupo de amigos do garoto fez um pequeno coral de "Ave Maria" bem na hora em que ela passou. Anahí voltou pra mesa, as orelhas pulsando, olhando a comida.
Robert: Não ligue pra isso. Eles vão deixar pra lá. – Aconselhou.
Kristen: Eu ainda posso sentar a mão na cara dele. – Anahí olhava a bandeja, como se não visse nada a frente, os olhos azuis desfocados. Só as orelhas pulsavam de uma raiva quente. Não bastasse o que ele fizera, a manhã inteira fora esse inferno.
Anahí: Não. Eu resolvo meus problemas. – Agradeceu, apanhando a maçã que estava na bandeja e dando meia volta, na direção da mesa de Benjamin. Gerou uma leva de assovios, os garotos esperavam, animados. Benjamin a encarava, muito senhor de si.
Kristen: Começamos a semana comprando problema. – Aceitou, se pondo em prontidão pro caso de precisar ir ajudar. Robert tinha a mesma atitude, vendo Anahí se aproximar da mesa do outro dando uma mordida na maçã.
Anahí: Bom dia, garotos. – Os meninos assentiram, alguns rindo com animação – Ben, querido, como está hoje? – Perguntou, mastigando a maçã.
Benjamin: Ótimo. Escute, antes que você surte, nenhum de nós aqui está tentando nem pretende tocar em você, certo? – Confirmou, com tom de deboche. Ela sorriu de canto.
Anahí: Sorte de vocês. – Aceitou, tranquila – Tem algo que você queira me dizer? A mim, ao invés de ficar cochichando por onde eu passo como uma velha fofoqueira? – Outra leva de assovios. Ela mordeu a maçã de novo.
Benjamin: O que tinha pra te falar, disse ontem, garota. – Desprezou – E você, tem algo a dizer?
Anahí: Com licença, querido. – Piscou, afastando a bandeja de um dos amigos dele e sentou na beira da mesa, cruzando as pernas – Na verdade, eu tenho uma dúvida.
Benjamin: Diga. – Disse, com um sorriso enviesado.
Anahí: Já que você preferiu trazer o assunto a tona, tem algo que eu devia ter te perguntado ontem, mas como sai as pressas ficou por falar. – Ele esperou – Por que raios você acha que eu, ou qualquer outra garota aqui iria mesmo querer transar com você? – Perguntou, em tom de deboche. Assovios mais altos ainda vieram – Quero dizer, você mantém essa carinha de anjo, esse cabelinho engomado como quem literalmente usa goma, e acha que isso vai fazer uma garota querer tirar a roupa pra você? – Ela riu de leve. Agora os amigos dele riam dele, que tinha o semblante fechado.
Benjamin: Você devia sair daqui. – Aconselhou, o rosto denunciando totalmente sua irritação.
Anahí: Sério, com essa carinha de bebê que você faz questão de manter, o único motivo pelo qual uma garota iria querer você sem roupa seria pra trocar suas fraldas. Nós nascemos com instintos maternais, você sabe. – Ela brincou com o queixo dele, que empurrou a mão dela com grosseria. – Se enxerga, moleque. – Desprezou.
Robert: Anahí. – Chamou, da mesa deles, e ela olhou, os olhos azuis parecendo impenetráveis e assentiu.
Anahí: Mas tudo bem, eu entendo a tentativa. – Aceitou, se apoiando no braço e se aproximando dele, e a tensão na mesa aumentou. Todos queriam ouvir. Os dois se encaravam, os olhos dela parecendo curtir uma piada particular – Afinal, o que há em mim que um homem possa não querer? – Perguntou, em voz baixa, piscando pra ele em seguida e descendo da mesa, mordendo a maçã de novo.
Assovios, palmas e até mesmo alguns gritinhos acompanharam ela enquanto ela voltava pra sua mesa, de queixo erguido, sorriso no rosto (e a bunda divinamente empinada, graças a calça). Assunto encerrado.