Efêmero
Wei Yuan é filho de um professor de piano. Desde cedo, isso costuma o proporcionar alguns momentos no fim de tarde onde não consegue se concentrar para estudar por conta da música desajeitada dos alunos iniciantes. Uma nota errada, um erro no tempo, uma correção, sempre assim.
Faziam algumas semanas desde que o último aluno havia desistido do instrumento, algumas semanas de quietude e silêncio nos fins de tarde da terça e quinta-feira. Até que um novo aluno aparece disposto a pagar caro para ser ensinado sobre como colocar os dedos corretamente em uma porção de teclas brancas e pretas.
Wei Yuan já estava de saco cheio, a matéria de geometria era exorbitantemente cansativa e o aluno da vez cometia o mesmo erro há alguns minutos, precisando sempre voltar ao começo. O jovem fechou os cadernos e livros e guardou-os. Suspirou frustrado ao se afastar da escrivaninha e imaginar que precisaria responder a uma prova inteira no dia seguinte sobre uma matéria que não entrava em sua cabeça.
E então, questionou-se da falta de som. O som do piano havia parado, mas lembrava-se bem que o aluno ainda não havia corrigido o erro. Estranhou, saiu do quarto e foi até as escadas, escondendo-se furtivamente na tentativa de descobrir o porquê de terem cessado.
Yuan então percebeu que seu pai havia se afastado para atender uma ligação. Pensou que não havia motivos para não descer e se apresentar, já desistira dos estudos por aquela tarde, de toda maneira...
"Boa noite..." Wei Yuan começou a dizer enquanto se aproximava do outro jovem, sentando-se ao lado dele no piano. Lembrava-se bem que aquela já deveria ser sua terceira aula e só agora havia vindo para se apresentar. "Eu me chamo Wei Yuan, mas pode me chamar de Lan Yuan se assim preferir." Mantinha a simpatia por questão de educação.
"Jin Ling, é um prazer." O Jin estranhou a aparição e apresentação repentinas, mas pôde apenas aceitar a gentileza na voz do outro jovem.
Wei Yuan o observou, reparando em alguns detalhes: os olhos castanhos claros com longos cílios, o cabelo liso e de corte caprichoso, além dos lábios vermelhos; por um momento, Wei Yuan se questionou sobre a naturalidade da cor e, depois de um tempo, concluiu que Jin Ling provavelmente usava algum tipo de batom.
O novo aluno também parecia vaidoso; seu estilo implicava em algum tipo de moda alternativa, com os brincos pendurados em ambas orelhas, as diversas pulseiras que adornavam seu braço e as unhas pintadas. As roupas que vestia já eram mais comuns: calça capri rasgada com uma camisa amarela clara folgada e sapatênis. Wei Yuan o achou muito diferente dos outros garotos que já apareceram por ali. Na verdade, ele não parecia alguém que estaria interessado em frequentar aulas de piano.
"Eu sou o filho do professor, desculpe-me por não ter me apresentado antes." O jovem disse quando parou de encará-lo, poucos segundos antes de ser considerado estranho, dessa vez fixando seu olhar nas teclas do instrumento.
"Tudo bem." Jin Ling foi quem decidiu observar dessa vez, espantado com a beleza do menino diante de si. "Você sabe tocar piano?"
"Sei um pouco, mas não sou tão bom quanto meu pai." Tocou alguns acordes apenas pelo desejo de ouvir o som.
"Posso ouvir você tocar?" O Jin pediu, observando como as mãos se moviam em ágeis e dançantes movimentos sobre as teclas. Ele havia tocado uma melodia simples, mas apreciável. Jin Ling não fazia ideia de como tocar aquilo; estava muito além dos seus conhecimentos que atualmente resumiam-se em 'Dó Ré Mi Fá'.
"Tem uma música que eu gosto muito." Yuan já posicionava os dedos para o primeiro acorde enquanto anunciava.
"Pode ser." Jin Ling observou atentamente quando ele começou uma melodia simples, mas sua surpresa maior foi quando Lan Yuan começou a cantar.
Ele não havia dito que iria fazê-lo, ou que era algo que ele sabia fazer, no entanto o mais sensato a se dizer talvez fosse que cantava e tocava como um anjo. Wei Yuan era dono de uma voz aveludada e tranquila e a música mantinha-se calma até que aumentava no refrão. A emoção aplicada em cada acorde no piano aumentava, assim como na voz daquele jovem. Jin Ling sentiu arrepios; o coração acelerava e quase pôde sentir a respiração descompassada. Não conseguiu perceber quantos minutos tinha a música, e sequer havia notado que ela não estava em chinês, apenas conseguia apreciar o talento e a beleza do cantor e pianista.
Quando Yuan terminou de tocar, Jin Ling ainda estava preso em um transe. Lan Yuan o observou com óbvia confusão.
"Como essa música se chama?" O Jin finalmente conseguiu dizer algo. Com certeza guardaria o nome em sua mente e pesquisaria assim que chegasse em casa, apenas para que tivesse a clara lembrança dos dedos se movendo sobre as teclas e a voz angelical agraciando seus ouvidos.
"The Great Dipper. Eu posso anotar no bloco de notas do seu celular se quiser, para você pesquisar depois." Yuan ofereceu e Jin Ling imediatamente o entregou o celular.
Foi quando Lan WangJi voltou de sua ligação que A-Yuan terminou de fazer sua anotação no telefone e, enquanto devolvia o aparelho, o pai observava os dois meninos.
"Filho, Wei Ying disse que irá trazer pizza para o jantar." WangJi avisou.
"Que bom!" Wei Yuan sorriu e levantou-se da banqueta do piano. "Eu já vou voltar para o quarto, até logo, Jin Ling."
"Até logo" significava que iria vê-lo outra vez.
E, de fato, aquela não seria a última vez em que se veriam, pois apenas duas semanas depois, Wei Yuan descobriu por parte de JingYi que Jin Ling estava sendo transferido para a mesma escola que eles.
"Pai, o menino que faz aula de piano com o senhor está sendo transferido para a minha escola. Hoje será o primeiro dia dele." O adolescente comentou durante um cenário de café da manhã. O clima do dia era agradável: claro e parcialmente ensolarado.
"Por quê?" Lan WangJi perguntou, observando-o.
"JingYi me contou que ele estava sofrendo bullying na antiga escola, eles são amigos há uns anos..."
"Bullying? Por que faziam bullying com ele?" Wei Ying o encarava com curiosidade e Lan WangJi, com interesse.
"JingYi não me explicou bem, mas pelo que entendi ele é gay e descobriram sobre isso na antiga escola."
Wei Ying expressou revolta, sem entender a razão de tanto ódio. "Trate bem esse garoto, ele pode estar passando por um momento bem difícil, certo?"
"Certo, papai." Wei Yuan assentiu e então levantou-se assim que terminou o café. Levou as louças sujas para a pia e lavou-as, buscando comida para a calopsita, que cantava dentro de sua gaiola, em seguida.
O jovem subiu ao quarto para escovar os dentes e, ao voltar, pegou a mochila que deixava sobre o sofá, já organizada com tudo o que precisava.
"Até logo, pais." Wei Yuan voltou à cozinha apenas para cumprimentá-los antes de sair, recebeu um breve abraço de Wei Ying, que lavava a louça suja e um beijo no topo da cabeça por parte de Lan WangJi, que limpava a mesa.
"Tome cuidado!" Wei Ying ordenou antes que ele saísse pela porta.
"Certo!"
Dessa forma, Wei Yuan deixou os limites da casa. A rua era movimentada naquela hora, com pessoas indo ao trabalho, à escola ou visitando padarias e cafés. Também havia algum movimento de pessoas admirando a tranquila manhã, clássica do começo da primavera. Mais tarde, as flores a desabrochar já poderiam ser vistas, pintando os arredores em diversos tons. Wei Yuan gostava bastante daquela época do ano.
O caminho para a escola não era curto, mas poderia ser bem mais longo, poderia ser descrito como agradável. Os sons da rua não eram exatamente incômodos, já que Wei Yuan já havia se acostumado com eles.
Quando chegou ao colégio, encontrou JingYi e Jin Ling conversando na entrada.
Jin Ling parecia muito diferente do que costumava ver em sua casa. O uniforme do colégio estava bem arrumado, ele não usava os brincos e nem o esmalte nas unhas, suas pulseiras não estavam mais em seus braços... No entanto, os lábios permaneciam avermelhados.
"Bom dia..." Wei Yuan os cumprimentou ao chegar.
"Bom dia, eu não sabia que você estudava aqui." Jin Ling comentou, após o cumprimento animado de JingYi.
"JingYi não contou para você?"
O garoto discordou com a cabeça, Wei Yuan olhou para JingYi com um olhar interrogativo.
"Acho que me esqueci de comentar!" JingYi respondeu com um riso.
Wei Yuan deu de ombros, tirando três barras de cereal do bolso da mochila. "Você quer?" Perguntou para Jin Ling com gentileza.
"Obrigado." O garoto aceitou, abrindo e comendo devagar.
"Por nada... JingYi, vamos dividir essa?" Ele abriu a segunda barrinha e partiu no meio. "Vou dar a outra para o Wen Ning, ele já chegou?"
"Não, acho que ele vai se atrasar."
"Wen Ning?" Jin Ling perguntou com curiosidade.
"É um alto de olhos verdes... Ele faz o terceiro ano do ensino médio." Wei Yuan tentou descrevê-lo da melhor maneira possível.
"É o irmão da esposa do meu tio, eu nem sabia que ele estudava aqui." Jin Ling estranhou. "Acho que não presto muita atenção." Deu de ombros.
Wei Yuan guardou novamente a terceira barrinha antes de trocarem os sapatos para a entrada na escola e irem aos armários deixar as mochilas pesadas, levando apenas o necessário para a primeira aula.
"Vamos mostrar o colégio para o Jin Ling?" JingYi sugeriu e A-Yuan concordou.
Os três caminharam por alguns corredores, mostrando onde ficam os banheiros, o refeitório e mais alguns ambientes importantes. Em seguida, levaram o novato para a sala de aula. Sentaram-se os três perto uns dos outros.
"Vocês se falam muito quando Jin Ling vai para as aulas de piano?" JingYi puxou um assunto.
"Na verdade, não... Normalmente estou ocupado no quarto." Yuan respondeu. Jin Ling estava um tanto quanto calado.
"Então por que não se falam? É uma boa oportunidade para se conhecerem!"
"Tudo bem." Yuan assentiu. "De que tipo de coisas você gosta?"
"Qualquer coisa." Respondeu sem engajar muito na conversa.
"Entendi..." Wei Yuan se calou por alguns instantes. "Você vai participar de algum clube aqui da escola?"
"Acho que não. Vocês participam de algum?"
"Eu não, mas JingYi é do clube de futebol. Ano passado eu fazia parte do de literatura, mas esse ano eu não quis e Wen Ning é do clube de arquearia."
"Entendi... Acho que não tenho afinidade com nada em especial."
"Jin Ling é otaku!" JingYi disparou.
"Eu não sou otaku!" Jin Ling finalmente parecia agir mais normalmente, diferente do jeito calado que estava até então. "Eu assisto anime às vezes, mas é bem raro!"
"Sério? Eu assisto doramas às vezes. Você gosta de ler?" Wei Yuan perguntou com interesse.
"Não muito, acho que só não encontrei um livro que eu goste." Fez uma pausa. "Que tipo de coisa você lê?"
"Gosto de todo tipo de livro, mas tenho uma preferência por novels xianxia."
"Li uma ou duas, são boas..." Jin Ling respondeu, desanimado.
"Se você quiser, eu e JingYi podemos te indicar algumas boas, se é que JingYi ainda não indicou umas dez." Yuan soltou uma breve e dócil risada.
"Eu só indiquei três e ele nem leu!" JingYi reclamou, rindo.
"Não tenho tempo!" Jin Ling se defendeu e cruzou os braços, obviamente insatisfeito.
Uns minutos passaram leves daquela forma, até o professor chegar à sala, fazendo todos se arrumarem nas cadeiras para assistir a aula.
Jin Ling mexeu no estojo que carregava, derrubando um lip tint por acidente, Yuan pegou e o entregou, sem estranhamento ou perguntas.
Na segunda-feira, Yuan entregou o lip tint de volta ao colega de classe.
Na terça, cantou mais uma vez.
Era final de tarde e Jin Ling havia chegado cedo demais para as aulas de piano. Lan WangJi ainda precisava terminar alguns afazeres antes de começar a aula, e Yuan decidiu que o faria companhia.
"Você pode cantar de novo?" Jin Ling perguntou.
"Claro, que música?" Wei Yuan não tinha objeções a cantar.
"Aquela mesma, consegue fazer um acapella?" Jin Ling o observava com interesse. Fora do colégio, suas roupas certamente tinham personalidade e um toque de extravagância que lhe caíam muito bem.
"Acho que consigo..." Fez uma pausa por um momento, pensando em um trecho. Quando decidiu qual seria e começou a cantar com sua voz suave e melodiosa, Jin Ling podia jurar que não importava quantas vezes escutasse a mesma música e a mesma voz, quereria escutar mais uma vez. Mais uma e mais outra, e juraria ser a última vez que o pediria para repetir, mas assim que ele terminasse, o imploraria para que cantasse mais uma única vez.
"Você quer ser um músico? Um cantor?" Jin Ling indagou com interesse.
"Não... não sei o que quero fazer ainda, mas provavelmente não envolverá música, não quero que isso se torne meu trabalho." Wei Yuan brincava com as teclas do piano, criando melodias aleatórias.
"Entendi... sabe falar coreano?" Perguntou, porque apenas agora havia percebido que não entendia sequer uma palavra da canção.
"Não, eu só improviso." Fez uma pausa. "Sei a letra de algumas poucas músicas, mas todas bem simples..."
"Você é muito modesto." Aquilo soou quase como uma reclamação, era como se Jin Ling quisesse que ele mostrasse todos os seus talentos ao mundo e se orgulhasse deles de uma vez. Que não escondesse uma voz angelical e o talento para o piano por trás de um rosto inocente.
"Eu realmente acho que não tenho motivos para não ser..."
"Como aprendeu a cantar? Ou seu talento é natural?"
"Meu pai me ensinou, ele também canta." Wei Yuan respondeu com simplicidade e um breve sorriso no rosto.
"Entendi." Jin Ling observou-o e conversou até o momento em que sua aula começaria. Wei Yuan subiria para o quarto e não se veriam mais durante aquele dia, a noite seria sofrida esperando o amanhã para que pudesse apreciar mais uma vez aquele sorriso.
Na quarta-feira, JingYi faltou e Wei Yuan o fez companhia o tempo inteiro.
Na quinta, Wei Yuan emprestou a Jin Ling seu livro favorito e ficou contente por ele ter se disposto a ler.
Na sexta, Jin Ling dividiu seu almoço, porque Wei Yuan havia esquecido o dinheiro para comprar.
No fim de semana, um punhado de mensagens trocadas e vontade de que a segunda-feira chegasse novamente.
E, de novo, que despertem mais segundas, quartas, quintas, e que venha até mesmo a sexta-feira, que anuncia o fim de semana, e que isso se repita num ciclo incansável.
As semanas passaram, os pequenos momentos se repetiam dia após dia e fazia florescer dentro deles algo que talvez não pudessem entender, que poderiam nem ser capazes de nomear baseado no senso comum humano, simplório demais para o amanhecer que experimentavam.
Em um instante, nem sabiam mais sobre o que conversavam, mas o faziam todos os dias, e sempre havia sobre o que falar.
Era a noite de terça-feira e naquele dia não tinham se falado e isso já soava como uma estranha sensação de falta. Jin Ling não havia comparecido à escola e nem à aula de piano, JingYi dissera que havia falado com ele, que disse que estava tudo bem, havia tido alguns problemas familiares.
Wei Yuan até pensou em enviar algumas mensagens, mas desistiu: se eram problemas familiares, preferia não soar invasivo.
O garoto apagou a tela do celular e ficou pensativo. Percebeu que tinha algo a dizer para os seus pais, algo que estava evitando há alguns dias, mas que se concretizava diante dos seus olhos.
Desceu as escadas e foi até a sala ao encontro dos dois. Wei Ying estava deitado no colo de Lan WangJi no sofá enquanto reclamava de dor de cabeça e era acariciado cuidadosamente pelo marido. O volume da televisão estava baixo, provavelmente para não piorar o seu estado.
"Pais? Está tudo bem?" Yuan perguntou, os olhando.
"Estou ótimo, é só uma dor de cabeça que me faz pensar se sobreviverei a essa noite..." Wei Ying foi propositalmente dramático, usava um tom de voz convalescente.
"Entendi... É que eu queria conversar sobre uma coisa com vocês." O adolescente pôs uma expressão séria no rosto.
Wei Ying rapidamente levantou-se do colo de seu amor e sentou-se normalmente no sofá, o convidando para fazer o mesmo enquanto Lan WangJi desligou a televisão.
Eles eram sempre acolhedores dessa forma, isso fazia com que Wei Yuan tivesse certeza de que poderia confiar neles, porque os dois sempre estariam ali e lhe dariam toda a atenção que precisava, aconselhando sem julgar, assim como têm feito desde sua infância.
"Pais... Eu acho que estou apaixonado por alguém..." Ele falou baixo, ainda que confiasse neles, não conseguia evitar em sentir-se envergonhado.
Wei Ying expressou surpresa: aquela declaração era demasiado repentina.
"A-Yuan?" Lan WangJi o encarou de maneira interrogativa.
"..." O garoto ficou em silêncio.
"Quem é?" O homem questionou, o observando.
"É um garoto." Yuan nunca se preocupou em falar de sua sexualidade para os seus pais. Obviamente não seria discriminado, e no dia que se sentisse apaixonado por alguém, seria tratado naturalmente. E esse dia finalmente chegara.
Wei Ying colocou uma expressão preocupada no rosto, o observou um pouco.
"Filho, tudo bem..." Não sabia por onde começar e a dor de cabeça não ajudava em nada. "O mundo é terrível, eu só não quero que você sofra algum tipo de discriminação, nem que se sinta inferior a ninguém..."
Wei Yuan só então percebeu que o mundo lá fora era diferente do ambiente em sua casa. O mundo não é atencioso, honesto, nem cuidadoso. Ele cresceu ao lado dos dois homens a quem chamava de pais, nunca enfrentou muitos problemas, sempre os teve ao seu lado e isso sempre soou natural. Mas só agora se deu conta de que, para a maioria das pessoas, sua família era errada.
Ser quem você é, é errado e sujo, amar é incorreto se fora das diretrizes e parâmetros criados pelos homens que sobre sentir nada sabem. Wei Yuan sentiu o quanto aquilo era injusto.
Wei Ying olhou para Lan WangJi, eles tinham um ar de preocupação.
"Isso é natural e não é errado, não aceite que qualquer um afirme o contrário." Lan WangJi falou sério.
SiZhui assentiu, escutando cada palavra com atenção. "Para vocês foi muito difícil? Eu tenho vocês dois, para mim é até fácil, mas vocês tinham alguém?"
"Mesmo que a família de WangJi o reprimisse, seu irmão sempre estava ao seu lado o defendendo." Wei Ying quem decidiu contar.
"E você?" Wei Yuan encarou-o.
"Eu não tive problemas com meus pais, eu nem tive a oportunidade de falar sobre isso, mas, na verdade, as pessoas mais queridas que eu conhecia se afastaram." Wei Ying suspirou. "É como Jin Ling, ele foi discriminado na escola antiga, não é? Eu não quero que você passe por isso."
"Eu serei discreto, não se preocupem."
Wei Ying assentiu. Queria poder dizer a ele para ser quem era sem medo, mas não podia, porque as pessoas não permitiam que fosse tão otimista, ainda mais num país como o seu. "Se você confiar no garoto de quem está gostando, por que não confessa seus sentimentos?"
"Eu pretendo..."
"Mas certifique-se de que ele não possa usar isso contra você." Wei Ying tinha um semblante sério, diferente de alguém que, mesmo adulto, estava sempre brincando. "E que não brinque com os seus sentimentos."
"Ele não vai." Wei Yuan afirmou. "Se tudo der certo, vocês me deixam namorar com ele?" Nunca pensou que um dia teria coragem de deixar palavras como aquelas escaparem de sua boca.
Wei Ying e Lan WangJi se encararam por alguns instantes, assentiram um para o outro em seguida, concordando com algo que havia decidido em pleno silêncio.
"Tudo bem." Foi o Lan quem se pronunciou primeiro.
"Mas eu quero que o traga para nos conhecer. Além disso, vou colocar algumas regras nesse namoro, hein?" Wei Ying bagunçou os cabelos dele.
"Sim..." Wei Yuan ainda tinha em mente as palavras de seu pai, como o mundo é cruel, e como só agora começou a ter dimensão do que aqueles homens passaram para estar ao seu lado daquela forma.
"A-Yuan! Não fique triste pelas coisas que te falei, olhe, mesmo com isso tudo eu e WangJi estamos casados!" Wei Ying sorriu e deu uma mão para o homem por cima das pernas do filho.
"Vocês não estão casados..." Yuan cortou o clima, rindo um pouco.
"Não estamos casados no papel, mas nos amamos muito, usamos aliança, vivemos juntos e temos um filho, não é o bastante para que eu o chame de esposo?"
"É..." Yuan tinha uma mistura de sentimentos dentro de si, estava feliz e nervoso, mas também sentia-se um pouco triste ao imaginar na crueldade das pessoas.
Wei Ying bocejou e Wei Yuan percebeu que ele ainda precisaria acordar cedo no próximo dia para trabalhar.
"Por que não vamos dormir?" O adolescente sugeriu, esperando que eles soltassem as mãos para que se levantasse.
"Boa ideia..." Wei Ying bocejou mais uma vez. "WangJi me leva no colo..." Encostou-se no amado, esperando receber um abraço.
Wei Yuan foi até a cozinha buscar um copo com água, pensativo.
Na quarta-feira, ele se sentia decidido sobre o que faria, era o dia da semana em que estudariam até às cinco da tarde. Imaginou que as cores do pôr do sol formavam um bom cenário para declarar seu amor. Além de tudo, estavam na época da primavera rosada e nada poderia dar errado.
"Gente, eu tenho que ir!" JingYi estava apressado: trabalhava de meio período em uma cafeteria e sempre precisava correr nas quartas para que fizesse ao menos um pouco de seu turno.
"Até mais!" Os dois garotos restantes exclamaram quando o terceiro correu.
Mesmo naquele dia, Jin Ling ainda parecia estressado e cansado, Wei Yuan não teria como saber o que se passava na sua mente, teria sido o problema familiar? Ou talvez fosse algo interno, algo que ele lidasse além da família ou das pessoas no geral?
"Jin Ling, está tudo bem?" Perguntou, novamente havia aquela voz aveludada e gentil. Aquela voz como se afirmasse que era alguém em quem se poderia confiar.
"Está..." Eles andaram em direção à entrada da escola, onde trocariam os sapatos para sair.
Algo que descobriram desde o tempo em que começaram a andar juntos, foi que havia um caminho para a casa de Jin Ling que passava pela de Wei Yuan. Apesar de tudo, era quase um desperdício ir por ali, era longe e cansativo. No entanto, talvez isso fosse o que Jin Ling menos se importava.
"Eu posso fazer uma pergunta? Não precisa responder se não quiser." O jovem Wei Yuan observou, o garoto assentiu enquanto dava um laço nos cadarços. "Por que você se transferiu da antiga escola?"
O Jin ficou calado por alguns segundos, o observou e pensou numa resposta. "Eu tinha um problema com as pessoas." Foi simplista e, dessa vez, ele quase não tinha tom na voz: falava de maneira seca e monótona.
"Entendi..."
Wei Yuan buscava uma brecha para dizer o que precisava dizer, mas não a encontrava. Os dois trocaram seus sapatos e caminharam em direção ao portão, foi quando Wei Yuan simplesmente parou, o que fez Jin Ling se virar e perguntar, com o olhar, o que havia acontecido.
"Jin Ling, o que você diria se eu dissesse que gosto de você?" As palavras saíram rápidas e atropelando umas às outras, mas não era impossível de entender.
O rosto do jovem Jin foi de confusão, ele apenas não podia processar aquela informação tão rápido quanto o esperado, de maneira tão repentina.
"Gosta?" Foi a única palavra que saiu de sua boca.
"Gosto... eu gosto de você, digo, de maneira romântica." Dessa vez, as palavras já saíam calmamente, apesar da tensão. Seu coração palpitava com tanta força que era capaz de escutar, acompanhado do frio na barriga.
Wei Yuan estava decidido e confiante, Jin Ling não agia consigo da mesma maneira como agia com os outros, era consideravelmente menos arisco. Vinha buscando se interessar por assuntos que antes não chamavam sua atenção e Wei Yuan sabia que ele também era gay. Uma vez até mesmo JingYi havia deixado escapar algo que o fez pensar que Jin Ling também estava apaixonado por si.
Mas o que aconteceu naquele momento o quebrou em duas partes. Jin Ling apenas manteve o silêncio e nem sequer o olhava no rosto. Wei Yuan esperou alguns segundos e finalmente percebeu que sua mente havia criado uma realidade positiva demais. Talvez tudo fosse um simples engano, fosse seu cérebro manipulando suas ideias ao seu próprio favor.
"Podemos ir...?" Yuan perguntou, começando a andar, Jin Ling não disse nada e nem assentiu, ele estava em completo silêncio.
O caminho para a casa foi exatamente assim, eles estavam calados, Wei Yuan cheio de dúvidas e Jin Ling apenas não sabia o que pensar ou dizer, se questionava se era tão difícil assim dizer uma das centenas de opções em sua mente, mesmo que todas elas significassem "sim, eu também gosto de você". Precisava escolher a melhor delas.
No entanto, depois do silêncio que havia o dado, achava injusto confessar de repente, não pareceria real, talvez o machucasse ainda mais.
Mesmo assim, isso seria pior que o silêncio?
Quando chegaram na porta da casa de Yuan, Jin Ling percebeu que havia falhado, por que agora se separariam e não haveriam oportunidades até o dia de amanhã.
"Desculpe-me pelo que eu disse..." Lan Yuan não sabia o porquê de estar se desculpando. Era por ser um garoto gostando de outro? Ou talvez porque foi convencido demais?
No instante em que Jin Ling assentiu e ainda calado seguiu seu próprio caminho, Wei Yuan percebeu que deveria ter sido bem mais cauteloso.