Quando criança, com 8 ou 9 anos, meus amigos (e os pais deles) me chamavam de terror esmeralda, por ser bem travessa e tirar do sério todos os adultos e até mesmo crianças. Costumava matar aula para ir até a casa de Ino e brincar com ela e seu irmão, Deidara, que era meu namoradinho na época.
No quintal da família Yamanaka havia uma enorme árvore, com raízes grossas que ocupavam grande parte do gramado. Possuía galhos firmes e por isso, vez ou outra, nos encontrávamos em cima da árvore conversando sobre o futuro ou fazendo desafios. A avó de Ino preparava um delicioso bolo de laranja e eu passava as melhores tardes na companhia deles. (Se a vó de Ino nos encobertava? Só um pouco.)
Em um fatídico dia, Ino havia ido à escola por estar de recuperação, e eu, apesar de faltar com frequência, me dava bem na pontuação. Deidara decidiu me fazer companhia e matou aula também. Subimos na grande árvore e decidimos ficar conversando sobre o que iríamos ganhar de natal. Deidara é mais velho que Ino e eu dois anos e sua mentalidade era um pouco mais avançada e “maldosa". O loiro estava afim de perder o bv aquele dia, e eu não estava entendendo nada.
Deidara então começou a falar coisas que na época eram sem nexo para mim, coisas do tipo “Você é muito bonita" ou “adoraria te dar um beijo", se aproximando, de olhos fechados, me fazendo recuar e me deixando sem espaço para fugir. Preciso constatar que era uma criança bem desastrada( até hoje sou uma pessoa desastrada) e não percebi que não havia mais espaço atrás de mim, o que resultou em eu capotando de costas e caindo da árvore.
O galho de onde cai não era tão distante do chão então nem me machuquei, mas só de imaginar que cai na frente do crush e que ele provavelmente riria de mim me fez pensar em uma saída totalmente sensata: Eu me fingi de morta.
O loiro gritou e gritou e eu não respondia, fazendo-o ficar desesperado e correr para dentro de casa para chamar um adulto. Minha vontade era de rir muito, mas eu não podia estragar meu disfarce. Bom, no fim dessa história, senhora mamãe foi me buscar na casa de Deidara e eu fiquei de castigo durante 3 semanas, e consequentemente não ganhei meu presente de natal. Também não tive coragem de matar aula de novo.
Enfim, o porquê de eu estar contando isso é que passou pela minha cabeça me fingir de morta para sair dessa situação embaraçosa em que me encontro agora, mas como cai de cara e imediatamente apoiei meu corpo aos meus cotovelos, ficou evidente que eu estava bem. Levanto meu olhar para Hinata, que esconde o rosto com a mão. Sorrio sem graça enquanto limpo minha roupa.
Faço menção para andar novamente mas minha chefe balança a cabeça em negação, como se quisesse que eu parasse aqui. Retornei ao meu lugar de origem, com a face pegando fogo de vergonha. A estagiária segura o riso e afunda seu rosto na tela do celular, de modo que eu não consiga ver sua cara de deboche.
-Minha assistente adora fazer apresentações dramáticas.- Hinata reúne toda graciosidade que existe em si para dizer essa frase e então prossegue com a reunião. Hanabi se levanta e apresenta gráficos, que parecem bem satisfatórios para o restante do pessoal, mas eu não consigo prestar atenção em nada. Minha vontade era de enterrar minha cabeça no chão e nunca mais sair. Acho que Hinata tem a mesma vontade.
E as horas foram se passando, creio que duas no mínimo, e eu já não aguento mais a posição que me encontro. Hinata então se levanta e dá por encerrada a reunião. Suspiro aliviada vendo os grandes executivos saírem da sala um por um, restando apenas a morena e eu. Ela então olha em minha direção e eu sorrio sem graça, fazendo a mesma bufar. Estou trabalhando com Hinata deve ter só 3 horas, mas já à fiz bufar centenas de vezes.
-Sra. Hyuuga, eu sinto muito…- enfim tomo coragem para dizer algo, embora minha voz saia falhada.
- Você.- Ela respira fundo antes de prosseguir.- Precisa aprender a como se portar dentro de uma empresa de renome, ainda mais com um cargo tão importante. Fiquei constrangida na frente de todos!
- Me desculpe de verdade, Hinata. Isso nunca irá acontecer de novo. - Ela balança a cabeça positivamente e anda em direção a porta, ainda séria.
-Preciso que vá até a ala do Marketing entregar essa pasta a Anko.- Ela me fita enquanto me aproximo para pegar a pasta.- 3° andar. Logo depois, vá até minha sala, vamos almoçar juntas hoje.
-Sim, senhora.- Respondo e ela sai da sala, me deixando sozinha naquele cômodo enorme e vazio. Observo a pasta azul em minhas mãos e suspiro antes de sair da sala também.
Preciso constatar que sou péssima com direção e não me recordo de qual lado viemos quando descemos do elevador. Coço minha cabeça e decido andar para a esquerda, porque eu tenho uma espécie de lema de que se você tem que escolher entre direita e esquerda, sempre vá para a esquerda. Como meus lemas sempre me abandonam, eu fui para o caminho errado e no final do corredor só havia banheiros e uma planta bizarra.Bufo, pronta para dar a volta, quando meus olhos pairam sobre um rapaz muito bonito escorado na parede. Seus cabelos vermelhos estão caídos para frente devido à posição que seu corpo se encontra. O ruivo está totalmente concentrado no celular e me pergunto se Hinata o visse procrastinando assim.
Não consigo ver seu rosto direito, graças a minha miopia e meu ranço por usar óculos. “Ah, Sakura. Como você diz que ele é bonito sendo que nem o rosto você está enxergando direito?”. Ele é bonito de corpo, se é que vocês me entendem. Encaro ele por alguns segundos até que o ruivo nota minha presença e levanta o olhar em minha direção. Ruborizei no mesmo instante e dei meia volta, rapidamente.
Sou a rainha em pagar micão, Kami do céu!
A agilidade com que cheguei novamente a sala de reunião é admirável, ligo meu modo turbo quando é caso de vida ou morte (morte da minha dignidade). Parei de andar tão rápido para conseguir respirar, quando vejo o cara dobrar o corredor. Meu coração acelera quando ele se aproxima de minha pessoa.
- Você deixou cair isso, moça.- o ruivo estende a mão com um papel grampeado juntamente com um cartão. Deduzo que tenha caído da pasta, então abro a mesma e coloco o papel dentro. Suspiro, e meu rosto queima de vergonha.
- O-obrigada.- Bom, se já estou fudida mesmo, por que não levar vantagem nisso?- Qual seu nome?
O ruivo bonitão (porque agora que estamos frente a frente eu consigo ver seu rosto) sorri cerrando os olhos e depois diz:
-Sasori. O seu é Sakura, correto?- OH MEU KAMI, COMO ELE SABE? Será que já leu uma de minhas fantasias publicadas?
-Como sabe?- Questiono, imaginando que ele é um fã do meu trabalho.
-Eu estava na sala de reunião agora pouco.- De repente parece que minha vista escureceu, é muita má sorte para uma pessoa só.
- Oh meu kami amado.- Digo baixo escondendo o rosto, fazendo Sasori gargalhar de uma forma fofa. Simpático demais ele. Quero dar uns beijos.
-Você é graciosa até caindo, sabia?- O boy afirma e eu sorrio de lado.
- Essa cantada é nova.- Digo, erguendo a sobrancelha.
-Talvez não caiu na frente de caras o suficiente.- Ele ironiza, piscando para mim. Ele tá pedindo um beijo, claramente.
-Ainda bem né?- Meu celular vibra no mesmo instante (me deixando toda atrapalhada) com uma mensagem de Hinata, não sei se fico com medo do conteúdo ou puta porque tenho que voltar ao trabalho.- É a chefona, preciso ir andando. Até breve, ruivo.
- Até, moça. E boa sorte, você sabe como ela é, né?- Sorrio de nervoso e aceno positivamente com a cabeça, indo na direção ao elevador.
A minha pessoa é um tanto quanto paranoica, e depois que o ruivo delícia me reconheceu pelo tombo, eu sinto que está todo mundo olhando para mim, debochando secretamente em suas mentes o quão ridícula foi a cena da garota de cabelos róseos indo de encontro ao chão logo em seu primeiro dia de trabalho. Ou talvez seja só egocentrismo da minha parte e ninguém nem esteja lembrando que eu existo.
Suspiro ao avistar o elevador de longe e que uma massa considerável de pessoas se dirige até ele. Massa foi exagero, eu diria umas 15 pessoas apenas. Caminho devagar para não parecer o pato que sou e me acomodo ao meio das pessoas, apertando o botão do andar desejado. As portas se fecham e o elevador se movimenta, enquanto uma música irritante soa pelos alto-falantes. Todos (com exceção de minha pessoa) conversam ao celular com tons sérios e com certa arrogância. O mundo corporativo me assusta, e mais ainda ter que fazer parte dele agora. Saudades de escrever livros, ou só de gastar meu tempo lendo hot.
(...)
-Boruto, retire o dedo do nariz, querido. - Hinata solicita ao filho pela milésima vez e o mesmo faz careta.
- Mamãe, eu quero tomar sorvete.
- Primeiro o almoço, depois a sobremesa. - Ela responde, exalando paciência.
Observo a pequena criança ao lado de sua mãe começar a bater na mesa, o que me fez agradecer por permanecer solteira e sem filhos até hoje. Rolo os olhos e sorrio forçada, mas a minha vontade é de sacudir a Hinata (repito, H I N A T A) para que ela controle seu pequeno furacão mimado. No entanto, ela apenas enfia a cara no celular e surfa pelas redes sociais. Há certas coisas que não entendo na vida, e uma delas é como uma pessoa consegue fingir que não está vendo algo.
Decido pegar meu celular também, para ignorar (ou tentar, pelo menos) a birra do filho da minha chefe. Faz alguns longos minutos que pedimos nosso almoço, mesma quantidade de tempo que estou pensando em como vim parar em um restaurante tão caro sendo que não tenho nem um centavo na conta. Espero que eu possa parcelar em 3x. Juro que nem sempre fui fodida assim, eu só dei má sorte de confiar em pessoas erradas ao l longo da vida.
O canard à l’orange vem sendo trazido pelo garçom e meus olhos se arregalam de saudade. Faz meses que não como uma comida francesa de qualidade, ou qualquer comida de qualidade. Não que eu esteja passando fome, mas morar com a minha mãe exige um estômago de ferro. E eu também não sou uma chef de cozinha. Boruto faz cara de nojo para o prato e sua mãe o reprova com o olhar, fazendo a criança engolir seco e alcançar os talhares. Até que enfim, porra! Colocando ordem na casa.
- Então, Saky. Está gostando do seu primeiro dia? - O semblante de Hinata transforma completamente, de Sr. Hyuuga para minha menina de sempre.
- Você é uma chefe muito severa. - Respondo, suspirando, fazendo Hinata rir. - Mas é bom poder trabalhar com pessoas que gosto. - É bom poder trabalhar, no caso.
- Fico feliz em saber disso. Sou a chefe de uma renomada empresa, tenho uma postura a zelar. - Hinata apoia sua mão na minha e olha no fundo dos meus olhos. - E é por isso que não passarei pano para você novamente. Precisa entrar nos trilhos. - Arrepio todinha, ainda bem que ela não viu isso. E por conhecer tão bem a Hinata eu sei que ela está falando muito sério. - Agora, me conta amiga. Algum date novo?
Essa dupla personalidade faz minha cabeça girar. Credo.
- Não sei nem o que é isso mais. - Pensei em mencionar o jovem do trabalho, mas provavelmente a mulher vai me julgar por misturar trabalho com a vida pessoal. Ou pior. - Meus problemas são maiores do que minhas necessidades biológicas.
- Com esse emprego, metade dos seus problemas serão resolvidos, darling! - Hinata tem um ar de eeuropeia que me irrita às vezes, mas não sou de falar isso com os outros.
- Isso é verdade. Logo, logo alugarei um apartamento aqui no centro. Aí sim as coisas se ajeitarão quase que 90%. - Os 10% restantes é claramente trabalho para um psicológo.
Hinata parece pensativa, e desvia o olhar para o vazio em sua frente. Olho aquela cena sem entender, então retorno a comer.
- JÁ SEI! - A mulher solta um grito animado que quase faz eu partir dessa para a mulher. - Naruto e eu temos um apartamento há algumas quadras daqui, muito bacana. Ganhamos de presente de casamento, mas nunca o usamos de fato. - Hinata diz e olha rapidamente para o filho. - Tá... talvez uma vez. Ele é novo e está completamente mobiliado, você poderia morar lá, até comprar um cantinho para você.
Algo de errado não está certo. As coisas não dão certo para mim assim, eu sei disso. Devo me preocupar? Banho de sal grosso? Ou devo recusar e manter um certo balanceamento entre as graças e as desgraças de minha vida?
- EU SUPER ACEITO! - Grito, mais do que ela, fazendo todos a nossa volta nos observar. Hinata bate palminhas graciosas em demonstração de felicidade, enquanto Boruto nos entrega sua melhor cara de paisagem
Sobre minha má sorte, eu cuido dela quando ela voltar.