With me

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A madrugada fria e escura me desperta sem dó, e me faz, mais uma vez, te procurar urgentemente. Olho para o lado e antes de encontrá-lo, meu corpo se prepara para ir até você, tocar sua pele e me sentir vivo de novo. Mas você não está lá. Encaro o quarto todo e as sombras dos móveis, só eu estou ali. O vento sussurra lá fora enquanto meu pulmão se enche de ar antes que o choro chegue avassalador. 

Mais uma vez.

Eles me perguntam quando vou parar com isso, e eu quero xingá-los como você fazia, com seu temperamento explosivo e pouco freio na língua. Eu gostaria de te ouvir xingá-los às vezes. Gostaria de muitas coisas, na verdade, todas sobre você. 

Respondendo mentalmente a eles, sempre digo que não vou. Porque não posso. Nem se quisesse. Você me deixou aqui, nesses dias sempre escuros, de madrugadas frias em que eu não consigo, nem sequer uma vez, me lembrar que estou sozinho. Não até que sua ausência me assuste e o choro venha. 

Assim gasto mais algumas horas, até que o sol aparece, mesmo que frio e opaco, me dizendo que eu fiquei. E tenho que continuar. Ou desistir. Mas você me disse para não desistir. Por isso não vou. Não posso.

Isso não impede que meu mais profundo desejo seja completamente irracional. O de que você me salve. Que esteja aqui na madrugada seguinte e me acolha nos seus braços, afagando meus cabelos e rindo de mim, porque sou mesmo bobo. 

Meu café fica forte, parece uma tintura e lembro de como você reclamava quando isso acontecia. James, isso é impossível de se tomar, você dizia, franzindo a testa e parecendo o cara mais sério do mundo odiando tintura de café. E eu amava, talvez errasse a quantidade de pó de propósito. Não sei, isso soa idiota. Eu só gostava muito de você e dessas coisas que formavam a vida do seu lado. 

Por isso me perdi aqui, dentro desse apartamento cheio de lembranças, cheio dos seus detalhes. 

Quero ser resgatado dessa melancolia, quero lembrar de você sem sentir o peito esmagado, eu quero, sim. Mas deixar a dor para trás talvez me faça perder você de uma vez por todas, aceitar que a vida foi cruel o suficiente para me tirar a única coisa que já desejei. 

Eu não sei. Não sei se posso fazer isso. Não hoje, de qualquer forma. 

Tomo o café e encaro nossa primeira foto juntos no porta retrato de morango, ele é brega, e você fingia que odiava, mas amava, eu sei. Eu o amo também. Amo todos os dias, sem intervalo, sem restrições. Amo o porta retrato de morango, e não sei como não amar ou como amar menos. 

Um dia me dirão para guardá-lo numa gaveta, e dirão que ainda tenho mais amores para viver. E eu acho que então conseguirei xingá-los propriamente. Sei que você vai me ajudar nisso. Mas se puder evitar, agradeço. Digo isso porque, assim como ontem, meu peito esmagado ainda consegue ter um fio de esperança de que virá me buscar. Me tirar daqui e me mostrar que ainda existe luz, mesmo que tenhamos de ir para outro lugar. Qualquer um que seja. 

Mas, por favor, não deixe que eu enfrente tantas madrugadas assim, porque não sei quantas mais consigo aguentar. Apenas me tire daqui. De uma vez por todas. Me tire daqui antes que eles consigam me convencer a te esquecer. 

There's nobody in here | JEGULUS Where stories live. Discover now