Capítulo 5

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Os dias que se seguiram foram tão insuportáveis quanto os dias anteriores. Até quinta-feira dividi meu tempo entre meus deveres no trabalho e meus estudos; corri pela cidade com o mínimo de dinheiro que conseguia economizar à procura de mão de obra e materiais para a reforma solicitada por Ansel. Se na época próxima aos testes meu sono era limitado apenas algumas quatro ou cinco horas, deveria me acostumar a ter esta quantidade de sono por um bom tempo se quisesse continuar na sala S e receber dinheiro para pagar meus estudos.

Kendra voltou ao dormitório no final do dia. Jogou sua bolsa de couro em sua cadeira, na escrivaninha ao lado da minha e se jogou de cara em sua cama. Ignorei sua presença, pois estou focada demais em terminar de estudar direito civil. Deveria criar um bom argumento para a próxima aula prática, na segunda-feira depois da semana do saco cheio. Se fosse uma aluna normal, poderia esperar que os estudantes ainda estivessem de ressaca e não poderiam elaborar bons argumentos contra os meus, mas todos sabem que os alunos S não são os 10 melhores por puro dom. Nós nos esforçamos muito para nos mantermos aqui. Enquanto alguns passam as manhãs e parte da tarde estudando, nós perdemos as noites, madrugadas, finais de semana e, no caso de Gillian, o primeiro lugar, as férias. Por sorte, senti que estou conseguindo manter meu fluxo sem exagerar; o fato de não precisar ir até o estúdio nos dois últimos dias me ajudou a economizar o tempo da viagem para me dedicar mais aos estudos. Além disso, diminuí o tempo do meu banho e alimentação para ler mais. Uma hora de sono não fez muita diferença depois de um dia cheio, por isso, a partir de amanhã testarei diminuir mais uma hora e acrescentar mais carboidratos na minha alimentação para conseguir me manter saudável.

- Fiquei sabendo que Ansel retificou sua demissão. – a voz de Kendra saiu abafada pelo edredom. Não respondi, preferi me manter calada a expressar mais uma vez minha inimizade com o meu chefe. – As pessoas andam perguntando quando você irá aparecer no estúdio. – continuei a ignorando. Não tenho o menor interesse no que todas as pessoas daquele lugar pensam. Dinheiro. Preciso do dinheiro. Ele deve ser meu foco para conseguir suportar toda a humilhação. – Hey, estou falando com você, sabia? É má educação ignorar uma pessoa quando ela está falando.

- É mais mal educado atrapalhar alguém que está concentrada em seus estudos. – retruquei, finalmente virando minha cadeira para olhá-la. Kendra havia virado o rosto e olhava para mim. Solto o ar e balanço a cabeça, voltando minha atenção para meus estudos.

- Vamos jantar juntas.

- Não, obrigada. Não caio na mesma duas vezes.

- Estou falando sério agora. – ouvi se mexer. – Sei que você tem memória fotográfica e só estuda para ter certeza de que não irá esquecer nenhuma informação possivelmente importante para o teste de avaliação.

- É verdade. Eu tenho memória fotográfica. – voltei a girar minha cadeira, vendo-a agora sentada. – Pode não parecer, mas nós do S queremos chegar ao primeiro lugar. Não queremos ter ninguém à nossa frente.

Kendra soltou uma risada.

- Tudo bem, sei que você está empenhada a conseguir uma bolsa na mensalidade. Mas estou sendo sincera quando digo que gostaria de jantar com você como uma companheira de quarto de verdade; sabe, falar sobre nós.

- Foi mandada a se aproximar de mim? – perguntei, levantando uma sobrancelha. Pela sua expressão, vi que se sentiu ofendida; contudo, como uma boa aluna, pensou antes de se expressar:

- Tudo bem. Eu mereci essa. E provavelmente mereço também não ter sua confiança, mas gostaria de tentar mais uma vez.

Não a respondi. Olhei em seus olhos e me lembrei sobre Ansel dizer que sou uma péssima pessoa em analisar outra pessoa. Me pergunto se devo concordar com ele. Pode ser que minha falta de contato com outras pessoas ou o fato de não ter um círculo de amizade seja prova de sua hipótese. Enfim suspiro:

Garota S [degustação]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora