23/12/15

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Hoje estou num daqueles dias em que me sinto mesmo sozinha. Há pessoas à minha volta, claro. O mundo não parou. Oiço a voz da minha mãe, na cozinha, e consigo aperceber-me da música vinda do andar de cima. Mas, na verdade, estou sozinha.

Estou sozinha... Não fisicamente, mas emocionalmente. Sinto-me excluída, sinto que ninguém me quer. Sinto que não faço falta a ninguém. Têm havido umas quantas discussões cá em casa, e como estou de férias, não dá para escapar para a escola. Para além disso, estou de castigo, e por isso não posso sair de casa. Que pesadelo. Mas a verdade é que manter-me fechada em casa não vai resolver nada, porque só vai criar mais discussões, porque eu vou querer sair e eles não me vão querer deixar. E, por mais que eu peça educadamente e baixinho, vou sempre levar com uns quantos gritos como resposta.

Fecho então a porta do quarto, e concentro-me neste sentimento de exclusão. Desde que as férias começaram, que tenho tido poucas novidades do exterior. Tenho amigos, claro, mas há para aí uns cinco dias que sei pouco ou nada da maioria deles. Às vezes, quando me sinto mais insegura, chego a perguntar-me se eles se encontram todos nas férias e simplesmente se esquecem de me convidar. Mas depois acalmo-me: por que razão haveriam de fazer isso? 

Eu sou teimosa. Quando quero alguma coisa, quero mesmo, e ninguém me pode demover. Vou lutar até ao fim para defender os meus motivos, e vou sempre fazer tudo o que achar que é melhor, mesmo que tenha que o fazer sozinha. Também sou casmurra, e não consigo tirar da cabeça certas ideias. As coisas já se enraizaram em mim, por vezes depressa demais, e já não há maneira de mudar.

Eu sou ingénua. Eu acredito em tudo o que me dizem, dou como certa e comprovada cada palavra, por mais estúpida que seja. Talvez por isso sou tão insegura, e chego a perguntar a mim própria, no final de um dia longo e cansativo, se devia ter acreditado tanto como acreditei. Mas bem, o que está feito, feito está. A verdade é que costumo acabar os meus dias a confiar 120% numa pessoa... diferente!

Eu sou chata. Eu sei que sim. Falo demais, dou a minha opinião mesmo quando não me pedem, e digo palavrões a mais. Sou uma pessoa de extremos. Ou irradio felicidade como se o Sol espreitasse através do meu sorriso, ou então estou tão triste que passo despercebida no meio da multidão. Mas a verdade é que a vida foi feita para ser vivida, não para ser deprimida. E eu tenho bem a noção de que não sou só defeitos.

Sou extrovertida. Sou muito extrovertida. Uma vez, estava a voltar para casa depois de ter ido comer gelado em dezembro, e vi um homem com os seus 50 anos a tirar uma fotografia no jardim municipal ao pé da minha casa. Sem pensar duas vezes, perguntei-lhe: "A foto ficou gira?". O homem até deu um salto. Mas, depois, sorriu e disse-me: "Ficou, sim. Estás árvores ficam com uma silhueta espetacular ao pôr do sol." E eu respondi, com sinceridade: "Eu sei. Venho cá tirar-lhes fotografias muitas vezes." E pronto. Não o conhecia de lado nenhum. Mas era bem simpático.

Sou corajosa. Uma das mais corajosas que conheço. Nunca tenho receio de exprimir os meus sentimentos, nem de agir da forma que acho correta, mesmo que vá ser julgada por isso. Nunca abandono os meus princípios, e mesmo que possa arriscar a minha própria segurança, nunca vou deixar de ajudar os outros. Sou honesta e não gosto de mentir, e prefiro ficar fechada em casa a aguentar o meu castigo do que sair às escondidas. E não sou hipócrita. Não sou capaz de falar de uma maneira e agir de outra, ainda que às vezes tente. Mas é simplesmente mais forte do que eu. Se digo uma coisa, vou inevitavelmente ter que agir em conformidade com isso. Talvez isto seja um aviso para me ensinar a manter a boca calada.

Sou altruísta. Tenho uma capacidade de perdão que até a mim me surpreende. Mesmo que uma pessoa já me tenha magoado muito, eu vou sempre arranjar maneira de lhe esboçar um sorriso sincero e de a ajudar de todas as maneiras que posso, porque tenho fé na humanidade. Já me avisaram várias vezes para não ser assim, para manter um pé atrás, mas eu simplesmente não consigo. Tenho uma necessidade enorme de distribuir amor e energia positiva por todos à minha volta. E eu sei que a maioria das pessoas não é assim, mas eu não posso fazer nada quanto a isso. Só posso esperar contagiar algumas pessoas com as minhas ações.

Já me disseram que sou como uma personagem de um livro. E eu chego a dizer ainda mais - sou de certeza a personagem principal. Porque tenho aquela mania muito irritante dos protagonistas de ter sempre que fazer tudo o que está certo, o que é bom para todos, o que nunca vai magoar ninguém que não eu. E, muitas vezes, sou eu que saio magoada. Sou eu que chego a casa em lágrimas, não pelo que os outros me fizeram, mas pelo que eu fiz a mim própria. Porque pus toda a gente à minha frente. Mas, no fim de contas, não me arrependo nada - afinal, a bondade deixa sempre aquele calorzinho no coração que é tão agradável, tão bom... Hum, um dia destes tenho que aprender a parar de alimentar este meu grande orgulho...

Sou a mesma de sempre. Nunca mudei, até porque as pessoas não mudam. Sou a mesma menina que aos 4 anos conduziu um carro estrada abaixo, perante o desespero do avô, a mesma que aos 6 colocou um dragão na sala de música, que por si só não era divertida o suficiente. A que aos 8 se metia no meio do bosque a apanhar amoras, dando preferência aos lugares cheios de silvas onde não entra a luz do sol, e algures entre todas estas idades, brincava num parque de diversões abandonado. Neste momento, decidi voltar a abraçar a criança curiosa e aventureira que fui, após a ter deixado durante algum tempo. Porque, faças o que fizeres, nunca deves pôr a tua própria felicidade em hiatus

Sou louca. Sim, acho que se pode dizer que sim. Mas todas as melhores pessoas são.


Desabafo 23/12/15 - One ShotWhere stories live. Discover now