Capítulo Único

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Dois anos. Esse foi o tempo que durou.

E eu me lembrava exatamente de como começou, me lembrava de como a intensidade me atingiu quase que instantaneamente, cada momento me dominou como se eu estivesse em chamas, foi rápido, foi devastador, foi quente como o amor deve ser.

Eu não esperava amar tanto alguém como amei ele... Não esperava que fosse acontecer tão rápido. E nem que acabaria mais rápido ainda. Ainda custava acreditar que tinha sido dois anos, e não dois dias.

O vento gélido do outono me fez sorrir por um momento. Ah, eu odiava aquele frio... Mas foi num desses dias gelados que eu o conheci, o homem que eu não sabia que teria tanto para me ensinar. Logo eu, a escritora de romances adolescentes, com meus vinte e três anos, tendo aulas sobre como é o amor com um garoto de dezenove.

Eu realmente não esperava.

Tudo o que eu estava procurando era uma inspiração, o bloqueio criativo não era muito comum comigo, eu costumava ter ideias a todo momento, sempre as anotando, desenvolvendo facilmente... Porém naquela noite eu precisei dar um tempo e resolvi passear pelas ruas de Milão.

Sempre amei minha cidade, a paz e tranquilidade que eu tinha era surreal, e tudo melhorava com a incrível paisagem, a arquitetura que sempre me atraía, mesmo tendo morado ali a vida inteira.

Eu não sei dizer se acredito em destino, talvez tenha sido apenas uma coincidência. Minha mente voava por todos as histórias que eu já tinha criado na vida, tentando pensar em algo diferente, mesmo que romances tenham a tendência de ser iguais, eu procurava algo que despertasse a vontade de amar nas pessoas. Algo que as fizesse sentir uma coisa que nem eu mesma havia sentido. Talvez eu fosse mesmo muito nova para dizer às pessoas o que é o amor, mas no fundo eu tinha certeza que o amor era tão quente quanto o sol que aquece nosso corpo no inverno. Aquele mesmo sol que nos traz conforto e satisfação de não estarmos morrendo congelados.

Eu observava as folhas caírem das árvores, o vento as levando para longe... E então eu o vi. Aliás, foi ele quem me viu. Ele me encarava com um pequeno sorriso nos lábios, eu não entendi direito.

Talvez a melhor coisa que eu podia ter feito era ter ido embora, ele se parecia muito com um daqueles psicopatas que a gente vê nos filmes. Mas eu não senti medo, eu me senti atraída. Aí é que estava o perigo que eu não me atentei. Mais tarde eu percebi que, na verdade, aquela era a armadilha que eu mais fiquei feliz de ter caído.

- Não está muito frio para um passeio à noite? - ele perguntou, ainda de longe. Lhe encarei bem, pensando sobre aquela frase. Ele estava tentando me cantar?

- É... - suspirei. - Mas foi a melhor coisa que eu conheci pensar pra liberar minha criatividade.

- Criatividade?

- Sim, eu sou uma escritora com bloqueio criativo. - rolei os olhos, olhando para o chão em seguida me sentindo uma tola de estar conversando sobre isso com um estranho. - Eu odeio o frio... - abracei meu próprio corpo e o ouvi rir.

- Eu sou Mateo. - ele disse um tempo depois, se aproximando. Reparei em como ele era novo, cara de adolescente... Tinha certeza que não passava dos vinte anos.

- Giovanna. - eu respondi.

Mateo engatou uma conversa que me fez me sentir mais leve, nós rimos pelo que pareceu horas e ele me contou que era jogador e novo na cidade.

Eu me dispus a lhe apresentar a cidade, deixa-lo mais familiarizado com o novo lar dele. Lembro de, a cada passeio que a gente dava, ter alguém nos observando e comentando. Eu me esquecia que ele era conhecido constantemente, meus olhos nunca o enxergaram como o jogador do Inter de Milão, e eu acreditava que era por isso que doeu tanto a partida dele.

Eu nem sei dizer em que ponto eu me apaixonei por ele, talvez tenha sido assim que o vi, ou quando ele riu, o quando ele tocou meu rosto de uma forma tão terna, sem segundas intenções... Eu só sei que ele me fez me sentir tão única e especial em cada momento juntos. A cada beijo eu só sentia que poderia viver daquele jeito pela vida inteira e mais outras mil.

Não encontrava palavras que fossem suficientes para explicar a felicidade evidente que todos viam em meu rosto. Por dois anos foi um hábito dormir e acordar com um sorriso, por saber que daríamos um jeito de nos ver entre os horários de trabalho e treino e jogos.

Dois anos... Não pareciam dois anos para mim, voou como um fim de semana que a gente espera tanto e que logo chega ao fim.

Eu sabia que não seria para sempre, no fundo eu sempre soube que ele iria embora. Ele era bom demais pra permanecer por ali. Eu me recordava de cada foto nossa que saía em algum blog, ele sempre dizia que queria assumir algo comigo, dizer pra todo mundo que a gente se amava. Eu não quis. Neguei desde o começo, porque eu tinha medo.

Eu só não queria que tivesse acabado tão cedo. Mateo foi minha inspiração, foi o que eu nunca senti, foi algo único e que eu não sentiria novamente. Ele foi tudo. Tudo, menos meu.

- Eu não quero ir embora nunca. - ele sorria ao dizer, me olhando tão apaixonado que eu não podia negar que era recíproco.

Suspirei com as lembranças, sentindo o vento querer me congelar novamente, mas enquanto eu me lembrasse de Mateo, eu nunca morreria de frio.

Ouvi passos atrás de mim e me virei, vendo o homem da minha vida com um sorriso triste nos lábios, e então eu soube que ele havia fechado o contrato. Ele se mudaria.

- Eu vou embora amanhã. - ele disse, baixo. Eu não respondi, continuei a olhar para ele, querendo gravar cada traço em minha mente. - O que eu disse na semana passada... eu estava falando sério. Eu quero que você vá comigo.

- Eu tenho uma vida aqui. - respondi.

- Mas a gente pode ter uma vida nova por lá. Recomeçar, ser feliz, juntos. - seu tom começou a soar desesperado. Me aproximei dele, tocando seu rosto e sentindo a minha textura preferida.

- Mateo... Você sabe o porquê de eu não aceitar sua proposta. E você sabe que eu estou feliz de ter tido a sorte de ter conhecido você. Você sabe o quanto eu te amo e o quanto eu sou grata termos vivido cada um de nossos momentos juntos... Eu não sei se com outra pessoa teria sido tão intenso, tão puro, tão perfeito.

- Eu não estou preparado pra ir embora...

- E nem eu pra te deixar ir... Porém não depende da gente. Você está guardado dentro de mim de um jeito que ninguém nunca vai ser capaz de te tirar. Tenho certeza que eu também estou dentro de você, então está tudo bem.

- Eu vou voltar pra te buscar. - disse, me abraçando pelo que eu sabia ser a última vez.

- Não, não vai. Você vai ficar bem, vai fazer o que você faz de melhor e vai conhecer alguém que possa ficar com você a vida toda... Eu não sou essa pessoa.

- Você sabe que sempre será minha flor de outono, não é? - perguntou e eu ri em seu pescoço.

- Se eu sobreviver a mais esse frio de outono...

- Não fala assim. - pediu, me apertando mais contra seu corpo.

Não houve um último beijo, não houve lágrimas e não houve um adeus. Nós sorrimos, porque todas as memórias felizes eram mais fortes que a dor de ver seu amor ir embora.

Eu não sabia se o veria algum dia novamente, muito embora eu implorasse para que sim. Queria tê-lo em meus braços novamente, relembrar na pele do nosso amor.

Foi por ama-lo que eu o deixei partir, o deixei ser livre. Era a carreira dele, o sonho dele, a vida dele. Eu não podia prendê-lo comigo nos meus dias limitados, mas eu nunca me esqueceria de cada momento que tivemos juntos. Eu nunca me esqueceria de Mateo Kovacic.

Flor de OutonoWhere stories live. Discover now