LUCY MAUD MONTGOMERY - CAROLINE PARRY

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“Eu amo os livros. Quando crescer espero ter muitos deles”, escreveu Lucy Maud Montgomery no seu diário quando tinha apenas catorze anos. Escrita em 1889, essa anotação é significativa para os leitores atuais que sabem que, quando cresceu, ela não apenas teve e leu muitos livros, como também se tornou L. M. Montgomery, uma autora mundialmente famosa. Entre 1908 e 1939, Maud, como gostava de ser chamada pela família e pelos amigos, escreveu 24 livros. O primeiro foi Anne of Green Gables. As outras obras incluem: outros sete livros sobre Anne, Chronicles of Avonlea, a trilogia Emily, dois romances para adultos, uma autobiografia e o romance The story girl.
Lucy Maud Montgomery era uma excelente contadora de histórias, escrevia sem parar, e criou mais de quinhentos contos. Ela também compôs inúmeros poemas. Uma edição da sua poesia foi publicada ainda em vida, e hoje todos os seus poemas estão coletados num único volume.
Entre suas obras, seu livro preferido era The story girl, um romance sobre uma jovem contadora de histórias. O que torna uma pessoa uma “contadora de histórias”? Se olharmos para a vida de L. M. Montgomery, parece evidente que o fato de ter nascido no Canadá, na maravilhosa Ilha Príncipe Eduardo, inspirou-a. Ter uma família literária também alimentou suas narrativas. No entanto, o mais importante era que Maud simplesmente tinha a cabeça cheia de histórias, idênticas aos personagens que criou: Anne, sua amada ruiva; a autobiográfica Emily, da trilogia Emily; e Sara, a principal contadora de histórias de The story girl.
Na sua autobiografia, The Alpine Path: The story of my career, ela escreveu: “Eu não consigo lembrar de um momento em que não estivesse escrevendo, ou não pretendesse me tornar uma escritora... Eu era uma pequena escrevinhadora infatigável.” Mais tarde, acrescentou: “Nove entre dez manuscritos eram devolvidos. E eu sempre, sempre, os mandava de volta.” Ela perseguia seus objetivos de escritora de uma maneira extremamente focada.
Além da sua laboriosidade literária, Montgomery também escreveu muitas cartas. Certa vez, ela e uma amiga de infância escreveram cartas para si mesmas que deveriam ser abertas e lidas somente dez anos mais tarde. Já adulta, L. M. Montgomery escreveu longas cartas para seus dois “amigos por correspondência”, que foram publicadas em 1960 e 1980 como The Green Gables letters, from L. M. Montgomery to Ephraim Weber, 1905-1909 e My dear mr. MacMillan: letters to G. B. MacMillan from L. M. Montgomery. Além da sua correspondência particular, Montgomery anotou uma observação depois da outra, que mais tarde foram publicadas nos dez volumes que contêm seus diários pessoais. Ela escreveu:
[Sábado] 21 de setembro de 1889. Vou começar um novo tipo de diário. Escrevi algo como um diário durante anos – desde os nove anos, quando ainda era criança. Hoje eu o queimei. Era tão bobo que senti vergonha dele..., mas hoje vou começar tudo de novo, e escrever somente quando tiver algo que valha a pena anotar. A vida começa a se tornar interessante para mim – daqui a pouco, no último dia de novembro, completarei quinze anos. E nesse diário, a menos que o tempo apronte alguma que mereça ser descrita, eu nunca mencionarei como está o dia. E – por último, mas não o menos importante – eu vou manter esse livro trancado a sete chaves!!
Ela encontrou muitas coisas que mereciam ser descritas. Os diários têm mais de 5 mil páginas. L. M. Montgomery escrevia sobre tudo: sobre os gerânios, a quem dava nomes; as fofocas da aldeia; as propostas de casamento; e até sobre as “grandes dores da alma”. Ela manteve esse hábito durante quase toda sua vida, exceto durante um período no início da Segunda Guerra Mundial, quando esteve deprimida demais para registrar as observações diárias. Três volumes dos seus diários já foram publicados, e outras coletâneas estão no prelo.
Em janeiro de 1904, já com quase trinta anos, ela escreveu: “Somente as pessoas solitárias escrevem diários.” Embora tivesse muitos amigos, L. M. Montgomery era uma pessoa solitária. Em 1876, sua mãe morreu de tuberculose, e seu pai mudou-se para o oeste, onde se casou novamente, porém sem levar Maud com ele. A pequena Maud, que na época ainda não havia completado nem dois anos de idade, foi criada pelos avós maternos. E foi este lado da família que lhe permitiu descobrir o amor pela literatura. Os livros eram amigos importantes para a menina solitária.
Apesar de ter a companhia dos colegas da escola, dos primos e das primas, ela não tinha irmãos nem irmãs, e até os oito anos não teve nenhum vizinho para brincar. Porém, ela era sensível e imaginativa, e possuía dois armários de livros com portas de vidro, um de cada lado da janela, muito parecidos com os da Katie Maurice de Anne Shirley. E, exatamente como Anne, Maud também dava nomes às suas árvores e às suas plantas favoritas, e conversava com elas como se fossem suas amigas.
Com o decorrer do tempo, os diários de Montgomery passaram a ser seus melhores amigos. Ela os chamava de “o confidente pessoal em quem posso ter absoluta confiança”. Isso foi particularmente verdadeiro durante períodos turbulentos. Em 1889, ela viajou para Alberta, onde morou um ano com o pai e sua segunda mulher. Maud detestou a “sra. Montgomery” e confidenciou: “A não ser na frente das outras pessoas, e em consideração a meu pai, eu não consigo chamá-la de outra coisa.” O amor que Maud sentia pelo pai e poder registrar suas queixas no diário ajudaram-na a sobreviver durante a estadia. No entanto, ela também teve momentos para festejar nas suas páginas. Naquele ano, ela foi publicada pela primeira vez no jornal The Charlottetown Patriot. Em 7 de dezembro de 1890, ela anotou: “Bem, este realmente foi o dia mais orgulhoso da minha vida!... Meu poema estava lá, numa das colunas!”
Em 1891, L. M. Montgomery voltou para a Ilha Príncipe Eduardo para terminar seus estudos. Depois de estudar um ano na faculdade e trabalhar um tempo como jornalista, ela seguiu a carreira do magistério. Durante aquela época, sua vida amorosa foi muito tumultuada. L. M. Montgomery morou com o sr. e a sra. Cornelius Leard durante o período em que deu aulas numa escola em Lower Bedeque. Para sua grande consternação, ela logo se envolveu romanticamente com Herman, o filho do casal. Acontece que ela não apenas estava noiva de Edwin Simpson, seu segundo primo, como sentia que Herman, um fazendeiro sem instrução, era um companheiro inadequado para ela. Maud percebeu que não amava Edwin Simpson pouco depois de aceitar sua proposta de casamento, porém, romper um noivado era algo muito sério naquela época. Ela se sentia incapaz de terminar o relacionamento, e agora estava atormentada por seus sentimentos pelos dois homens.
Quando Edwin Simpson apareceu em Lower Bedeque no Natal, para fazer-lhe uma visita de surpresa, L.
M. Montgomery descreveu a cena no diário: “Ali estava eu, debaixo do mesmo teto com dois homens, um que eu amava, mas com quem nunca poderia me casar, e o outro a quem prometi que me casaria com ele, mas que nunca poderia amar! Eu jamais conseguirei expressar em palavras o que eu sofri naquela noite de horror, vergonha e pavor.”
Apesar da agitação que se apoderou dela durante esse período, L. M. Montgomery nunca parou de escrever. Em doze meses, entre 1897 e 1898, ela publicou dezenove contos e catorze poemas.
Seu envolvimento com Herman Leard terminou em março de 1898, quando o avô morreu e ela voltou para a Ilha Príncipe Eduardo. Pouco depois, ela rompeu o noivado com Edwin Simpson. L. M. Montgomery permaneceu na Ilha Príncipe Eduardo e se tornou a companheira e governanta zelosa da avó, uma responsabilidade que ela carregou nos ombros durante nove anos.
Em 1906, L. M. Montgomery ficou noiva de um pastor chamado Ewan MacDonald, e ambos concordaram que só se casariam depois que suas obrigações em relação à avó tivessem sido cumpridas. Ela não amava MacDonald apaixonadamente, mas o respeitava, e ele era um companheiro mais adequado para ela do que qualquer um dos pretendentes anteriores. Foi durante o namoro que ela começou a escrever Anne of Green Gables, seu primeiro romance. Quando o livro finalmente encontrou um editor, tornou-se um sucesso quase instantaneamente e vendeu mais de 19 mil cópias em cinco meses. Surpresa e feliz, Montgomery terminou a primeira sequência rapidamente. Mal sabia ela que continuaria escrevendo histórias sobre Anne Shirley, sua heroína espirituosa, até 1939.
Quando a avó morreu em 1911, Maud estava finalmente livre para casar com Ewan MacDonald. Eles passaram a lua de mel na Grã-Bretanha, e depois ela acompanhou o marido até sua igreja, em Ontário. Eles tiveram três filhos, um dos quais, infelizmente, morreu no parto. A partir daí, Montgomery teve de representar vários papéis importantes na sua vida: aquele da escritora mundialmente famosa e o de esposa, mãe e pilar da comunidade.
Naqueles três anos, e sem parar de fazer malabarismos entre seus deveres e o trabalho criativo, L. M. Montgomery teve momentos de grande satisfação e alegria, mas também de muita frustração, enquanto batalhava para desempenhar seus papéis com sucesso. Os vizinhos se acostumaram a ver a petite mrs. MacDonald, como a chamavam, caminhando apressadamente pela rua, murmurando os diálogos dos seus livros, enquanto ia cuidar das compras ou se dirigia para a escola dominical.
L. M. Montgomery passou por muitos momentos de tensão na sua vida: o horror da Primeira Guerra Mundial, a depressão crônica do marido e a deterioração das suas relações com o primeiro editor. No entanto, ela manteve as aparências tanto como esposa do pastor quanto como autora. Extremamente produtiva, tanto no lado doméstico quanto no profissional, ela mantinha uma rotina diária para escrever histórias, poemas e cartas, e respondia todas as cartas dos fãs de próprio punho. Ela continuava a extravasar os problemas e as agonias da sua vida íntima no diário, e considerou o advento da Segunda Guerra Mundial particularmente horrível. Finalmente, seus dias se tornaram tão difíceis que até seu amigo, o velho diário, não lhe serviu mais de consolo. Triste e amarga, sem conseguir escrever sequer para seus amigos por correspondência nem encontrar um desafogo no seu diário durante meses, L. M. Montgomery morreu em 1942.
Após sua morte, sua ambição “de escrever um livro que viveria” foi realizada muitas e muitas vezes, especialmente com os livros de Anne. Anne of Green Gables foi traduzido em dezessete línguas e vendeu milhões de cópias. Anne também foi levada para o teatro e para o cinema, e serviu de inspiração para um musical e um balé, inúmeros filmes e várias minisséries na televisão.
Ironicamente, e apesar da enorme popularidade de todos os seus livros, depois da década de 1920, L. M. Montgomery foi ignorada pelos críticos e somente foi reconhecida como uma escritora canadense importante após 1970. Naquela época, os estudiosos interessados em autores femininos começaram a investigar por que as pessoas gostavam tanto de ler sobre Anne e Emily, e suas outras personagens maravilhosas. Eles questionaram por que um autor feminino – que, em 1947, uma pesquisa de opinião mostrou ser quase tão querido quanto Charles Dickens – fora deixado de lado na literatura. Por fim, os diários de Lucy Maud Montgomery passaram a ser reconhecidos como fontes importantes para entender tanto sua personalidade complexa quanto as personalidades daqueles a quem ela dava vida nos seus livros
Graças à energia e ao talento de L. M. Montgomery, as personagens sobre quem ela escreveu continuam vivas – especialmente a temperamental e corajosa Anne. A independência vivaz da pequena heroína ruiva tem conquistado os leitores de todas as partes do mundo, e o sentido apurado de L. M. Montgomery, tanto de beleza como de justiça, que ela incorporou em Anne e em todas as suas outras heroínas, tem incentivado os jovens no mundo inteiro.

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⏰ Last updated: Nov 22, 2017 ⏰

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Anne de Green Gables - L. M. MontgomeryWhere stories live. Discover now