Domingos de sol

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No meio da rua, onde devia ter asfalto, tem terra. Quando chove, vira lama. Mas nos domingos de sol, vira o Maracanã. Nos barracos, onde deviam haver sonhos, tem realidade. Quando chove, tem goteira. Mas nos domingos de sol, vira concentração.

Morenos, mulatos, negros, infâncias em vários tons, corações que batem no ritmo de uma bola que quica nas calçadas, que passa em poças de água suja, que atravessa as traves feitas com chinelos enterrados no barro. Tem domingos em que chove, chove muito, pedras rolam pela rua, lama invade as casas e a gente some. Olhos espiando por janelas estreitas buscando um sinal, um raio de sol, uma esperança.

Os anos passam, a vida leva uns e deixa outros. Crianças crescem, seus filhos assumem suas posições. Brincam de polícia e bandido de dia, enquanto de noite a brincadeira fica séria. Os tiros se confundem com os rojões que explodem nos dias de jogo. Flamengo e Vasco, Botafogo contra Fluminense. Quando o jogo na tevê acaba, começa o campeonato na rua. Gritos e urros, vitórias e derrotas se misturam a joelhos ralados e sonhos construídos.

Das muitas crianças que vivem seu futebol naquela rua no topo do morro, uma consegue treinar em time grande. Cresce e vive o sonho, canta o hino com a seleção. Toda vez que faz gol, ele chora por dentro. Porque lá no alto do morro, em todo o domingo de sol, a rua continua virando um Maracanã.

AnacronismosWhere stories live. Discover now