Feridas do Passado - Patricia Maiolini

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Certas feridas nunca vão cicatrizar; por mais que tentemos esquecer o nosso passado, muitas vezes ele volta para nos assombrar. Esta história não é sobre animais fofinhos, um casal feliz e apaixonado, bem melosa, e, tampouco uma história de humor. Essa é a história de uma jovem, abusada sexualmente pelo seu primo mais velho e melhor amigo, aos treze anos de idade. É a minha história.

Meu nome é Vanessa, atualmente tenho 24 anos, moro em uma cidade no interior de São Paulo e estou para me formar em Psicologia. Aos treze anos, eu era uma jovem com um corpo desenvolvido para a idade, que já chamava a atenção dos homens. Já havia sido diversas vezes assediada na rua e nos transportes públicos, o qual eu uso, sozinha, desde muito nova. Na escola, eu percebia que alguns garotos mais velhos me olhavam com malícia; nunca parecia, de fato, ter somente treze anos. Eu penso que esses motivos, de certa forma, colaboraram para que Fabrício me estuprasse. Por favor, não pense que estou justificando o abuso! Nunca terá uma justificativa para abusar uma pessoa; apenas interpreto dessa maneira, já que crescemos juntos.

Fabrício era meu primo de primeiro grau, por parte de mãe, apenas quatro anos mais velho que eu. Além disso, era meu vizinho. Morávamos no mesmo condomínio e eu almoçava todos os dias com ele e minha tia, irmã da minha mãe, depois da aula. Sempre fomos muito próximos, até tudo isso mudar e ele destruir a minha vida.

Em meados de 2007, minha vida tornou-se um grande pesadelo. Em um dia, depois do almoço, minha tia precisou ir até o mercado para fazer as compras do mês, restando somente nós dois na casa; foi quando ele se aproximou de mim, me obrigou a tocá-lo e me abusou pela primeira vez.

***

— Van, podemos ir ao meu quarto?

— Para quê? — Fiquei curiosa.

— Preciso te mostrar uma coisa. Quero aproveitar que minha mãe não está em casa. ­— Minha tia não concordava com a presença de meninas no quarto dele, principalmente sem que ela estivesse, mesmo que fosse da família.

­— Não vai demorar, né? Você sabe que a tia Luana não gosta que nenhuma menina esteja em seu quarto, sem que ela possa vigiar.

— Não, vai ser rápido. Você vai gostar.

— Você não pode me mostrar aqui na sala? Tenho medo de que ela chegue e eu esteja no seu quarto.

— Não, está no meu quarto e não consigo trazer aqui.

— Tá bom, vamos lá.

Chegando ao seu quarto, Fabrício fechou a porta e a trancou. Arrastou-me pelo braço e me jogou em sua cama, tampando a minha boca com as suas mãos e disse:

— Agora você será só minha. Não tem para onde fugir e eu acho melhor você não gritar, senão as coisas vão piorar para você. — Ele soltou lentamente as mãos e eu aproveitei o momento para questioná-lo.

— O que você quer, Fabrício? Me solte! Você enlouqueceu?

— Quero muitas coisas... Principalmente, que você fique calada e seja uma boa garota. ­— Dito isso, meu primo acariciou meu rosto, jogou suas pernas para cima de mim, aproximou seus lábios do meu pescoço, roçando seus lábios e subindo até minha boca, beijando-a com voracidade, enquanto tocava meu corpo. — Quero ser o primeiro.

A sensação de pavor tomou conta de mim; eu era uma pré-adolescente sem muita malícia, nem sequer tinha perdido meu BV, porém não era burra. Havia suspeitado o que Fabrício faria comigo naquele momento, mas não era uma certeza -só fui descobrir algum tempo depois. Já havia visto e lido notícias sobre assédio, abuso sexual, estupro e violência contra mulheres; infelizmente, houve alguns casos na família ou conhecidos. Só não imaginava que aconteceria comigo, algum dia. Aliás, nós nunca imaginamos quando algo ruim vai nos acontecer e muito menos que o nosso abusador seria alguém tão próximo de nós.

Feridas do Passado - Antologia Cinderelas (Editora Sinna)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora