O trunfo

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Um capítulo curto, que não vai terminar no clima de quando começou...

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Edgard Villar não se lembrava da última vez que esteve na sala do irmão sem que ele exigisse a sua presença dentro do escritório.

Não se lembrava se havia sido no dia em que o comando do conglomerado passou para as mãos de Gustavo, ou se foi um dia após descobrir que suas ações, vendidas a um procurador misterioso, na verdade foram parar nas mãos do irmão mais velho;

Nunca foi o maior fã de Gustavo. Na verdade, ele tinha um certo ressentimento porque o pai, Cláudio, visivelmente gostava e preferia mais o filho mais velho, ao invés dele, Edgard. Ao menos, sua mãe lhe dava todo o amor e a atenção - Amparo o amava exclusivamente. De acordo com os pensamentos de Edgard, ela fora uma influência muito mais positiva na vida dele do que Cláudio.

Por isso, Gustavo era tão estranho para ele. Desde o conflito relacionado ao flagra de Vivi e o casamento dele com Luciana, os dois ficaram completamente afastados um do outro, cada um deles representando o lado de uma briga quase pública.

Era engraçado ver o rosto de Gustavo, e saber que os dois compartilhavam muitas coisas parecidas: ambos eram morenos, tinham os mesmos olhos verdes, os mesmos cabelos pretos e lisos, o mesmo rosto com a mandíbula marcada e proeminente. Porém, existiam diferenças entre os dois que faziam todos considerarem os dois fisicamente distintos como irmãos. A postura de Gustavo era sempre muito fria e distante, com suas roupas escuras e cenho franzido; enquanto Edgard parecia sempre mais leve e menos preocupado, como se não carregasse dentro de si maiores tensões ou coisas a fazer.

Contudo, Edgard mal podia imaginar que aquela imagem passada por Gustavo era apenas uma fachada. Nem mesmo Vivi ou Luciana conheceram o verdadeiro homem, longe do mundo de milionários, da elite e das festas exclusivas. Gustavo era alguém de decisões muito rápidas e impulsivas, de paixões que queimavam, e mesmo sendo um empresário calculista, parecia pensar sempre depois de agir.

O Gustavo apaixonado ficava apenas à distância, guardado para o momento certo, e com quem lhe importava. O Gustavo Villar a ser enfrentado pelo irmão mais novo era a sua versão mais calculista.

- É um verdadeiro milagre você me convocar para uma conversa, Gustavo... Pensei que tinha esquecido quem é sua família de verdade...

- Você e Amparo são apenas pessoas com quem compartilho material genético. Daí pra ser uma família, meu caro, é um longo processo. Mas não te chamei para questões familiares, e sim porque saiu o resultado da auditoria e eu tenho os dados em mãos.

Edgard colocou as mãos nos bolsos e caminhou, cauteloso, até a poltrona localizada à frente da mesa de trabalho pertencente a seu irmão

- E...?

- E... Provou-se o que desconfiávamos. As obras nas clínicas-escolas da unidade Paralela foram superfaturadas. – Edgard arregalou os olhos dramaticamente, fazendo-se inocente. – Reformas de pequeno porte foram colocadas nos contratos com valores muitas vezes maiores do que o acordado no orçamento inicial, que naturalmente está salvo e assinado por todos do conglomerado antes da feitura dos contratos. Ou seja, essa discrepância está documentada e carimbada.

- Meu Deus... Que loucura... Por que alguém faria algo assim com as nossas clínicas? Superfaturamento é coisa do governo...

- Chute: alguém colocou esse valor maior porque queria incluir no projeto dinheiro que não faz parte do nosso caixa para lavar dentro das reformas na UBaES.

- Lavar?

- Sim, Edgard, lavar dinheiro.

- Então precisamos falar com quem é do jurídico e do financeiro, certeza que esse vazamento, esse superfaturamento vem de lá.

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