Ato I

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Acordei pontualmente às 5h, como de costume, era impossível ser diferente já que meus pais acordam no mesmo horário e de tanto me fazerem levantar da cama tão cedo para cultivar "bons hábitos" eu acabei continuando a fazer isso naturalmente.

"Uma pessoa responsável e trabalhadora acorda junto com o sol!" Era o que o papai sempre dizia, e como eu não era muito de contestar, apenas concordava.

E eu não contestava várias coisas.

Certa vez, ainda quando eu estava no começo do ensino médio, mamãe me pediu para conhecer minhas amigas, na época eu não tinha entendido muito bem o porquê dela me proibir de falar com as garotas que sempre foram tão divertidas, mas hoje eu entendo.

"Você não pode andar com garotas tão vulgares, o que pensariam de você?" Era o que ela dizia, e como sempre, eu não contestei.

Hoje, aos 19 anos, já estava no meu segundo semestre de engenharia civil, um sonho se realizando, o sonho dos meus pais. Não o meu. Estava rodeada de amigos, os aprovados pelos meus pais, amigos que iriam alavancar minha vida, como diziam eles, boas companhias. Mas por que eu me sentia tão mal em meio às piadas esnobes e os olhares que mediam de cima abaixo qualquer um que eles considerassem inferiores? Mamãe, o que devem pensar de mim agora? 

— Ei, querida, estou falando com você!— A voz impaciente de minha mãe interrompeu meus devaneios, mesmo irritada seu timbre continuava moderado e calmo, por conhecê-la tão bem pude identificar isso.

— Me desculpe, mamãe, poderia repetir?— Disse em um sobressalto, estava fazendo tudo tão no automático que mal percebi estar na mesa da cozinha na companhia dos meus pais.

— É falta de educação não prestar atenção no que dizem a você, trate de corrigir isso. Enfim, estava te perguntando se vai mesmo comer tantos biscoitos assim, sabe, eu notei que você engordou um pouco, não deveria diminuir as quantidades?— O olhar carregado de expectativa me deixou nervosa. Eu tinha mesmo engordado? Era ruim eu ter engordado? Talvez ela tivesse razão…

— Você está certa, mãe...— Disse baixo, pegando apenas dois dos biscoitos para comer enquanto bebia o chá.

— Só quero o melhor para você, querida, seria péssimo para sua imagem se engordasse demais, os pretendentes fugiriam!— Eu não entendi a lógica por trás disso, sempre observei casais das mais variadas fisionomias, mas não iria responder.

— Sua mãe está certa, você ainda é jovem, mas quando ficar mais velha a tendência é virar uma baranga feia. Faça como sua mãe e se cuide desde nova, certo?— Papai entrou na conversa para nos iluminar com seu machismo diário, encantador.

— Certo...posso me retirar? Gostaria de passar mais cedo na biblioteca da faculdade para devolver os livros que peguei durante a semana de provas.

— Como esperado, você é meu orgulho, filhota— Papai parecia especialmente radiante naquela manhã, o contrário da minha mãe que mesmo com a maquiagem tinha leves olheiras estampadas debaixo dos olhos, deve ser por passar mais uma noite dormindo sozinha? Não seria eu a perguntar.

— Antes de sair deixe o login e a senha do seu sistema, vou checá-lo de hora em hora para acompanhar o resultado de suas notas— Mamãe disse enquanto retirava meu prato da mesa.

— Eu posso te dizer as notas quando saírem sem problema, mãe…

— Deixe o login e a senha— O olhar severo me capturou acompanhado do sorriso forçado, era a feição que mais me assustava. Acenei com a cabeça tirando o papel e a caneta da bolsa pendurada na cadeira rapidamente, ela soltou um murmúrio satisfeito ao me ver anotar rapidamente o que ela havia exigido.

GOOD GIRL. Imagine DabiOnde histórias criam vida. Descubra agora