𝐂𝐡𝐚𝐩𝐭𝐞𝐫 𝟔𝟓 🦋 Minha vida perdeu o brilho

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♡︎  Bárbara Narrando  ♡︎


Bati na porta levemente.

─ Pode entrar. – tia Angélica disse de dentro de sua sala.

─ Oii tia. – eu digo.

─ Oi querida! – ela me cumprimenta com um abraço. – E aí? Como vão as coisas?

─ Vão mais ou menos bem. – digo enquanto me sento de frente para ela.

─ Conta tudo. – ela diz se sentando na minha frente.

─ É que, as coisas têm sido estranhas. Tem tido, muitas coisas, ocasiões, que sempre a Lizzie está presente... – eu digo.

─ Que tipo de ocasiões? – ela pergunta.

─ Por exemplo: outro dia, o Victor e eu estavamos andando pela escola, até que nós fomos ver o quadro de avisos e tinha um cartaz falando sobre o atentado. Ontem, eu e as minhas amigas ficamos no sótão de casa, vendo fotos antigas e todas que eu via era relacionado a ela. – eu explico.

─ Entendo, então, aparições estranhas.... – ela diz anotando algo em seu bloco de notas. – Então, você sente como se tudo o que você olha, o seu cérebro liga com Lizzie, ou, você sente que realmente, são aparições físicas?

─ Acho que a primeira opção misturada com a segunda. Além de eu conectar tudo com ela, eu já não sei mais diferenciar o que é coisas da minha cabeça, e o que é real...

─ Entendo... – ela diz anotando mais algumas coisas.

Nós continuamos a conversar sobre o que acontecia na minha vida.

Realmente, tudo está relacionado à Lizzie.

Qualquer criança que eu vejo nos Outdoors, eu relaciono com ela.

Quando eu solto meu cabelo, eu lembro dela.

Quando eu coloco brincos de argola, eu lembro dela.

Isso é, repugnante.

Essa sensação de luto, de você não poder fazer nada para salvar aquela pessoa.

No meu caso, eu vi ela se soltar da minha mão.

Eu vi isso acontecer.

Isso é, frustrante.

O luto é uma coisa tão dolorosa, que parece que seu peito vai explodir.

Eu não desejo isso a ninguém.

As pessoas reagem de diferentes maneiras com o luto.

Algumas choram dias inteiros.

Outras se rendem a vícios, como drogas, cigarros, álcool...

E têm as pessoas como eu: que escondem.

Eu digo que está tudo bem, que eu estou superando, e que é só uma fase difícil.

Mas, de noite, eu continuo tomando remédios, para dormir pelo menos quatro horas por noite.

Eu digo que está tudo bem, mas eu sei que quando chegar em casa, minha lâmina vai estar à minha espera.

Eu queria desistir disso, há muito tempo.

Se olhar no meu calendário, em vários meses você encontrará a sigla "UD", ou seja, o último dia.

Mas, eu não consegui nunca cumprir com esse combinado.

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E agora, eu não consigo, e nem posso. Eu tenho pessoas que se importam comigo, sem ser meus pais.

Eu sei que se eu fosse embora hoje, eu iria deixar uma dor imensa em Victor. A dor do luto. Eu prefiro morrer do que deixar ele sofrer como eu sofri. Logo, ele acabaria como eu.

Eu sei que eu deixaria Carolina com o pensamento de "O que há de errado comigo?". Ela já perdeu sua avó, e perder uma amiga também...

Eu sei que eu tornaria Thaiga mais fria do que ela já é. Ela esconderia o que sente, como eu. Como eu sei disso? Porque eu era como ela. Eu era muito brava, brigona, adorava a sensação de poder que uma boa farpada me dava. Eu estava no comando, da minha vida, e das pessoas ao meu redor. Claramente, eu não sou mais assim.

Eu sei que Milena iria perder todo o brilho que ela tem. Sei que Mob sofreria por seu amigo, e se renderia a vícios. Sei que Crusher não suportaria ver Carolina daquele jeito, e muito menos Victor. Eu sei que Gs pararia de jogar, por minha causa.

Tia Angélica passaria a perder as esperanças com manter Victor em casa. Ela ia entrar em uma tristeza profunda, tanto por mim, quanto por Victor.

Meus pais, talvez morressem comigo, de tanto que eu sou apegada a eles, e eles comigo – além de que, eu sou a única que restou no ninho.

Isso é só das pessoas mais próximas, que eu convivo diariamente. Como ficariam meus primos? Avós?

É isso que passa na cabeça de uma pessoa que quer ir embora.

Eu me sinto presa, como se uma corda me amarrasse aqui. Eu não quero ir, mas também não quero ficar.

Não aguento mais. Por quanto tempo eu vou ter que mentir?

Mentir sobre a minha saúde, dizer mentiras sobre como eu me sinto, esconder coisas de Victor, chorar quando ninguém vê...

Às vezes, uma pessoa pode parecer perfeita, com uma vida perfeita, e isso pode causar inveja. Mas, quando você se deparar com alguém assim, pense no interior dessa pessoa. Você não sabe o que ela passa em casa, você não sabe com quem ela convive, como ela vive, você não sabe nem cinquenta por cento da vida dela.

Depois de algumas horas na sessão, eu fui embora. Fui à pé até a minha casa, que não era muito longe da clínica.

Eu pensava sobre a vida, enquanto passava pelas ruas, via as árvores, respirava aquele ar puro, e refletia. Como seria o mundo sem mim?

Com certeza, melhor.

Existem pessoas que não servem para nada. Não têm um propósito. E eu sou esse tipo de pessoa.

Eu vim com o propósito de sofrer, e só.

Parei na frente da minha casa, olhando que as cartas chegaram.

Me agachei, pegando-as do chão.

Olhei uma por uma, e vi que tinham contas, revistas novas...

As duas últimas cartas me chamaram atenção.

IML e Richiman.

Duas cartas que não chegavam em casa há 365 dias.

Eu ficava muito empolgada quando cartas da Richiman chegavam.

Mas, tudo perdeu o brilho. Minha vida perdeu o brilho.

Olhei a carta do IML, que tinha registrado no envelope o tema da carta.

Nota sobre o possível corpo

Eu tive vontade de me matar naquele momento.

Por que aquilo insistia em me perseguir?

𝐃𝐞𝐬𝐞𝐧𝐡𝐨𝐬 𝐕𝐚𝐥𝐞𝐦 𝐌𝐚𝐢𝐬 𝐪𝐮𝐞 𝐏𝐚𝐥𝐚𝐯𝐫𝐚𝐬, 𝘣𝘢𝘣𝘪𝘤𝘵𝘰𝘳Onde histórias criam vida. Descubra agora