Capítulo 3

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DESCONHECIDO

Eu sou apenas uma página em branco.

— Minha cabeça está doendo demais.

Deito com cuidado, evitando a médica que me olha com expectativa.

— Vou administrar a medicação para dor, você vai sentir um pouco de sonolência.

Concordo suavemente, evitando qualquer tipo de movimento, minha cabeça realmente está doendo, mas olhar os grandes olhos verdes da médica, cheia de esperança e não ter nada para responder é frustrante.

Eu sou ninguém.

Este é meu último pensamento antes de ser engolido pela escuridão e voltar à mulher de branco.

__________

SEHER

— Seher, você precisa ir para casa, esse cara não vai desaparecer se você tomar um banho e dormir algumas horas. –Neslihan está sentada na cama, aos pés do homem misterioso.

— Eu sei, mas alguém precisa estar aqui para quando ele acordar novamente.

— Doutora Seher, essa é a última vez que eu estou pedindo para você ir para casa descansar. –Neslihan levanta e colocas as mãos na cintura e me olhando com cara de poucos amigos.

— Então vamos fazer assim, eu tomo banho aqui mesmo, troco essa roupa por uma limpinha, descanso lá na sala e você fica com o olho vivo em cima dele, e assim que ele acordar, você me chama e eu venho.

— Seher, nós não podemos dar atenção somente a este paciente, você viu como o hospital está cheio, se o chefe pegar a gente aqui, vamos ter problemas, aliás, nós já vamos ter problemas por ter colocado um completo desconhecido em um dos melhores leitos do hospital. Quem vai bancar a conta dele? Obviamente meu salário não cobre nem os remédios que administramos nele.

— Ninguém vai pegar a gente, vou conversar com o Selim também e posso falar que o paciente estava em estado crítico e precisava de toda a ajuda possível. –Abro um sorriso amarelo tentando convencer Neslihan.

Ela revira os olhos para mim.

— Quando tudo isso aqui der errado, vou ter o prazer de falar aquela famosa frase "eu avisei". Mas você sabe o que faz, vou te ajudar, só não prometo ficar o tempo todo aqui do lado dele, tenho mais uns 30 pacientes esperando.

Dou dois pulinhos me aproximando de Neslihan e beijo sua bochecha.

— Você é a melhor, não existe no mundo enfermeira melhor que você, um exemplo de profissional e de amiga.

— OK, não vamos exagerar, eu vou cobrar esse favor mais tarde. –Pisca para mim.

— Tenho certeza que vai cobrar. Agora vou tomar um banho e dormir um pouco, vejo você mais tarde, rainha das enfermeiras, deusa suprema do jaleco branco.

Neslihan ri da minha cara de pau e sai do quarto batendo os cabelos loiros pelo corredor.

Me aproximo uma última vez da cama e olho o homem deitado nela. Seu rosto é calmo e tranquilo, a única coisa que afeta essa tranquilidade é a quantidade de curativos que tem pela cabeça. Perco a noção do tempo enquanto fico observando o subir e descer do seu peito.

Coitado. Além de estar sem memória por algum motivo que eu não faço ideia qual seja, ainda foi atropelado e despejado na porta do hospital como um lixo. Ninguém merece passar por isso.

Passo as costas das mãos de forma suave em seu rosto, sentindo a textura suave de sua barba cheia.

Um longo suspiro de contentamento escapa por seus lábios e mesmo em sono profundo, seus lábios repuxam em um sorriso fraco, aceitando meu carinho, da mesma forma que uma criança faria e isso faz meu coração apertar dentro do peito.

DUAS VIDASOnde histórias criam vida. Descubra agora