01 | O Rebuliço de Uma Lágrima

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Setembro de 2013

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Setembro de 2013. Vila Velha, Espírito Santo.

Abigail nunca imaginou que encontraria em Alguém invisível coisas que seu íntimo desejava profundamente: amor, paternidade, companhia... Tanta graça e poder concedidos a uma mera mortal eram recebidos por ela como um escândalo. E quando digo escândalo, é no sentido literal que quero que entenda.

Era um determinado sábado do penúltimo trimestre do ano. Havia acabado de começar a Primavera, estação favorita de Abigail. É o período em que as árvores e flores, antes cinzentas, amarronzadas e com aspecto cansado, dão lugar a novas versões de si mesmas: revigoradas, coloridas, exalando vida e beleza a quem desejar parar para admirá-las.

As cores amarelo, branco e rosa eram as que preenchiam a rua da moça, provindas dos ipês enormes que foram plantados ali na época dos seus bisavós. A rua era conhecida como Alameda dos Ipês.

No entanto, em nada a alegria que esta exalava se parecia com o interior da garota.

— Abigail! Está demorando por quê? — Ouviu gritos de uma voz conhecida, vinda do início da escada que dava acesso ao segundo andar da casa.

Abigail respirou fundo enquanto fechava sua Bíblia. Estivera lendo o livro dos Salmos.

Passando os dedos finos sobre os olhos vermelhos e inchados, ela limpou as lágrimas. Seu nariz deixava escorrer ranho, o que a fazia fungar a todo momento. Sua cabeça doía, em especial entre as sobrancelhas e atrás dos olhos. Ela já havia levantado de sua cama sentindo dor naquela manhã, meio perturbada pelo pesadelo que assolou seu sono.

E as expressões de seus corpo e mente nada mais eram que uma resposta aos acontecimentos do íntimo da menina: caos.

Fazia exatamente uma semana que ela se sentia — irei usar de eufemismo aqui, pois as palavras que rondavam a mente de Abigail não são nada pronunciáveis — um lixo. Uma verdadeira sucata, que não serve para ser reciclada, nem concertada, nem aproveitada. Era assim que ela se sentia.

E o pior: sentia vergonha, pois achava que o Senhor a via assim. Eu sei, absurdo.

Seis dias se passaram sem que ela conseguisse ter um tempo realmente bom a sós com Aquele a quem chamava de Pai. No domingo passado, dia de Culto da Família em sua igreja, ela foi com sua mãe. Lá, nada sentiu; os hinos não penetraram seu interior, os testemunhos não aumentaram a sua fé e a pregação em nada mudou a sua vida. Ela se frustrou, pois havia pedido ao Senhor que tocasse seu coração de forma especial naquela noite.

Na segunda-feira, quando foi separar o melhor tempo ao Senhor, sua alma não estava nos melhores momentos. Em sua mente rondava uma palavra que servia de acusação: silêncio. Deus esteve em silêncio com ela no dia anterior; com certeza havia um motivo. Talvez aquele pecado que ela cometeu, bem conhecido pelo Senhor, fê-Lo se sentir irritado com Abigail e ter decidido puni-la, mantendo-se em completo silêncio. Será que Ele já a teria perdoado naquela segunda-feira?

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