Capítulo 34

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Passam-se meses, até completar um ano sem notícias de Sr. Thomas. Aqui e ali, haviam boatos de sua morte e vida. Ninguém sabia dizer se ele ainda estava vivo. Mas de todo modo, resolvi o  meu status civil, sendo, por lei, uma mulher divorciada. Estava apta a me casar novamente, mas eu só o faria se fosse apenas com uma pessoa. Thomas Lancaster.

Depois do meu encontro com sir Benjamin, eu soube que ele perdeu tudo. O pai o deserdou após descobrir que o filho fugiu com outra mulher estando casado comigo. A família Halfenaked tentou se desculpar com a minha mãe, que não aceitou, sequer quis ter qualquer relação com a família Halfenaked. Dizem as más línguas que eles se evitaram nos eventos seguintes e sempre rolava burburinhos pelos cantos de Beaconsfield.

Continuei no casarão, atendendo ao pedido de Sr. Thomas. Fui até Bear Cross algumas vezes, na esperança de que ele aparecesse por lá. Os dias eram tão silenciosos que eu sempre voltava correndo para Bournemouth.

Eu também aparecia em Beaconsfield, mas ficava o menor tempo possível na cidade. Os boatos a meu respeito ainda existiam. Quando eu chegava à cidade, todos notavam a minha presença e não demorava muito para aparecer visitas, que eram, nada mais e nada menos, curiosos. Minha mãe diz que fiquei mais popular, e alguns cavalheiros a procuram para saber sobre mim, até mesmo os antigos pretendentes.

Com o tempo, eu criei um de altar de pedras no meio do bosque com árvores tropicais. O feito surgiu quando passei a me sentar em um tronco de árvore e empilhei pedras, pensando no sr. Thomas. Fazia preces, sem perceber, enquanto aumentava a pilha. Isso foi se tornando um hábito dos meus fins de tarde durante o verão. Quando a tristeza me dominava, eu passava mais tempo nessa tarefa.

Voltei para casa, caminhando em passos lentos. O vento estava suave misturado com a brisa do mar. As crianças, que ainda apareciam às vezes, brincavam no jardim, dando vida ao que parecia estar secretamente morto sem a presença de sr. Thomas. Todos sentam a sua falta.

— Senhora...

— Sim, Elsie.

— Algumas cartas acabaram de chegar. Deixei-as em sua mesa.

A Sra. Elsie estava tão agitada. Tentei não criar expectativas até tê-las em minhas mãos. 

Cinco cartas endereçadas a mim, com as cursivas que eu sempre reconhecerei.

Sr. Thomas! — Gritei, sem pensar no que pensariam de mim.

Sentei-me rapidamente na sala, abrindo a primeira carta, depois outra, e mais outra, até chegar à última. Elas foram escritas há meses. Enviara-as para mim sempre que faziam uma parada no outro lado da costa. Lugares novos, pessoas diferentes, outras línguas. Ele estava feliz e aprendendo muito. Perguntou muito sobre a gravidez em todas elas. Na última, ele havia recebido minhas cartas e as de Dr. Johnson, e soube o que aconteceu. Lamentou muito por não estar por perto, sentindo-se culpado por partir.

Lágrimas escorrem pela minha face, molhando algumas letras que ficam borradas facilmente no papel. O mundo parece ruir aos meus pés.

Reli as cartas várias vezes até adormecer. Despertei quando já era noite, com a voz da sra. Elsie me perguntando sobre o jantar. Eu havia sonhado com sr. Thomas, e foi um sonho bom.

— Sirva o jantar. Eu só vou... lavar meu rosto.

— Sim, senhora.

Apesar de ainda estar sozinha naquela casa, mesmo com os criados, eu estava feliz por ter tido sinais de vida de sr. Thomas. Embora eu não soubesse se ele ainda estava vivo, mas ao menos sabia que ele recebeu minhas cartas ávidas por notícias suas.

A cozinha estava alegre. As mulheres e eu cantávamos alegremente, enquanto sovávamos massas e mexíamos as caldas no folgo. O calor estava intenso dentro daqueles poucos metros quadrados, mas ainda sentíamos alegria. A sra. Elsie estava preocupada com o céu, que se fechava em um intenso cinza.

— Teremos chuva! — Disse ela, olhando para cima pela janela. — Que ela traga o que estiver faltado e leve o que estiver sobrando.

As crianças estavam amontoadas no outro lado do cômodo. Cada uma com seu brinquedo e próprio dialeto infantil, já que algumas ainda não sabiam falar.

Olhando para todos, enchi o peito e suspirei. Fiquei me perguntando se eu já tinha sido feliz assim. Pensava que não, ou não me lembrava mais de como era.

Antes que a chuva chegasse à propriedade, fui até o altar das pedras, como de costume. Sentei-me no tronco da árvore após escolher a pedras lisas, e as empilhei uma a uma, delicadamente. Já haviam bastante empilhadas, e já era difícil andar entre elas sem derrubar algumas. Fiquei ali por algum tempo. Pensei nas cartas de sr. Thomas e agradeci por elas, quem sabe, milhares de vezes. Até perdi a conta. Agradeci por ele ter se encontrado vivo para ler as que enviei, as quais reforcei em poucas palavras e nas entrelinhas que o amava. Ratifiquei que sempre o pertenci, mesmo muito antes de conhecê-lo. E desejei apenas uma coisa: que ele voltasse para casa, são e salvo.

Colhi algumas flores para colocar na mesa da sala antes de pegar o caminho de casa. Com a chuva que cairia, algumas flores poderiam se perder em poças d'águas. Isso já aconteceu muitas vezes.

 Com as flores na mão, vi a chuva se aproximando e me apressei para voltar para casa. Mas, ela me alcançou. Eu estava com o coração tão leve que não liguei. Desacelerei meus passos e continue o caminho curtindo tudo aquilo. Chegando no jardim, notei que alguém estava chegando em um cavalo negro. Sem perceber, deixei as flores caírem ao chão e corri para me encontrar, com quem quer que fosse, que estava chegando.

O cavalo parou à minha frente. O cavalheiro, que com sua capa escondia o rosto da chuva, desceu do animal e aproximou-se. Seu rosto finalmente fica à mostra.

— Sr. Thomas!

— Por que  ainda se aventura na chuva? Pedi que se cuidasse.

Ele sorri, e eu, sem pensar muito, me joguei em seus braços. Sr. Thomas me abraçou tão forte que parecia querer me sufocar. Olhei para ele, diretamente para o seu rosto molhado com as bochechas avermelhadas, e sorri. Eu estava feliz, completa e mais apaixonada do que nunca. Nossos lábios se unem, num beijo intenso e apaixonado, que esperamos tanto trocarmos, selando de vez todos os nossos sentimentos guardados e perpertuados em nossas almas.

Eu o esperei, e ele voltou. Eu sabia, o tempo todo, que sr. Thomas voltaria para mim.

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