⚠️ALERTA DE GATILHOS⚠️
Música do capítulo: In My Blood/ Shawn Mendes.
Stella 😠
Depois de uns dez minutos, viemos aqui pra casa. Com ela o caminho inteiro me interrogando, fazendo perguntas como: “O que aconteceu?”, “O que você quer falar comigo?”, “É importante?”, “Tem a ver por você estar tão estranha?”
Eu simplesmente ignorei todas elas, e dei uma dura nela para parar de me perguntar tanto. Mas na verdade, eu só queria pensar no que vou dizer e como vou dizer.
— É para treinar o giro que até agora não colocamos em prática? — minha amiga me questiona, quando entramos no meu quarto.
— Não... — murmuro e acompanho ela andando direto para o closet. — Para ser sincera, nem sei mais o que é vestir a roupa de animação. Se é que ela existe ainda...
— Um mês, Stella, um mês... Não vai demorar para os diretores irem reclamar com você. — Vejo ela abrindo a porta. — Daqui a pouco eles vão cogitar em colocar outra líder de torcida — ela praticamente me adverte, mas faço desdém. — Você mudou completamente de soft para dark. Olha essas roupas... só tem preto — ela me julga, olhando minhas roupas no closet.
— Preto não chama a atenção. — Tento não demonstrar indiferença na minha voz. — E também... não tem somente preto. Tem outras cores. — Olho para o lado. — Outra, Letícia, eu era criança, tá!? É normal ficar obcecada por cor-de-rosa e suas variações. As vezes, tem até influência da mãe — me justifico, mesmo essa não sendo a questão certa. — A sua só não vai fazer isso, porque vai ser um menino.
Ela deixa de ficar estudando as minhas roupas nos cabides, e vem até mim.
— Não se esqueça que eu também era criança, mas prefiro e uso vestidos floridos até hoje. — Ela senta na cama, ao meu lado.
— É... você não mudou nada até hoje... — Lembro, com a minha entonação baixa, olhando para minhas mãos.
— E você mudou tudo — comenta, com suas pálpebras baixas e me olhando. — Stella... você pode contar comigo sempre. Somos melhores amigas, esqueceu?
Encaro suas íris azuis. Elas estão confiantes. Igual... igual o olhar do Josh domingo a noite. Eu me senti muito confortável com ele. E, realmente, eu iria contar tudo o que aconteceu. Mas aí... bom, é... o Leonardo apareceu no corredor de uma forma tão repentina, e a minha mente simplesmente travou na hora, não consegui me raciocinar para dizer nada. O sentimento de sua presença desconfortável, simplesmente desativou todas as palavras que eu iria dizer ao Josh.
Ele estava lá comigo, segurando minhas mãos, trazendo-me confiança pelo o seu olhar. E a Letícia também está aqui, me olhando firme — não como o Josh — mas ainda sim, firme. E ela é a minha melhor amiga.
Tento ficar confortável na cama, ela está parecendo dura. Mas sei que esse desconforto estar sendo por causa do assunto delicado que pretendo desabafar. Vai ser um desafio enorme para mim, depois de tanto tempo.
— Letícia... é... — Retorso os lábios.
— O quê?
O ar está muito escasso, mal estou conseguindo respirar com total facilidade. Desde quando ela tocou no assunto que intitulei como intocável, não consigo parar de pensar nisso e em várias outras coisas.
Respiro o ar denso antes de tentar continuar:
— Lembra do Leonardo? O-o primo do Josh? — pergunto e ela assente. — Ele... no meu aniversário de treze anos. — Sinto meus olhos pinicarem, avisando que lágrimas já estão esperando para serem livremente bem-vindas. — É... — Mordo o interior da minha bochecha. — E-eu não queria, juro! Mas ele invadiu o meu quarto, o som estava alto. — Minha voz começa a ficar levemente falha. — Me desculpa por ter deixado ele me violentar, eu não tinha mais forças para gritar...
Ela me corta, colocando sua mão nas minhas. A olho de fato, e ela está com seu semblante de pena. Suas sobrancelhas juntas, suas pálpebras baixas e seus lábios levemente para baixo. Pelo o seu olhar... Tenho por mim que ela já soube o que eu quis dizer.
— Stella, eu entendi... — Os olhos dela estão marejados, nada diferente dos meus. — Eu sinto tanto, amiga... — Ela me abraça.
— Me desculpa — falo, apressadamente. — O nosso juramento de que...
— Nada disso, Stella! — Me encara. — A culpa não foi sua, amiga — confirma, com o timbre doce de sua voz.
Letícia me abraça novamente. Ficamos longos segundos abraçadas, com ela me falando palavras de apoio. Eu consegui contar para alguém, finalmente. Mas... não sei. Ainda estou me sentindo estranha... o ar ainda está denso.
— Eu ainda tenho muito medo — confesso, quebrando o silêncio e me levantando. — Medo que ele possa fazer isso mais uma vez. — Com minhas próprias mãos, abraço meu corpo. — Tenho receio de tudo, Letícia. Só de ouvir o nome dele...
— Você já falou isso para mais alguém? Quem mais sabe?
Paro com a minha inquietação e sento novamente ao seu lado.
— A, Madá. E... agora você... — respondo baixo.
— Nem a sua mãe sabe?
Aperto a colcha e viro a cabeça um pouco.
— Ela não iria entender! — falo imediatamente.
A minha mãe. Eu já pensei em contar pra ela logo quando tudo aconteceu. Mas eu fiquei com muita vergonha. Os anos foram se passando, e eu meio que quase esqueci o que houve. E agora que voltaram tudo que ele e todas as coisas que fiquei sentindo na época, eu poderia muito bem desabafar para a minha mãe. Afinal, ela é a minha mãe. É claro que ela entenderia. Se ela não tivesse se casado outra vez. Agora toda a atenção dela é voltada para o seu Jorge. Tudo é o novo marido dela, desde quando se casaram. Então, não! Ela não me entenderia..
— Como você está conseguindo viver com ele aqui, com você vendo ele todos os dias...?
Ela ganha a minha atenção. Abro a porta e deixo as lágrimas saírem, e suspiro antes de dizer:
— Ficando o dia todo trancada no quarto...
— Stella, você tem que acabar com isso. Denunciando ele...
— Não vai resolver — nego, balançando a cabeça. — Já tem tempo que ele fez aquilo comigo. — Tento respirar para ficar aliviada, mas não está adiantando tanto assim.
Abruptamente, um toque de uma música da Taylor Swift soa do celular da Letícia.
— Oi... como assim, o que ela teve? Mas a mamãe está bem?
Ela desliga a chamada. Seu semblante nublou em uma preocupação visível.
— A minha mãe passou mal... — ela comenta, tentando deixar sua voz não tão indiferente, só para eu não perceber.
— E o bebê?
— Não sei como ele está... ela está indo para o hospital agora...
— Me mantenha informada!
— Quê? — Ela franze o cenho. — Não, Stella! Vou ficar aqui com você.
— Claro que não, Letícia! — adverti. — Você tem que ir.
Ela nega com a cabeça e depois diz:
— Não. Eu vou ficar aqui com você, amiga — insiste e conserta o óculos.