Quando acordei aquele dia, senti um pressentimento ruim de que algo aconteceria. Desci as escadas sem a ajuda de Neil e o encontrei acordado, assistindo a um programa de TV. Passei por ele e fui para a cozinha preparar o café, mas ele parecia não perceber. Fiz panquecas e o cheiro se espalhou pela sala. Neil olhou para mim enquanto eu colocava as panquecas em um prato e se aproximou. Ele parecia aflito, e eu não gostava disso.
- Está tudo bem?- eu perguntei
- August- ele disse com a voz beirada a nervosismo
Eu não disse nada e esperei que ele continuasse. Ele percorreu os olhos por toda a cozinha e sala, mas não me encarou. Mesmo quando começou a falar, ele não olhava para mim.
- Precisamos falar sobre ontem- colocou as mãos juntas em cima do balcão da cozinha e passou a olha-lá
- Eu já sei o que você vai falar, que não podemos, bla bla- eu disse de forma infantil
- Eu vou me mudar- ele disse de uma vez só. Por um segundo eu pensei ter ouvido mal. Toda minha saliva secou, meus olhos incontrolávelmente assustados
- Porra- foi a primeira coisa que eu disse
- Porra é isso que tem a dizer?- gritou
- Por que?- eu disse dramaticamente
- Se convivermos no mesmo lugar vamos acabar fazendo coisas como a que fizemos na noite passada
- E?
- Você sabe que não vai dar certo, você mesmo costumava dizer isso. E continuar aqui só vai piorar a nossa relação que por enquanto ainda está boa
- Achei que tínhamos dado um primeiro passo
- Para continuarmos a ter uma relação boa, precisamos ter espaço, para pensar, para entender tudo- Pontuou- Vou morar em Londres
- E você acha que indo morar em Londres vai ajudar?- bati a mão fechada contra a mármore do balcão
- Eu espero que sim- ele saiu andando e eu fui atrás
- Como pode dizer isso e sair andando?- eu gritei
- Olha, você não entende- ele virou irritado para mim
- Estamos no mesmo barco aqui- eu disse
- Podemos até estar. Mas você, você não acredita que as pessoas precisam de espaço para pensar- ele voltou a andar e dessa vez eu deixei que ele fosse e o observei subir as escadas.
Me sentei no sofá e soquei a almofada. Droga de Neil. Claro que estávamos no mesmo barco, ele que não sabe ver isso.
Aquela noite, ele disse tantas coisas, que me amava, nós transamos. Como ele pode achar que isso não é nada? Se nós começassemos de novo, seria diferente, eu sei que seria.Olhei o relógio e quase que automaticamente eu me levantei, me troquei e fui trabalhar, sem Neil. Peguei um ônibus ao invés de espera-lo, para ter que ouvir a mesma coisa no carro. Porque parece que a minha presença faz mal.
Entrei na clínica, já torcendo para sair. Não tive muitas consultas também, apenas 3 e 3 delas era de uma menina fofa, a mãe dela era meio rude, mas isso não prejudicava em nada, só era chato. Ela tinha deficiência intelectual, e eu estava usando de brinquedos para exercita-la, mas a mãe aparentemente diz que me pagar não ajuda em nada, como se isso fosse se resolver em 10 segundos.
Sai da clinica também aumaticamente. As palavras de Neil não saia da minha cabeça. Ele estava sendo egoísta dessa vez, não eu e se ele quer mesmo ir embora, vou deixar.
Quando cheguei em casa, encontrei Neil saindo com mala e cunha. Eu não olhei para ele enquanto saia arrastando as rodinhas da mala. Ele já estava planejando isso, claro que já. Como fui bobo em acreditar que podíamos recomeçar.
Me sentei no sofá e afoguei as mágoas na almofada. Foi como voltar no tempo, onde eu tinha que chorar calado para que Neil não escutasse e agora eu posso chorar alto, gritar. Eu lembro que ele disse que nunca me faria chorar como Harry fez e ele fez. Me ajeitei no sofá assim que meu celular apitou. Era uma mensagem de um número desconhecido.
Eu ia ignorar, mas pensei que poderia ser importante. Quem atende a ligação ou responde a mensagem de um número desconhecido? Eu só não queria pensar em Neil.
Meus olhos estavam embaçados, então esfreguei a manga da blusa nos olhos e consegui ver melhor
Desconhecido: Espero que esteja passando bem. Gostaria de obter um posicionamento sobre a continuidade do processo de divórcio, uma vez que não obtive retorno de sua parte nem do seu marido. Portanto, decidi enviar esta mensagem para obter esclarecimentos.
Atenciosamente, Harry Hiddleston
Só podia ser ele. Sempre aparecendo nos momentos indesejáveis. Desliguei o celular e voltei a liga-lo de novo.
Eu: Se estiver livre me encontre no Quo Vadis em uma hora.
Eu não esperei sua resposta e saí com um casaco na mão. Voltaria a Londres de novo, mas não tinha medo. Meu maior medo agora era ver Neil.
Peguei um ônibus até Londres. De carro com certeza era mais rápido, mas Neil levou o nosso carro. Ok, nunca tenham carro compartilhado, quando seu marido for embora ele vai leva-lo com ele.
Desci no ponto mais próximo do restaurante e caminhei um pouco até lá. Eu já tinha vindo nele antes com a mamãe e Luke.
Adentrei o local e ele era frio e aconchegante, o que era mistura engraçada. Da última vez que vim, o ambiente era quente. Uma mulher me direcionou até uma mesa, e eu fiquei ali sentado. Pensei em uma mesa no centro para que ele pudesse ver, mas pensei que no canto seria mais surpreendente.
Olhei pela câmera do meu celular a minha aparência e estava meio desgostosa. Eu nem pensei em me arrumar. Ainda estava com os olhos inchados. Não queria dar motivo para Harry perguntar então quando o homem trouxe a água com gelo eu peguei um e me escondi debaixo da mesa e passei em volta dos meus olhos. Na minha cabeça aquilo funcionaria.
Ouvi um barulho e quando fui me levantar bati a cabeça na mesa. Droga. Eu tentei me recompor ali mesmo e encontrei Harry meio confuso. Ele teria rido em outros momentos. Mas ele só estava confuso, com sua maleta preta, seu terno preto suas luvas de mesmo tom. Saudades de quando ele usava roupas mais casuais ou quando não as usava.
- Desculpe o atraso- ele disse se sentando a minha frente e deixando a maleta de lado
- Tudo bem- sorri e ele não expressou nada
- Você está bem?- perguntou ao observar meus olhos inchados. Sabia que ele ia notar
- Sim- concordei e ele não questionou mais nada
- Bom, o senhor disse que queria continuar com o processo, certo?- ele disse com toda sua formalidade
- Isso
- Posso começar fazendo algumas perguntas para entender melhor a situação? Há quanto tempo você está casado e você tem filhos?
- quatro anos. Não, não temos- neguei
- Há consentimento de ambas as partes?
- Claro- eu concordei. Aquilo não era totalmente verdade, meu coração não consentia para aquilo
- O processo pode demorar 3 meses para ser concluído. Se seu marido concordar, não teremos muitos problemas e o processo será tranquilo
- E se ele não concordar?