Waldhar Hvitstreik era o inimigo de todos os Jötnar que viviam na Escandinávia naquela época. Não apenas devido as crueldades que essa raça levava aos seus escravos, os homens e mulheres do norte, mas, especialmente, porque havia um fogo ardente que inflamava ao vê-los.
Em vista disso, ele se encarregou de matar os Reis-Feiticeiros de Jötunheimr em combates abertos e pré-arranjados, em vez de na guerra; os campos da rebelião, ele deixou para os exércitos crescentes de Ástridr e seu esposo-irmão jötunn.
Waldhar convocou Járnglumra, o Estampido de Ferro, para um duelo. Seu nome não se sabe se deriva da sua habilidade de convocar uma poderosa voz capaz de mover montanhas ou do som da luz mortal de Hvitstrike de quando seu projétil, após sair da fumaça branca, atingiu o Rei-Feiticeiro do Reino de Agder. E o Clérigo de Asgard comeu as veias de seu pescoço enquanto gritava impropérios a Judas Iscariotes, um nome que ninguém conhecia ainda.[1]
Quanto a Beinvidr, o Madeira de Osso, do Reino de Rogalândia, sua cabeça foi esmagada sobre o altar dos cervos, o animal preferido dos xamãs jötnar. E, em sua sabedoria, Waldhar disse um pequeno feitiço de praga para impedir que o mal contido naquele altar se reformasse por meio da magia seidr, típicas de traidores da causa.[2]
Mais tarde naquela temporada, Waldhar matou Björgólfr, o Lobo Abrigado, nos degraus de granito do Reino de Sogn, onde as lanças do Rei-Feiticeiro conheceram sua primeira objeção. Por um tempo, nenhuma arma dos jötnar poderia perfurar armadura de placas de aço, que Waldhar admitiu ser diferente de qualquer outra feita por homens daquele tempo, mas não diria mais nada mesmo quando pressionado.
No que concerne o Reino de Hordalândia, foi um caso incomum nesses tempos. Sua capital, hoje chamada de Narvik, foi encontrada vazia pelos exércitos da rebelião, porém ao anoitecer batalhões eram massacrados e não havia uma grande mente que sabia dizer o motivo. Por três noites, soldados nórdicos foram mortos sem ver seus inimigos nos olhos. Até o momento que uma sagaz skjaldmaer [donzela-escudeira] descobriu que os gigantes com o uso de magia seidr ficavam invisíveis nas ruas, respiravam abaixo d'água nos rios e flutuavam acima dos telhados nos céus. Depois disso, a conquista dessas terras se tornou breve e o Rei-Feiticeiro Fjalarr, o Ocultador, rapidamente foi estourado em mil pedaços de sangue e carne pela luz mortal de Waldhar. Por esse ato de perspicácia, a cidade foi rebatizada em homenagem a skjaldmaer Viktoria como Viktoriahavn.
Quando Mímir Bölthornssen, o Sábio,[3] o ermitão a quem Waldhar foi cuidado em sua conturbada chegada a Midgard do Reino Desconhecido e a muito amava, foi levado a morte de uma ponta de flecha feita da galhada de um cervo ancestral de Glámr, o Brilho Pálido, Hvitstrike entrou em sua primeira loucura. Ele causou a destruição do Reino de Halogalândia, e apagou essas terras dos mapas de Jötnar e dos Homens, e todas as coisas nelas, e Ástridr foi forçada a fazer sacrifícios aos Deuses para impedi-lo de deixar o mundo em desgosto.
E então veio o Primeiro Cerco de Galdhøpiggen, a Garganta do Norte, a maior das montanhas da Escandinávia. Diziam as lendas de outrora que lá jazia o Coração de Ymir, o Caos Criador, arremessado ao outro lado do mundo por Odin, o Rei dos Nove Æsir e Vanir, após a primeira das muitas batalhas entre os gigantes e os deuses. Nela, os deuses primordiais e os jötnar sem-pêlos que há muito invejavam e desejavam o poder de Ymir e seus seguidores. Assim, uma guerra foi travada e o corpo do Caos Criador foi utilizado na construção do Cosmos como o conhecemos. E Midgard apesar de ter sido criada com outra parte, a vida e a luz que ela sustenta foi feita de seu coração.
No tempo que Odin, o Pai de Todos, tentou arrancar o coração de seu ancestral jötunn, ele riu e exclamou que "Este Coração é o coração do mundo e sustentará sua vida, pois um foi feito para satisfazer o outro. Não importa o quanto tentes controlar o destino, tu falharás, ó Wuotan.". E sabendo que tal caos não poderia ser domado, simplesmente o arremessou ao outro lado do mundo onde nunca seria encontrado, mais do que isso em seu lugar de pouso formou Galdhøpiggen, a Garganta do Norte.
Os Jötnar tinham conhecimento das lendas de outrora e montaram seu Novo Hall de Útgardr no topo da maior das montanhas da Escandinávia a fim de encontrar o Coração de seu ancestral e acessar seu poder. Enquanto não o encontravam, os diversos Reis-Feiticeiros realizaram pactos com os diversos demônios presentes nos cantos escuros de Yggdrasil: em Helheimr, a Rainha dos Mortos, Hel, proveu legiões de draugr [mortos-vivos] que serviriam para labutas ilegítimas; e em Múspellsheimr, o Rei do Mar de Fogo, Surtr, proveu os Guerreiros das Cinzas, gigantes de fogo, cujo chama há muito apagara e, portanto, não mais de utilidade. Em retorno, a demônia dos mortos e o demônio do fogo receberam orações e oferendas, o que nunca antes havia lhes auferido.
Em meio a mesquinhas brigas entre os fieis de diferentes demônios, os Jötnar renomearam o terrível "meio-deus" Hrymr, o Decrépito, como seu campeão... pela primeira vez desde sua chegada, foi Waldhar quem foi chamado à batalha por outro, pois Hrymr tinha o sangue imortal do Caos Criador e nunca conheceria a morte.
Muito orgulho de sua genealogia, ambas de ascendência e descendência, o Campeão dos Jötnar tinha. Através de sua mãe Grýla, a Bruxa Raposa, era neto de Ymir Primeiro-Gigante, e através de sua filha, Angrboda, a Portadora de Pesares, é avô das Criaturas do Apocalipse, Hel, Fenrir e Jörmungandr.
O cerco foi um desastre e o sangue do Clérigo de Asgard foi derramado pela primeira vez no gramado nevado, onde nunca mais nascera uma única planta. Tal era o poder daquele que um dia comandaria as legiões de gigantes através do navio Naglfar no dia do Crepúsculo dos Deuses [Ragnarök].
Ele era Hrymr, o Conquistador, aos estrangeiros. Ele era Hrymr, o Amaldiçoado, aos nativos. Ele era Hrymr, o Opulento, aos ricos. Ele era Hrymr, o Mesquinho, aos pobres. Ele era Hrymr, o Benevolente, aos mestres. Ele era Hrymr, o Cruel, aos escravos. Ele era o Alto-Rei-Feiticeiro da Escandinávia aos nossos antepassados. Ele será o Capitão das Legiões de Naglfar aos nossos herdeiros.
Porém para todos, Ele era, Hrymr, o Decrépito,
E por todo o tempo, sua tirania e crueldade seriam infindáveis.
Referências Editoriais
[1]. Anteriormente, no Volume 2, é mencionado que Waldhar Hvitstreik se autodenomina de o "Carniceiro de Halogalândia", apesar de o ocorrido que o rendeu esse nome não ter ocorrido ainda, depois é mencionado que utilizava uma "armadura de placas de aço de um tempo futuro", e agora ele próprio menciona Judas Iscariotes, "um nome que ninguém conhecia ainda". Nesse sentido, é possível pensar que o personagem é um tipo de viajante vindo do futuro ou de fato a encarnação do æsir Odin, e portanto, onisciente. Ou talvez o autor original desses textos não era contemporâneo dos ocorridos da Grande Rebelião do Norte e sim era de um tempo futuro ao início da Era Cristã.
[2]. Magia seiðr na Era de Expansão Viking, entre os anos 700 e 1000 da Era Cristã, tinha conotações de falta de masculinidade ou efeminação, pois seus aspectos manipulativos eram contrários ao ideal masculino de comportamento franco e aberto. No entanto, como estabelecido anteriormente, a Grande Rebelião do Norte ocorreu entre cerca de 600 e 400 antes da Era Cristã, portanto essas conotações podem não ter sido desenvolvidas ainda. Ou talvez se trata de um prelúdio para a relação homoafetiva de Waldhar e Mímir.
[3]. Nesse momento, Mímir Bölthornssen, o Sábio, é mencionado pela primeira vez. A primeira questão a se debater é acerca seu sobrenome que implica ser filho do jötunn Bölþorn, o Espinho-Maligno. O que também implica que Mímir é irmão da jötunn Bestla, a Doadora-de-Madeira, e portanto, tio de Odin. Se isso também implica que Mímir que Waldhar tem algum parentesco, fica aberto a debate.
[4]. É interessante que o autor desconhecido descreve Surtr de Múspellsheimr como demônio, afinal, nós, escandinavos, apenas começamos a crer em demônios com a chegada do Cristianismo em nossas terras. Isto é, por volta dos anos 900 e 1000 da Era Cristã, algo que pode indicar que o autor original era de algum desses tempos. Portanto, praticamente contemporâneo a escrita da atual reconstrução desse épico. Algo que conflita com os fragmentos foram utilizados como base teórica encontrados na Biblioteca Real de Vestfold, que, tal qual o Rei-Juiz Sigtrygg, provavelmente datam de meados dos anos 300 da Era Cristã.
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A Canção do Clérigo de Asgard
FantasyDurante os dias que procederam o fim da Idade Média, muitas calamidades assolaram a terra. No entanto, ao padre católico Walter Loxley de Northampton, a pior delas, eram os devotos da nova Reforma Protestante. Visto que muitos reis protestantes tinh...